Acórdão nº 594/14.3T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelJER
Data da Resolução15 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

APELAÇÃO n.º 594/14.3T8VNG.P1 SECÇÃO SOCIAL ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I.RELATÓRIO I.1 No Tribunal da Comarca do Porto – V. N. Gaia - Inst. Central - 5ª Sec. Trabalho, B...

intentou a presente acção especial, emergente de acidente de trabalho, contra a entidade patronal C...), que veio a ser distribuída ao J 3, pedindo a condenação deste a pagar-lhe: - a quantia de 2 800,35€, a título de indemnizações temporárias; - o capital de remição da pensão anual e vitalícia de 686,00€, a partir do dia 01/03/2014, calculada com base na IPP de 10%.

Alegou para tal, em síntese, que no dia 05 de Outubro de 2013, pelas 05:15 horas, quando se encontrava no estabelecimento comercial de que o Réu é proprietário e onde ele exercia funções de “barman”, foi alvejado a tiro de arma de fogo por um indivíduo que ali penetrou.

Apesar de tal evento ter ocorrido depois do encerramento do estabelecimento ao público, o Autor ainda se encontrava no respectivo interior e apenas podia abandonar o local de trabalho depois de todo o estabelecimento estar limpo, os cartões de entradas estarem contados, e ser realizado o fecho de caixa. O que, face à dimensão do edifício, implicava mais cerca de duas horas de trabalho, após o encerramento do estabelecimento.

Por volta das 5h15, enquanto todos os colaboradores se encontravam a laborar, o estabelecimento foi invadido por três indivíduos que entraram a disparar, tendo o autor sido um dos atingidos, baleado na zona do pescoço e na região peitoral direita.

Em consequência, sofreu lesões, que implicaram a sua incapacidade absoluta para o trabalho e de que lhe resultaram sequelas, susceptíveis de lhe acarretar uma IPP de 10%.

O Autor auferia então a retribuição mensal de 700,00€, acrescida de comissões a que pudesse ter direito.

O Réu não tinha a sua responsabilidade civil decorrente de acidentes de trabalho transferida para qualquer companhia seguradora.

Devidamente citado, o Réu deduziu contestação. Aceita a ocorrência do evento relatado pelo Autor, mas contrapõe que aquele se encontrava já fora do seu horário de trabalho, numa altura em que permanecia no estabelecimento a conviver com os demais colegas e amigos.

Além disso, referiu ainda que o vencimento mensal do Autor era de 700,00€, já com as comissões incluídas.

Concluiu, pedindo a improcedência da acção, com a sua consequente absolvição do pedido.

I.2Finda a fase dos articulados o Tribunal formulou convite a ambas as partes, no sentido de estas virem esclarecer dúvidas relativas à retribuição mensal auferida pelo Autor.

As partes acederam a tal convite Foi proferido despacho saneador, nesse âmbito tendo-se procedido à selecção da matéria de facto com relevo para a decisão da causa.

Foi ordenado o desdobramento do processo, nos termos dos artigos 131º nº 1 e) e 132º, do CPT Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal.

I.3Subsequentemente foi fixada a matéria de facto, seguida da imediata prolação da sentença, concluída com o dispositivo seguinte: «Nestes termos e com tais fundamentos, julgo a presente acção improcedente, por não provada, em consequência do que absolvo o Réu do pedido formulado pelo Autor.

Custas pelo Autor, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que goza.

Registe e notifique.

Valor da acção: 2.000,00€ - artigo 98º-P nº 1 do Código de Processo do Trabalho.

(...)».

I.4 Inconformado com a sentença o Autor apresentou recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram sintetizadas nas conclusões seguintes.

1 - Nos processos emergentes de acidente de trabalho ou doença profissional é sempre admissível recurso para a Relação, independentemente do valor da causa e da sucumbência (art.º 79.º, alínea b), do CPT); II – IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO: 2 - O recorrente impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto, pois há erro no julgamento, na apreciação e valoração da prova, há matéria de facto considerada provada que não se pode ter por provada, e outra considerada não provada que deve ser considerada provada, que pode ser alterada pelo Tribunal da Relação por no processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão, tendo o recurso por objecto a reapreciação da prova gravada; 3 – Os erros na apreciação e valoração da prova verificam-se nos pontos 3.º, 4.º, 5.º e 6.º, da Base Instrutória; 4 - A resposta ao quesito 3º deve ser alterada para “Provado apenas que o mencionado em 2.º demorava cerca de uma hora”, face à prova produzida, nomeadamente o depoimento de parte e declarações de parte do recorrido, os depoimentos das testemunhas D..., E..., F..., G... e H...; 5 – Inclusive o Mmº. Juiz “a quo” refere que a duração da execução das tarefas de limpeza era de cerca de uma hora, pelo que não tem fundamento e é contraditória a resposta de “Não Provado” ao quesito 3.º; 6- Que o mencionado em 2.º demorava cerca de uma hora é um facto provado útil e relevante para a decisão final da causa, para que esta corresponda à resolução justa do litígio, e não excede os limites da alegação do recorrente; 7 - A resposta ao quesito 4º deve ser alterada para “Provado apenas que o mencionado em F) ocorreu para o Autor proceder à limpeza das instalações”, face à prova produzida; 8 - Sobre a hora do encerramento do estabelecimento ao público na noite em causa ter sido depois das quatro horas e dez minutos em que a música foi desligada, depuseram o Réu, no depoimento de parte e declarações de parte, e as testemunhas, E... e H..., sendo facto notório e que decorre das regras da experiência, que só depois os clientes pagaram e saíram; 9 – O Senhor Juiz “a quo” fundamenta a resposta do quesito 4.º no depoimento da testemunha E..., que considera isenta e imparcial, mas fez uma errada apreciação da prova ao concluir que não teria afirmado que o Autor estava a realizar a limpeza quando foi alvejado a tiro; 10 – Sempre que inquirida sobre a questão, a testemunha E... respondeu, peremptoriamente, que no momento do tiroteio o recorrente B..., assim como a testemunha, estavam no estabelecimento por causa da limpeza deste, que ainda decorria, referindo expressamente que “Nós estávamos a fazer o fecho normal do bar, limpeza”, “É assim, naquela altura, eu recordo que estávamos todos ainda a trabalhar. Depois, quando acabávamos, podia haver esse momento. Mas no momento em que aconteceu estávamos ainda a finalizar a limpeza”, que era normal estarem a trabalhar àquela hora, por não ser “automático” o encerramento do bar às quatro horas, e que os trabalhadores do bar acabavam de fazer as tarefas de limpeza todos ao mesmo tempo, entreajudando-se de forma a que saíam todos juntos do estabelecimento; 11 - Inquirida sobre a possibilidade do recorrente B... estar no estabelecimento apenas a conversar, a comer e a beber, a testemunha E... admitiu que por vezes até sucedia, mas de imediato declarou, de forma peremptória “Mas no momento em que aconteceu estávamos ainda a finalizar a limpeza”; 12 - Face ao depoimento prestado pela testemunha E... não restam dúvidas de que, após o encerramento do estabelecimento ao público, o recorrente permaneceu no estabelecimento para proceder à limpeza das instalações e que esta decorria ainda quando ocorreu o tiroteio; 13 - A resposta ao quesito 5º deve ser alterada para “Não Provado”, face ao depoimento da testemunha E... no qual o Senhor Juiz “a quo” fundou a sua convicção que disse que após o encerramento do estabelecimento ao público, o recorrente ali permaneceu a “fazer o fecho normal do bar, limpeza”; à matéria provada no quesito 2.º de que “após o encerramento do estabelecimento ao público, o Autor apenas o podia abandonar depois de o mesmo estar limpo”; à confissão do recorrido de que quando o recorrente terminava o atendimento ao público, estava encarregado de proceder à limpeza do bar e à arrumação dos copos; 14 – A permanência do recorrente no estabelecimento após o encerramento deste não derivou da sua vontade própria, mas da obrigação a que estava adstrito de proceder à limpeza, só podendo abandonar o estabelecimento depois de o mesmo estar limpo; 15 - Não tem fundamento a resposta ao quesito 5.º e 6.º ser dada em conjunto, devendo ser autónoma a cada um dos quesitos, porque a matéria de facto é distinta nos dois quesitos, e daí terem sido elaborados dois quesitos; 16 - A resposta ao quesito 6º deve ser alterada para “Não Provado”, em face do depoimento da testemunha E... no qual o Mmº. Juiz “a quo” fundou a sua convicção, e na sequência de não ter ficado provado que o recorrente permanecera no estabelecimento por vontade própria objecto do quesito 5.º, lógica e consequentemente, a resposta ao quesito 6.º tem de ser “Não Provado”; III – JUNÇÃO DE DOCUMENTOS DE PROVA: 17 – Em face do julgamento proferido na 1.ª instância, que assenta em que o acidente não ocorreu no decurso o tempo de trabalho do recorrente, torna-se necessária a junção de documentos (art.º 651.º do C.P.C., “ex vi” art.º 1.º, n.º 2, do C.P.T.); 18 - O recorrente junta, como documentos n.ºs 1 e 2, certidões judiciais extraídas do processo Comum (Tribunal Colectivo) n.º 2071/13.0JAPRT, da Comarca do Porto – V. N. Gaia – Instância Central – 3.ª Secção Criminal-J2; 19 – Os documentos ora juntos demonstram que, na altura em que o recorrente foi alvejado, os vários barman, incluindo o recorrente, estavam a efectuar as limpezas do estabelecimento; 20 – Designadamente, o visionamento dos ficheiros de vídeo do sistema de videovigilância do “I...” e imagens deles extraídas, mostram o que se passava, no interior e no exterior, no período antes e durante o tiroteio, vendo-se a movimentação dos trabalhadores a executar tarefas de limpeza, os utensílios de limpeza, caso de esfregona, que estavam a ser usados, atrás do balcão vê-se o recorrente a arrumar e a limpar, garrafas a serem colocadas e retiradas do balcão, panos e rolo de papel de limpeza; 21 - Os documentos ora juntos...

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