Acórdão nº 978/17.5T8VNG.1.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelFERNANDA SOARES
Data da Resolução11 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº978/17.5T8VNG.1.P1 Relatora: M. Fernanda Soares – 1486 Adjuntos: Dr. Domingos José de Morais Dra. Paula Leal de Carvalho Acordam no Tribunal da Relação do Porto INos presentes autos de acidente de trabalho, a correr termos no então Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Gaia – hoje Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia – Juiz 2 – em que é sinistrado B… e entidade responsável Companhia de Seguros C… S.A.

, na sequência de pedido de revisão de incapacidade requerido pelo sinistrado, foi proferida decisão, em 06.03.2017, com o seguinte teor: (…) “Em 24.02.2017, veio o sinistrado B… requerer incidente de revisão de incapacidade. A data da fixação da incapacidade remonta a 06.04.1995 (folhas 23). Considerando o limite imposto pelo nº2 da Base XXII da Lei nº2127, de 03.08.1965, aplicável, in casú, concluímos já não ser possível ao sinistrado deduzir qualquer incidente de revisão de pensão, porque decorridos mais de 10 anos sobre a data da fixação da incapacidade. Pelo exposto, indefiro o incidente de revisão deduzido” (…).

O sinistrado, inconformado, veio recorrer, pedindo a revogação do despacho e a sua substituição por outro que admita o incidente de revisão, concluindo do seguinte modo: 1.

A interpretação dada pelo Tribunal a quo ao disposto no nº2 da Base XXII da Lei nº2127 de 03.08.1965 é desconforme ao princípio constitucional da justa reparação das vítimas de acidente de trabalho e ao princípio da igualdade consagrados no artigo 59º, nº1, al. f) e 13º da CRP.

  1. Tendo o Tribunal Constitucional no seu acórdão nº147/2006 julgado «inconstitucional, por violação do direito do trabalhador à justa reparação consagrado no artigo 59º, nº1, al. f) da Constituição, a norma do nº2 da Base XXII da Lei 2127, interpretada no sentido de consagrar um prazo absolutamente preclusivo de 10 anos, contado a partir da data da fixação inicial da pensão, para a revisão da pensão devida ao sinistrado por acidente de trabalho, com fundamento em agravamento superveniente das lesões sofridas, nos casos em que desde a fixação inicial da pensão e o termo desse prazo de 10 anos tenham ocorrido actualizações da pensão, por se ter dado como provado o agravamento das lesões sofridas pelo sinistrado».

  2. E com adesão à fundamentação neste acórdão desenvolvida, idênticos juízos de inconstitucionalidade foram proferidos no Acórdão nº161/2009, Acórdão nº59/2007 e as Decisões Sumárias nº390/2008, 470/2008 e 36/2009.

  3. A norma do nº2 da Base XXII da Lei nº2127 é inconstitucional na medida que limita temporalmente o pedido de revisão das prestações fixadas, pelas razões invocadas pelo Tribunal Constitucional quanto à justa reparação imposta pela Constituição às vítimas de acidente de trabalho, cientes que essa revisão está sempre dependente da demonstração do nexo causal entre o acidente e o agravamento da lesão, pelo que a invocação dos danos adicionais resultantes do acidente, agravará o ónus processual do lesado que terá mais dificuldades em estabelecer a correlação do dano superveniente com o acidente, ou seja, a necessidade de ser estabelecido o nexo de causalidade entre o agravamento ou a melhoria da lesão e o acidente de trabalho, para assim excluir a possibilidade de abusos da parte de quem requer a reavaliação.

  4. A Lei nº98/2009 de 04.09 ao abolir qualquer limite temporal ao direito à revisão das prestações, torna esse regime mais conforme a norma constitucional que consagra o direito da vítima a uma justa reparação em caso de acidente de trabalho ou doença profissional.

  5. Embora, de acordo com a norma consagrada no artigo 187º da Lei nº98/2009, esta lei apenas seja aplicável aos acidente ocorridos após a respectiva entrada em vigor, o desaparecimento, no respectivo artigo 70º, do prazo preclusivo para requerer a revisão da incapacidade constitui verdadeiramente uma alteração do conteúdo da relação jurídica emergente de acidentes de trabalho, pelo que tem pertinência a aplicação dessa norma às situações jurídicas já constituídas à data da entrada em vigor da Lei, em conformidade com o disposto na parte final do nº2 do artigo 12º do C. Civil.

  6. Uma interpretação restritiva da norma do artigo 187º é uma forma de assegurar o princípio constitucional da igualdade de tratamento.

  7. Com efeito, a assim não se entender, estaria criada uma situação de desigualdade no que a esta questão concerne.

  8. É perfeitamente possível em termos clínicos configurar situações de agravamento ou melhoria das lesões após o decurso do referido prazo de 10 anos e ao não se admitir nesses casos a revisão coarcta-se e diminui-se de forma grave e significativa a possibilidade de adequar a pensão ao estado de saúde do respectivo titular.

  9. Entende-se que essa diminuição é ofensiva de direitos constitucionalmente consagrados e não se justifica em obediência ou em honra a outros princípios ou direitos constitucionalmente consagrados.

  10. A interpretação normativa constante do despacho recorrido contraria o disposto no artigo 59º, nº1, al. f) da Constituição da República Portuguesa, isto é, viola o direito do trabalhador à justa reparação e como tal deve ser recusada a sua aplicação.

    A Seguradora veio responder pugnando pela manutenção do despacho recorrido, concluindo do seguinte modo: 1.

    Não é inconstitucional, à luz do princípio da igualdade, o entendimento de que decorridos 10 anos sobre a data da fixação da pensão, sem que se tenha registado qualquer evolução justificadora do pedido de revisão, se considera consolidada a situação clínica relativa às lesões do sinistrado.

  11. A aplicação do regime introduzido pela NLAT ofenderia gravemente a certeza e segurança do direito, sendo inaceitável que a parte responsável/seguradora se pudesse ver confrontada com o ressurgimento de um direito que estava já juridicamente extinto à luz da Lei aplicável.

  12. O prazo de 10 anos para a formulação do pedido de revisão da incapacidade previsto no nº2 da Base XXII da Lei nº2127 revela-se, na generalidade dos casos, e segundo a normalidade das coisas, como um prazo suficientemente dilatado para permitir considerar consolidada a situação clinica do sinistrado.

  13. Razão pela qual têm os Tribunais superiores decidido no sentido da não inconstitucionalidade do referido artigo, assim como do posterior artigo 25º, nº2 da Lei nº100/97 de 13.09.

    O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência do recurso ao qual a Seguradora veio responder reafirmando a improcedência do recurso e sustentando tal posição nos acórdãos do Tribunal Constitucional de 19.03.2003, 10.12.2008 e de 17.09.2014 bem como nos acórdãos do STJ de 22.05.2013, 29.05.2013 e de 29.10.2014.

    Admitido o recurso cumpre decidir.

    * * * II Matéria de facto a ter em conta no presente recurso.

  14. O sinistrado sofreu um acidente de trabalho no dia 20.09.1993.

  15. Em 06.04.1995 foi proferido despacho que homologou o acordo entre sinistrado e Seguradora tendo esta aceite pagar a pensão anual e vitalícia de 82.808$00, tendo por base o salário de 108.636$00 x 14 meses e a IPP de 10%. A referida pensão foi remida.

  16. Em 18.01.1999 o sinistrado veio requer a revisão da sua incapacidade alegando ter piorado das lesões sofridas.

  17. Em 23.05.2002 foi proferido despacho que manteve a pensão fixada ao sinistrado.

    * * * III Objecto do recurso.

    Da caducidade do direito de pedir a revisão da pensão – Base XXII, nº2 da Lei nº2127 de 03.08.1965.

    Antes de tudo cumpre dizer que tendo o acidente ocorrido em 20.09.1993, ao caso é aplicável a Lei nº2127 de 03.08.1965 – Base LI, nº1 al. a) da referida Lei e artigo 83º do Decreto nº360/71 de 21.08 [a Lei nº100/97 de 13.09 aplica-se aos acidentes de trabalho que ocorrerem após a entrada em vigor da mesma – 01.01.2000 (artigo 41º, nº1, al. a) da Lei nº100/97 de 13.09 e artigo 1º do DL nº382-A/99 de 22.09). Igualmente, a Lei nº98/2009 de 04.09 aplica-se aos acidentes de trabalho ocorridos após a entrada em vigor da mesma – 01.01.2010 (artigo 187º, nº1 e 188º da referida Lei)].

    Segundo o disposto no nº2 da Base XXII da Lei nº2127 “ A revisão só poderá ser requerida dentro dos dez anos posteriores à data da fixação da pensão e poderá ser requerida uma vez em cada semestre, nos dois primeiros anos, e uma vez por ano, nos anos imediatos” Sobre a referida disposição legal já o Tribunal Constitucional se pronunciou em diversas ocasiões.

    No acórdão nº155/2003 de 19.03.2003, considerou-se não ser inconstitucional a norma do nº2 da Base XXII da Lei nº2127, quando aplicada ao caso em que não tenha sido requerido a revisão da pensão/incapacidade dentro do prazo de 10 anos desde a fixação da pensão inicial. Diz-se nesse acórdão que “não se reveste de flagrante desrazoabilidade o entendimento do legislador ordinário de que, 10 anos decorridos sobre a data da fixação da pensão (que pressupõe a prévia determinação do grau de incapacidade permanente que afecta o sinistrado), sem que se tenha registado...

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