Acórdão nº 409/15.5T8PVZ-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 31 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelRUI MOREIRA
Data da Resolução31 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

PROC. Nº 409/15.5T8PVZ-A.P1 Comarca do Porto - Póvoa de Varzim Inst. Central - 2ª Secção Cível - J2 REL. N.º 329 Relator: Rui Moreira Adjuntos: Tomé Ramião Vitor Amaral* ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: 1. - RELATÓRIO B… propôs acção declarativa, com processo comum, contra C…, pedindo o reconhecimento do seu direito de usufruto sobre uma fracção autónoma que identificou, bem como a condenação da ré, que a vem ocupando e que dela é proprietária porque lhe foi doada, a entregar-lha livre de pessoas e bens. Pede, por isso, a condenação da ré a abster-se de praticar qualquer acto que colida com o seu direito, bem como a pagar-lhe €50,00 por cada dia de atraso na entrega dessa fracção, desde a citação, até integral pagamento, a acrescer com o valor correspondente aos impostos que vem pagando a propósito da mesma, desde a data da doação até à sua entrega, no valor actual de €463,95.

Sustentando os pedidos, alegou a inscrição registal do direito reivindicado a seu favor e esclareceu que a ré, que é titular do correspondente direito de propriedade, vem ocupando a fracção ao abrigo de um contrato de comodato, autor. Porém, tendo já exigido a respectiva restituição, pretende que a fracção lhe seja entregue, para que possa colher os frutos do direito de usufruto que ficou reservado para si. É que, além de suportar os custos da fracção, está privado dos proventos que ela lhe proporcionaria se fosse arrendada, que calcula em 250,00€ por mês.

Citada, a ré contestou, excepcionando que o contrato de comodato em questão foi acordado de forma a que a fracção assegurasse a sua própria necessidade de habitação, enquanto essa necessidade se mantivesse. Como tal necessidade se mantém, por razões que descreveu, não pode ter-se por resolvido o contrato de comodato, o que impede o direito do autor à respectiva entrega, como este pretende. Além disso, qualificou esta pretensão como abuso de direito, por o autor dispor do usufruto de outras fracções que pode utilizar, sem que precise da reivindicada, além de que lhe continua a prestar cuidados e alimentos, conforme se obrigou aquando da doação do direito de propriedade. Concluiu pela improcedência da acção.

Foi realizada audiência prévia, com observância de todas as formalidades legais.

O processo foi saneado e parte dos pedidos foi imediatamente decidida. Assim a acção foi julgada procedente no tocante ao pedido de condenação da ré a reconhecer o direito de usufruto do autor, ao pedido de condenação na abstenção quanto a qualquer conduta perturbadora do exercício desse direito e ao pedido de condenação da ré a entregar ao autor a fracção ocupada. Quanto ao mais, prosseguiu a acção, com a concretização do objecto do litígio remanescente e dos temas de prova.

É desta sentença que decidiu parcialmente do mérito da causa que vem interposto recurso, pela ré. Concluiu o seu recurso formulando as seguintes conclusões: “A - Não pode ser considerado como contrato sem prazo ou sem duração temporal limitada o contrato de comodato de imóvel celebrado para um uso determinado de habitação da filha do casal que constituiu o usufruto, quando o referido contrato teve uma duração temporal reduzida; B - Ainda que o uso determinado possa ter uma duração mais longa e determinada por factores externos, o contrato não deixa de estar temporalmente limitado pela necessidade do comodante, na medida em que lhe assiste o direito a fazer cessar o contrato com a invocação de justa causa; C – Contudo, atenta a gratuitidade do contrato e a renuncia que este representa para o comodante a receber os frutos do bem dado em comodato, quer a celebração, quer a cessação do contrato de comodato representam sempre um acto de disposição, e não um acto de mera administração ordinária, e como tal, tal como se alegou, o Autor carecia da necessária legitimidade para fazer cessar o contrato de comodato; D - Em todo o caso, o tribunal teria que obter a prova da legitimidade, ainda que considerasse que tal cabia ao Autor como cabeça de casal, sendo que a demonstração de tal qualidade, teria que decorrer de prova documental que não se encontra junta aos autos; E - A Ré, na invocação da tese de abuso de direito não se limitou a alegar que o Autor não tem qualquer necessidade de pedir a entrega da fracção, nem tal facto representaria abuso de direito; F-Com efeito, e como consta da alegação da Ré, integra abuso de direito o conjunto de factos que revelam um comportamento arbitrário, que excede os limites do direito, porque o direito é dirigido por forma a privar a Ré da casa onde mora por indicação de ambos os seus pais, quando o Autor sabe que a Ré não tem rendimento para poder suportar uma renda, é doente renal com limitações para o trabalho, e presta ainda assim os alimentos ao Autor impostos na escritura de doação; Com efeito, o acto de reclamar a entrega do imóvel, na alegação da Ré, representa um acto de manifesta crueldade para quem se encontra debilitado; E é neste excesso que considera a Ré haver abuso de direito; G-Por outro lado, considerando os factos alegados, o tribunal não dispunha do conhecimento de facto para por um lado reduzir a alegação de abuso de direito a uma súmula onde se excluíram factos relevantes, e por outro, concluir sem produção de prova, que não se verifica a existência de qualquer abuso de direito; Termos em que, deve ao presente recurso ser concedido provimento e em conformidade, revogada a douta decisão em recurso, ordenando-se o prosseguimento dos autos, como é de Justiça“ O recorrido não apresentou resposta.

O recurso foi admitido como apelação, com subida em separado e efeito devolutivo.

Cumprirá conhecê-lo.

*2- FUNDAMENTAÇÃO: O objecto do recurso, definido a partir das conclusões enunciadas pelo apelante apresenta as seguintes questões a resolver: - se o contrato de comodato em questão deve ter-se como de “duração temporal limitada, duração essa definida pela necessidade do comodatário; - se a denúncia desse contrato é um acto de disposição ou de mera...

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