Acórdão nº 3630/15.2T8GDM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução19 de Junho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 3630/15.2T8GDM. P1-Apelação Origem-Comarca do Porto-Gondomar-Inst. Local-Secção Cível-J2 Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Miguel Baldaia 2º Adjunto Des. Jorge Seabra 5ª Secção Sumário: I- O regime dos defeitos instituído para a compra e venda, por força do artigo 939.º do CCivil, tem aplicação a outros contratos tipificados neste diploma, tais como o de sociedade, de doação com encargo ou de dação em cumprimento, ou regulados em diplomas avulsos (por ex., locação financeira) e mesmo contratos atípicos, como a permuta, razão pela qual é aplicável a este último contrato, verificando-se os demais requisitos, o estatuído no artigo 1225.º do CCivil.

II- Quando se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível, também impede a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido (cfr. artigo 331.º, nº 2 do CCivil).

III- Todavia, esse reconhecimento deve ser expresso, concreto ou preciso, de modo a não subsistirem dúvidas sobre a aceitação, pelo devedor, dos direitos do credor, não sendo suficiente a simples admissão vaga ou genérica desse direito, não sendo, porém, exigível que tenha de revestir o mesmo valor do acto que deveria ser praticado.

IV- Verifica-se tal reconhecimento se o construtor/vendedor procede à reparação de alguns dos defeitos denunciados, ainda que frustrada, e desde a denúncia se deslocou ao imóvel todos os anos até 2015 a fim de proceder à sua eliminação.

V- Não existe fundamento para fixar um montante indemnizatório a título de danos morais se apenas ficou provado que os defeitos existentes no imóvel, adquirido pelos Autores, não lhes permitiram usufruir do conforto natural que o mesmo lhes deveria proporcionar*I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B... e C..., casados, residentes na ..., .., ..., Gondomar, intentaram a presente acção declarativa de condenação contra D..., Lda., com sede na ..., n.º ..., ..., Gondomar, pedindo a sua condenação a proceder à eliminação dos defeitos de obra no imóvel propriedade dos autores, no prazo máximo de 60 (sessenta dias), bem como ser condenada a pagar a quantia de € 10 000,00 (dez mil euros), a título de danos não patrimoniais.

Alegaram, para tal e em suma, que, em 21 de Julho de 2009, através de contrato de permuta e mútuo com hipoteca, em cumprimento de contrato promessa de compra e venda anteriormente celebrado, autores e ré transferiram para os primeiros a propriedade do imóvel descrito no artigo 1.º da petição inicial, sendo que em Dezembro de 2009 o imóvel começou a evidenciar defeitos os quais foram comunicados à ré, que sempre se apresentou e assumiu como construtora do imóvel. Mais alegaram que a ré, por si ou através da sociedade E..., Lda., procedeu como achou conveniente para a eliminação dos defeitos, porém tal reparação/eliminação não se revelou adequada e suficiente, uma vez que os defeitos denunciados continuam a afectar o imóvel em crise.

*A Ré contestou a acção nos termos e com os fundamentos que constam do articulado de folhas 107 a 110, defendendo-se por excepção e por impugnação.

Por excepção invocou a inaplicabilidade do prazo de garantia de cinco anos, por o negócio celebrado entre as partes ter consistido num contrato de permuta, excepcionou, ainda, a caducidade do direito de eliminação dos defeitos, pelo decurso do prazo previsto no artigo 1225.º do Código Civil.

Por fim, impugnou parte da factualidade alegada pelos autores.

*Os autores responderam às excepções invocadas, pugnando pela improcedência das mesmas.

*Foi proferido despacho saneador, despacho de enunciação do objecto do litígio e temas de prova.

*Procedeu-se a julgamento com observância das formalidades legais.

*A final foi proferida sentença que, na procedência da invocada excepção peremptória de caducidade, julgou a acção parcialmente procedente por provada e, em consequência condenou a Ré D..., Lda a: 1)- no prazo de sessenta dias, proceder às seguintes reparações no prédio urbano dos autores sito na ... n.º.., ..., Gondomar: - reparar as humidades em várias divisões da habitação, em consequência das paredes exteriores rachadas (nas duas frentes), reparando tais paredes e o peitoral da janela partido; - reparar as infiltrações de água em várias divisões da habitação e os danos no rodapé, soalho parquet e nas paredes da habitação; - reparar as fissuras em todas as divisões da habitação e no tecto e paredes laterais de várias divisões e pisos da habitação; 2) a pagar aos autores a quantia de € 2.000,00 (dois mil euros), a título de danos não patrimoniais e 3) absolveu a Ré do demais peticionado pelos autores;.

*Não se conformando com o assim decidido, veio a Ré interpor o presente recurso, concluindo as suas alegações nos seguintes termos: 1ª- Por escritura pública de 21 de Julho de 2009, de permuta, a Ré transferiu a propriedade do seu prédio urbano composto de casa de rés-do-chão e andar sito na ..., .., ..., Gondomar, descrito no Registo Predial sob o nº 2467, e inscrito à matriz sob o artigo 4971º, para os Autores e estes, na mesma escritura, de permuta, transferiram para a Ré, a propriedade da fracção autónoma designada pela letra “E”, correspondente a uma habitação no 1º andar esquerdo, com entrada pelo nº 932, da Rua ..., freguesia ..., concelho da Maia.

  1. - Tendo sido a transferência da propriedade da Ré para os Autores, não por compra e venda, mas por permuta, o prazo de garantia de cinco anos, previsto no nº 1 do artigo 1225º do Código Civil, não é aplicável ao caso sub judice.

  2. - O disposto nos nºs 1, 2 e 3 do artigo 1225º do Código Civil é aplicável apenas ao “vendedor de imóvel”.

  3. - O contrato de compra e venda tem uma natureza jurídica diferente da permuta. “Compra e venda é um contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço”, art.º 874º do C. Civil. A permuta consiste na troca de propriedade de uma coisa ou direito por outra coisa ou direito.

  4. - O disposto no artigo 1225º do Código Civil destina-se a proteger o comprador de imoveis destinados a longa duração e não os permutantes adquirentes de imoveis.

  5. - Ficou como facto não provado que: os autores nunca tiveram conhecimento do mau isolamento do imóvel, assim como a causa dos defeitos enunciados no momento da aquisição do imóvel em crise.

  6. - Razão pela qual, tratando-se, não de uma compra e venda, mas de uma permuta, cada um dos permutantes adquire a propriedade do bem permutado no estado físico em que se encontra ao momento da permuta.

  7. - O disposto no Decreto-Lei nº 67/2003 de 8 de Abril é aplicável “aos contratos de compra e venda celebrados entre profissionais e consumidores”. E define “VENDEDOR”, qualquer pessoa singular ou colectiva que, ao abrigo de um contrato, vende bens de consumo no âmbito da sua actividade profissional.

  8. - A Meritíssima Juíza do Tribunal a quo, não fez correta aplicação do disposto no artigo 1225º do Cód. Civil e Dec. Lei 67/2003 ao contrato de transferência da propriedade do imóvel para os Autores, que foi de permuta, e não de compra e venda, como referem as disposições legais enunciadas.

    Por outro lado, 10ª- O imóvel foi permutado aos Autores a 21 de Julho de 2009, que tomaram posse do mesmo nessa data.

  9. - Confessam os Autores–art.º 29 da P.I.–que “Actualmente o imóvel possui os mesmos defeitos que foram comunicados em Dezembro de 2009”.

  10. - Como resulta do depoimento do sócio gerente da firma E..., Lda., construtora da obra de pedreiro e trolha do prédio em causa, depois da intervenção que fez no prédio 2010/2011, nunca mais comunicou à Ré os defeitos da obra cuja reclamação o Autor fazia.

  11. - As instâncias dos advogados e da Meritíssima Juíza, por mais que uma vez, sempre foi peremptória a dizer: J – Pronto, e agora volto a perguntar novamente.

    Quando foi lá, o senhor já disse que não reparou porque havia outras coisas é isso? T – Sim, sim.

    J – E o senhor não assumiu, mas a parte essa não reparação foi perante o Sr. B..., ou falou com a D...? (22:43 a 22:46) T – Não, foi só perante o Sr. B.... (22:47 a 22:48) J – Então mas porquê portanto, preciso de perceber isso.

    Quem é que o chamou lá, foi o Sr. B...? (22:49 a 22:54) T – Foi o Sr. B..., sim, sim. (22:54) J – E ele tinha o seu contacto é isso? (22:55 a 22:56) T – Tinha, tinha. (22:57) J – Ou seja, quando havia esses problemas, contratava, falava consigo? (22:57 a 23:00) T- Sim falava sim comigo, algumas vezes sim, ele ficou com o contacto a partir da 1ª intervenção.

    (23:00 a 23:06) J – E o senhor deu conhecimento à D... que ia lá tratar disso? (23:06 a 23:08) T – Não dei não. (23:09) J – Não deu conhecimento, pronto.

  12. - Os contactos, a partir da 1ª intervenção, 2010/2011, foram em exclusivo entre o Autor e o representante da construtora, E..., Lda. que não deu conhecimento à Ré.

  13. - A interpelação dos Autores, verificou-se logo em 2009 e com a missiva de 1 de Junho de 2015.

  14. - Não houve conhecimento e muito menos reconhecimento dos defeitos da obra, depois da intervenção em 2010/2011.

  15. - A 1 de Junho de 2015, já estavam os Autores a denunciar os defeitos para além dos 5 anos de garantia.

    De qualquer modo, 18ª- Se os defeitos eram os mesmos de 2009, como alegam os Autores, se houve uma intervenção a 2010/2011, se os mesmos não foram reparados, ao proporem a acção a 15 de Dezembro de 2015, já havia caducado, nos termos do nº 2 do artigo 1225º do Código Civil, e nº 3 do artigo 5º-A do Dec. Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, os direitos dos Autores a verem reparados os defeitos, e a pedirem indemnização.

  16. - Os factos invocados pelos Autores para fundamentar o pedido de indemnização por danos não patrimoniais foram considerados não provados.

  17. - Considerar provado que os defeitos descritos não permitiram aos Autores usufruir do conforto natural que a sua habitação lhes deveria proporcionar, impedindo-os que habitassem em imóvel com características que lhes garantissem conforto à sua pessoa, é conclusivo, sobretudo quando os factos relevantes para...

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