Acórdão nº 588/11.0TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA CEC
Data da Resolução30 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 588/11.0TVPRT Tribunal Judicial da Comarca do Porto Porto, instância central, 1ª secção cível – J1 Acórdão Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. RelatórioB…, residente na Rua …, …. - … Satão, instaurou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma do regime processual civil experimental regulada pelo decreto-lei nº 108/2006, de 8 de junho, contra C…, S.A., com sede na Av. …, nºs …/…, no Porto (agora Banco D…, S.A.

), alegando, para tanto e em síntese, que depositava as suas poupanças em contas à ordem e em depósitos a prazo no C… desde 2006, ano que contratou o com o R. um crédito multiusos no valor de €100.000,00 (cem mil euros) para aquisição dum apartamento em França, país onde esteve durante o ano de 2007. Quantia pecuniária que não chegou a ser utilizado para esse fim, mas aplicado em depósitos, renováveis de três em três meses. Durante a sua ausência, deixou vários documentos por si assinados, sem data, à guarda da gestora de conta de então, Dª. E…, para permitir a transferência entre as suas contas. Funcionária que foi substituída nessas funções pelo Sr. F… e, por vezes, pelo funcionário Sr. G…, com o qual renegociou o spread do seu crédito, que lhe ofereceu uma taxa de juro mais alta para um depósito a três meses. Para constituir os depósitos a prazo limitava-se a assinar comunicação em branco, cujo duplicado, já devidamente preenchido, mais tarde lhe era entregue. Assim, em 26-01-2008 foi contactado telefonicamente pelo Sr. F… com a sugestão de um depósito a prazo a um ano, com um juro mais atrativo. De novo assinou a comunicação em branco e sem data, para efeitos de autorizar a constituição daquele depósito. Em março de 2008, ao receber o extrato bancário, verificou que havia subscrito papel comercial … e interpelou o R., na pessoa do Sr. G…, sobre o que era o “…”. Quando se deslocou ao banco, foram-lhe renovadas todas as garantias pelo gestor de conta quanto ao recebimento do capital depositado e respetivos juros na data de vencimento. E quando quis, após a data de vencimento, levantar o seu dinheiro, o Sr. F… referiu que o Banco não poderia satisfazer essa pretensão. A subscrição do papel comercial “…” ocorreu em momento posterior ao término do período de subscrição, em 28/01/2008 quando a subscrição terminara em 24/01/2008. O próprio contacto telefónico efetuado pelo Sr. F… para oferecer condições para um depósito remunerado aconteceu em 26/01/2008. Atitudes reveladoras da conduta dolosa daquele funcionário. O R. não cumpriu com a lei ao não produzir os testes de adequação da operação ao perfil do cliente que esta impõe e, sendo do R. a iniciativa de prestar o alegado serviço, ele não poderia dizer-se desobrigado de fazer tais testes de adequação [alínea b) do nº 1 do artigo 314º do CVM]. Não lhe foi prestada informação prévia sobre o papel comercial da “…”, antes tendo sido acordado um depósito a prazo a um ano. O R. agiu contrariamente aos valores previstos, designadamente, nos artigos 304º/1, 2, 4 e artigo 312º/1 e 2 do CVM, pelo que estão reunidos todos os pressupostos para a sua responsabilidade civil, quer por falta da não disponibilização do saldo quando solicitado, findo o prazo acordado para o depósito, quer por ter atuado como intermediário financeiro. Essa sua qualidade impunha-lhe a necessária informação ao cliente antes de prestar o serviço. Concluiu pedindo a condenação do R. na restituição da quantia de €150.000,00 acrescida de juros desde 28/01/2009, que perfazem, à data, €14.120,55, e ainda juros à taxa legal. Caso assim se não entenda, se declare que o R. agiu na qualidade de intermediário financeiro e, com base na sua responsabilidade contratual, por não cumprimento, com dolo ou culpa grave, dos deveres de informação a que estava obrigado, a sua condenação no montante de €150.000,00 acrescido de juros, desde 28/01/2008, que perfazem a quantia de €20.136,99, e juros vincendos à taxa legal.

Regularmente citado, o R. deduziu contestação e impugnou os fundamentos da ação, sustentando que as instruções que dava aos seus funcionários eram no sentido de proibir que fossem depositários de documentos dos clientes e está ciente que tais instruções sempre foram cumpridas. O A. tinha um depósito a prazo que se vencia em 27/01/2008 e dias antes do vencimento foi contactado pelos seus funcionários para lhe darem nota de um leque de oportunidades de rentabilização/investimento dos seus recursos, no qual foi incluída a possibilidade de subscrição do Papel Comercial …, 10ª Emissão. Tendo o A. demonstrado interesse na subscrição desse produto, atendendo à taxa de rentabilidade associada, foi o mesmo convidado a deslocar-se à agência do C… e feito de imediato o registo da intenção de subscrição, por forma a garantir que o produto estaria disponível para o cliente o subscrever nessa visita, caso assim entendesse. Assim, no dia 28/01/2008, o A. dirigiu-se à agência de Viseu, onde foi informado sobre as características do produto, com consulta e explicitação do Programa de Papel Comercial … 10ª Emissão. Na data da subscrição o A. ligou do seu telemóvel ao seu Advogado para pedir esclarecimentos acerca do que lhe foi dito pelos funcionários e, na sequência desse contacto, ordenou a subscrição. É, pois, rotundamente falso que esse formulário não estivesse preenchido quando foi assinado pelo A., o que agora comprova. Ainda alegou que qualquer hipotética responsabilidade da sua parte está, entretanto, prescrita, quer nos termos do artigo 324º do CVM, quer nos termos do artigo 498º do C.C.. Concluiu pela improcedência da ação.

Proferido despacho saneador, foi afirmada a validade e regularidade da instância, tendo-se relegado para a sentença o conhecimento da exceção de prescrição. Foram organizados os factos assentes e a base instrutória, sem reclamação.

Realizou-se a audiência de julgamento, com observância do legal formalismo e foi pronunciada a sentença com o seguinte dispositivo: «Nos termos e com os fundamentos expostos, julga-se a presente acção procedente, por provada e, consequentemente, condena-se o Réu a pagar ao Autor o montante de €150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), acrescido dos juros remuneratórios à taxa de juros indexada à EURIBOR do prazo da emissão, cotada no segundo “dia útil em Lisboa” imediatamente anterior, adicionada de 1,25% ano arredondada para 1/1000 de ponto percentual imediatamente superior, no período convencionado de um ano (de 28.01.2008 a 26.01.2009), sendo considerada, para o cálculo dos referidos juros, a base de 360 dias, a que acrescem os juros de mora, à taxa legal, desde 26.01.2009 até efectivo e integral pagamento.» Irresignado, recorreu o Banco Réu, cuja alegação assim sintetizou: «1.

A decisão recorrida violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D do CdVM e 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE e 220º, 232º e 236º, 483º e ss., 595º e 615º do C.C.

  1. O Tribunal a quo condenou o Recorrente por considerar que o facto do gerente bancário do Réu ter dito ao Autor que a aplicação financeira tinha “garantia de capital e juros” no termo do prazo configura a prestação de uma informação falsa.

  2. O uso dessa expressão apenas pode ser visto como referencia à mecânica de funcionamento do investimento, que é feito por um determinado prazo, findo o qual o capital é reembolsado na totalidade, acrescido da rentabilidade.

  3. É utópico pretender ver nessa singela referência qualquer espécie de garantia absoluta do investimento, até porque essa garantia não existe.

  4. Mesmo que se compare o investimento efectuado com aquele que é afirmado como paradigma de investimento seguro – o depósito a prazo – essa garantia não existe, sobretudo até considerando que uma hipótese de insolvência da instituição bancária sempre redundaria na cobertura pelo Fundo de Garantia de Depósitos que, à data do investimento se cifrava em apenas 25.000,00 euros, o que seria fraco consolo para ressarcir uma perda de investimento de 150.000,00 euros.

  5. O Tribunal a quo parece considerar que a aplicação financeira era afinal um “produto de risco”, pelo facto do Autor não ter recebido o capital investido no final do prazo.

  6. Porém esse raciocínio é uma falácia, pois confunde a causa com a consequência. Não é porque um investimento se possa vir a revelar ruinoso, que o mesmo pode ser classificado como investimento de risco.

  7. Tal juízo tem que ser feito retroagindo ao momento da subscrição e tendo por base a prognose que então era possível fazer com os dados conhecidos.

  8. O Papel Comercial era então, como é ainda, um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente. Ao que acrescia, no caso concreto, o facto de a entidade emitente pertencer ao mesmo Grupo que o Banco Réu.

  9. O investimento efectuado era assim um investimento seguro e não um investimento em qualquer “produto de risco”.

  10. Pelo que o investimento efectuado era então adequado a alguém como o Recorrente.

  11. A sentença recorrida merece censura por tratar indistintamente os deveres que incidem sobre o intermediário financeiro, sem cuidar de perceber o momento ou o negócio a que dizem respeito e em função do qual devem ser cumpridos.

  12. Os deveres de informação podem ser categorizados segundo o momento em que devem ser cumpridos (informação pré-contratual ou informação contratual) ou também segundo a estrutura própria dos negócios de intermediação financeira.

  13. Trata-se, em suma, de sistematizar os deveres de informação, consoante se referem: i) ao negócio de cobertura – a saber, o contrato de intermediação propriamente dito celebrado entre o intermediário financeiro e o cliente –; ii) ao negócio de execução – a saber, os contratos que o intermediário celebra com terceiros com base nos poderes que lhe foram conferidos pelo negócio de cobertura, ou até mesmo os contratos celebrados entre o cliente e o terceiro, com intermediação do...

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