Acórdão nº 144/09.3TYVNG.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução06 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 144/09.3TYVNG.P2 Sumário da decisão: I. Para a integração da previsão do n.º 1 do artigo 242.º do CSC, não basta que o comportamento do sócio seja desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade, sendo ainda imprescindível que tenha causado ou possa vir a causar à sociedade prejuízos relevantes.

  1. A exclusão de sócio deverá ser entendida como ultima ratio, apenas sendo permitida quando se mostre necessária para que os restantes sócios prossigam normalmente a atividade social.

  2. Concluindo-se que o funcionamento normal da sociedade pode prosseguir com o sócio na sociedade mas fora da gerência, à qual o mesmo renunciou, não se justifica a sua exclusão.

  3. Tendo o diretor do I.E.F.P., IP. proferido despacho a determinar a resolução do contrato de concessão de Incentivos Financeiros à sociedade e a consequente devolução do valor entregue, encontrando-se o ato administrativo em causa com os seus efeitos suspensos por decisão judicial, enquanto se aguarda o resultado da sua impugnação, não pode proceder o pedido de condenação do sócio no pagamento da quantia exigida pela referida entidade administrativa.

  4. A situação em apreço não é integrável na previsão legal do n.º 1 do art.º 610.º do CPC, porque o que está em causa não é meramente a inexigibilidade decorrente da falta de vencimento da obrigação (situação suscetível de integração na previsão legal do n.º 1 do art.º 610.º do CPC), mas a existência dessa obrigação (que apenas emergirá do ato administrativo, caso o mesmo se torne definitivo).

    Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Em 27.02.2009, B…, sócia gerente da sociedade comercial por quotas B…, Lda., intentou no Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia, ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum ordinário, contra D…, formulando os seguintes pedidos de condenação da ré:

    1. Que “seja reconhecido o comportamento da ré ter sido a causa direta para a ocorrência dos prejuízos da C… Lda., e dos que possam vir a ocorrer, e nesta medida seja imediatamente excluída de sócia da referida sociedade, nos termos dos artigos 241º e 242º do Código das Sociedades Comerciais, a decidir no despacho saneador com base nos elementos de prova que já se encontram juntos aos autos como documentos nºs 1,2,12, 4, 8,13,16 14,17”.

    2. Seja a ré “condenada a pagar à C…, Lda., e à autora uma indemnização pelos prejuízos que poderão ocorrer pelo incumprimento do contrato de Incentivos Financeiros que foi celebrado com o IEFP, que se computam atualmente no valor de € 23.650,56 (vinte e três mil seiscentos e cinquenta euros e cinquenta e seis cêntimos), acrescidos de juros legais, sendo relegada para a execução de sentença a fixação de valor superior caso se venha a verificar”.

    3. Seja a ré condenada a pagar à C…, Lda., uma indemnização pelos resultados negativos que a empresa teve no ano de 2007que se computam no valor de € 13.113,76 (treze mil cento e treze euros e setenta e seis cêntimos), bem como os juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.

    4. Seja a ré condenada no pagamento numa indemnização à C…; Lda., pela situação que criou a fixar equitativamente pelo tribunal.

    5. Seja a ré condenada a pagar à C…, Lda., as contribuições que foram pagas à segurança social no valor de 186,00 (cento e oitenta e seis euros), sem a ré ter prestado o seu trabalho.

    6. Seja a ré condenada a pagar à autora o valor de € 1.759,89 (mil setecentos e cinquenta e nove euros e oitenta e nove cêntimos) a título de danos patrimoniais pelos pagamentos que efetuou a título pessoal das despesas da empresa, referidas nos artigos 97º, 100º,101º e 102º, ainda pelos que poderão ocorrer a fixar em execução de sentença g) Seja a ré condenada a pagar à autora de uma indemnização pelos danos não patrimoniais de que está a ser vítima, no montante a fixar equitativamente pelo tribunal.

    7. As quantias peticionadas, serão acrescidas dos juros vencidos e vincendos à taxa legal, até efetivo e integral pagamento e, acrescidas ainda de sobretaxa de 5% desde o trânsito em julgado da sentença nos termos do artigo 829º – A do Código Civil, e das custas de parte, e custas judiciais.

    8. Seja a ré condenada a pagar os prejuízos que não forem possíveis fixar na presente ação, seja fixado em execução de sentença.

    Alega a autora, em síntese, como fundamento da sua pretensão: autora e ré são as únicas sócias da sociedade por quotas C…, Lda.; cada uma das sócias tem uma quota no valor € 3.750,00, representativas cada uma delas, de 50% do capital social; no início a administração ficou a cargo das duas sócias, sendo necessária a assinatura de ambas para obrigar validamente a sociedade; em dezembro de 2007 a ré renunciou à gerência; a referida sociedade dedica-se à lavagem, limpeza a seco e engomadoria de têxteis e peles; a C…, Lda., apresentou uma candidatura aos apoios financeiros, previstos na Portaria 196-A /2001, de 10 de março, no âmbito da modalidade Iniciativas Locais de Emprego, sendo promotoras de tal iniciativa a autora e ré; a candidatura foi aprovada, e em 30/12/2004, celebrou com o Instituto de Emprego e Formação Profissional (I.E.F.P., IP) um contrato de concessão de Incentivos Financeiros, pelo prazo de quatro anos, segundo o qual foi concedido um incentivo financeiro para a constituição de uma iniciativa local de emprego, conforme cópia de contrato que se junta; esta candidatura foi aprovada para um investimento total de € 35. 420,78, um apoio financeiro total concedido à C…, Lda., de € 27.929,78, sob a forma de subsídio não reembolsável, sendo o montante de € 13.161,60, relativo à criação líquida de dois postos de trabalho, € 12.126,86 relativo ao apoio financeiro ao investimento e 2632,32€ referentes a duas majorações; 15% do investimento ficou retido até à obtenção da autorização de utilização para a atividade e emissão de alvará; assim que a C…; Lda., obtivesse a referida autorização (licenciamento para a atividade), receberia do I.E.F.P., IP, os 15% do investimento; nos termos do contrato, a C…, Lda., ficou de cumprir com as obrigações constantes da cláusula 9º do contrato, destacando-se a obrigação de não reduzir o nível de emprego atingido por via do apoio concedido, por um período mínimo de quatro anos e manter a sua situação regularizada perante a Administração Fiscal e a Segurança Social; pelo cumprimento das obrigações ficou responsável a empresa, C…, Lda., sendo a autora e a ré, na qualidade de promotoras da iniciativa, solidariamente responsáveis com a empresa e entre si – Cláusula 10º do referido contrato de incentivos financeiros; autora e ré ficaram a comandar os desígnios da empresa, obrigadas a cumprir durante quatro anos os seus postos de trabalho que foram criados e apoiados pelo I.E.F.P, IP; sucede que a ré desde março de 2007, só ocasionalmente é que aparecia na empresa, e a partir de maio do ano de 2007, pese embora tendo conhecimento que não o poderia fazer, deixou de comparecer no seu posto de trabalho, em total desrespeito do referido contrato de concessão de incentivos financeiros, sem efetuar qualquer comunicação prévia ao I.E.F.P,IP e à autora a sua sócia; aquele abandono causou e está causar sérios prejuízos à sociedade C…, Lda., bem como à autora; a ré saiu da empresa precisamente na altura em que se previa a consolidação da empresa, já que os anos anteriores se encontrava em fase de implantação no mercado; o funcionamento da sociedade era assegurado pela autora e ré, eram estas que trabalhavam na empresa diariamente efetuando todo o trabalho de lavandaria, engomadoria e costura; os lucros da empresa que se adivinhavam para o ano de 2007, não se fizeram sentir, pelo contrário continuou com resultados negativos; a C…, Lda. deixou de poder cumprir com as prestações da viatura que adquiriu para efetuar o trabalho ao domicílio; a instituição Bancária, E… – Instituição Financeira de Crédito SA, moveu ação judicial contra a C…; mas “o pior de tudo, foi o abandono do posto de trabalho pela ré que era assegurado pelo I.E.F.P, IP, e que deveria ocupar durante 4 anos, que gerou o incumprimento por parte da sociedade C… das obrigações assumidas com o I.E.F.P, I.P”; a autora preocupada com as consequências do abandono da ré, do seu posto de trabalho perante o Instituto do Emprego e Formação Profissional, encetou todas as diligências para resolver esta situação, de forma a sanar o incumprimento, e repor o nível bastava a ré ter bom senso e ceder a sua quota pelo seu valor real, resolvendo assim o grande problema que criou com o IEFP, como não quis, prejudicou e está a prejudicar seriamente a empresa e a sua sócia, a ora autora, fazendo com que estas corram o risco de terem que reembolsar todos os incentivos concedidos; ora é manifesto que a ré provocou toda esta situação, pois se não abandonasse seu posto de trabalho, nada disto aconteceria; teve tempo e oportunidade para sanar o seu incumprimento, pois era sua a obrigação repor o nível de emprego, sendo que para o efeito poderia ceder a sua quota, mas só o faria se tivesse uma contrapartida monetária €10,000.000; nunca a ré teria direito a esse valor pela sua quota, pois esta tem tido um valor negativo, conforme as avaliações que foram efetuadas pela contabilidade F…; devido à “teimosia da ré, a C…, Lda., está numa situação muito complicada, uma vez que é esta sociedade a responsável pelo cumprimento das obrigações assumidas pelas promotoras (autora e ré); a conduta reiterada da ré denota uma intenção de prejudicar os interesses da sociedade e da sua sócia, preferindo abandonar o seu posto de trabalho, e ir trabalhar por conta de outrem, sem antes resolver a situação perante o IEFP, adotando assim um comportamento desleal, egoísta, egocêntrico e gravemente perturbador do bom funcionamento da sociedade; do comportamento da ré resultam os danos peticionados.

    Citada, a ré apresentou contestação em 16.04.2009, na qual suscita as exceções dilatórias e ineptidão da petição inicial e de ilegitimidade ativa da autora, bem como a...

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