Acórdão nº 907/10.7TTMTS.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelPAULA LEAL DE CARVALHO
Data da Resolução29 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 907/10.7MTS.P2 Relatora: Paula Leal de Carvalho (Reg. 983) Adjuntos: Des. Jerónimo Freitas Des. Nelson Fernandes Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I. RelatórioParticipado, aos 30.08.2010, por B… a ocorrência de acidente que qualificou como de trabalho, frustrada a tentativa de conciliação que teve lugar na fase conciliatória do processo (cfr. auto da tentativa de conciliação de 14-05-2012 de fls. 118-119), o A., aos 03.04.2014, apresentou petição inicial demandando a Ré, COMPANHIA DE SEGUROS C…, SA., nos termos da qual pede que esta seja condenada a pagar-lhe, uma pensão anual e vitalícia no montante de €3.351,91, com início em 30/10/2003, acrescida de juros de mora desde a tentativa de conciliação.

Para tanto, alegou em síntese que: no dia 12.01.2003 sofreu um acidente de trabalho quando, no exercício da sua profissão de jogador profissional de futebol ao serviço do D…, no Estádio E…, participava num jogo de futebol, acidente que consistiu no seguinte: ao disputar uma bola, em suspensão sofreu um traumatismo na perna esquerda, o que provocou a sua queda sobre o joelho esquerdo; do traumatismo e da queda resultou uma rotura parcial do ligamento cruzado anterior esquerdo e, ainda, entorse do ligamento lateral interno esquerdo; em consequência das lesões sofridas o Autor foi sujeito a meniscectomia parcial externa por artroscopia e ligamentoplastia tipo osso-tendão-osso do LCA; auferia a remuneração anual de €239.422,00, encontrando-se a responsabilidade por acidente de trabalho transferida para a Ré através da apólice número ……., pelo referido salário anual; o acidente acima descrito provocou no Autor direta e necessariamente as lesões descritas nos relatório do exame médico singular de fls. 114 a 116, que lhe determinaram uma ITA de 12/2/2003 a 29/10/2003 e uma IPP de 2%; realizada a tentativa de conciliação a mesma não foi possível porquanto a Ré: aceitando embora a existência de um acidente de trabalho e a retribuição transferida, não aceitou assumir qualquer responsabilidade por já ter decorrido o prazo de caducidade do direito de ação do Autor, no que não lhe assiste razão, pois que nunca foi chamado pela Ré para aferir o seu estado de saúde, mesmo durante o período de recuperação, a qual foi efetuada nos serviços clínicos do D… e nem este, nem a Ré, lhe comunicaram a alta clinica, comunicação essa que deveria ser feita mediante a entrega do duplicado do boletim de alta e apenas com essa entrega se iniciando o prazo de caducidade.

A Ré, aos 29.04.2014, contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação.

Em sede de defesa por exceção, invoca o abuso de direito por parte do autor e a extinção, por caducidade, do direito de ação respeitante às prestações que o mesmo veio reclamar, para tanto alegando, em síntese, que: da apólice e de acordo com o previsto no art.º 3º da Lei n.º 8/2003 de 12/5 a assistência clinica do sinistrado ficou a cabo dos serviços clínicos do clube segurado que, por conveniência deste e dos próprios atletas, providenciavam tratamento mais rápido e eficiente com vista ao interesse reciproco da alta do atleta para a competição; por isso, verificada a alta clínica do atleta, o clube comunicava-o a este de modo a habilitá-lo a retomar a atividade futebolística profissional, o que aconteceu com o A. pois o D…, após participar o sinistro como ocorrido em 12/1/2003, comunicou à R. em 15/11/2003 que tinha ocorrido alta sem qualquer desvalorização em 29/10/2003, sendo que o então médico do clube comunicou ao A. que tinha alta das lesões sem qualquer incapacidade, podendo retomar os treinos e regressar à competição sem qualquer limitação; a Ré não dispõe de qualquer “Boletim de Alta” o qual ficou na posse do A. e do clube; em consonância com essa alta a R. indemnizou as ITs até à data da alta comunicada – 29/10/2003 -, tendo o A., em sintonia com essa informação, retomado a sua atividade sem qualquer limitação, não formulando qualquer reclamação à Ré, tendo alinhado em competições de futebol, em equipa da F… nas épocas subsequentes (2004 a 2006) e pela seleção do seu pais em jogos de apuramento para o campeonato do Mundo em 2004 e 2005; o A. tinha interesse em não reclamar ou invocar qualquer incapacidade que pudesse colocar em causa a sua aptidão ou performance atlética, pelo que se manteve silenciado e desinteressado em formular a menor reclamação que levaria a que o mesmo fosse desde logo examinado e sindicada a alta sem incapacidade que lhe foi dada; para além dessa atividade, o A. desempenhou também, primeiro em acumulação e, depois, em exclusivo, a de treinador de futebol, atividade essa com grande componente física e que manteve ainda sem queixas ou limitações; mantendo a atividade após a alta da lesão, sujeito ao desgaste e sobreposição de lesões sobre o joelho esquerdo, tornou-se impossível determinar com clareza se as eventuais limitações que apresente serão decorrentes da lesão que refere na PI ou de traumatismos ulteriores que o tempo prolongado (10 anos) sobrepôs, eliminando a possibilidade de se estabelecer um nexo causal seguro; nos termos do art.º 32.º n.º 1 da LAT em vigor à data em questão (Lei 100/97) ex vi art.º 6º da Lei n.º 8/2003 de 12/5 , o prazo legal de caducidade de um ano ocorreu no dia 29/10/2004; a não verificação da caducidade permitiria ao sinistrado dilatar infindavelmente, em seu proveito, um prazo curto de um ano que se destina, precisamente, a determinar pela frescura da prova médica o nexo causal de sequelas de acidente de trabalho e evitar, designadamente, a sobreposição de outros eventos traumáticos que o sinistrado pretendesse reportar a épocas de melhor remuneração; há fraude á lei quando o atleta consegue, mediante uma atuação formalmente correta, um resultado não pretendido pela lei, para além de que a invocação da falta de entrega do boletim de alta clínica, quando o próprio sinistrado e sua entidade patronal atuem de modo a não permitir a atuação do médico assistente que o deveria emitir e entregar, consubstancia abuso de direito, traduzindo um venire contra factum proprium.

Em sede de defesa por impugnação, indica os arts. da p.i. que aceita e os que impugna. Mais diz que: na participação o A. alude a uma lesão contraída em 3/1/2003 e agora refere 12/1/2003, sendo que apenas esta foi participada; até 29/10/2003 em que ao A. e à seguradora foi comunicado que aquele tivera alta sem desvalorização ou incapacidade, pagou ao A. as respetivas indemnizações por incapacidade temporária no valor total de €121.040,00, nada mais lhe pagando após essa data por ter ficado claro para ele a situação de alta sem incapacidade; dado o acordo existente entre a R. e o seu segurado, o tipo de apólice e as especificidades da atividade dos futebolistas profissionais, estando a assistência médica e recuperação funcional do atleta a cargo do clube, não era à R. que competia a atribuição da alta e emissão do respetivo boletim, mas aos serviços clínicos do clube, o que não ignorava o autor que por eles foi tratado até à alta e o confessa em 13º da PI, pelo que não pode agora o A. alegar que a R. não lhe efetuou uma comunicação formal que não lhe competia a esta fazer mas aos serviços clínicos do clube. E termina concluindo pela improcedência da ação e pela sua absolvição do pedido, mais requerendo exame por junta médica, para o que formulou quesitos.

O A., aos 09.05.2014, respondeu, tendo, em síntese, reafirmado o já alegado na p.i., no sentido da inexistência da alegada caducidade, cujo prazo não se iniciou dado a alta médica não lhe ter sido comunicada, comunicação essa que teria que ser efetuada com a entrega do duplicado do boletim de alta, mais referindo não aceitar a matéria da contestação que indica e que a referência, na participação do acidente, à data de 03.01.2003 se ficou a dever a mero lapso de escrita, que foi corrigido no auto de não conciliação. Quanto ao alegado abuso de direito refere que “a ver vamos…” [sic]..

Conclui como na p.i. e no sentido da improcedência das exceções.

Foi proferido despacho saneador, no qual foi julgada improcedente a exceção da caducidade do direito de ação e relegado para final o conhecimento do invocado abuso de direito.

Procedeu-se também à seleção da matéria de facto, consignando-se a assente e organizando-se base instrutória (desta tendo a Ré reclamado, reclamação que foi inferida por despacho de 17.07.2014).

Determinou-se também a abertura de apenso para fixação da incapacidade e decidiu-se no sentido da eliminação dos quesitos a submeter à junta médica relativos ao nexo de causalidade entre o alegado acidente e as lesões, do que a Ré recorreu, tendo esta Relação, por acórdão de 19.05.2015, revogado o despacho recorrido, admitindo-se os quesitos formulados pela Ré.

No apenso para fixação da incapacidade procedeu-se à realização de exame por junta médica, após o qual foi, aos 02.07.2015, proferida decisão nos termos da qual se “declarou” que o A. “se encontra afectado por uma incapacidade permanente parcial de 3,5%.” Realizada audiência de julgamento [cuja reabertura foi determinada pela 1ª instância para ampliação da matéria de facto] e decidida a matéria de facto, foi, aos 17.10.2016, proferida sentença que, julgando a ação procedente, condenou a Ré a pagar ao Autor o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia no valor de €:5.865,84, com acréscimo de juros de mora vencidos e vincendos calculados sobre o capital de remição, à taxa legal “(que atualmente é de 4%)”, desde 30/10/2003 até à entrega efetiva desse capital. Mais se fixou à ação o valor de €96.364,00 Euros.

Inconformada, a Ré recorreu, tendo formulado, a final das alegações, as seguintes conclusões: “1ª) A resposta dada aos “Artigos 2º, 3º e 4º da BI” deve ser alterada para não provada, eliminando-se, consequentemente eliminados do elencos dos factos provados da sentença os dos pontos 4) “nessa data sofreu um acidente…” até lesões e 6) da sentença, correspondentes aos art.ºs 2º, 3º e 4º da BI/PI; 2ª) A...

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