Acórdão nº 343/09.8TBILH-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelRUI MOREIRA
Data da Resolução25 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

PROC. 343/09.8TBILH-B.P1 Comarca de Aveiro - Aveiro Inst. Central - 1ª Sec. Comércio - J2 REL. N.º 364 Relator: Rui Moreira Adjuntos: Fernando Samões Vieira e Cunha* ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: 1. - RELATÓRIO A requerimento da própria, foi declarada a insolvência de B…, LDA., por decisão proferida a 12/3/2009, que transitou em julgado a 27/4/2009.

O Sr. administrador de insolvência juntou a relação de créditos reconhecidos, que posteriormente corrigiu, constando a lista definitiva e rectificada a fls. 123ss deste apenso.

C… deduziu impugnação à referida lista, afirmando a incorrecção da natureza e do valor do crédito que lhe foi reconhecido.

Para o efeito, afirmou que celebrou com a insolvente um contrato promessa de permuta, prometendo a transmissão de um lote de terreno para aquela, que por sua vez lhe prometeu a entrega de uma moradia, constituída pela fracção autónoma “A” de um prédio a edificar no dito terreno e a constituir em regime de propriedade horizontal Mais, declarou que a insolvente abandonou a empreitada, nos finais de 2007 e ainda constituiu depois hipoteca sobre o imóvel, assim inviabilizando o cumprimento da sua parte no contrato-promessa, apesar de ter recebido o lote de terreno e de a ter notificado exigindo a conclusão dos trabalhos e a emissão da licença de habitabilidade. A tal notificação seguiu-se a instauração de uma execução para prestação de facto, com o valor atribuído de € 108.920,00.

Invocou, finalmente, que possui as chaves do imóvel desde pelo menos 2007, entregues pela insolvente, tendo ali fixado a sua residência, ainda que precariamente, e liquidado os correspondentes impostos. Em consequência, requereu que o seu crédito seja considerado como garantido, por beneficiar de direito de retenção, e pelo montante de € 108.920,00 (que depois esclareceu corresponder a € 100.000,00), atribuído à fracção, acrescido de juros de mora.

O D… SA respondeu à mencionada reclamação, impugnando a factualidade alegada pelo referido credor e rejeitando que ele disponha do invocado direito de retenção, por nunca ter tido a posse sobre a moradia referida no contrato-promessa, já que essa posse foi mantida pela insolvente e, em qualquer caso, teria na data da apreensão levada a efeito pelo Sr. administrador da insolvência.

Também a insolvente apresentou resposta à impugnação, contrariando parte da matéria factual invocada naquela e defendendo que: a) não existe mora, nem direito a juros, por se tratar de uma obrigação sem prazo certo e já cumprida, b) alguns dos trabalhos necessários para a obtenção da licença de habitabilidade e não realizados eram da responsabilidade do impugnante, c) apenas entregou as chaves ao impugnante para efeitos de realização desses trabalhos, e não para outros efeitos, não tendo existido tradição do imóvel, tendo a insolvente mantido as demais chaves do imóvel e, no interior deste, matérias-primas que a si pertenciam, ali se deslocando livremente; e d) a intenção do impugnante foi sempre a de alienar o imóvel, a fim de receber o seu preço. Concluiu pela improcedência da impugnação.

Foram tramitados e decididos os incidentes de habilitação do respondente, cuja posição passou a ser ocupada por BANCO E… SA e F… SA Foi realizada a audiência de julgamento, no termo da qual foi proferida sentença que concluiu pela procedência parcial da impugnação deduzida por C… e qualificou o seu crédito como garantido, por direito de retenção, em relação ao imóvel da verba nº14 do auto de apreensão, identificado como fracção A, com o valor de € 100.000,00, acrescido de juros de mora, vencidos desde o início de Maio de 2008 até ao final do prazo para a reclamação de créditos. Mais o graduou, quanto a esse imóvel, em conformidade com tal decisão.

É contra esta decisão que BANCO E… SA e F… SA vem deduzir o presente recurso, pretendendo a revogação da decisão no que respeita ao reconhecimento do direito de retenção do referido credor.

Terminam esse recurso, que desenvolvem num articulado com 86 itens, com um elenco de 83 itens que apelidam de conclusões, nos termos que se passam a transcrever: 1. Entendem os Apelantes, salvo o devido respeito, que a sentença recorrida, na parte em que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida por C… e reconheceu o crédito deste como garantido, por direito de retenção, em relação ao imóvel da verba n.º 14 do auto de apreensão, não fez correta aplicação da prova produzida e do direito.

  1. DOS FACTOS Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto 2. Analisada a matéria de facto dada como provada na douta sentença por contraposição com a prova produzida nos autos, designadamente dos depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento, verifica-se que ocorreu erro de julgamento notório e grave, que conduz à alteração da matéria de facto e impõe uma decisão diversa da proferida, nos termos do artigo 640.º do Código de Processo Civil (doravante CPC).

    1. A douta sentença em crise dá como provado que “13) Em princípios de 2008, a insolvente abandonou a execução da construção da fracção designada pela letra A do referido empreendimento, que não concluiu (BI/1-5).” 4. Na motivação, fundamenta o tribunal a quo que “o legal representante da insolvente, embora com alguma flutuação no seu depoimento, acabou por reconhecer o abandono da obra, que atribuiu a falta de capacidade financeira”.

    2. Do depoimento prestado pelo legal representante da insolvente, o Sr. G…, verifica-se que o mesmo admitiu a possibilidade de o atraso na conclusão das obras que lhe cabia efetuar na fração A se dever a falta de capacidade financeira, mas esta hipótese foi-lhe sugerida e, conforme referido pelo próprio, o seu depoimento encontra-se prejudicado pelo facto de terem decorrido vários anos desde o acontecimento dos factos.

    3. O legal representante da insolvente disse, de forma taxativa e espontânea, que os trabalhos de acabamento, não estavam terminados, estando dependentes do Sr. C… terminar a parte dele.

    4. A Insolvente não abandonou a execução da construção em “princípios de 2008”, limitou-se antes a aguardar que o Impugnante concluísse os trabalhos de carpintaria e outros a que se obrigou por via do contrato promessa celebrado entre as partes em 04 de Fevereiro de 2005 (facto provado n.º 5) e sem os quais a primeira não poderia concluir a sua parte e providenciar pela emissão da respetiva licença de habitabilidade.

    5. No contrato promessa celebrado entre as partes em 04 de Fevereiro de 2005, as mesmas acordaram que a transmissão da fração A (bem futuro) para a propriedade do Impugnante ocorreria após a emissão da respetiva licença de habitabilidade, o que se previa que ocorresse até 05 de Fevereiro de 2008, mas não tinha prazo fixado.

    6. A emissão da mencionada licença de habitabilidade estava dependente da conclusão da construção, sendo que existiam trabalhos que eram da responsabilidade da Insolvente e outros da responsabilidade do Impugnante.

    7. Por um lado foi dado como provado que o Impugnante requereu, a 10 de Março de 2008, a notificação avulsa da insolvente para que procedesse, em quinze dias, ao acabamento da obra e à entrega da documentação necessária no sentido de realizar a escritura definitiva de dação em pagamento (facto provado 10).

    8. Também foi dado como provado (facto provado 12) que, a insolvente, em resposta, requereu a 30 de Abril de 2008, a notificação avulsa do Impugnante para que, além do mais, concluísse a aplicação das madeiras e colocação dos armários e electrodomésticos na cozinha.

    9. Não se verificou o abandono da construção por parte da Insolvente, mas tão só o desacordo entre as partes sobre as fases da construção e conclusão da fração em causa, sendo que a questão ficou por resolver em face da declaração de insolvência.

    10. Face aos elementos de prova produzidos, deve o quesito 1 da base instrutória ser julgado como não provado e apenas ser dado como provado o quesito 5 da base instrutória (a insolvente não concluiu a construção da fração).

      ACRESCE QUE, 14. O facto dado como provado em 16) e referente ao quesito 6 da base instrutória - “A insolvente não entregou ao impugnante os documentos que este solicitou” - carece de resposta explicativa na motivação.

    11. Embora seja referido na respetiva motivação que o legal representante da Insolvente reconheceu a ausência de pedido de licenciamento da fração designada pela letra A e que a Insolvente não correspondeu à solicitação da conclusão das obras e de documentação para a obtenção da licença de habitabilidade (o que resultou também da notificação judicial avulsa com cópia inclusa a fls. 46ss), a verdade é que a douta sentença ignora o facto dado como provado em 12), ou seja, que à mencionada notificação judicial avulsa requerida pelo Impugnante, respondeu a Insolvente de imediato, com a notificação avulsa requerida em 30 de Abril de 2008, para que o Impugnante, além do mais, concluísse a aplicação das madeiras e colocação dos armários e eletrodomésticos na cozinha.

    12. O reconhecimento que consta da resposta dada em 12), assim como a Insolvente requereu, em 30 de Abril de 2008, a notificação avulsa do impugnante para que, além do mais, concluísse a aplicação das madeiras e colocação dos armários e eletrodomésticos na cozinha, vem contrariar essa conclusão.

    13. Na mencionada notificação avulsa requerida pela Insolvente (a fls. 105ss) é referido, no seu art. 5.º, que “Invocando o sobredito contrato promessa e a (falsa) circunstância da ora requerente ter injustificadamente abandonada a obra, o aqui requerido promoveu a sua notificação judicial para que proceda ao acabamento da obra e à entrega, no prazo de 15 dias da documentação necessária, no sentido de obviar à outorga da escritura”.

    14. Mais é referido na mencionada notificação judicial, designadamente nos seus artigos 12.º e seguintes, que “para que a edilidade emita a licença de ocupação ou de habitabilidade é necessário que a construção esteja terminada”, o que não se verifica por exclusiva responsabilidade do Impugnante...

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