Acórdão nº 80954/14.6YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA
Data da Resolução15 de Dezembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso de Apelação Processo n.º 80954/14.6YIPRT [Comarca do Porto/Inst. Local/V. N. Gaia/Sec. Cível] Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, S.A.

, pessoa colectiva n.º ………, com sede em ..., Vila Nova de Gaia, apresentou requerimento de injunção, convertido depois, na sequência da apresentação de oposição, em acção declarativa com processo comum, contra C…, Lda.

, pessoa colectiva n.º ………, com sede em Lisboa, reclamando o pagamento das quantias de €14.962,50 de capital, €2.049,33 de juros de mora e €102,00 de «outras quantias».

Para o efeito, alegou que em 18.11.2011 celebrou com a ré um contrato de compra e venda de 10 caravanas residenciais que deviam ser fabricadas pela autora e entregues à ré de forma faseada, pelo preço de €86.000,00, a ser pago em prestações; que fabricou 5 caravanas de acordo com as especificações requeridas e entregou duas à ré, a qual pagou apenas a quantia de €5.250, valor inferior ao da primeira prestação acordada; que a ré solicitou a suspensão do fabrico e entrega das caravanas remanescentes; que com a entrega das duas caravanas emitiu factura no valor parcial de €17.220,00; que face ao incumprimento da obrigação de pagamento do preço resolveu o contrato, sendo credor do valor em dívidas dos bens que fabricou e entregou, de uma penalização de 25% prevista no contrato e dos respectivos juros de mora.

A ré deduziu oposição à injunção alegando que não deve o montante peticionado porque as caravanas que lhe foram entregues não tinham ventilação adequada que permitisse a sua habitabilidade, nem se encontravam devidamente homologadas, defeitos que, apesar das insistência da ré, a autora nunca reparou, pelo que a ré se recusa a pagar o respectivo preço, tendo suspendido o contrato, o qual foi celebrado com cláusula de reserva de propriedade pelo que os bens ainda pertencem à autora que pode proceder ao seu levantamento.

A autora respondeu à oposição, alegando ser falsa a factualidade alegada pela ré. Em resposta, a ré veio alegar que tal factualidade já foi anteriormente julgada nos embargos à sua própria insolvência declarada em processo requerido pela aqui autora, nos quais lhe foi reconhecida razão.

Após julgamento, foi proferida sentença julgando a acção parcialmente procedente e condenando a ré a pagar à autora a quantia de €14.962,50 e juros de mora nos termos especificados no dispositivo.

Do assim decidido, a ré interpôs recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões: a) […]. b) O Mmº Juiz “a quo” com esta decisão põe totalmente em causa uma decisão anterior, proferida no processo nº 1350/12.9TYLSB-C do 2º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa, no incidente de embargos ao processo de insolvência que a aqui autora moveu contra a aqui ré, em cuja decisão devidamente fundamentada, o tribunal considerou posta em dúvida a existência do crédito aí reclamado pela ora autora por se entender que as caravanas fornecidas padeciam de vício que impedia o fim a que se destinavam e que esses vícios não foram corrigidos pela ora autora quando lhe foram denunciados pela ré, bem como que a ora ré ao não proceder ao pagamento agira ao abrigo de excepção de não cumprimento do contrato.

  1. A justificação da Mmª Juiz “a quo” de que se desconhece se a decisão supra já transitara em julgado, é no mínimo ridícula, e inaceitável, porque foi referido pelas partes que sim, e facilmente a própria Mmª poderia consultando o Citius, aferir do seu trânsito.

  2. Estamos aqui perante uma situação de caso julgado, que a Mmª Juiz “a quo” simplesmente ignorou.

  3. O objecto das duas acções, a presente e a do incidente de embargos à insolvência, é exactamente o mesmo; quanto às partes, não há qualquer sombra de dúvida que são as mesmas; quanto ao pedido e causa de pedir, apenas se distingue num pequeno grande pormenor de que no Tribunal do Comércio, a autora, além de peticionar o pagamento, pediu também a declaração de insolvência da ré.

  4. Revela para o caso a identidade da causa de pedir, ou seja, todos os factos concretos com relevância jurídica para a discussão da causa, que aqui são exactamente os mesmos, sem tirar nem por, até nos documentos juntos e testemunhas apresentadas.

  5. Existe uma decisão no primeiro processo que impede que esta acção possa ser discutida; ao não obedecer a este princípio, a Mmª juiz “a quo” originou a que agora existam duas decisões de tribunais de primeira instância totalmente contraditórias, sobre o mesmo objecto e a mesma causa de pedir, e envolvendo as mesmas partes.

  6. Colocou a Mmª Juiz “a quo” a segurança jurídica em causa, um dos principais princípios basilares do ordenamento jurídico português.

  7. Assim, deve o Tribunal “a quem” anular a decisão do tribunal “a quo”, declarando a existência de caso julgado, excepção dilatória que obsta a que o tribunal “a quo” conheça do mérito da causa.

A recorrida respondeu a estas alegações defendendo a falta de razão dos fundamentos do recurso e pugnando pela manutenção do julgado.

Após os vistos legais, cumpre decidir.

  1. Questões a decidir: As conclusões das alegações de recurso demandam desta Relação que decida se, tendo a aqui autora requerido a insolvência da aqui ré, a qual foi declarada, e a ré deduzido embargos à insolvência que obtiveram provimento, entre a sentença dos embargos à insolvência e a presente acção se verifica a excepção do caso julgado.

  2. Os factos: Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1] Autora e ré outorgaram em 18 de Novembro de 2011 um contrato que designaram de compra e venda, com pagamento do preço em prestações e com cláusula de reserva de propriedade, conforme consta do documento junto a fls. 61 e 62 que aqui se dá por integralmente reproduzido.

    2] O contrato tinha como objecto a compra pela autora à ré de 10 caravanas residenciais fabricadas por esta, de modelo …, de acordo com a nota de encomenda datada de 22.02.2011, assinada pela ré.

    3] O fabrico e a entrega das caravanas pela autora à ré seriam feitos de forma faseada: Duas até ao dia 15.02.2012; Duas até ao dia 15.03.2012; Duas até ao dia 15.03.2012; Duas até ao dia 16.04.2012; Duas até ao dia 15.05.2012; Duas até ao dia 30.05.2012.

    4] O preço total do negócio era de €70.000,00, acrescido de IVA à taxa legal de 23% perfazendo o valor total de €86.000,00, a ser paga pela ré à autora com o respeito do seguinte plano de pagamentos: €7.000,00 até ao dia 07.01.2012; €10.000,00 até ao dia 09.04.2012; €10.000,00 até ao dia 09.05.2012; €10.000,00 até ao dia 09.06.2012; €13.000,00 até ao dia 09.07.2012; €18.000,00 até ao dia 09.08.2012; €18.000,00 até ao dia 09.09.2012.

    5] A autora fabricou cinco caravanas residenciais de acordo com as especificações pretendidas pela ré e entregou-lhe duas em 15.02.2012 no local previamente indicado por esta.

    6] A ré apenas efectuou pagamentos parciais que totalizaram um valor de €5.250,00, sendo: €3.200 em 06.01.2012; €550,00 em 10.01.2012; €600,00 em 14.02.2012; e €900,00 em 15.02.2012 - cf. doc. juntos a fls. 56, 57, 58 verso e 59 verso que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

    7] A ré solicitou a suspensão do fabrico e entregas das caravanas residenciais remanescentes.

    8] Com a entrega das duas caravanas residenciais em 15.02.2012 a autora emitiu a factura n.º ….., de 15.02.2012, no valor de €17.220,00 e data de vencimento de 16.03.2012, cf. doc. junto a fls. 46 que aqui se dá por integralmente reproduzido.

    9] Por e-mail de 16.02.2012 a ré confirmou a recepção dos dois bungalows, solicitou a introdução de alterações nos três bungalows ainda não entregues - a colocação de um exaustor na cozinha e de uma janela por cima do beliche -, com vista a superar a alegada inexistência de exaustão e de circulação de ar que, a seu ver, as tornava inabitáveis, solicitando infirmação quanto ao custo dessas alterações.

    10] E suspendeu de imediato a fabricação e entrega dos cinco bungalows ainda não fabricados - tudo cf. doc. junto a fls. 21 que aqui se dá por integralmente reproduzido.

    11] A ré celebrou o contrato referido em 1. sem ter ido ver os bungalows.

    12] A ré manteve o pedido de não fabrico e entrega das restantes caravanas residenciais objecto do contrato de compra e venda.

    13] Por e-mail de 09.03.2012 a autora enviou à ré fotos das propostas de alterações a introduzir nos bungalows, conforme por esta solicitadas - cf. doc. junto a fls. 69 que aqui se dá por integralmente reproduzido.

    14] Em 14.03.2012 a autora deslocou dois técnicos ao local para aferir das queixas da ré e aferir eventuais alterações a introduzir nos bungalows.

    15] Em 14.03.2012 a ré informou a autora, por escrito, de que não tinha interesse nos demais 5 bungalows e invocando dificuldades financeiras solicitou um atraso no contrato de 2 meses - cf. doc. junto a fls. 21 verso que aqui se dá por integralmente reproduzido.

    16] Por e-mail de 16.03.2012 a autora comunicou à ré que aceitava resolver o contrasto estabelecido entre...

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