Acórdão nº 1805/09.2T3AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelARTUR OLIVEIRA
Data da Resolução15 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

O TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO – SECÇÃO CRIMINAL (QUARTA) - no processo n.º 1805/09.2T3AVR.P1 - com os juízes Artur Oliveira [relator] e José Piedade, - após conferência, profere, em 15 de junho de 2016, o seguinte Acórdão I - RELATÓRIO 1. No processo comum (tribunal coletivo) n.º 1805/09.2T3AVR, da 1ª Secção Criminal (J5) – Instância Central de Aveiro, Comarca de Aveiro, em que é assistente B…, são demandantes civis B…, C…, D…, E…, F… e “G…, LDA.” e é arguida e demandada civil H…, foi proferido acórdão que decidiu nos seguintes termos [fls. 3022-3024]: «(…) Nos termos e pelos fundamentos supra expostos, decide o Tribunal coletivo: A) – Condenar a arguida, H…, pela prática, em autoria material, sob a forma consumada, em concurso efetivo, de dois crimes de abuso de confiança qualificado, p. e p. pelo art. 205º, nºs 1 e 4, al. b), do Código Penal, nas penas de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão e de 3 (três) anos de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena única de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão; B) – Suspender a execução da referida pena única de prisão pelo período de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses, com sujeição a regime de prova e condicionada à obrigação, cujo cumprimento deverá comprovar nos autos, de: a) - no prazo de 30 (trinta) dias, restituir à sociedade "G…, S.A." a quantia de 23.366,91 € e respetivos juros de mora e a B…, C…, D…, E… e F… da quantia de 36.299,78 € e respetivos juros de mora, sem prejuízo da sua cobrança coerciva eventualmente promovida pelos demandantes no âmbito da execução dos pedidos de indemnização civil; b) - no prazo de 6 (seis meses), pagar aos demandantes B…, C…, D…, E… e F… as indemnizações por danos morais arbitradas a cada um infra descriminadas e respetivos juros de mora; C) – Condenar a arguida no pagamento de taxa de justiça, que se fixa em 5 UC, bem como nos encargos a que a sua actividade deu lugar (artigos 513º, n.ºs 1, 2 e 3, e 514º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal e 8º, n.º 5, do Regulamento das Custas Processuais); D) – Julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido de indemnização civil formulado no processo principal (n.º 1805/09.2T3AVR) e, consequentemente, condenar a demandada/arguida a pagar: a) - aos demandantes B…, C…, D…, E… e F… a quantia de 36.299,78 €, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal, desde 28.06.2006 até integral pagamento; b) - a B… a quantia de 4.000,00 €, a C… a quantia de 5.000,00 €, a D… a quantia de 3.000,00 €, a E… a quantia de 4.000,00 € e a F… a quantia de 2.000,00 €, acrescidas de juros de mora, calculados, à taxa legal, a partir da presente decisão até integral pagamento; E) – Julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido de indemnização civil formulado no processo apenso (n.º 167/12.5T3AVR) e, consequentemente, condenar a demandada/arguida a pagar à demandante sociedade "G…, S.A." a quantia de 23.366,91 €, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal, desde 11.11.2005 até integral pagamento, absolvendo-a do demais peticionado, designadamente pelos demandantes B…, C…, D…, E… e F…; (…)» 2. Inconformada, a arguida recorre, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: «I. No que concerne à acusação deduzida a fls. 630 e ss. do processo n.º 167/12.5T3AVR, entretanto apensado ao processo 1805/09.2T3AVR, (designado processo principal), estamos perante uma inexistência de queixa, por força da ausência de legitimidade da participante "G…, S.A." devendo, em consequência, ser declarado extinto o procedimento criminal instaurado contra a recorrente, o que desde já se invoca, sem conceder, a título de questão prévia.

  1. Mesmo que assim não se entenda, atentos, entre o mais, os factos constantes do ponto 153 FP, e tendo a participação criminal sido apresentada em Março de 2011, tal acto foi praticado quando já se encontrava prescrito o direito de queixa. (cfr. art. 115º n.º 1 do Código Penal) - prescrição que igualmente se invoca, sem conceder.

  2. No que se refere ao depósito do precatório-cheque referente à caução, (processo apenso) o Tribunal a quo apreciou e interpretou erradamente os factos constantes dos autos e, em consequência: (i) Julgou incorrectamente os factos que deu como provados nos pontos 20 (na parte em que refere "que o montante por ele titulado não lhe pertencia", 21 (na parte em que refere "e que tinha de entregar o remanescente à sociedade G…, Lda., o que não fez, usando-o antes em proveito próprio", 22, 23 e 24.

  3. O acórdão recorrido desconsiderou por completo ou valorou erroneamente provas que impunham decisão diversa daquela que foi proferida, designadamente (i) o documento de fls. 379 e 380 dos autos, (ii) a declaração emitida por entidade bancária em 29.4.2015, junta aos autos em audiência de julgamento, e (iii) o fax datado de 24.1.2007, constante de fls.362 a 364 dos autos) e identificado no ponto 153 FP.

  4. Os elementos constantes dos autos impõem que se considere que (i) a recorrente levantou a quantia referente à caução prestada no processo movido por I… à sociedade G…, Lda. (processo nº 456/2000 e que veio a ser renumerado 71/09.4T4AGD) com autorização e conhecimento da mesma, e que (ii), depois de paga a caução que foi prestada no processo nº 586/04.7TAAGD movido por J… à G…, Lda., ficou com o remanescente desse valor em cumprimento de um acordo feito com a referida sociedade (acordo de acerto de contas e pagamento de honorários que se encontravam em dívida pela sociedade).

  5. O teor do acordo que a recorrente fez com a sociedade, quanto à utilização, entre o mais, do valor remanescente da caução para pagamento de honorários, despesas e encargos que lhe eram devidos pela mesma e apurados até 31.12.2008, resulta do doc.0 de fls. 379 e 380 dos autos, comunicação que o acórdão recorrido não podia ter desconsiderado, como fez, dado que o envio da mesma foi devidamente documentado com o documento de fls. 380 (relatório de envio), e a sua existência não é aleatória nem inconsistente, pois consiste numa resposta a carta remetida pela própria sociedade (cf. ponto 154 FP).

  6. Por outro lado, não foi sequer indagado, muito menos demonstrado, que a sociedade G…, Limitada, dispusesse de sistema certificado de registo de comunicações, para que o Acórdão recorrido possa valorar positivamente, como valorou, que "não existem quaisquer documentos recebidos nesta data ou em datas próximas, via fax e remetidas pela arguida” VIII. Resulta ainda comprovado nos autos que a sociedade G…, Lda., ou quem quer que fosse, nunca interpelou a recorrente, para que lhe devolvesse o valor em causa — nem antes, nem depois da cessação do mandato (cf. Ponto 158 FP).

  7. Mesmo que persistisse alguma dúvida sobre a existência do acordo, a retenção da quantia por parte da recorrente nunca poderia importar o cometimento de algum ilícito penal, visto que: (i) Comprovadamente, a recorrente tinha em seu poder tal quantia com o conhecimento e consentimento da sociedade G…, Lda. (agora S.A.); (ii) Comprovadamente a sociedade G…, Limitada nunca interpelou (em qualquer momento) a recorrente para a entregar (o que não se compadece com um juízo de razoabilidade e de normalidade), e; (iii) Comprovadamente, a recorrente tem em seu poder a quantia em causa, como se retira do documento datado de 29.4.2015 (declaração bancária) e junto aos autos no decurso da audiência de julgamento, a fls., pelo que não se "apropriou" nem o "utilizou em proveito próprio" como refere o Acórdão sob recurso.

  8. Pelo que, não se verifica in casu qualquer apropriação na acepção da "teoria do acto manifesto de apropriação" defendida por Eduardo Correia e acolhida de modo dominante na jurisprudência: a recorrente não levou a cabo actos manifesta e objectivamente idóneos a inverter o título de posse.

  9. Nem, muito menos, se verifica qualquer ilicitude no seu comportamento atento o conhecimento e o consentimento da sociedade G…, Limitada, quanto à posse do dinheiro por parte da recorrente e à ausência de qualquer interpelação para entrega - tudo o que afasta o preenchimento do tipo legal de crime pelo qual foi condenada.

  10. O facto constante do ponto 40 FP está em manifesta contradição com o facto constante dos pontos 149, 153, 155, 157 e 158 FP.

  11. O Acórdão recorrido deveria ter dado como provados os factos constantes das alíneas jj) (até ao vocábulo "Lda."), II), nn), oo), pp) e qq) da factualidade não provada.

  12. Quanto ao depósito do precatório-cheque referente à indemnização devida pela expropriação (processo principal), o Tribunal a quo apreciou e interpretou erradamente os factos constantes dos autos.

    XV.O acórdão recorrido julgou incorrectamente os factos que deu como provados nos pontos 35 (na parte em que refere "e fez seu o montante nele titulado de 36.299,78€”), 37, 38, 39, 47 e 87 da factualidade provada, XVI. Desconsiderou, ou valorou erroneamente provas que impunham decisão diversa daquela que foi proferida, designadamente: (i) os documentos juntos a fls. 672 e ss dos autos, que é também o no 2 e ss. da petição inicial da acção de honorários identificada no ponto 128 FP, (ii) o doc. n.º 34 junto à petição inicial; (iii) a declaração emitida por entidade bancária em 29.4.2015 e junta aos autos em audiência de julgamento.

  13. O acórdão recorrido, conferiu indevida relevância probatória às comunicações electrónicas, constantes de fls. 798 e 799 dos autos.

  14. O Acórdão recorrido deveria a ter dado como provados os factos constantes das alíneas z), aa), bb), cc), dd), ee), e hh) da factualidade não provada.

  15. Efectivamente, os elementos constantes dos autos impõem que se considere: (i) que a recorrente levantou a quantia em causa com autorização e conhecimento dos demandantes e (ii) que procedeu ao seu depósito em conta por si titulada com autorização e conhecimento dos demandantes, (iii) mais tendo sido acordado que a recorrente ficaria na posse de tal quantia até que os demandantes acordassem numa forma de repartição do dinheiro entre si.

  16. Resulta da prova carreada para os autos a inexistência de acordo...

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