Acórdão nº 4871/14.5T8LOU-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelMIGUEL BALDAIA DE MORAIS
Data da Resolução23 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 4871/14.5T8LOU-A.P1 Origem: Comarca do Porto, Porto – Instância Central – 1ª Secção de Execução, Juiz 6 Relator: Miguel Baldaia Morais 1º Adjunto Des. Jorge Miguel Seabra 2º Adjunto Des. José Sousa Lameira*Sumário I- Na ação executiva a causa de pedir não se confunde com o título executivo, porque aquela é o facto jurídico de que resulta a pretensão do exequente e que imana do título, por isso, a causa de pedir é o facto jurídico nuclear constitutivo da obrigação exequenda, ainda que com raiz ou reflexo no título.

II- Para ser conferida exequibilidade extrínseca a um documento particular constitutivo ou recognitivo de uma obrigação, torna-se mister a sua autenticação por entidade dotada de competência para esse efeito, visando, desse modo, assegurar a compreensão do conteúdo do mesmo pelas partes.

III- A validade dessa autenticação implica que seja efetuado o registo informático do respetivo termo dentro do prazo estabelecido no art. 4º da Portaria nº 657-B/2006, de 29 de junho, isto é, que o mesmo seja realizado no momento da prática do ato ou nas 48 horas seguintes se, em virtude de dificuldades de caráter técnico, não for possível aceder ao sistema nessa oportunidade temporal.

IV – A inobservância do referido condicionalismo temporal, afetando a validade do termo de autenticação, implica que o documento particular não chega sequer a adquirir a natureza de documento particular autenticado, não podendo, nessa medida, servir de base à ação executiva, por não consubstanciar título passível de ser subsumido à fattispecie da al. b) do nº 1 do art. 703º do Cód. Processo Civil.

* Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I- RELATÓRIO Por apenso à ação executiva que lhes é movida por B… e C… vieram os executados D…, E… e “F…, Sociedade de Construções Ldª” deduzir os presentes embargos de executado advogando, para além do mais, que o documento dado à execução não possui os requisitos necessários para valer como título executivo.

Notificados os exequentes, apresentaram contestação pugnando pela improcedência dos embargos.

Realizou-se audiência prévia, no âmbito da qual se proferiu saneador/sentença julgando procedentes os embargos, por se considerar que os exequentes não dispõem de título executivo em que possam basear a execução, dado que a autenticação do documento particular que apresentaram para esse efeito não obedeceu aos requisitos legalmente exigidos.

Não se conformando com o assim decidido, vieram os exequentes/embargados interpor o presente recurso, que foi admitido como apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Com o requerimento de interposição do recurso apresentaram alegações, formulando, a final, as seguintes CONCLUSÕES: 1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos, na firme convicção que a mesma resulta de uma errada e insuficiente qualificação jurídica que serviu de base à decisão, a qual vai em sentido bem diferente daquele que, Vossas Excelências, elegerão, certamente, como mais acertada, depois da necessária reponderação dos pertinentes pontos da matéria direito, e à luz do meios probatórios disponíveis.

  1. O objecto do presente recurso é a impugnação da decisão proferida quanto à procedência dos Embargos de Executado e a consequente extinção da execução porquanto, segundo o entendimento do Tribunal a quo, os Exequentes, ora Recorrentes, não dispõe de um título executivo válido.

  2. Pois bem, com todo o respeito, que é muito e bem devido, o Tribunal recorrido decidiu incorrectamente, o que, em consequência, determinou a prolação da decisão ora posta em crise.

  3. Efectivamente, é firme convicção dos Apelantes que a decisão recorrida constitui uma errada aplicação das regras de direito. Senão vejamos: I - DA ALEGADA FALTA DO TÍTULO EXECUTIVO: 5. Sucede que, os Embargantes, aqui Recorridos, através da respectiva Oposição à Execução mediante Embargos, vieram invocar que o documento dado à execução não preenche os requisitos como título executivo, nos termos do previsto nos arts. 703º, nº 1, al. b) e 707º, ambos do C.P.C., porquanto, segundo os Recorridos, o termo de autenticação, bem como os respectivos reconhecimentos de assinaturas, que fazem parte integrante da “Declaração de dívida e acordo de pagamento” que constitui o título executivo da acção executiva ora em apreço, são nulos por falta de forma, em virtude de os registos online de tais actos não terem sido efectuados no prazo previsto no artigo 4º da Portaria 657-B/2006, de 29 de Junho, o que, na sua opinião, levaria à violação do artigo 38º, nº 1 do D.L. 76-A/2006, de 29 de Março.

  4. Em face disso, e de forma absolutamente inesperada, aquando da realização da Audiência Prévia no âmbito dos presentes autos, e sem que tivesse sido produzida a prova testemunhal arrolada pelos aqui Recorrentes, o Meritíssimo Juiz a quo proferiu o respectivo despacho saneador/sentença, ora colocado em crise, e através do qual, conforme supra se disse, julgou procedente os Embargos de Executado deduzidos pelos aqui Recorridos, por entender que o documento particular que constitui o título executivo não se consubstanciar num documento autenticado, já que do seu ponto de vista a referida autenticação não obedeceu aos requisitos legalmente exigidos, e, por via disso, não pode valer como título executivo.

  5. Porém, a verdade é que a argumentação supra explanada carece de suporte legal e factual que a fundamente, conforme infra melhor se demonstrará.

  6. PARA O EFEITO, importa considerar que os Recorrentes deram à execução um documento particular autenticado intitulado de “Declaração de dívida e acordo de pagamento”.

  7. Acontece que, os Recorrentes eram titulares de um direito de crédito perante a Recorrida “F…, Sociedade de Construção, Lda.”, decorrente do incumprimento pela Recorrida de um contrato de empreitada celebrado entre as partes.

  8. No entanto, e apesar das diversas diligências extrajudiciais levadas a cabo pelos Recorrentes visando a obtenção da quantia em débito, a Recorrida, supra identificada, não procedeu à liquidação desse montante assim como, nunca manifestou o intuito de cumprir tal obrigação, pelo que, não restou outra alternativa aos aqui Recorrentes senão a de recorrerem à via judicial.

  9. Porém, tendo em consideração que os Recorrentes terão tomado conhecimento que a sociedade comercial aqui Recorrida se encontrava numa situação económico-financeira precária, instauraram um procedimento cautelar de arresto contra a Recorrida “F…, Lda.”, o qual correu os respectivos termos no J3 da 1ª Secção Cível da Instância Central do Porto, da Comarca do Porto, sob o Proc. nº 683/14.4T8PRT, sendo que, à data, o referido crédito dos aqui Recorrentes foi liquidado no valor global de €65.707,16, acrescido dos respectivos juros de mora, vencidos e vincendos, até efectivo e integral pagamento, conforme decorre do teor do doc. nº 3 junto com o Requerimento Executivo e para onde se remete para os devidos efeitos legais.

  10. Ora, os Recorrentes tinham um fundado e legítimo receio de que a aqui Recorrida “F…, Lda.” alienasse, ou fossem onerados, todos os bens que ainda possuía, capazes de constituir garantia patrimonial do crédito dos Recorrentes, tendo o Tribunal, em face de toda a prova produzida nos referidos autos, decretado o arresto de vários bens da propriedade da referida sociedade comercial, aqui Recorrida.

  11. COM EFEITO, na sequência da decisão proferida no âmbito do referido procedimento cautelar, os bens nomeados pelos Recorrentes foram arrestados e, consequentemente, no dia 02/12/2014, procedeu-se à realização da diligência de tomada de posse dos imóveis e de apreensão dos veículos automóveis alvo de arresto (cfr. o Auto de Tomada de Posse, junto com o Requerimento Executivo sob o doc. nº 6).

  12. Sucede, porém que, quando no dia da referida diligência o sócio da Recorrida “F…, Lda.”, o Exmo. Senhor E…, aqui também ele Recorrido, tomou consciência do objectivo da mesma, tentou, a todo o custo, impedir que os Recorrentes efectivassem a diligência, procurando, em alternativa, ultimar um acordo com os ora Recorrentes de forma a pôr fim ao litígio, o que assim veio a suceder, tendo as partes conseguido chegar a acordo.

  13. Com efeito, os aqui Recorridos, ou seja, a sociedade comercial “F…, Lda.”, e os sócios da mesma, o Exmo. Senhor E… e a Exma. Senhora D. D…, assumiram-se solidariamente devedores dos Recorrentes, o que formalizaram mediante a elaboração e subscrição de uma declaração de dívida à qual atribuíram força executiva, no valor de €55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros) referente a parte da quantia que se encontrava em discussão no âmbito do procedimento cautelar supra identificado (cfr. título executivo).

  14. E comprometeram-se a proceder ao pagamento de tal quantia mediante a entrega imediata aos ora Recorrentes do cheque nº ………, emitido sob a G…, em 02/12/2014, no valor de €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), sendo que o valor remanescente da dívida, no montante global de €30.000,00 (trinta mil euros), seria pago pelos Recorridos em 5 (cinco) prestações, mensais e sucessivas, no valor de €6.000,00 (seis mil euros) cada, vencendo-se a primeira no dia 2 de Janeiro de 2015, e as restantes em igual dia dos meses imediatamente subsequentes (cfr. título executivo).

  15. Uma vez elaborada e devidamente assinada a referida confissão de dívida por todos os aqui Recorridos, o Exmo. Senhor Dr. H…, lavrou o respectivo termo de autenticação, nos termos do preceituado no art. 38º do Decreto-lei nº 76-A/2006 de 29 de Março, mediante o qual a Recorrida D… declarou ter manuscritamente elaborado a referida declaração de dívida e, ademais, através de tal instrumento, mais declararam, todos os aqui Recorridos, terem lido e assinado a referida declaração de dívida e que o conteúdo da mesma expressava a vontade de todos.

  16. O respectivo termo de autenticação foi lido pelo Sr. Dr. H… aos Recorridos e aos mesmos explicado o seu conteúdo, tendo, posteriormente, todos os aqui Recorridos, sem excepção e sem...

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