Acórdão nº 540/13.1T2AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução14 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)
  1. Secção Apelação n.º 540/13.1T2AVR.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto I- Relatório.

    B…, residente na Rua …, Aveiro, intentou a presente ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra C…, Advogada, com domicílio profissional na Rua …, nº .., Aveiro, pedindo a condenação desta a pagar-lhe: a) a quantia de € 31.508,00; b) os rendimentos mensais futuros até à data da sua saída do estabelecimento prisional com liberdade condicional ou pulseira eletrónica; c) juros de mora, à taxa legal, a partir da citação e até integral pagamento.

    Para tanto, alegou, em resumo, que por acórdão do Tribunal de Círculo de Aveiro de 16/04/2009, foi condenado, em cúmulo jurídico, na pena de três anos e nove meses de prisão. A Ré, após ter sido substabelecida a 27/04/2009, acordou com o ora A. a interposição de recurso do antes referido acórdão, tendo-lhe este entregue, para o efeito, conforme solicitado por ela, a provisão de € 1.500,00. O recurso que a ora Ré interpôs foi rejeitado, por extemporâneo, no Tribunal da Relação de Coimbra, por decisão do Relator de 25/03/2010, pelo que teve de se apresentar para cumprir a pena de prisão em que foi condenado. Os outros coarguidos (D…, E… e F…), todos eles condenados por crimes semelhantes aos praticados pelo A., por intermédio dos competentes recursos, apresentados em devido tempo pelo respetivo mandatário, tiveram as suas penas de prisão suspensas com subordinação ao regime de prova. Participou à Ordem dos Advogados e o Conselho de Deontologia de Coimbra, pelo acórdão de 20/07/2012, aplicou à ora Ré a pena de multa de € 3.000,00 e a pena acessória de obrigação de restituição ao ora A. dos € 1.500,00 que este lhe havia entregado.

    A Ré contestou, sustentando que cometeu um erro profissional, mas a chance de sucesso da pretensão do A. seria muito reduzida, pois este já tinha sido anteriormente condenado por dois crimes de condução sem habilitação legal e por um crime de ameaças, e pediu intervenção principal provocada da Companhia de Seguros G…, S.A., que celebrou com a Ordem dos Advogados contrato de seguro para cobertura da responsabilidade civil dos Advogados inscritos, titulado pela Apólice nº ………. e da Companhia de Seguros H…, S.A., para a qual tem transferida a responsabilidade civil decorrente do exercício da sua profissão de advogada, mediante contrato de seguro titulado, à data dos factos, pela Apólice .. …….., e atualmente pela Apólice .. ……...

    Foi admitido o chamamento das Companhias de Seguros G…, S.A., e H…, S.A., mas para intervenção acessória.

    A interveniente G… veio excecionar a sua ilegitimidade “para a presente ação”, máxime no que respeita a eventuais consequências dos alegados atos e omissões imputáveis à Ré.

    A Ré veio, a fls. 450/453, requerer a intervenção principal provocada de I…, Ltd., igualmente admitida mas para intervenção acessória - fls. 461.

    Saneado o processo e realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida a competente sentença, que julgou a ação parcialmente procedente e condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 10.800,00, por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa civil, desde a citação e até integral pagamento, e na quantia de € 15.000,00, por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa civil, a partir da prolação da presente sentença e até integral pagamento, absolvendo a Ré do restante pedido deduzido.

    Desta sentença veio a Ré interpor o presente recurso, alegando e concluindo nos termos seguintes: I – DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO 1ª ) Dá o douto Tribunal a quo por provado, no ponto 19 da matéria de facto que “ o A., antes de dar início ao cumprimento da pena de prisão, trabalhava numa pizaria e auferia cerca de 600,00€/mês “ – cf. fls. 8 da decisão recorrida, 2ª ) Para depois, com base nas considerações tecidas no ponto 3º de fls. 17 da mesma sentença, condenar a R. a pagar ao A., a título de danos patrimoniais, a quantia de 10.800 €, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa civil, desde a citação e até integral pagamento.

  2. ) De acordo com tais considerações – as vertidas no ponto 3º da fls. 17 da sentença recorrida – a Meritíssima Juiz chega a tal valor considerando então que o salário auferido pelo A. seria de 600 € mensais e que, tendo o mesmo iniciado o cumprimento da pena de prisão a 08/02/2012 e regressado ao trabalho em Junho de 2013, teria, deste modo, deixado de auferir os salários de 16 meses de trabalho Fevereiro de 2012 a Maio de 2013 inclusive ), bem como os subsídios de férias e de Natal de 2012, deixando, deste modo, de auferir 18 x 600,00 €, perfazendo a quantia global de 10.800 €.

    Ora 4ª ) Como resulta da fundamentação da sentença recorrida, mais exatamente de quanto, a este propósito, aí vem dito a fls. 10, quanto à prova do aludido ponto 19 da matéria de facto, o douto Tribunal da 1ª Instância fundou a sua convicção exclusivamente com base no depoimento da testemunha J… – proprietário do restaurante K…, em Aveiro, prestado na sessão de audiência de julgamento de 9 de Outubro de 2015, o qual teria afirmado que, à data em que iniciou o cumprimento da sua pena – 08/02/2012 – o R. ganhava cerca de 600,00€/mês.

    Ora 5ª ) Salvo o devido respeito pela Meritíssima Juiz do Tribunal da 1ª Instância –que é muito – do depoimento da referida testemunha não resulta tal coisa.

  3. ) Atento tal depoimento – o prestado pela testemunha J…, no âmbito dos presentes autos, cuja gravação áudio teve lugar na audiência de 9 de Outubro de 2015, através do programa informático em utilização nos Tribunais, com início às 09:56:41 e fim às 10:29:55 desse mesmo dia, o qual se encontra integralmente transcrito supra e aqui se dá por inteiramente reproduzido – conjugado com o facto de o A. – a quem incumbia a prova deste facto -, não ter apresentado em Tribunal qualquer cópia de um qualquer contrato de trabalho que tivesse outorgado com a identificada testemunha ou empresa titulada pela mesma, não ter juntado aos autos qualquer cópia de qualquer recibo de vencimento, não ter juntado aos autos qualquer declaração de IRS – reportado ao ano de 2012 ou anteriores -, não ter juntado aos autos qualquer documento comprovativo de se encontrar inscrito na Segurança Social como trabalhador dependente ( e cumpridor das suas obrigações para com esta entidade ), nunca poderia o Tribunal a quo ter dado por provada a factualidade constante do ponto 19 dos factos provados.

    Sem conceder 7ª ) Do depoimento daquela testemunha resultaria, quando muito, que o A. auferia, à data do início do cumprimento da sua pena – 08/02/2012, um valor próximo do salário mínimo nacional.

  4. ) Sucede que, em 2012 – como é facto público e notório, constando das mais variadas bases de dados nacionais, mormente da base de dados de referência, PORDATA – o salário mínimo nacional BRUTO era no valor de 485,00 € (quatrocentos e oitenta e cinco euros), sendo que o salário mínimo nacional, descontados os 11% para a Segurança Social, ou seja, LÍQUIDO, não ultrapassava os 431,66 € ( quatrocentos e trinta e um euros e sessenta e seis cêntimos ).

  5. ) Assim, sempre sem conceder e no limite, deveria ter sido com base neste último valor – partindo do pressuposto de que o A. cumpriria com as suas obrigações para com a Segurança Social – que o Douto Tribunal a quo poderia ter efetuado os seus cálculos: 18 x 431,66 €, perfazendo assim a quanto global de 7.769,88 € (sete mil setecentos e sessenta e nove euros e oitenta e oito cêntimos) e não os 10.800 € em que condenou a aqui Recorrente.

  6. ) A este propósito coloca-se ainda a questão de saber, se, face aos elementos de que dispunha, podia/devia ou não o Tribunal a quo dar por assente – como o faz – a existência de um contrato de trabalho celebrado entre a testemunha J… – ou qualquer sociedade comercial detida pelo mesmo – e o aqui A., contabilizando em consequência, no cálculo que faz dos supostos danos patrimoniais sofridos pelo A., os subsídios de férias e de subsídio de Natal que este teria deixa de auferir.

    Ora 11ª ) Salvo o devido respeito por melhor opinião, mesmo admitindo, em tese, que o A. pudesse, efetivamente, ter prestado alguns serviços no estabelecimento de restauração explorado pela aludida testemunha (ou por sociedade comercial titulada por esta), não se vê como, da prova produzida em audiência de julgamento, pudesse o Tribunal a quo ter considerado provado – como fez -, que tais serviços o tivessem sido no âmbito de um contrato de trabalho, muito menos a tempo inteiro.

  7. ) Termos em que, face à manifesta insuficiência da prova produzida sobre esta matéria, nunca poderia o Tribunal a quo ter dado por provado quanto vem no ponto 19 da matéria de facto.

  8. ) Não se considerando provada tal factualidade, deve, em consequência, ser a R. absolvida do pedido no que toca à sua condenação pelos supostos danos patrimoniais causados ao A.

    II – DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO RELATIVA À MATÉRIA DE DIREITO

    1. DA INDEMNIZAÇÃO POR PERDA DA CHANCE 14ª ) Sobre esta matéria, se bem o percebemos, a Meritíssima Juiz do Tribunal de 1ª Instância conclui pela altíssima probabilidade de sucesso do recurso extemporaneamente interposto pela aqui R. atendendo aquilo que foi a decisão efetivamente proferida pelo Tribunal da Relação de Coimbra no âmbito do processo-crime em que o aqui A. era arguido, conjuntamente com outros três – os quais viram as suas penas suspensão na sequência dos respetivos recursos.

    Ora 15ª ) Salvo o devido respeito por opinião diversa, a questão da perda de chance não se pode apreciar tendo por base aquilo que sabemos de antemão veio efetivamente a acontecer num determinado caso concreto.

  9. ) Deve, sim, ser apreciada em abstrato, relativamente aquilo que era expectável que acontecesse, face às circunstâncias do caso, atendendo às boas práticas judiciais e aquilo que vêm/vinham sendo as decisões, em idênticas circunstâncias, das Instâncias Superiores, ou seja, à jurisprudência dominante – in casu, do...

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