Acórdão nº 159/17.8T8AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução12 de Julho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 159/17.8T8AVR.P1-Apelação Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro-Juízo Central Cível de Aveiro-J3 Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Miguel Baldaia 2º Adjunto Des. Jorge SeabraSumário:I- Não é possível ao cônjuge não devedor no âmbito do procedimento cautelar de arresto-diferentemente do que acontece na execução, no caso de penhora-requerer a separação de bens.

II- Também por esse motivo não cabe no procedimento de arresto, proceder à citação do cônjuge não devedor nos termos do artigo 740.º, nº 1 do CPCivil.

III- Por conseguinte não podem ser arrestados bens comuns do casal para garantia de pagamento de crédito de um dos cônjuges em relação ao outro.

IV- Da mesma forma que não é admissível o arresto do direito à meação ou do quinhão de um dos cônjuges na partilha que venha a ocorrer em cada um dos concretos bens que façam parte do património comum do casal, por tal direito não existir, enquanto tal, no património de cada um deles.

* I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto:B…, residente na Rua …, nº…, …, …., Anadia, instaurou o presente procedimento cautelar contra C…, com domicílio profissional na Praceta …, …, …. - … Anadia, e D…, tradutora, com domicílio profissional no escritório do 1º requerido e pessoal na Rua …, Edifício …, …, …. - … Anadia, pedindo que se proceda ao arresto dos seguintes bens: a) Casa de habitação correspondente à casa de morada de família, descrita na Conservatória do Registo Predial de Anadia sob o nº1633/19940331; b) Recheio da referida casa, do escritório do requerido e do apartamento onde o mesmo reside actualmente, bem como quatro veículos automóveis, melhor identificados no requerimento inicial; c) Saldos e/ou valores de qualquer cofre e/ou contra de depósito (à ordem ou a prazo), incluindo acções e demais valores e produtos financeiros 1, titulados pelo 1º requerido e pela 2ª requerida, em qualquer instituição bancária e/ou financeira a operar em Portugal ou no estrangeiro; d) As remunerações do requerido enquanto advogado e administrador de insolvência, incluindo remunerações variáveis em processos especiais de revitalização; e) Todos os bens de que a requerida seja titular; f) Todas as contas em offshores registadas em nome de qualquer dos requeridos.

Para o efeito, alegou, em resumo, o seguinte: - A requerente é casada com o requerido, sob o regime supletivo da comunhão de adquiridos; - No mês de maio de 2016, o requerido decidiu abandonar a casa de morada de família, passando a residir com a ora requerida; - A requerente pretende instaurar uma acção de divórcio e obter uma indemnização pelos danos morais que os requeridos lhe causaram; - Com a separação, a requerente viu o seu rendimento e nível de vida mensal baixar drasticamente, sendo que na sede própria irá exigir ao requerido uma pensão de alimentos em valor não inferior a 2.000,00€; - A requerente, embora desconhecendo com exactidão o quantitativo de aplicações financeiras que o requerido possui em instituições bancárias, tem fundado receio de que o mesmo transfira todo o dinheiro de que é titular, podendo ter contas em offshores; - O requerido colocou avultadas quantias em contas de que é titular a sua actual companheira, ora requerida, que é cúmplice na dissipação de bens que o mesmo pretende levar a cabo; - Com tal comportamento, o requerido pretendeu apenas tirar aqueles montantes do alcance da requerente, pois são bens comuns do casal.

*Foi proferido despacho de aperfeiçoamento, em 23/2/2017, com os fundamentos de fls. 504, que se dão por reproduzidos, tendo a requerente, nessa sequência, peticionado que se procedesse ao arresto do “quinhão do requerido na partilha que venha a ocorrer”.

*Produzida a prova arrolada foi, a final, proferida decisão que julgou o procedimento cautelar parcialmente procedente e, consequentemente, decretou o arresto dos seguintes bens: - Saldo da conta bancária titulada pela requerida no Banco E…, agência de …; - Direito litigioso e respectiva acção de indemnização, no valor de 5.000,00€, arbitrado por sentença proferida em 24/7/2006 nos autos de acção sumária que correram termos sob o nº1283/04, no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Anadia, devida pelos aí réus F… e mulher G…; - Direito litigioso e respectiva acção de indemnização, no valor de 10.000,00 €, reclamada pelo de cujos nos autos de acção sumária que correram termos sob o nº1282/04.4TBAND, no 1º Juízo do Tribunal Judicial de Anadia, devida por H… e I…; - Prédio urbano inscrito na matriz sob o art. 43º, da freguesia de …; - ½ (metade) do prédio urbano inscrito na matriz sob o art. 48º, da freguesia de …; - Prédio rústico inscrito na matriz sob o art. 2439, sito nas … ou …, da freguesia de …; - ½ (metade) de um jazigo com duas sepulturas, no talhão do meio, com o nº11, no cemitério ….

*Não se conformando com o assim decidido veio a requerente interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte: I. Manifesta-se a óbvia discordância da recorrente relativamente ao entendimento expresso na decisão recorrida no entendimento de que “não há lugar, conforme pretendido pela requerente, ao arresto “da meação dos bens comuns” ou “ do quinhão do requerido na partilha que venha a ocorrer””. É que; II. Tendo em conta a prova supra produzida não restam dúvidas de que os requisitos referidos no art.º 391.º do CPCivil estão devidamente preenchidos.

  1. Sendo, portanto, exigível, está devidamente demonstrada a prova sumária da existência do direito –“fumus bonus iuris”– e o risco de ver o seu direito lesado se não lançar mão do procedimento cautelar – “periculum in mora”.

    NESTE SENTIDO; IV. Para garantia de tal crédito, entendeu o Tribunal a quo que apenas seriam arrestáveis os “bens próprios” do requerido.

  2. É neste entendimento que reside a discordância da recorrente/requerente com a decisão proferida. É que; VI. Salvo melhor opinião e sempre com o devido respeito, no entendimento da recorrente configura-se enquanto (equiparado a) “bem próprio” o direito à meação do requerido C… na globalidade dos bens comuns do casal.

  3. Tal emerge claramente do disposto no art.º 1696.º n.º 1, in fine, do CCivil, ao estabelecer que “Pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem os bens próprios do cônjuge devedor e, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns.”.

  4. Do mesmo modo, ao contrário do que emerge da decisão recorrida, o direito à meação é penhorável-cfr. redacção dada ao art.º 825.º do CPCivil pelo Decreto-Lei nº 47690 de 11-05-1967, que previa expressamente na “Subsecção I-Bens que podem serpenhorados” a “Art.º 825.º - Penhora da meação em bens do casal” - e; IX. Consequentemente é alienável, como é apanágio num grande conjunto de execuções e processos de insolvência em todos os tribunais deste país.

  5. O que sucede na esteira do art.º 1730.º n.º 1 do CCivil que estatui a regra da meação ou seja a de que os cônjuges (ou ex-cônjuges sem partilha efectivada) participam por metade no...

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