Acórdão nº 1348/15.5T8GDM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Outubro de 2016
Magistrado Responsável | MARIA CEC |
Data da Resolução | 11 de Outubro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo n.º 1348/15.5T8GDM.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto Gondomar, instância central, 2ª secção de família e menores, J3 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório O Ministério Público intentou o presente processo de promoção e proteção relativamente à menor LB…, nascida em 02-11-2005, filha de C… e D….
Foram juntos aos autos os relatórios sociais.
Na ausência de decisão negociada, foi declarada encerrada a instrução e cumpridas as notificações a que alude o artigo 114.°, n.° 1, da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, doravante designada por “LPCJP”[1].
Apresentadas alegações e prova, realizou-se o debate judicial em observância do formalismo legal e foi proferida decisão com o seguinte dispositivo: “Aplicar a B…, nascida a 2/11/2005, natural da freguesia …, Valongo, registada na Conservatória do Registo Civil de Valongo, sob o assento de nascimento n.° …. do ano de 2010, como filha de C… e D…, a medida de promoção e protecção de confiança a instituição com vista a futura adopção que dura até ser decretada a adopção, sem necessidade de revisão.
Tal medida será executada na Instituição "E…", Santa Casa da Misericórdia …, sito na …, …, …, onde a criança já se encontra.
Nos termos do artigo 62.°-A, n.° 5, da LPCJP, nomeia-se curador provisório da criança o (a) Director (a) da referida Instituição, que exercerá funções até ser decretada a adopção.
Não há lugar a visitas por parte da família biológica.” Recorreu a menor, representada pelo patrono nomeado, assim concluindo, em síntese, a sua alegação: 1. Por decisão de 6 de setembro de 2010 foi substituída a medida de acolhimento residencial pela medida de apoio junto da mãe e a menor passou a viver com a mãe em setembro desse ano.
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Em 2012 a mãe passou a viver com um companheiro de 19 anos de idade, estava grávida e a menor passou a conviver com essa realidade até 2013, quando foi acolhida na instituição em setembro de 2013, por suspeitas de abuso sexual pelo companheiro da mãe.
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A mãe não tem conseguido um ambiente familiar estável e seguro, mas mantém ligação afetiva com a filha e recusa qualquer medida que implique a sua perda 4. A menina continua a ter um projeto de vida junto de sua mãe e, por isso, o tribunal deveria ter designado conferência para obtenção de acordo quanto a medida de promoção e proteção adequada, impondo-se a anulação dos atos subsequentes ao encerramento da instrução e designação de conferência para o efeito.
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Apesar das dificuldades da progenitora, as complicações de uma adoção tardia da menina, a entrar na adolescência, podem ensombrar o seu desenvolvimento harmonioso.
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A adoção nesta idade obriga a adaptação a novo modelo familiar, novas regras de conduta e, até à adoção, gera sentimentos de perda e necessidade de fazer luto pelo corte com as ligações afetivas significativas.
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O tribunal não pode deixar de dar por provado que a menor pretende viver com a sua mãe e irmão F….
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A sentença deve ser revogada e permitir que a menor seja cuidada por sua mãe.
Em resposta o Ministério Público concluiu, em súmula: 1. Não se contesta que a mãe tenha afeto pela filha, mas o percurso da mãe e do pai tem revelado instabilidade e não dá seguridade a um equilibrado desenvolvimento da menor.
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No primeiro processo de promoção e proteção nem um nem outro reuniu, de forma consistente e duradoura, condições pessoais, económicas e habitacionais para o crescimento da menor.
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E quando, numa segunda etapa, a mãe parecia reunir condições para acompanhar a menina e ela foi entregue aos seus cuidados, foi a mesma sujeita a abusos sexuais por parte do companheiro daquela.
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A mãe da criança, no entanto, solidarizou-se com o companheiro e acusou a filha de ter mentido, postura que manteve mesmo depois da sua condenação e que só mudou quando percebeu que a menina seria encaminhada para a adoção.
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Nem o pai, que está preso, nem os membros da família alargada querem ou têm condições para assumir a sua guarda.
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Não obstante a menor estar bem integrada no E… e evidenciar um desenvolvimento ajustado à sua faixa etária, necessita de uma família idónea que lhe assegure um desenvolvimento adequado.
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Reconhecendo as dificuldades no surgimento de candidatos à adoção de crianças da faixa etária da menina, isso não constitui fator impeditivo de que seja tentada essa solução. Pelo que deverá ser confirmado o acórdão recorrido.
O pai da menor, C…, manifestou a sua adesão ao recurso da menor.
O recurso foi admitido como apelação, com subida nos próprios autos e efeito suspensivo.
II.
A instância é válida e regular, nada havendo que obste ao conhecimento do mérito do recurso.
Sendo o objeto do recurso delimitado pelo recorrente nas conclusões da sua alegação (artigo 635º do Código de Processo Civil), impõe-se a apreciação do acerto da medida de promoção e proteção aplicada à menor B…, em concreto a medida de confiança judicial a instituição com vista à adoção.
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Fundamentação 1. Decisão de facto Na sua alegação, a recorrente defende que os factos provados devem exarar que a menor pretende residir com a mãe e o irmão F…, por tal resultar dos elementos juntos aos autos. A propósito do seu projeto de vida, está dado por demonstrado que “(…) a B…, após ter expressado a vontade de integrar um contexto familiar alternativo, refere-se às expectativas relativamente a este afirmando que gostaria de ser adotada “desde que não voltasse outra vez para o centro”. Asserção que, à falta de outra menção diretamente relacionada com a colocação junto da mãe, faz intuir que a menina não perspetiva o seu futuro junto da mãe.
Apreciando a prova produzida a respeito dessa matéria, colhem-se os seguintes dados: 1. O relatório social elaborado em 15-07-2015, que relevantemente suportou a decisão de facto, extrata que “Junto da menor foi possível apurar que a mesma gosta de residir na instituição, pareceu-nos bem integrada, junto de pares e adultos. A B… gostava de viver com a mãe e com o irmão, mas não quer ir viver com eles enquanto o G… estiver naquela casa. (…) Gostava de ter uma família nova, o problema era não poder ver o irmão” (…) “Ficou muito triste com a mãe e com a tia, porque não acreditaram nela e mentiram em tribunal, dizendo que a B… era mentirosa”. (fls. 223 a 239).
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Em 27-10-2015, o relatório elaborado pela pedopsiquiatra que acompanha a menor enuncia que, na consulta de janeiro de 2015, a B… apresentava uma sintomatologia depressiva e inibição, que parecia reativa à sua situação familiar. Quando o companheiro da mãe foi condenado pelo abuso sexual contra si perpetrado, confrontada com a hipótese de a mãe o não deixar, perspetivou a integração numa nova família e de poder sair da instituição. Com o passar dos meses passou a desculpabilizar a mãe pelas ausências, a negar as possibilidades de um novo começo, alegando que a mãe gosta dela e não a deixará ser adotada. Conclui que a criança tem ainda condições de investir em novos pais (fls. 264).
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Em 22-01-2016, a informação clínica da pedopsiquiatra, refere o grande descontrolo emocional e comportamental em que se encontrava a B…, muito provavelmente em consequência da indefinição em que se encontrava. Após condenação do companheiro da mãe e a postura desta, conseguiu perspetivar que tinha direito a uma nova família.Com o passar do tempo e vendo cada vez mais longínqua essa possibilidade, perante a instabilidade dos contactos com a mãe, a B… desistiu e mostra um comportamento desorganizado (fls. 290).
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Em 08-04-2016, o relatório de perícia médico-legal atesta que a B… parece evidenciar sinais de instabilidade afetiva e emocional, nomeadamente sinais de angústia e ansiedade, tristeza persistente, baixa autoestima, elevada carência afetiva, traduzida na expressão de querer integrar um núcleo familiar alternativo aos progenitores. Embora tenha manifestado afetos positivos em relação à mãe, também lhe associou sentimentos de rejeição e abandono quando ela lhe revelou ter sido abusada sexualmente por parte do seu companheiro e ela não se ter separado dele. A B… necessita de um contexto familiar alternativo ao dos progenitores e ao institucional (fls. 329 a 332).
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No debate judicial, em 28-06-2016, as declarações então prestadas pela menor (auditadas por este Tribunal da Relação), conduzidas pela Senhora Juíza de forma exímia, transmitiram os seguintes dados com relevo para a apreciação dos sentimentos da menina: - a propósito de quem a visita no E… e do decurso das visitas, disse (é visitada por) “a minha mãe e a minha avó (paterna).
Às vezes elas trazem-me coisas Nós tínhamos um jogo para jogar, mas agora já não temos. Falamos a escola e o Centro, o que é que eu faço”.
(a mãe) “Às vezes vai com o meu irmão”.
- instada se, no fim da visita da mãe, gostaria de ir com ela, respondeu Não sei.
- perguntada sobre o que pretenderia para a sua vida, referiu “Eu queria estar com a minha mãe por causa do meu irmão e também queria ter uns pais novos para me sentir mais feliz”.
- e se, antes do nascimento do mano, se sentia bem com a mãe, disse “Sentia”.
- se fosse com a mãe com quem queria viver, expressou “A minha mãe (...) Tinha de viver com o G…, o meu padrasto.
- perguntada se não gosta do padrasto disse: “À primeira sim. Agora não”.
- à pergunta “não gostaste de viver com quem?”, respondeu “Com o G…”.
- instada de como se sentiria mais feliz, responde “Era ir para uns pais novos”.
- e à pergunta direta “era disso que tu gostavas?”, afirmou “Sim”.
- mas quando perguntada “Porque gostavas de ter uma família nova?” disse “Porque já não estava com o G…” (...) “Mas a minha mãe diz que quer viver com ele”.
- instada sobre o que esperas da nova família referiu “Acho que vai ser mais fixe. E vou ter amigos novos”.
- perguntada quando fica triste, disse Às vezes, quando não quero fazer as tarefas e às vezes quando (impercetível)..
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- e quando ficas mais feliz, afirmou “Quando vou para Amarante” (uma quinta) - a respeito dos seus sonhos, depois de longo silêncio, disse “Ir viver para a quinta”.
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