Acórdão nº 225/10.0TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelANA PAULA AMORIM
Data da Resolução10 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Resp-Advog225-10.0TVPRT-I Comarca do Porto Instância Central-1ªSç Cv-J1 Proc. 225-10.0TVPRT Proc.83/16-TRP Recorrente: B… Recorrido: C… e Outros*Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim Juízes Desembargadores Adjuntos: Manuel Fernandes Miguel Baldaia de Morais* *Acordam neste Tribunal da Relação do Porto[1] (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível) I. Relatório Na presente ação que iniciou os seus termos como ação ordinária, em que figuram como: - AUTOR: B…, residente na Rua …, nº .., Porto - RÉUS: “C… – Sociedade de Advogados, R.L.”, com sede na Rua …, .., ….-… Porto e o D…., com domicílio profissional na Rua …, .., ….-… Porto e o E… com domicílio profissional na Rua …, .., ….-… Porto formulou o Autor o pedido de condenação dos Réus no pagamento da quantia total de € 277.438,00, acrescida de juros vincendos a contar da citação, até efetivo e integral pagamento.

Alegou o Autor, para tanto e em síntese, que após ter sido alvo de uma busca domiciliária, ter havido apreensão de diversas armas que possuía e que se encontravam na sua habitação, ter sido constituído arguido e detido no âmbito de um processo crime, contratou a ré Sociedade de Advogados, na pessoas dos réus D… e E…, para assumir a sua defesa no âmbito do mencionado processo crime, tendo sido outorgada a respetiva procuração.

Mais alegou que os Réus não executaram de forma criteriosa e zelosa o mandato forense que lhes fora conferido, violando e não defendendo os interesses legítimos do Autor/mandante, designadamente não formulando, no prazo estabelecido na lei, o requerimento de apresentação a exame e manifesto das armas apreendidas no domicílio do Autor, sendo certo que, se o tivesse feito, lograriam alcançar, sem mais, como questão prévia a qualquer outra a apreciar, a extinção daquele procedimento criminal.

Em consequência da atuação dos Réus, violadora das disposições legais e prejudicial aos interesses do Autor, este sofreu diversos danos patrimoniais e não patrimoniais, cujo valor global corresponde à quantia peticionada nos presentes autos.

*Citados os Réus apresentaram contestação, defendendo-se por exceção e por impugnação.

Em sede de exceção, invocaram a ilegitimidade dos réus D… e E…, questão que já foi decidida (no sentido da improcedência) no despacho saneador proferido nos autos.

Em sede de impugnação, refutaram alguns dos factos relativos à constituição e desenvolvimento da relação de mandato, contraditaram os factos alegados pelo Autor relativos ao seu desempenho profissional, contrapondo que prepararam e conduziram a defesa do Autor de acordo com as preocupações essenciais e prioritárias que lhes foram comunicadas por este (evitar a aplicação de uma pena de prisão efetiva e obter a recuperação da totalidade ou do maior número possível das armas apreendidas), não tendo os Réus ignorado ou descurado a hipótese de aplicação da norma do art. 115º, nº 1, da Lei das Armas, ao caso do Autor, antes tendo sido discutido com este tal questão, procurando explicar as razões que poderiam excluir a aplicação daquele regime transitório ao caso do Autor e as razões que poderiam desaconselhar a dedução de um requerimento de apresentação a exame e manifesto das armas apreendidas no domicílio do Autor, tendo o Autor, entre a alternativa de ficar sem parte das armas ou ser submetido a julgamento, continuado a favorecer a recuperação das armas. Alegaram ainda que o Autor, depois da improcedência, no acórdão proferido pelo Tribunal de 1ª Instância, do requerimento de apresentação a exame e manifesto das armas apreendidas (que os Réus haviam apresentado em audiência de julgamento), optou por não interpor recurso desse segmento decisório.

Quanto aos danos, os Réus refutaram a existência e/ou relevância da maioria dos danos invocados pelo Autor, defendendo ainda não existir qualquer obrigação, da sua parte, de indemnizar os danos, na medida em que nenhum incumprimento do contrato de mandato lhes pode ser imputado.

*O Autor apresentou réplica, na qual pugnou pelo indeferimento da exceção de ilegitimidade e de outras exceções inominadas, invocadas pelos Réus na contestação, mantendo o já alegado na petição inicial.

*Proferiu-se despacho saneador, onde foi julgada improcedente a exceção dilatória da ilegitimidade dos réus D… e E… e onde se procedeu à seleção da matéria de facto considerada assente e à elaboração da base instrutória (objeto de reclamação e com decisão de indeferimento).

*Realizou-se o julgamento com observância das formalidades legais.

O despacho que contém as respostas à matéria de facto consta de fls. 2252 a 2263.

*Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve: “Em face de todo o exposto, julga-se a presente ação improcedente, com consequente absolvição dos réus “C… – Sociedade de Advogados, R.L.”, D… e E… do pedido.

Custas a cargo do Autor (art. 527º, nºs 1 e 2, do CPC-2013).

Notifique e registe.

*Determina-se a devolução do Processo Crime cuja requisição foi ordenada pelo despacho de fl. 1314 dos autos”.

*O Autor veio interpor recurso do despacho proferido em 15 de maio de 2012 e da sentença.

*Nas alegações que apresentou o apelante formulou as seguintes conclusões: Da decisão proferida em ata, datada de 15/05/2012: I.Pelo despacho recorrido, entendeu o Tribunal a quo não ter dúvidas que o A. confessou o teor do facto levado à base instrutória no artigo 27.

  1. Com tal decisão, o Tribunal julga como provada que a prioridade do A. na definição da sua estratégia de defesa em processo-crime em que foi arguido era, em primeiro lugar, evitar a aplicação de uma pena de prisão efetiva, e em segundo lugar, obter a recuperação da totalidade ou do maior número possível das armas apreendidas.

  2. Não pode admitir-se como provada uma tal factualidade, por não corresponder ao teor do depoimento prestado (único meio de prova relevante para o efeito). Devendo assim ser dado como não provado o teor do quesito n.º 27.

  3. Em vários momentos do depoimento prestado o A. contraria a factualidade que se pretende dar como assente, o que não se admite.

  4. Em face do teor do depoimento do A., deve anular-se o despacho recorrido, substituindo-se por outro que julgue não confessado o teor do quesito 27, admitindo a produção de prova sobre a factualidade que ali consta, com as devidas e legais consequências.

    Do recurso da decisão final: I.O mandato iniciou-se antes do período de vigência do artigo 115.º da Lei 5/2006.

  5. O referido preceito, tinha um prazo definido – 21/08/2006 a 19/12/2006 – para apresentação do requerimento previsto no artigo 115.º da Lei 5/2006.

  6. No período de vigência, os RR. não apresentaram esse requerimento.

  7. Apenas o fizeram posteriormente, sendo o mesmo rejeitado por extemporaneidade.

  8. O A. não concordou com a estratégia dos RR.

  9. Nem se pode considerar que houve uma estratégia, que definia a não aplicação do artigo 115.º da Lei 5/2006, porque esse requerimento foi apresentado pelos RR.

  10. A decisão entra em contradição quando considera que existe uma estratégia que excluía o requerimento do artigo 115.º da Lei 5/2006, ao mesmo tempo que dá por provado que o mesmo foi apresentado.

  11. O que importa nulidade da decisão.

  12. A apresentação do requerimento do artigo 115.º da Lei 5/2006, é um facto inabalável, confessado, registado em ata e em decisão judicial que nunca foi questionado ou revisto.

  13. Assim, se o Tribunal desse como provado que havia uma estratégia, tinha que dar como provado que os RR. não cumpriram essa estratégia, o que não sucedeu.

  14. Os factos provados sob os n.º 56, 57, 58, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67 e 69 estão incorretamente julgados porque contrariam o facto provado n.º 13, devendo por isso ser dados como não provados.

  15. A decisão é nula na parte em que considera que existia uma estratégia definida e que esse estratégia passava pela não apresentação do requerimento previsto no artigo 115.º da Lei 5/2006 e ainda que essa estratégia merecia o acordo do A..

  16. Até porque a sentença dá como provado que o A., por várias vezes, solicitou a aplicação do referido regime do artigo 115.º da Lei 5/2006.

  17. O objeto da presente ação assenta na eventual responsabilidade dos RR., no exercício do mandato.

  18. Sem abordar a questão essencial, o Tribunal entendeu que o A. aceitou e concordou com a estratégia dos RR..

  19. Entendimento que levou a que o Tribunal considerasse prejudicado o pedido de indemnização e a apreciação do incumprimento do mandato.

  20. Não há prova (nem foi feita) que evidencie a existência de qualquer acordo.

  21. E para além disso a realidade é que ainda que existisse qualquer acordo, tal não seria idóneo para não se apreciar a responsabilidade dos RR. decorrente do incumprimento do mandato.

  22. Como resulta da própria sentença, o exercício do mandato é um ato de independência técnica.

  23. O A. não concordou nem aceitou qualquer estratégia, precisamente porque essa definição é da livre e exclusiva responsabilidade dos RR..

  24. E seja como for a questão da autoria/responsabilidade da estratégia é diferente de saber se um determinado requerimento – que revestia uma importância essencial para o A. – foi ou não apresentado tempestivamente.

  25. E a realidade é que, pese embora as solicitações do A. e as comunicações de outros Advogados (incumbidos da defesa da testemunha Dr. F…), os RR. apresentaram o requerimento que foi rejeitado por extemporaneidade.

  26. Os factos provados n.º 56 e 66 estão incorretamente julgados.

  27. A motivação do Tribunal assenta nos depoimentos das testemunhas G…, H… e I….

  28. Contudo, todos estes depoimentos revelam que as testemunhas nunca falaram com o A. e nunca presenciaram qualquer reunião com ele.

  29. Para além disso, não afirmaram existir qualquer acordo.

  30. Uma nota para o depoimento essencial – no entendimento da decisão em crise – que é o da Dra. G…: assumiu nada perceber de armas, nem ter interesse nisso.

  31. E no entanto, segundo os RR. este foi o argumento principal para a definição da estratégia de defesa do A., o que bem evidencia a diligência dos RR. em torno do mandato.

  32. Mas a prova produzida...

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