Acórdão nº 8535/14.1T8PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelANA PAULA AMORIM
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Desp-renda8535-14.1T8PRT.P1 Comarca do Porto Proc. 8535-14.1T8PRT.P1 Proc. 1282/15-TRP Recorrente: B… Recorrido: Herança Indivisa por óbito de C… - Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim Juízes Desembargadores Adjuntos: Manuel Fernandes Rita Romeira* * * * *Acordam neste Tribunal da Relação do Porto[1] (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível) I. Relatório Na presente acção de despejo, que segue a forma de processo comum em que figuram como: - AUTORA: Herança Indivisa Por Óbito de C…, representada pela cabeça de casal, D…; e - RÉU: B…, residente na Avenida…, Matosinhos pede a Autora: - que seja decretada a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre autora e réu; - a condenação do réu a entregar o imóvel arrendado à autora; e - a condenação do réu a pagar à autora a quantia relativa ao valor em dívida das rendas vencidas no montante de 1.999,25 euros, bem como as que se vencerem na pendência da ação, desde 01/03/2013, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, tudo até efetivo e integral pagamento.

Alegou, em síntese, que em 23 de abril de 1985 celebrou com o réu um contrato de arrendamento referente ao rés do chão do prédio sito na Avenida…, Matosinhos, destinando-se o imóvel em causa à atividade de comércio de carnes (talho).

Em setembro de 2013, a autora iniciou o processo tendente à atualização da renda que o réu pagava que, fruto das atualizações era de 318,25 euros mensais, pretendendo que passasse a ser de 6.000,00 euros anuais, pagável em duodécimos de 500,00 euros mensais.

Mais refere que para esse efeito remeteu ao réu uma comunicação propondo-lhe a alteração da renda, aplicando os critérios legais, para o valor então de € 500,00 mensais, comunicando ainda a alteração da duração do contrato para dois anos. O réu respondeu, suscitando dificuldades financeiras e solicitando o adiamento da actualização da renda por um ano, mas não se opôs ao valor proposto, o que vale como aceitação.

Mais alega que a nova renda seria devida desde 1 de dezembro de 2013 e que o réu continuou a pagar apenas € 318,25, pelo que se encontra em mora superior a dois meses, o que confere à autora o direito de resolução do contrato e consequente despejo do réu do locado.

- Citado o réu contestou defendendo-se por exceção.

Alega para o efeito que o procedimento de atualização do valor da renda é omisso a respeito do valor do locado, sendo por isso nulo o procedimento de atualização de rendas. Na carta a que alude o artigo 7º da P.I. é indicado o valor do locado de €112.070,00, conforme caderneta predial que também foi remetida pela A. ao R, mas tal imóvel é descrito na citada caderneta predial como um prédio em propriedade plena sem andares nem divisões suscetíveis de utilização independente, composto no entanto de três pavimentos, com entrada pelo número … da Av…, em Matosinhos.

Refere, ainda, que tal prédio é de facto de composto por R/C com entrada pelo número … da Av…, Matosinhos, destinado ao comércio, onde se encontra instalado o estabelecimento do R., e por 1º e 2º andares destinados à habitação, com entrada, estes sim, pelo número … da citada avenida e por isso, o imóvel em causa deverá ser classificado como prédio com andares e divisões susceptíveis de utilização independente e, por via disso, ser avaliado em conformidade com o que se encontra previsto na alínea b) do nº2 do artigo 7º do CIMI.

- Na resposta à matéria da exceção, a Autora manteve a posição inicial.

- Em sede de saneador, proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve: “Atento tudo o exposto e nos termos das disposições legais supra citadas, julgo a ação procedente, por provada, e em consequência: a) declaro resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre a autora e o réu, relativo ao prédio sito na Avenida…, Matosinhos.

  1. condeno o réu a entregar à autora o imóvel referido em a), livre de pessoas e bens.

  2. condeno o réu a pagar à autora a quantia relativa ao valor em dívida das rendas vencidas desde 01/12/2013 até 01/10/2014, no valor de €1.999,25 (mil novecentos e noventa e nove euros e vinte e cinco cêntimos), e as que se vencerem até efetiva entrega do imóvel, acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.

    Custas: Custas pelos réus, nos termos do art. 527º nº 1 do Código de Processo Civil”.

    - O réu veio interpor recurso da sentença.

    - Nas alegações que apresentou o apelante formulou as seguintes conclusões:

    1. O Tribunal “a quo” julgou incorretamente pontos de facto, motivo pelo qual deve alterar-se a decisão recorrida nos termos do artigo 640º nº1 e alínea a) do C.P.C.

    2. O Tribunal “a quo” dá como provado que a autora cumpriu os requisitos plasmados no artigo 30º do NRAU, na redação da Lei nº31/2012 de 14 de agosto.

    3. Isto porque, confunde valor do imóvel com valor do locado.

    4. O que manifestamente não corresponde à verdade.

    5. O valor do locado será apenas de uma fracção do valor do imóvel já que a parte arrendada representa apenas um de três pisos.

    6. O valor do locado será cerca de 1/3 do valor do imóvel.

    7. Tal valor não consta da carta datada de 24 de setembro de 2013 que a autora envia ao réu.

    8. Não consta, nem poderia constar já que tal valor não está determinado.

    9. Esta avaliação é efetuada pela Autoridade Tributária de acordo com as regras do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, a requerimento do proprietário.

    10. A avaliação apenas da parte locada é requisito prévio ao processo de atualização de renda.

    11. Sendo certo, que o imóvel tem dois números de polícia, a saber, … e … sendo o rés do chão com entrada pelo nº… destinada ao comércio e a entrada pelo número … destinada à habitação, ou não fosse esta última a residência da Autora à data da celebração do contrato de arrendamento – Fls. 42 a 46.

    12. Com esta configuração construtiva, e não estando o imóvel constituído em propriedade horizontal, é forçoso concluir que se trata de imóvel com andares e divisões suscetíveis de utilização independente e, por via disso, ser avaliado em conformidade com o previsto na alínea b) do nº2 do artigo 7º do CIMI, que dispõe: “2-O valor patrimonial dos prédios urbanos (…) determina-se: b) Caso as diferentes partes sejam economicamente independentes, cada parte é avaliada por aplicação das correspondentes regras, sendo o valor do prédio a soma das suas partes” M) A obrigatoriedade da comunicação do valor do locado reveste particular importância já que condiciona, ou pode condicionar o valor da nova renda.

    13. Renda essa que nas circunstâncias previstas nos artigos 51º e seguintes do NRAU, na redação da Lei nº31/2012 de 14 de agosto não pode ultrapassar 1/15 do valor do locado.

    14. Tendo em conta que o réu explora sozinho o talho instalado no locado e que o seu volume de negócios liquido é muito inferior a €500.000,00 é seguro afirmar que a avaliação da parte locada não atinge valor suscetível de desencadear aumento de renda nos termos dos artigos 51º e 54º do NRAU, na redacção da Lei nº31/2012 de 14 de agosto.

    15. A falta de determinação deste pressuposto (valor do locado) inquina por completo o processo de atualização de renda.

    16. De tal modo que o torna nulo e de nenhum efeito.

    17. Como resultou provado o réu tem vindo a liquidar atempadamente as rendas que sucessivamente se mostram vencidas pelo valor contabilizado antes da nula atualização.

    18. Logo, nada é devido pelo réu à autora.

    19. E consequentemente, inexiste fundamento para a resolução do contrato de arrendamento.

    20. Assim sendo, forçoso será de concluir que, ao contrário do sentenciado pelo Tribunal “a quo”, o processo de atualização do valor da renda desencadeado pelo autor é nulo e de nenhum efeito.

    21. Pelo que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, julgando-se assim totalmente improcedente a ação.

    - A Autora veio apresentar resposta ás alegações formulando as seguintes conclusões: 01.O Recorrente não identifica concretos pontos de facto que o Recorrente considera incorrectamente julgados limitando-se a alegar, na conclusão A) das suas alegações, de forma vaga e indefinida que: “O Tribunal “a quo” julgou incorretamente pontos de facto”.

    1. As alegações apresentadas a juízo pelo Recorrente não fazem a indispensável referência aos pontos concretos de facto erradamente julgados pelo Tribunal a quo, nem especifica os concretos meios de prova que impunham que cada um desses pontos fosse julgado provado ou não provado, violando de forma clara o disposto no artigo 640.º do CPC.

    2. A lei processual civil não prevê o prévio aperfeiçoamento das conclusões de recurso, quando o apelante não respeita o ónus prescrito para a delimitação e fundamentação do objeto do recurso de facto, estatuído pelo artigo 640.º do CPC.

    3. Nestes termos, em obediência ao preceituado no artigo 640.º, nº 2, al. a) do CPC, impõe-se rejeição do presente recurso, no que à matéria de facto respeita, conforme, no mesmo sentido, Ac. do STJ de 09.02.2012 in www.dgsi.pt, ainda no âmbito do código de processo civil de 1961 e Acs. da Relação de Lisboa de 03-09-2013 e da Relação de Coimbra de 15-01-2013, igualmente in www.dgsi.pt, permanecendo inalterada a decisão da matéria de facto.

    4. Sem prescindir, a Sentença a quo não merece qualquer censura, devendo ser mantida qua tale.

    5. Compulsadas as alegações do recorrente, bem se percebe que este estriba os seus argumentos (frise-se, sem indicar os concretos pontos de facto erradamente julgados pelo tribunal a quo) na tese de que “o processo de atualização do valor da renda desencadeado pelo autor é nulo e de nenhum efeito”.

    6. Sucede que, é inegável, em face de todos os elementos juntos aos autos, que andou bem a Sentença ora em crise ao declarar resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre o Recorrente e a Recorrida, relativo ao prédio sito na Avenida…, Matosinhos, ao condenar o Recorrente a entregar à Recorrida o imóvel objeto em crise, bem como, ao condenar o Recorrente no pagamento à Recorrida das rendas vencidas desde 01/12/2013 até 01/10/2014, pois, o processo de atualização de...

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