Acórdão nº 739/15.6T8AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução23 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 739/15.6T8AVR.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 505) Adjunto: Desembargadora Paula Maria Roberto Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, residente em …, intentou contra “Junta de Freguesia de …”, com sede no Largo …, a presente acção declarativa emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, pedindo:

  1. Que o contrato celebrado com a R. seja considerado como um contrato de trabalho por tempo indeterminado; b) Que seja reconhecida a má-fé da R.; c) A condenação da R. a pagar-lhe: - Indemnização, a título de má-fé, no valor de € 14.165,09, acrescidos de juros vencidos, no valor de € 518,48; - € 66,86, a título dos duodécimos do subsídio de Natal correspondente aos meses de Fevereiro e Março de 2014, acrescidos de juros vencidos, no valor de € 2,55; - € 328,65, correspondentes a 3 anos de horas de formação não fornecidas, acrescidos de juros vencidos, no valor de € 28,36; - € 1.000,00, de indemnização por danos não patrimoniais; - € 26.221,03, a título de férias não gozadas e correspondentes ao triplo do capital, acrescidos de juros vencidos; - € 6.724,29, correspondentes a indemnização por danos patrimoniais resultantes da falta de pagamento das contribuições e quotizações à Segurança Social, no lapso temporal compreendido entre 1997 e 2001, e respectivos juros de mora vencidos.

    - Juros vincendos desde a data da propositura da presente acção, até efectivo e integral pagamento.

    Alegou para tanto, em síntese, que foi admitida pela R. em 1997, verbalmente, para exercer as funções inerentes à categoria profissional de “tarefeira ajudante – nível 1”, sob as ordens e direcção da R., funções que realizava nos locais que esta lhe indicava, fazendo uso de instrumentos de trabalho pela mesma disponibilizados, recebendo uma remuneração horária que, ultimamente, era no valor de € 3,13, bem como subsídio de alimentação, no valor diário de € 4,27, sendo-lhe também pagos subsídios de férias e de Natal, estes apenas a partir de Dezembro de 2002.

    Cumpria um horário de trabalho fixo, imposto pela R., que era a sua única entidade empregadora, sendo a remuneração mensal que esta lhe pagava, a única fonte de rendimentos que tinha.

    Apenas a partir de 2001, a R. começou a efectuar o pagamento das correspondentes contribuições à Segurança Social e impostos às Finanças, e a emitir os respectivos recibos de vencimento.

    A R. comunicou-lhe, em 27 de Março de 2014, que o contrato era nulo, por carecer de forma legal, dando-o como cessado, e não a deixando prestar a sua actividade, a partir do dia 31 de Março de 2014.

    A R. não lhe pagou todos os créditos laborais a que tinha direito, faltando ainda pagar os ora peticionados, bem como indemnização, calculada à razão de 60 dias de retribuição base mensal por cada ano de trabalho.

    A A. nunca teve férias, porque a R. não permitia, impondo-lhe que trabalhasse e ameaçando-a de perder o emprego, se fosse de férias, o que lhe confere direito a uma compensação no valor do triplo da retribuição correspondente ao período em falta.

    Devendo-lhe ainda a R. uma indemnização pelos danos patrimoniais causados com o não pagamento de descontos à Segurança Social, em relação ao período de tempo entre 1997 e 2001.

    A R. agiu de má-fé, porque tinha um claro conhecimento da situação da A. e de outras duas trabalhadoras em igual situação, e nunca fez nada para a resolver. Tendo essa situação de ilegalidade sido questionada ao longo dos anos, em várias reuniões do executivo da R.. Estando a A. de boa- fé, pois desconhecia que a sua situação era ilegal.

    O facto de ter ficado sem trabalho de um dia para o outro, sem que lhe fosse comunicado tal facto, com qualquer antecedência que fosse, causou-lhe dificuldades económicas e uma enorme angústia e vergonha, ficando triste, chorosa, raramente falando com os vizinhos, amigos e familiares, ao contrário do que acontecia antigamente. Ficou ansiosa e nervosa, com o facto de não ter perspectivas de novo emprego, de não ter outro modo de subsistência e de depender de familiares.

    A R. contestou, excepcionando a incompetência material dos tribunais do trabalho para conhecer da acção e invocando a falta de legitimidade da Junta de Freguesia, sendo que esta, por ser um mero órgão da Freguesia, não tem a susceptibilidade de ser parte, por não ter personalidade nem capacidade judiciária, uma vez que não é uma pessoa colectiva.

    A Ré impugnou ainda, em parte, a factualidade alegada na petição inicial, defendendo que a A. foi admitida ao seu serviço no ano de 2001, mas apenas com a obrigação de prestar serviços de limpeza de valetas e jardins, em diversas instalações da Junta de Freguesia, não se verificando qualquer subordinação jurídica, na medida em que a A. não estava sujeita a qualquer horário de trabalho, fiscalização do cumprimento de funções, nem vinculo jurídico apropriado, sempre tendo sido considerada pela R. como uma prestadora de serviços (tarefeira), à semelhança do que sucede com os contractos de avença. Desta qualificação jurídica resultam prejudicados os direitos reclamados no que respeita à indemnização, formação profissional e férias não remuneradas.

    Caso assim não se entenda, sempre foram pagos à A. todos os seus direitos, que eram correspondentes às horas de trabalho efectivamente prestadas, de acordo com as fichas de trabalho preenchidas, foi processado e pago à A. o proporcional relativo ao subsídio de Natal pelo serviço prestado nos três primeiros meses do ano de 2014, e não era devida formação profissional, porque em presença duma relação de emprego público, proporcionar formação não constitui uma obrigação, só sendo devida caso seja necessária e haja cabimento orçamental, o que em concreto não sucedia.

    A R. começou a efectuar os descontos para a Segurança Social a partir de Abril de 2001, data em que admitiu a A. ao seu serviço, não lhe sendo exigível que fizesse descontos em relação a período anterior.

    Não existiu qualquer má-fé da parte da R., já que apenas com a tomada de posse do actual executivo foi conhecida a situação irregular da A., tendo-se de imediato efectuado diligências no sentido de encontrar solução para o problema.

    Concluiu a Ré pedindo que sejam julgadas procedentes as excepções invocadas, com a consequente absolvição da instância; ou se assim não se considerar, que a acção seja julgada improcedente, por não provada, com a sua absolvição do pedido.

    Invocou, por fim, que se considerasse isenta de custas.

    Respondeu a A., suscitando desde logo a indevida pretensão da Ré de isenção de custas, e considerando que as excepções invocadas na contestação devem improceder, requerendo à cautela a intervenção principal provocada da Freguesia de …, e no mais reafirmando o já alegado na petição inicial, aceitando especificamente a confissão e impugnando documentos.

    Foi proferido despacho estabelecendo que, no caso concreto, a Ré não está isenta de custas, e ordenando o pagamento da taxa de justiça devida.

    Foi seguidamente proferido despacho saneador, no qual foram decididas e julgadas improcedentes as excepções de incompetência material dos tribunais do trabalho e de ilegitimidade da Junta de Freguesia de …, analisada além do mais, sob a perspectiva da falta de personalidade jurídica da mesma, e a final foi fixado à acção o valor de €49.055,31.

    Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento com gravação da prova nela prestada e foi subsequentemente proferido despacho fixando a matéria de facto provada e não provada com consignação da respectiva convicção motivadora, após o que foi proferida sentença, de cuja parte dispositiva, consta: “Termos em que se decide, na parcial procedência da acção: I. Reconhecer que entre as partes vigorou um contrato de trabalho subordinado, desde Março de 2001 até 31 de Março de 2014, contrato esse que é nulo, pelas razões acima expostas.

    1. Condenar a R. a pagar à A.: a) € 5.588,05 (cinco mil, quinhentos e oitenta e oito euros e cinco cêntimos) de indemnização, pelo despedimento ilícito.

  2. € 328,65 (trezentos e vinte e oito euros e sessenta e cinco cêntimos), a título de retribuição por formação profissional não proporcionada.

  3. € 5.960,37 (cinco mil, novecentos e sessenta euros e trinta e sete cêntimos), a título de retribuição por férias não gozadas.

  4. Juros de mora às taxas legais aplicáveis (actualmente de 4%), até integral pagamento, contados: - Desde a citação da R., no que se refere à quantia aludida na al. a).

    - Desde 31 de Março de 2014, quanto à referida na al. b).

    - E no que se refere à mencionada na al. c), desde 01/01/2002, sobre € 488,31; desde 01/01/2003, sobre € 287,37; desde 01/01/2004, sobre € 520,41; desde 01/01/2005, sobre € 507,53; desde 01/01/2006, sobre € 498,00; desde 01/01/2007, sobre € 491,05; desde 01/01/2008, sobre € 411,60; desde 01/01/2009, sobre € 469,24; desde 01/01/2010, sobre € 481,76; desde 01/01/2011, sobre € 499,63; desde 01/01/2012, sobre € 489,32; desde 01/01/2013, sobre € 454,37; desde 01/01/2014, sobre € 97,81; e desde 31/03/2014, sobre 263,96.

    1. No mais, absolver a R. do pedido.

      Custas por A. e R., na proporção do respectivo decaimento (art.º 527º n.ºs 1 e 2 do Cód. de Processo Civil), sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia a A.

      ”.

      Inconformada, interpôs a Ré o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões: I. O douto despacho saneador proferido nos presentes autos julgou improcedentes as exceções da falta de personalidade e capacidade jurídica da ré e da incompetência absoluta do Tribunal a quo, não tendo para o efeito fundamento válido; II. Na verdade, a autora recorrida intentou a ação contra a Junta de Freguesia, que é, nos termos da Constituição da República Portuguesa, juntamente com a Assembleia de Freguesia, um dos órgãos representativos (órgão executivo) da autarquia local; a Freguesia, pessoa coletiva de direito público (cfr. arts. 235.º, n.os 1 e 2, 236.º, n.º 1, 244.º e 246.º da C.R.P.); III. A Junta de...

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