Acórdão nº 604/12.9EAPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 31 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelPEDRO VAZ PATO
Data da Resolução31 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Pr 604/12.9EAPRT.P1 Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I – B… veio interpor recurso da douta sentença do Juiz 3 da Secção Criminal da Instância Local de Vila do Conde do Tribunal Judicial da Comarca do Porto que a condenou, pela prática de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108.º, n.º 1, do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de dezembro, na pena de três meses de prisão, substituídos por igual tempo de multa, e cinquenta dias de multa, à taxa diária de seis euros.

Da motivação do recurso constam as seguintes conclusões: «A. No que se refere à subsunção da conduta que se imputa à Recorrente em sede de factualidade tida como provada, entende modestamente aquela que, ao contrário do decidido na douta Sentença sob recurso, não se poderia haver concluído por preenchidos os elementos constitutivos do tipo legal em causa relativamente à máquina dos autos, denominada “6 ELEMENTOS”, uma vez que, e desde logo, não será de entender o mesmo jogo como um qualquer desses jogos nefastos (em que efectivamente “pensava” o legislador quando decidiu restringir a sua prática/exploração às zonas de jogo) cuja exploração a tais zonas se limita, conforme se manifestou em sede de Motivação de Recurso e que aqui se considera integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.

B. Na verdade, a utilização da máquina dos autos é absolutamente imediata e instantânea, esgotando-se com a emissão do respectivo talão, não sendo sequer possível acumular pontos ou qualquer outra espécie de pontuações, ou sequer creditar ou dobrar “apostas”, motivo pelo qual, conclui-se que não estamos perante um qualquer acto de jogar.

C.

Mais, se bem atentarmos ao alegado modo de funcionamento explanado no referido “Exame Pericial” de fls… dos autos, TÃO SÓ podemos concluir o seguinte: 1.º A máquina funciona apenas com a introdução de uma moeda de 0,50€, 1€ e 2€ 2.º Em virtude de tal conduta, a máquina expele um “talão”.

  1. O “talão” pode ou não ser premiado.

  2. A utilização da máquina esgota-se com a introdução de uma moeda.

  3. Se o utilizador pretender voltar a utiliza-la, terá que introduzir nova moeda.

ORA, ISTO É ALGUM JOGO DE FORTUNA OU AZAR??! OBVIAMENTE QUE NÃO!!! D.

Mais, qualquer juízo “técnico” que se “encontre subtraído à livre apreciação do julgador”, nos termos do artigo 163.º do Código de Processo Penal, apenas e só será quanto às concretas características e funcionamento do material apreendido e nunca e em momento algum quanto à subsunção jurídica a aplicar à situação, sob pena de esvaziar por completo os poderes que competem a um tal órgão de soberania (v.g. “Tribunal”) e, por outro lado, por tal enquadramento jurídico ser realizado por pessoa que não possui “capacidades” técnicas necessárias e suficientes para proceder a tal qualificação.

E. Deste modo, e por outro lado, quanto a esta factualidade sempre é de salientar, o que muito recentemente manifestou este Dign.º Tribunal da Relação do Porto, 1.ª Secção, através do Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 150/12.0GDGDM.P1, e no que toca a uma máquina exactamente igual à dos presentes autos, inclusive com a mesma denominação, seja, “6 Elementos”, referindo que «Trata-se de um jogo que funciona como uma espécie de rifa, jogo de pequena danosidade, em que o valor arriscado pelo jogador é diminuto e em que o prémio a que se habilita está à partida predeterminado, pelo que estão reunidas as características próprias das modalidades afins dos jogos de fortuna azar.» F. Perante tal, concluiu este Dign.º Tribunal da Relação no seu douto Aresto: «A exploração da referida máquina em que era desenvolvido o jogo descrito não integra um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo art. 108.º, n.º 1 do DL n.º 422/89, de 2/12, mas antes uma contra-ordenação prevista pelos art.s 159.º, 160.º n.º 1 e 163.º n.º 1, do mesmo diploma.» (sublinhado nosso) ACRESCE QUE, G. Tendo por base e fundamento a Jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, no seu douto Acórdão n.º 4/2010 (proferido no Processo n.º 2485/08 e publicado na 1.ª Série, N.º 46º, do D.R. de 08 de Março de 2010), sempre se questiona o Recorrente de quais as diferenças existentes entre o jogo desenvolvido pela máquina dos autos e aquele outro jogo que foi objecto do citado Acórdão de Fixação de Jurisprudência, para além daquela diferença óbvia de que a máquina ora em causa depende de impulso electrónico, enquanto que aquela outra depende de impulso mecânico? H. Não obstante, e sem descurar do exposto, apraz referir que, após rigorosa análise e enquadramento de tudo o vertido em tal douto Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/2010, o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, no seu douto Acórdão de 02-02-2011 (proferido no âmbito do Proc. n.º 21/08.5FDCBR.C2 e disponível in www.dgsi.pt), elaborado após rigorosa análise e enquadramento de tudo o vertido em tal douto Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/2010, e aquando da análise comparativa entre o jogo em causa nos autos onde veio a ser fixada a aludida Jurisprudência e naqueles autos de recurso (nos quais se trata das vulgarmente denominadas “roletas electrónicas”).

I. E, ainda que tais jogos possam mesmo atribuir prémios em dinheiro ou desenvolver temas de jogos de fortuna ou azar, até porque, e ainda segundo o vertido naquele douto Acórdão, mesmo «às modalidades afins que atribuam prémios em dinheiro ou fichas a lei não deixa de designar como modalidades afins», constituindo uma qualquer sua exploração ilícita uma “mera” contra-ordenação, conforme preceituado no art. 163º, pois que, conclui então aquele Venerando Tribunal da Relação de Coimbra «ser esta a tese que está imanente ao acórdão de fixação de jurisprudência e que importa considerar até em obediência ao princípio da igualdade plasmado no artigo 13º da Constituição da República.».

J. Donde, atento o vertido no douto Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 02-02-2011, de 26-03-2014, de 25-06-2014 (este não publicado) e de 18-03-2015, os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 11-12-2013, de 12-02-2014 (este não publicado), de 09-07-2014 e de 17-09-2014, 24-09-2014 (este não publicado), 04-02-2015 e de 22-04-2015, e o Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 31-05-2011, de 28-02-2012 e de 10-05-2016, encontrando-se disponíveis em www.dgsi.pt, está em crer modestamente a Recorrente que a máquina em causa nos presentes autos, não poderá ser entendida como desenvolvendo um qualquer jogo de fortuna ou azar.

K. Mais que não seja porque, e abordando-se a questão por outro prisma, e tal qual resulta do vertido no aludido douto Acórdão de Fixação de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2010, sendo o tipo legal em causa (exploração ilícita de jogo) dotado de uma certa rigidez, que o constitui como tipo de garantia, sendo essa precisamente uma das manifestações do princípio da legalidade, claramente será de excluir o jogo dos autos das previsões de punição penal decorrentes do preceituado nos artigos 1.º, 3.º, 4.º e 108.º da “Lei do Jogo”, L. Isto sem descurar do facto de a própria “Lei do Jogo” (artigos 1.º e 4.º do D.L. n.º 422/89, de 02 de Dezembro, na redacção do D.L. n.º 10/95, de 19 de Janeiro), na definição de jogos de fortuna ou azar, combinar uma fórmula generalizadora (artigo 1.º) com a técnica exemplificativa (artigo 4.º), donde resulta que os diversos tipos de jogos considerados como de fortuna ou azar e que são autorizados nos casinos são os que estão especificados na lei, e não outros, pois que, não obstante exemplificativa, a especificação dos jogos de fortuna ou azar constante da lei, sempre tal especificação é tendencialmente completa e comporta uma certa rigidez, como é próprio de um tipo legal de crime, que é um tipo de garantia, M.

Ao que acresce o facto de, nem mesmo pelas Portarias actualmente em vigor (nºs 817/2005, de 13 de Setembro e 217/2007, de 26 de Fevereiro), relativamente às regras de execução dos jogos de fortuna ou azar, porque os tipos de jogos (bancados, não bancados, e, em máquinas electrónicas) quase totalmente coincidentes com os especificados no D.L. n.º 422/89, de 02 de Dezembro, se poder concluir pela observância por parte do jogo da máquina dos autos das características dos denominados jogos de casino.

N. Assim, tal como se infere do Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/2010 (Diário da República, 1.ª série — N.º 46 — 8 de Março de 2010), tendo o critério de distinção entre o ilícito criminal e o ilícito contra - ordenacional que ser um critério material, imposto pelo princípio da legalidade e pela função de garantia inerente a cada tipo de crime, motivo pelo qual os jogos de fortuna ou azar serão aqueles que se encontram especificados no n.º 1 do artigo 4.º, e, como tal, nunca a máquina dos autos poderá ser enquadrada nesses jogos, na medida em que, não pagava directamente prémios em fichas ou moedas, nem sequer atribuía pontuações, não permitia acumular e/ou arriscar posteriormente, e, não desenvolvia um qualquer tema próprio dos jogos de fortuna ou azar ou similar.

O. No entanto, sempre se diga que, nem mesma a referida possibilidade de atribuição de prémios pecuniários em função do texto “impresso” poderá, por si só, fazer precludir a sua “integração” enquanto mera modalidade afim dos jogos de fortuna ou azar, mas tão só, poderá consubstanciar, ela própria, uma distinta contra - ordenação.

P. Ademais, de referir que, temos por inconstitucional a interpretação das normas contidas nos nºs 4.º, 108.º e 115.º do D.L. n.º 422/89, de 02 de Dezembro, quando efectuada (como sucede no caso dos autos) no sentido de que um qualquer jogo desenvolvido por máquina electrónica, cujo resultado dependa exclusiva ou fundamentalmente da sorte, e que sem desenvolver tema próprio de fortuna ou azar não se destine à atribuição de pontuações, susceptíveis de serem acumuladas e/ou arriscadas em novas jogadas, consubstancia um qualquer jogo de fortuna ou azar, Q. Pois que, uma tal...

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