Acórdão nº 991/09.6TBMCN-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA CEC
Data da Resolução14 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Sumário (artigo 663º, 7, do NCPC): 1. Em sede de articulado superveniente devem ser carreados para os autos novos factos fundamentais, enquadráveis no tatbestand da norma aplicável à pretensão ou à exceção e reconduzíveis a uma alteração da causa de pedir que alicerce a modificação do pedido.

  1. Quando estejam em causa factos complementares que determinem a modificação simultânea do pedido e da causa de pedir e que sejam desenvolvimento do pedido primitivo, podem os mesmos ser deduzidos até ao encerramento da discussão em 1.ª instância, desde que o objeto da ação mantenha um nexo estreito com o pedido inicial e com a originária causa petendi e não implique convolação para relação jurídica diversa da controvertida.

  2. Por isso, não obstante a extemporaneidade do articulado superveniente apresentado pelo autor, numa ação de responsabilidade civil emergente de acidente de viação é admissível, até ao encerramento da discussão em 1.ª instância, a ampliação do pedido indemnizatório por lucros cessantes resultante do aumento do vencimento do autor, por não estar em causa qualquer facto essencial que constitua a causa de pedir, mas apenas um facto complementar traduzido no desenvolvimento da causa de pedir e pedido primitivos.

    * Apelação em separado n.º 991/09.6TBMCN-B.P1Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório 1.

    B… e C… intentaram ação declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra a Companhia de Seguros D…, S.A. pedindo a condenação da ré a pagar-lhes, respetivamente, a quantia de 9.000,00 euros e 138.260,40 euros, bem como a quantia a liquidar em ampliação do pedido ou em execução de sentença, acrescidas de juros moratórios, à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento.

    Alegaram, para tanto e em síntese, que ocorreu, em 13-10-2008, um embate entre o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula ..-BU-.., conduzido por E… e de sua propriedade, e o motociclo de matrícula ..-DM-.., conduzido pelo autor B… e propriedade da autora C…. Mais aduziram que o embate deveu-se a comportamento culposo do condutor do veículo BU que, ao não parar no sinal STOP, deu causa exclusiva à colisão com o motociclo conduzido pelo autor, para ele resultando lesões corporais graves e subsequentes danos, que especifica, designadamente que exercia as funções de enfermeiro a tempo inteiro no Centro Hospitalar do F…, EPE, auferindo um rendimento anual de 19.407,52 euros, mas prestava serviços a tempo parcial, fora do horário de trabalho, no G…, Lda., donde lhe advinha a quantia anual de 10.080,00 euros, e colaborava com o Instituto Superior de H… e Instituto Politécnico de I…, na preparação e realização de diversas ações de formação, com a remuneração anual de 1.000,00 euros.

  3. Citada, a ré Companhia de Seguros D…, S.A. contestou, aceitando a versão do acidente apresentada pelos autores e a sua responsabilidade pelo pagamento dos prejuízos dele emergentes, embora contrapondo que os valores pedidos são francamente exagerados.

  4. Na réplica, os autores ampliaram o pedido em consequência das dores intensas de que padece o autor e do acompanhamento em tratamentos e consultas externas, bem como da paralisação do veículo.

  5. A ré apresentou tréplica, em que reiterou a sua responsabilidade, mas invocou a falta de legitimidade e de interesse do autor para o pedido relativo à perda do veículo DM. Quanto à ampliação do pedido, opôs tratar-se de uma ampliação da causa de pedir, que não é um desenvolvimento ou uma consequência do pedido primitivo, e pugnou pela sua inadmissibilidade.

  6. Os autores, notificados da tréplica, requereram a correção do lapso material da réplica, porquanto apenas foi identificado o autor B… como apresentante daquele articulado, quando o mesmo foi apresentado por ambos os demandantes. Insurgiu-se a ré, referindo que a leitura da réplica demonstra que a identificação do apresentante do articulado não se ficou a dever a qualquer lapso, pois diz respeito apenas a danos alegadamente sofridos pelo autor e não pela autora.

    Foi proferido despacho que admitiu a requerida correção do lapso material e não admitiu a réplica e a tréplica, mas não foi ordenado o seu desentranhamento em virtude de, nos mesmos articulados, ter sido formulada a ampliação do pedido, com direito ao contraditório da ré.

  7. Apreciada a requerida ampliação do pedido, foi admitida em tudo quanto se verificou após a propositura da ação (28-07-2009) e rejeitada quanto ao ocorrido anteriormente. Não foi admitida a ampliação do pedido relativa aos danos decorrentes da perda total do veículo sinistrado, por estarem em causa factos novos sem superveniência.

  8. Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar e selecionada a matéria de facto assente e a controvertida, com reclamações parcialmente atendidas. Foi proferido despacho que determinou a apensação a estes autos da ação sumária nº1761/10.4TBMCN.

  9. A decisão judicial que fixou a data para a audiência final foi notificada às partes em 22-06-2015 e o autor apresentou, em 17-09-2015, articulado superveniente, que foi admitido por despacho de 29-10-2015.

  10. Não se conformando com o despacho de admissão do articulado superveniente, a ré Companhia de Seguros D…, S.A. recorreu, assim concluindo a sua alegação: 9.1. Não se conforma com o despacho que admitiu o articulado superveniente apresentado pelo autor em 17-09-2015.

    9.2. Tal despacho considerou que a apresentação do mencionado articulado superveniente, no qual o autor aduz factos novos constitutivos e modificativos do seu direito, foi legal e tempestiva.

    9.3. Sucede, porém, que tais factos, pessoais do autor e por ele bem conhecidos, ocorreram, pelo menos, no mês de Maio de 2011.

    9.4. No processo não foi designada qualquer audiência prévia/preliminar e, na data da apresentação daquele articulado superveniente, já tinha sido proferido o competente despacho saneador.

    9.5. A decisão judicial que fixou a data para a audiência final foi notificada às partes em 22-06-2015, presumindo-se que a respetiva notificação ocorreu em 25-06-2015.

    9.6. Perante esta factualidade, o aludido articulado superveniente deveria ter sido apresentado em juízo nos 10 dias posteriores à notificação da data marcada para a realização da audiência final (artigo 588.º, 3 al. b), do C.P.C.).

    9.7. E não, como se refere no despacho recorrido, na audiência de julgamento, em observância da alínea c) do nº. 3 do citado dispositivo legal, que no caso não tem aplicação, dado que os factos supervenientes ocorreram muito antes da notificação às partes da data designada para a realização da audiência de julgamento.

    9.8. Ao não considerar extemporânea a apresentação do articulado superveniente e ao admiti-lo no processo, o despacho violou o disposto no artigo 588.º, 3, al. b) do C. P. C., sendo, por isso, ilegal e destituído de qualquer eficácia processual.

    9.9. Deve o mesmo ser revogado e substituído por outro que declare a manifesta extemporaneidade do articulado superveniente, com as necessárias consequências legais, nomeadamente a eliminação dos artigos correspondentes aditados pelo despacho recorrido ao questionário (57.º, 58.º e 59.º).

    1. Do mérito do recurso O objeto do recurso, salvo questões do conhecimento oficioso delimitado pela recorrente nas conclusões da sua alegação (artigos 635.º, 3 e 4, e 639.º, 1 e 3, e 3.º, 3, do NCPC[1])...

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