Acórdão nº 149/14.2TAMAI.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL SOARES
Data da Resolução26 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 149/14.2TAMAI Comarca do Porto, Tribunal de Maia Instância Local, Secção Criminal, J3 Acórdão decidido em Conferência no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório 1.1 Decisão recorrida Por sentença proferida em 22 de Janeiro de 2016, a Sra. Juiz decidiu condenar o arguido B… na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de 7 euros, por um crime de furto, previsto no artigo 203º nº 1 do Código Penal (CP), que consistiu na subtracção de água da rede pública de abastecimento, para uso próprio na sua residência.

1.2 Recurso O Ministério não se conformou e interpôs recurso pedindo a revogação da sentença e a absolvição do arguido. Alegou, em resumo, o seguinte: - Na sentença não consta como facto provado que a água de que o arguido se apropriou pertencia ao município … – nem aliás isso estava imputado na acusação – mas a Sra. Juiz na motivação, ao subsumir os factos provados ao tipo de crime, considerou que a água foi comprada pelo município e portanto que lhe pertencia, o que integra o vício previsto no artigo 410º nº 2 al. a) do Código de Processo Civil (CPP); - Os factos provados não permitem a condenação por crime de furto porque a água de que o arguido se apropriou não é coisa móvel nem é alheia.

1.3 Resposta O arguido respondeu ao recurso dizendo, em suma, que deve improceder e que a sentença deve ser confirmada por estar bem elaborada, quer de facto quer de direito.

1.4 Parecer do Ministério Público na Relação Nesta Relação o Ministério Público limitou-se a apor o “visto” no processo.

  1. Questões a decidir no recurso Teremos de ver em primeiro lugar se a sentença padece do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada. Depois, se isso não tiver ficado prejudicado pela decisão da questão anterior, há que analisar se os factos integram ou não o crime de furto pelo qual o arguido foi condenado. E caso integrem, importará ver oficiosamente a questão da eventual omissão de pronúncia sobre a qualificação do crime no furto de coisa de valor diminuto e destinada à utilização imediata e indispensável à satisfação de uma necessidade do agente ou dos familiares.

    É indiferente a circunstância de o arguido ter respondido ao recurso pedindo que a sua condenação seja confirmada, porque o Ministério Público pode recorrer no seu interesse e não está na disponibilidade do arguido manter-se ou não uma condenação, caso esta se considere ilegal.

  2. Fundamentação 3.1. Matéria de facto provada na sentença (transcrição): Da audiência de julgamento resultaram provados os seguintes factos: a) Em 9 de Dezembro de 2013, os C… procederam ao levantamento do contador da água na residência do arguido, à data sita no nº.., 2° dtº, Rua …, …, Maia, através de fecho e selagem da torneira de corte.

    1. Porém, em data não concretamente apurada, entre 9 e 12 de Dezembro de 2013, o arguido B… fez uma ligação directa entre os tubos de fornecimento de água da refe pública de canalização da sua residência, facto que foi constatado pelo funcionário do C…, D… quando no dia 12 de Dezembro de 2013, se deslocou à residência do arguido.

    2. Desta forma B… logrou fazer sua quantidade não apurada de água, mas que rondará 1 m3, no valor de 2,67.

    3. O arguido agiu livre e conscientemente, com o propósito de fazer sua a água a que sabia não ter direito, não ignorando que desta forma estava a actuar contra a vontade da ofendida, a Câmara Municipal …, que a disponibilizava aos munícipes mediante pagamento.

    4. B… sabia a sua conduta proibida e punida por lei.

      Mais se provou que: f) Por sentença proferida em 19.04.2012, devidamente transitada em julgado, no âmbito do processo nº139/11.7GAPVZ do 1 ° Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Póvoa do Varzim, o arguido foi condenado pela prática, em 16.04.2011 e 21.04.2011, de um crime de furto qualificado p. e p. no art. 204°, nº1, aI. a) do Código Penal, de um crime de extorsão na forma tentada p. e p. no art. 223°, nº1, 22, e 23° do Código Penal e de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. no art. 3°, nº1 e 2 do DL nº2/98, de 3/01 na pena única de 255 dias de multa à taxa diária de €6,00, num total de €1530,00- g) Por sentença proferida em 15.05.2012, devidamente transitada em julgado, no âmbito do processo nº244/11.0GBMTS do 3° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Matosinhos, o arguido foi condenado pela prática, em 26.03.2011, de um de falsificação ou contrafacção de documento p. e p. no art. 256°, nº1, e 3, do Código Penal, na pena de 110 dias de multa à taxa diária de €5,00, num total de €550,00.

    5. Por sentença proferida em 25.09.2012, devidamente transitada em julgado, no âmbito do processo nº239/10.0GFPRT do 2° Juízo do Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto, o arguido foi condenado pela prática, em 11.12.2010, de um crime condução sem habilitação legal p. e p. no art. 3°, nº1 e 2 do DL nº2/98, de 3/01 na pena de 80 dias de multa à taxa diária de €5,00, num total de €400,00.

    6. Por sentença proferida em 24.04.2014, devidamente transitada em julgado, no âmbito do processo nº17/14.8PBVCD do 1° Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila do Conde, o arguido foi condenado pela prática, em 11.04.2014, de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. no art. 3°, nº1 e 2 do DL nº2/98, de 3/01 na pena de 200 dias de multa à taxa diária de €6,00, num total de €1.200,00.

    7. Por sentença proferida em 15.10.2014, devidamente transitada em julgado, no âmbito do processo nº239/10.0GFPRT referido h) procedeu-se ao cúmulo jurídico da pena ali aplicada e da pena aplicada no processo referido g) tendo-se aplicado ao arguido a pena única de 140 dias de multa á taxa diária de €5,00, num total de €700,00, sendo que tal pena já se encontra extinta pelo pagamento.

    8. Por sentença proferida em 15.07.2015, devidamente transitada em julgado, no âmbito do processo nº24/15.3PBVCD do J1 - Secção Criminal - Inst. Local - Vila do Conde da Comarca do Porto, o arguido foi condenado pela prática, em 14.07.2015 de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. no art. 3°, nº1 e 2 do DL nº2/98, de 3/01 e de um crime de desobediência p. e p. no art. 348°, nº1, aI. b) do Código Penal, na pena única de 270 dias de multa à taxa diária de €7,00, num total de €1890,OO.

      I) Por sentença proferida em 21.05.2015, devidamente transitada em julgado, no âmbito do processo nº475/11.2GAVCD do J1 - Secção Criminal - Inst. Local - Vila do Conde da Comarca do Porto, o arguido foi condenado pela prática, em 23.02.2011 de um crime de violação de correspondência ou de telecomunicações agravada p. e p. no art. 194°, nº1, e 197°, aI. a), de um crime de burla simples p. e p. no art. 217°, de um crime de falsificação de boletins, actas ou documentos p. e p. no art. 256°, nº1 e 3, e de um crime de subtracção de documento e notação técnica p. e p. no art. 259, nº1, todos do Código Penal, na pena única de 320 dias de multa à taxa diária de €5,50, num total de €1.760,00.

      3.2. Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada Este vício está previsto no artigo 410º nº 2 al. a) do CPP. Ocorre nas situações em que decorre da simples leitura da sentença, por si ou conjugada com as regras da experiência comum, que a matéria de facto provada na sentença não suporta a decisão de direito, quer quanto culpabilidade quer quanto à determinação da pena.

      Segundo o Ministério Público, a insuficiência consiste em a Sra. Juiz ter considerado na fundamentação da decisão que a água que o arguido consumiu depois de fazer a ligação directa da rede de abastecimento público à sua residência era pertença dos C…, quando nos factos provados não consta a quem pertencia.

      O que está provado sobre a titularidade de direitos sobre a água é que o seu fornecimento tinha sido interrompido pelos C…, com o levantamento do contador da residência do arguido, e que ele restabeleceu a ligação...

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