Acórdão nº 120/15.7GBPFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMOREIRA RAMOS
Data da Resolução13 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 120/15.7 GBPFR.P1 Tribunal da Relação do Porto (2ª Secção Criminal – 4ª Secção Judicial) Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO: Inconformado com o despacho proferido em 24/02/2017 em que se decidiu declarar a ilegitimidade do Ministério Público para promover o procedimento criminal relativamente ao acusado crime de furto simples, atenta a inexistência de queixa válida atempadamente ratificada pela “B..., S.A” e, em consequência, foi julgado extinto o correspondente procedimento criminal instaurado contra os arguidos, dele veio recorrer o Ministério Público nos termos constantes de fls. 165 a 184 dos autos, aqui tidos como especificados, tendo formulado, a final, as seguintes conclusões (transcrição do texto, sem destacados a negrito/”bold”): 1 – Apresentada a queixa por crime semipúblico, por mandatário sem poderes especiais, o Ministério Público tem legitimidade para exercer a ação penal se a queixa for ratificada pelo titular do direito respetivo – mesmo que após o prazo previsto no artigo 115.°, nº1 do Código Penal de 1982; 2 – Tendo uma queixa sido apresentada por pessoa que se apresentou como representante da pessoa coletiva titular do direito de queixa – não sendo mandatário forense –, sem que se mostrem comprovados os seus poderes especiais para expressar tal queixa em nome da representada, o Tribunal não pode considerar extinto o direito de queixa se a ratificação não tiver sido feita antes do decurso do prazo de seis meses referido no artigo 115.° do Código Penal.

3 – Tal solução corresponderia ao entendimento de que a ratificação não tem efeito retroativo em todos os casos, operando ex tunc (artigo 268.°, n° 2, do Código Civil); 4 – A ratificação de queixa não está sujeita ao prazo do artigo 115.°, nº1 do Código Penal.

5 – Mantém pela atualidade e vigência a jurisprudência fixada no Ac. STJ 1/97.

6 – Daí que, no caso dos autos, não pudesse a Mmª Juíza a quo ter recusado o recebimento da acusação pública deduzida contra os arguidos C... e D..., pela prática do crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.°, nº1 do Código Penal.

7 – Com efeito, tendo aqui sido apresentada queixa válida, ainda que ineficaz por parte de um funcionário da B..., a ratificação apresentada pela mesma em 03-11-2015, operou retroactivamente (artigo 268.°, nº2 do C.C.), conferindo eficácia à queixa inicialmente apresentada.

8 – Aquando da dedução da acusação contra o arguido --- pela prática do crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.°, nº1 do Código Penal, o MP tinha efetiva legitimidade para o fazer - artigo 49.° do C.P.P - pois havia nos autos queixa válida e oportunamente ratificada pelo legítimo titular do direito de queixa.

9 – Deste modo, o douto despacho recorrido deverá ser revogado e substituído por outro que receba a acusação pública deduzida nos autos contra os arguidos C... e D..., pela prática de um crime de furto, p. e p. pelo artigo 203.°, nº1 do C.P.

O recurso foi regularmente admitido, mas mal quanto ao efeito fixado, o que entretanto foi já retificado no despacho preliminar (cfr. fls.

185 e 207).

Não há respostas.

Já neste tribunal, e com vista nos autos, o Ex.mo PGA emitiu o parecer junto a fls. 200 a 202, aqui tido como reproduzido, através do qual sustentou que o recurso deveria ser julgado procedente e revogar-se o despacho recorrido, ordenando-se o prosseguimento do processo com vista à realização do julgamento.

No cumprimento do artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, nada mais foi aduzido.

Após exame preliminar, colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir, nada obstando a tal.

II – FUNDAMENTAÇÃO: a) a decisão recorrida: No que ora importa destacar, o despacho recorrido é do teor seguinte (transcrição): Autue como processo comum com intervenção do Tribunal Singular.

O Tribunal é competente.

Questão prévia: Vem o Ministério Público requerer o julgamento dos arguidos C... e D..., em processo comum e, perante Tribunal Singular, porquanto lhes imputa factos suscetíveis de, integrarem a prática, em coautoria material de um crime de furto p. e p. pelo art. 203º, nº1 do Código Penal.

O crime de furto tem natureza semipública, logo depende de queixa (cfr. artigo 203º, nº3 do Código Penal).

Analisando os autos, constata-se que a queixa foi apresentada em 12/05/2015 e, por factos ocorridos a 05/12/2014 e, subscrita por E..., diretor da B...., SA (cfr. fls. 3 e 4).

O referido E... não estava munido de poderes especais para apresentar tal queixa e, como exige o art. 49º, nº3 do Código de Processo Penal, daí que a 03/11/2015 a B..., S.A., tenha vindo ratificar a queixa apresentada e, supra referida (cfr. fls. 55 a 78).

Urge, antes de mais, saber se, a ratificação operada pode produzir os seus efeitos jurídicos, ou não.

Em nosso entendimento a ratificação da queixa tem que ocorrer no prazo para a apresentação da queixa, ou seja, no prazo de seis meses, sob pena de ser encontrado um “expediente” para alargar um prazo legal (art. 115º, nº1 do Código Penal), não podendo assim, ser apresentada depois de esgotado aquele prazo, atribuindo à ratificação intempestiva, efeitos retroativos.

O Supremo Tribunal de Justiça quanto ao prazo de exercício do direito de queixa, fixou jurisprudência no sentido de “o prazo de seis meses para o exercício do direito de queixa, nos termos do artigo 115º nº 1, do Código Penal, termina às 24 horas do dia que corresponda, no sexto mês seguinte, ao dia em que o titular desse direito tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores; mas, se nesse último mês não existir dia correspondente, o prazo finda às 24 horas do último dia desse mês” – Acórdão nº4/2012, publicado in DR 98, Série I, de 21/05/2012.

Entendimento contrário – ratificação depois de esgotado este prazo – contende com os direitos do próprio arguido já que "permitiria o alargamento ad aeternum do prazo que a lei fixou para o exercício do direito de queixa, causando uma situação de absoluta incerteza para o arguido, insustentável num Estado de Direito...

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