Acórdão nº 68/14.2TTMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelFERNANDA SOARES
Data da Resolução01 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º68/14.2TTMTS.P1 Relatora: M. Fernanda Soares – 1342 Adjuntos: Dr. Domingos José de Morais Dra. Paula Leal de Carvalho Acordam no Tribunal da Relação do Porto IB… instaurou, em 30.01.2014, no Tribunal do Trabalho de Matosinhos, acção de impugnação judicial de decisão disciplinar contra C…, S.A., pedindo a) A anulação da sanção disciplinar de 12 dias de suspensão de trabalho com perda de retribuição e de antiguidade aplicada ao Autor pela Ré, sem causa justificada, por aquele cumprida de 11 a 27 de Fevereiro de 2013; b) A condenação da Ré a pagar ao Autor os montantes retributivos mencionados no artigo 27 da petição inicial, que não recebeu mas que normalmente auferiria caso não tivesse sido sujeito à dita sanção disciplinar, os quais ascendem a € 6.233,44; c) A condenação da Ré a pagar ao Autor a quantia de € 6.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais em consequência da conduta ilícita da Ré; d) A condenação da Ré a pagar ao Autor a quantia de € 1.511,69 de prémio de gozo de férias vencidas em 01.01.2011; e) A condenação da Ré a pagar ao Autor a quantia de € 1.520,97 de prémio de gozo de férias vencidas em 01.01.2012; f) A condenação da Ré a pagar ao Autor os juros das importâncias em dívida referidas nos artigos 27, 43 e 46 da petição inicial, à taxa legal, a contar da data do vencimento das respectivas obrigações até integral pagamento, ascendendo os já vencidos ao valor de € 351,14 e bem assim os juros da importância mencionada no artigo 32 da petição, à taxa legal, a contar da citação da Ré e até integral pagamento.

Alega o Autor ter sido admitido ao serviço da empresa pública C… EP em 01.09.1987 para trabalhar na Refinaria desta, sita em …, e a partir da publicação do DL nº103-A/89 de 04.04 – que transformou aquela empresa pública em pessoa colectiva de direito privado – passou o Autor a trabalhar, sem qualquer interrupção, para a aqui Ré, detendo actualmente a categoria profissional de Coordenador Técnico II. Por carta datada de 08.11.2012 a Ré comunicou ao Autor a instauração de processo disciplinar com intensão de despedimento, tendo-lhe aplicado, por carta datada de 06.02.2013, a sanção de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade por um período de 12 dias. A sanção aplicada ao Autor, e que este cumpriu, carece de justa causa e é manifestamente desproporcionada ao imputado comportamento.

A Ré contestou alegando que os comportamentos do Autor, que descreve, consubstanciam uma grave violação do dever de respeito e urbanidade para com a sua empregadora e superiores hierárquicos, bem como do dever de guardar lealdade à Ré, previstos, respectivamente, nas alíneas a) e f) do nº1 do artigo 128º do CT. Mais refere que, e não obstante a gravidade do comportamento do Autor, a Ré optou por lhe aplicar sanção que não o despedimento, a qual se mostra proporcional à referida conduta do trabalhador. Conclui pela total improcedência da acção.

O Autor veio responder e a Ré veio pedir o desentranhamento da resposta e dos documentos juntos com ela. O Mmº. Juiz a quo ordenou o desentranhamento da resposta apresentada pelo Autor. Foi designado dia para a realização de uma audiência prévia/preliminar, e aí foi proferido despacho saneador com consignação dos factos já admitidos por acordo e elaboração da base instrutória, a qual foi objecto de reclamação por parte do Autor mas não atendida. Procedeu-se a julgamento com gravação da prova pessoal, respondeu-se aos quesitos e foi proferida sentença, em 26.06.2015, que julgou a acção parcialmente procedente, revogou a sanção disciplinar de 12 dias de suspensão do trabalho com perda de retribuições e de antiguidade e condenou a Ré a pagar ao Autor 1. O montante retributivo que este não recebeu, mas que normalmente auferiria caso não tivesse sido sujeito à dita sanção disciplinar, no montante global de € 6.163,44, acrescida dos juros, à taxa legal, desde 31.03.2013 no que respeita ao montante da retribuição base, desde 31.05.2013 no que respeita ao prémio de avaliação e ao prémio extraordinário; 2. As quantias de € 1.511,69 e de € 1.520,97, de prémio de gozo de férias vencidas em 01.01.2011 e 01.01.2012, respectivamente, acrescidas dos juros, à taxa legal, desde 30.06.2012 no que concerne à primeira quantia e desde 30.06.2013 no que concerne à segunda quantia. Dos demais pedidos foi a Ré absolvida.

A Ré, inconformada, veio recorrer pedindo a revogação da sentença na parte condenatória e a sua substituição por acórdão que a absolva de todos os pedidos, concluindo do seguinte modo: 1. A conduta do Autor – descrita e assente nos autos – constitui infracção disciplinar grave, por violação culposa dos seus deveres laborais de respeito, de urbanidade, de lealdade, de preservação dos bons nomes e reputação das entidades que visou.

  1. A sanção aplicada é plenamente justificada, sendo adequada e proporcional à gravidade da infracção cometida.

  2. O Tribunal a quo fez uma errada interpretação e aplicação da lei aos factos, em concreto o disposto nos artigos 126º, nº1 e 128º, nº1, alíneas a) e f) do CT.

  3. Todos os factos constantes da nota de culpa, e que culminaram com a aplicação da sanção disciplinar de 12 dias de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade, resultaram provados.

  4. A verdade é que o Autor nunca negou a prática dos mesmos.

  5. Com base nestes mesmos factos, concluiu o Tribunal a quo não ter o Autor praticado qualquer infracção disciplinar, decisão que evidentemente se rejeita.

  6. A infracção disciplinar objecto dos presentes autos resume-se ao e-mail enviado pelo Autor em 14.09.2012, dirigido aos trabalhadores D… e E…, com conhecimento para outros 47 trabalhadores da Ré – pontos 18 a 20 dos factos provados.

  7. Conforme resultou provado – pontos 21 a 22 dos factos provados – através do referido e-mail, o Autor divulgou factos falsos, que agudizaram as relações entre os trabalhadores e a Ré, e que afectaram a reputação desta, abalando a sua imagem de empresa honrada e cumpridora.

  8. Ao contrário do que fez o Mmº. Juiz a quo, a análise do conteúdo do e-mail de 14.09.2012 tem que fazer-se antes de atender aos demais factos e circunstâncias que compõem todo o comportamento do Autor, para no final poder concluir pela existência ou não de infracção disciplinar e da sanção adequada e proporcional àquele comportamento.

  9. Se a divulgação do e-mail, e o seu conteúdo, constituírem – de per si – violação dos deveres laborais que impendiam sobre o Autor e, por isso, consubstanciar a prática de infracção disciplinar, como propugna a Ré, então tudo o mais terá que ser visto apenas como factos e circunstâncias que atenuaram ou agravaram o comportamento do Autor, sem lhe retirar a natureza de infracção disciplinar.

  10. Através do dito e-mail, o Autor divulgou informação falsa e susceptível de criar nos trabalhadores expectativas erradas e que não se verificavam naquele momento.

  11. Também a imagem e reputação da Ré saiu afectada, pois o e-mail poderia ser interpretado no sentido de que a recorrente actuou de forma arbitrária e discricionária, ignorando a lei e as decisões judiciais, o que não correspondia à verdade.

  12. Por outro lado, as expressões utilizadas – dirigindo-se à Administração da Ré e, consequentemente, aos membros que a compunham – ofenderam a honra, o bom nome e a reputação das pessoas visadas.

  13. Com a expressão “A obrigatoriedade da Administração devolver o dinheiro roubado aos trabalhadores na última greve”, o Autor insinuou que a Ré, em especial os elementos do Conselho de Administração, roubaram os trabalhadores, o que constitui uma acusação que ultrapassa largamente os limites do aceitável e do razoável no contexto laboral em causa, assim violando os deveres de respeito e urbanidade que sobre aquele recaem.

  14. Considerando ainda que se iniciaria no dia 17.09.2012, uma nova greve de 3 dias convocada pelas estruturas sindicais, é manifesto que o Autor pretendeu – com a expressão «roubar» – ferir a reputação da Ré e dos seus representantes num contexto particularmente sensível e que o mesmo julgava adverso, a fim de tentar abalar a confiança que os trabalhadores depositavam na Ré e na sua Administração.

  15. Com a expressão “A Administração afirmou em comunicado estarem os trabalhadores da C1… a ser alvo de uma campanha de desinformação, acertou em cheio, foi ela própria quem o fez e continua a fazer”, o Autor acusou a Ré de transmitir, de forma consciente, informações falsas aos trabalhadores, o que não se verificava, no fundo acusando-a de mentirosa.

  16. O Autor concluiu o e-mail de forma ameaçadora referindo que “Todos aqueles que servirem de «caixa-de-ressonância» de pretensões criminosas serão pessoalmente e criminalmente responsabilizados”.

  17. Só poderá concluir-se que o conteúdo do referido e-mail, para além de falso, é desrespeitador, insultuoso, provocador e ameaçador, pondo em causa a autoridade e honorabilidade da Ré.

  18. Assim violando os deveres laborais de respeito e urbanidade para com a sua empregadora e superiores hierárquicos, bem como o dever de guardar lealdade ao empregador, previstos no artigo 128º, nº1, alíneas a) e f) do CT.

  19. Para concluir pela inexistência de infracção, o Mmº. Juiz a quo baseou-se nos seguintes factos: o e-mail foi enviado num contexto de forte litigio laboral; o Autor apenas tinha conhecimento da tramitação das acções judiciais através de informações verbais dados por dirigentes do F… e pelo coordenador da Comissão de Trabalhadores da Ré; o Autor apenas reproduziu o texto que lhe havia sido enviado pelo trabalhador G…; o H…, no mesmo dia, emitiu um esclarecimento, rectificando a informação contida no e-mail do Autor.

  20. Por outro lado, ainda considerou as imputações dirigidas à Ré legítimas e razoáveis no contexto que então se vivia.

  21. Mas não procedem as justificações apresentadas pelo Autor, e sobre as quais o Tribunal a quo fundou a sua decisão.

  22. As circunstâncias elencadas nunca teriam a virtualidade de anular o comportamento do Autor, retirando-lhe natureza...

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