Acórdão nº 1709/15.0T8AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução07 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 1709/15.0T8AVR.P1 Sumário do acórdão: I. Considerando o carácter “predominantemente extrajudicial” do PER, e a imperatividade do n.º 1 do artigo 216.º do CIRE, que expressamente impõe ao credor reclamante o ónus da prova “em termos plausíveis, em alternativa” de que a sua situação ao abrigo do plano era previsivelmente menos favorável do que a que ocorreria na ausência de qualquer plano, ou que o plano proporciona a algum credor um valor económico superior ao montante nominal dos seus créditos sobre a insolvência, face à não alegação por parte do reclamante, dos pressupostos enunciados, legitimadores da não homologação, não pode o julgador apreciá-los oficiosamente na decisão prevista no n.º 5 do artigo 17.º-F do CIRE.

II. O princípio da igualdade também se concretiza no tratamento de forma diferente, de realidades diversas, traduzindo-se na ideia geral de proibição do arbítrio.

III. Entre as “razões objetivas” que justificam a diferenciação dos credores, nos termos do n.º 1 do artigo 194.º do CIRE, destaca-se a diferenciação entre créditos garantidos e privilegiados, créditos comuns e créditos subordinados, prevista no artigo 47.º do mesmo diploma legal.

IV. Decorrendo da lei, que em primeiro lugar é dado pagamento aos créditos com garantias ou privilégios creditórios e o remanescente, se o houver, será distribuído pelos créditos comuns (artigos 174.º, 175.º e 176.º do CIRE), o Plano de Recuperação que distingue e privilegia um crédito hipotecário e um crédito da Segurança Social, relativamente a um segundo patamar onde integra todos os créditos comuns, não viola o princípio da igualdade enunciado no n.º 1 do artigo 194.º do CIRE.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Em 15.05.2015, B…. e C…, casados um com o outro, apresentaram-se em Processo Especial de Revitalização, na Instância Central, 1.ª Secção de Comércio (J2) da Comarca de Aveiro.

Em 6.11.2015 foi apresentado pelos devedores/requerente, o seguinte Plano de Recuperação: «O presente plano de recuperação prevê a satisfação do credor pela recuperação dos Revitalizados, permitindo que o pagamento aos credores seja efetuado à custa dos rendimentos gerados, tal qual indicado no presente PER.

Os devedores enfrentam dificuldades sérias para cumprir as suas obrigações, designadamente por ter falta de liquidez. O presente plano obstará à probabilidade séria da impossibilidade de cumprimento, pelos devedores das suas obrigações vincendas.

Propõe-se o pagamento a todos os credores nos seguintes termos: Quanto aos créditos da D…, Credor Hipotecário, propõe-se: - Prolongamento do prazo de pagamento dos empréstimos até aos 80 anos do devedor mais velho (Janeiro de 2044); - Redução do spread em 0,25% nos contratos ………….-. e …………..-.; - Novo contrato com a finalidade de liquidação do contrato ………….-. e pagamento de todos os valores vencidos nos contratos ………….-. e …………..-., com spread de 10%.

- Garantia hipotecária no novo contrato (Hipoteca s/ prédio descrito na CRP Anadia sob o nº 647 do distrito de Aveiro, concelho de Anadia, freguesia de …, inscrito sob o artº matricial urbano 716 da mesma freguesia) - Manutenção das garantias existentes nos contratos ……………-. e ………….-.2.

Quanto aos Créditos Comuns, propõe-se: - Perdão de 70% dos valores reclamados e reconhecidos e pagamento dos restantes 30% em 120 prestações mensais, iguais e sucessivas.

- A primeira prestação vence-se no mês seguinte à data da sentença de homologação do plano especial de revitalização.

Quanto ao crédito do Instituto da Segurança Social, I.P., propõe-se: - Regularização da dívida junto do competente órgão de execução fiscal (secção de processos executivos do IGFSS) de acordo com as regras previstas no CPPT. Face aos rendimentos dos Requerentes e ao elevado volume de crédito concentrado no Credor Hipotecário e nos créditos do Estado – Segurança Social - não têm os devedores outra alternativa senão propôr o perdão de 70% dos créditos comuns.

Pelo que, só assim os devedores conseguirão honrar os seus compromissos, não importando o perdão proposto qualquer tipo de descriminação, tendo em conta que o mesmo é aplicado a todos os credores comuns, salvaguardando-se desta medida apenas os credores garantidos, titulares de privilégios reconhecido legalmente.

Importa ainda referir que, com esta medida, os Credores Comuns e todos os demais ficarão sempre em melhor situação do que aquela em que ficariam se os aqui Devedores estivessem numa quadro de insolvência, o que não é de todo o caso sub judice, pois consideram-se os Revitalizados capazes de cumprir os compromissos assumidos perante os seus credores no âmbito do presente Plano de Recuperação.

Caso os Requerentes fossem declarados insolventes, o que não se prevê, os credores comuns nunca receberiam 30% dos créditos, conforme aqui se propõe, o que facilmente se pode concluir pela análise de um juízo de prognose que possa ser feito com base num eventual rendimento disponível, bem como no valor que pudesse ser cedido à massa.

A fiscalização do cumprimento do plano caberá ao Senhor Administrador Judicial provisório.

As vantagens do presente plano de revitalização, passam pela previsão de uma maior probabilidade de recebimento dos seus créditos para todos os credores.

Todos os pagamentos serão feitos mediante transferência bancária para NIB a indicar por cada um dos credores, devendo posteriormente ser remetido para os Revitalizados o respetivo recibo de quitação.».

Foi proferido despacho em 26.11.2015, no qual se decidiu: «O expediente respeitante à votação demonstra que o plano foi objecto de voto favorável por parte de credores que totalizam 203.338 votos, num universo de 233.231 votos expressos na totalidade e de € 243.903,79 de créditos reconhecidos.

Assim, a vontade dos credores é inequívoca no sentido da aprovação do plano, encontrando-se preenchidos ambos os quóruns previstos para o efeito no art. 17.º-F/3 do CIRE, sendo certo que um deles bastaria para o reconhecimento do mesmo resultado.

[…] Pelo exposto, i) declaro aprovado o plano de recuperação dos devedores; ii) determino seja tal aprovação publicitada, nos termos previstos no art. 213.º do CIRE; e iii) fixo em cinco dias, após tal publicitação, para apresentação de eventuais requerimentos de interessados ao abrigo do disposto nos arts. 17.º-F/5 e 216.º do CIRE.».

Em 27.11.2015 o E…, SA., veio requerer a não homologação do Plano apresentado pelos devedores, alegando em síntese: reclamou créditos no valor de € 12.066,32, com origem em contrato de crédito individual ao consumo; tais créditos foram reconhecidos; o Plano prevê o perdão de 70% dos valores reclamados e reconhecidos; a ser posto em prática, o crédito do E… seria reduzido em € 8.446,42, e iria ser pago em 10 anos, assim como os restantes dos credores comuns; ao passo que os credores garantidos veriam o seu crédito satisfeito na íntegra (D… e Instituto da Segurança Social); a redução do pagamento do capital dos credores comuns em 70% traduz-se num tratamento manifestamente desproporcional que vai para além dos limites da razoabilidade, sendo que a desproporção em causa não se encontra justificada por razões subjetivas que a sustentem.

Em 7.12.2015, vieram os devedores deduzir oposição á pretensão do credor E…, SA., reiterando o pedido de homologação do plano apresentado.

Em 15.12.2015 foi proferido despacho a determinar a notificação dos devedores para «… em três dias, juntarem novo plano que, respeitando os elementos essenciais do que já consta nos autos, cumpra o disposto no art. 196.º/2, als. a) e d), do CIRE, de modo a que mencione o esforço mensal no pagamento da dívida, face ao rendimento que auferem, e a comparação com a situação que previsivelmente ocorreria com a ausência de qualquer plano e o prosseguimento dos autos para insolvência.» Em 18.12.2015, vieram os requerentes/devedores reformular o Plano com menção do “esforço mensal no pagamento da dívida”, reiterando: «[…] propõe-se o pagamento a todos os credores nos seguintes termos: Quanto aos créditos da D…, Credor Hipotecário, propõe-se o pagamento dos valores em dívida à data do trânsito em julgado da sentença da homologação do plano de revitalização, nos seguintes termos: - Prolongamento do prazo de pagamento dos empréstimos até aos 80 anos do devedor mais velho (Janeiro de 2044); - Redução do spread em 0,25% nos contratos ………….-. e ………….-., fixando se o mesmo em 2,54% para o contrato ………….-. e 2,25% para o contrato …………-.2; - Novo contrato com a finalidade de liquidação do contrato ………….-. e pagamento de todos os valores vencidos nos contratos ………….-. e ……..........-., com spread de 10%.

- Garantia hipotecária no novo contrato (Hipoteca s/ prédio descrito na CRP Anadia sob o nº 647 do distrito de Aveiro, concelho de Anadia, freguesia de …, inscrito sob o artº matricial urbano 716 da mesma freguesia) - Manutenção das garantias existentes nos contratos ………….-. e …………..-..

- Estas alterações devem ser implementadas após a data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano de revitalização Quanto aos Créditos Comuns, propõe-se: - Perdão de 70% dos valores reclamados e reconhecidos e pagamento dos restantes 30% em 120 prestações mensais, iguais e sucessivas.

- A primeira prestação vence-se no mês seguinte à data da sentença de homologação do plano especial de revitalização.

Quanto ao crédito do Instituto da Segurança Social, I.P., propõe-se: - Regularização da dívida junto do competente órgão de execução fiscal (secção de processos executivos do IGFSS) de acordo com as regras previstas no CPPT.

Desta forma, o plano ora proposto aos credores, permitirá aos Requerentes suportar, aproximadamente, os seguintes encargos mensais: Banco F…, S.A.: 25,15 € Banco G…, S.A.: 5,75 € H…: 19,57 € I…, S.A.: 5,41 € E…, S.A.: 30,17 € J…, S.A.: 19,03 € Banco K…, S.A.: 1,26 € L…, S.A.: 15,63 € D…: aproximadamente 750,00 € O que perfaz o encargo mensal total de 871,97 € Face aos rendimentos dos Requerentes e ao elevado volume de crédito...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT