Acórdão nº 2634/11.9TBVCD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução23 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. Nº 2634/11.9TBVCD.P1 Apelação 1ª Relator: Inês Moura 1º Adjunto: Paulo Dias da Silva 2º Adjunto: Teles de Menezes Sumário: (art.º 663.º n.º 7 do C.P.C.)1. Estando em causa um terreno que se situa a menos de 50 metros das águas do mar, o mesmo integra o domínio público marítimo, nos termos do disposto no art.º 3.º al. e) e art.º 11.º n.º 2 da Lei 54/2005 de 15 de Novembro.

  1. O facto de um terreno estar integrado no domínio público marítimo não constitui obstáculo a que possam subsistir direitos de natureza privada. A averiguação e prova da existência desses direitos que pode levar ao seu reconhecimento, deve porém ser feita de acordo com o regime legal e exigências estabelecidas no art.º 15.º do diploma referido.

  2. O reconhecimento do direito de propriedade privada exige a alegação e prova, de que o terreno já se encontrava no domínio privado antes de 1864, bem como do seu historial de transmissão, sendo irrelevante apenas a prova da posse mais recente atenta a natureza de direitos indisponíveis conferida aos bens do domínio público, que obsta a que os mesmos possam ser adquiridos por usucapião.

Acordam na 3ª secção do Tribunal da Relação do Porto I. RelatórioB… e C…, instauraram contra Administração da Região Hidrográfica …, I.P. e D…, S.A, a presente acção declarativa de condenação, com processo comum e forma ordinária pedindo que: a) - Se reconheça e declare o direito de propriedade dos Autores sobre a totalidade do imóvel identificado no artigo 1.° da petição, nele se incluindo a parcela de terreno de 150 m2 ocupada com as construções promovidas pela 2.ª Ré e autorizadas pela 1.ª Ré; b) - Se ordene a restituição da posse sobre a mesma aos Autores, livre e desocupada de pessoas e bens, designadamente, das infra-estruturas ali edificadas; c) Se condene as Rés, solidariamente, no pagamento aos Autores do valor de €500,00, a título de indemnização pecuniária compulsória, por cada mês de atraso na restituição da parcela de terreno com a área de 150 m2, completamente livre, limpa e desembaraçada de quaisquer construções.

Alegam, em síntese, que adquiriram por usucapião a propriedade sobre o imóvel em que a 2ª Ré, autorizada pela 1ª, implantou as infra-estruturas cuja remoção pede, sendo que ambas as Rés afirmam pertencer tal trato de terreno ao domínio público marítimo.

Os RR. contestaram impugnando os factos alegados e deduzindo defesa por excepção – tendo sido arguidas as excepções de ilegitimidade passiva da 1ª Ré, foi requerida a intervenção principal do Estado (apenas esta admitida) e do Instituto da Água, IP e arguida incompetência material do tribunal.

Foi proferido despacho saneador que fixou o valor da acção, conheceu da matéria excepcionada e procedeu à selecção da matéria de facto.

Procedeu-se à audiência de julgamento com observância do formalismo legal.

Em sede de audiência de julgamento, os AA. reduziram o pedido nos seguintes termos: "Se reconheça e declare o direito de propriedade exclusiva dos Autores sobre a totalidade do imóvel descrito na al. A) da douta especificação e com a descrição registral ali referenciada, bem como a manutenção da posse de propriedade sobre a totalidade do terreno identificado como objecto do direito de propriedade, tal como descrito em A). Na sequência da redução assim declarada, não pretende ver tomada posição sobre os restantes pontos que constavam da p.i., ou seja, a desocupação de pessoas e bens, designadamente, das infraestruturas ali edificadas e a condenação de título de indemnização pecuniária que integrava a alínea c ) da p.i. apresentada, ( … ) ” – conforme resulta da respectiva acta de fls. 873 e ss dos autos.

Foi admitida a redução do pedido apresentada pelos AA.

Foi proferida sentença que julgou totalmente improcedente a acção, absolvendo as RR. dos pedidos contra eles formulados nos autos.

É com esta decisão que os AA. não se conformam e dela vem interpor recurso, concluindo pela revogação da sentença proferida e sua substituição por outra que julgue procedente o pedido, apresentando para o efeito as seguintes conclusões, que se reproduzem: A) – Está ferida do vício qualificado como nulidade – 615.º, nº 1, c) do C.P.C. - a douta sentença quando, tendo definido como “Questão a decidir: Se deve reconhecer-se os AA como proprietários do prédio identificado em A) da matéria dada como assente, ……e respectiva posse sobre o mesmo, incluindo a parcela de 150 m2 ocupada com as construções ….” (sic) e depois de ter assumido, como pressuposto da decisão que “apenas essa parcela [a parcela de terreno ocupada com a construção das infra-estruturas em causa está integrada no imóvel reclamado pelos Autores” (nº 10), e que “fica a norte da assinalada com a letra A) e delimitada a vermelho no ortofotomapa da IGP/DGRF” (nº 30), ambos da matéria provada] está em causa, no demais não é questionada a propriedade” (sic), julga a acção totalmente improcedente, depois de ter declarado não questionada a propriedade dos AA sobre a maior parte do terreno, e, do que, em termos de posse de proprietários dos AA sobre o terreno cuja propriedade não é questionada, se dá como provado - nºs 35 e 36 da matéria provada. Há, pois, que julgar procedente a nulidade de contradição entre fundamentos e a douta decisão, assim arguida, declarando-se, quando menos, que a acção improcede só em parte, ainda que com custas a cargo dos AA por falta de oposição dos RR nessa parte.

  1. - Há contradição absoluta entre a matéria de facto dada como provada, no nº 30 desta, e não provada, tal como consta da al. G) desta.

  2. - Se uma das RR, autorizada pela outra, por virtude de trabalhos que levou a cabo no terreno, em 2009, e, como comprovam fotos nos autos, esses determinaram profundas alteração do mesmo, e por tal, se tornou incerta ou impossível a prova do traçado da estrema (sic) norte do prédio”, como se sublinha a fls. 603 e 668 -, demais que os Peritos entendem que se “afigura ter esta área correspondência quer com a parcela assinalada pela letra A no citado ortofotomapa junto a fls. 238” -, dar como não provada a matéria subsumida na alínea g) desta, é violar a regra do nº2 do artigo 344 do C.C. Deve, pois, ser alterada a resposta de não provado que “o prédio referido em 1) na realidade e actualidade tenha a área referida em 1), passando a constar da matéria provada que: “o prédio referido em 1) na realidade e actualidade tem a área total de 2950 m2- certidão de fls. 25, referida em 1)” D) - Ao dar como provada a matéria dos artigos 22, 31 a 34 da matéria provada e não provada a matéria sob as alíneas D) e H), com base numa prova testemunhal, cuja coerência fica acima apontada e contra critério legal, o que só se tolera – e a referida testemunha não perfilhou recentemente – em “Comissões”, que só deve ter lugar em caso de dúvidas fundadas na aplicação dos critérios legais à definição no terreno dos limites do domínio público hídrico, pode levar a aplicação do regime do artigo 2º, b) DL 353/2007, a douta decisão violou as regras dos artigos 607.º, nº 5 e 662.º, nº 2, a) do C.P.C e 351.º, ou 393.º, todos do C.C., por se dar como provado algo que contraria norma legal pré - existente. Há, pois, que, com base nos esclarecimentos do também Perito, Eng.º E… – depoimento gravado das 10:15 às 11:21 da sessão de 16.02, como do depoimento de Arq. F… - registado, das 10:45 às 11:23, da sessão de 01.03, e sobremaneira, depoimento de Eng.º G… e até mesmo Eng.ª H… (registado de 10:15 às 11:21, da sessão de 16.02) e documentos que serviram de base à douta fundamentação, D.1) – dar como provado: 22)“O terreno, tal como descrito em 1), dista mais de 50 metros da “linha máxima da preia–mar das águas vivas equinociais”, que, de acordo com o que está estabelecido, pela Portaria 931/2010, para toda a costa oeste de Portugal continental, corresponde à curva de nível dos 4 metros”; 30)“ A parcela de terreno dos AA, onde se encontra localizada a câmara de carga do emissário submarino e parte da tubagem, fica a Norte da assinalada com a letra A, delimitada a vermelho no ortofotomapa do IGP/DGRF, do ano de 2005, existente no Instituto da Água, na escala 1.2000, junto a fls. 238” D.2) – Eliminar a resposta constante actualmente dos nºs 31, 32, 33 e 34 dos ”factos provados”, como as constantes das alíneas D), H), e pelas razões já apontadas, também, G) da matéria não provada, D.3) – Mantendo–se a alínea I, dos não provados.

  3. – Sendo o tema da questão o reconhecimento de posse titulada de proprietário, relativamente a dado terreno com a descrição registral comprovada e assente na especificação, sendo qualificado, por entidade oficial como “terreno com fim agrícola” - planta de localização no POOC - Caminha a Espinho e documento nº 6, junto em 29.09.2014, com referência a 18.11.2009 (!!) e doc. nº 6, junto em 19.03.2015, com data de 16.02.2015, com a configuração coincidente com a do ortofotomapa referido pela perícia (!!), era ao perturbador que incumbia provar que tinha fundamento para tal (teria que demonstrar que não ofendia posse aparentemente tutelada dos AA ou que tinha melhor posse), o que se traduz em defesa...

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