Acórdão nº 2928/16.7T8PRT-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA CEC
Data da Resolução15 de Dezembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 2928/16.7T8PRT-B Tribunal Judicial da Comarca do Porto, instância central, secção de execução - Juiz 6 Acórdão Acordam no Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório 1.1. B… – Unipessoal, Lda., com sede em Rua …, n.º …, ….-… Porto, por apenso à execução que lhe move C…, residente Rua …, n.º …, .., ….-… Felgueiras, deduziu embargos de executado e oposição à penhora, pedindo: “a) Ser o pedido reduzido para €5.062,24 (cinco mil e sessenta e dois euros e vinte e quatro euros), correspondente ao montante efetivamente em dívida pela Embargante b) Ser o Embargado condenado como litigante de má fé e, em consequência condenado a pagar à Embargante uma indemnização nunca inferior a €1.000,00 (mil euros), acrescida das despesas processuais nomeadamente com taxas de justiça (306,00) e honorários dos mandatários em montante nunca inferior a €500,00 (quinhentos euros).

  1. Ser ordenado o levantamento penhora do recheio do estabelecimento comercial por violação expressa do princípio da proporcionalidade e necessidade.

  2. Ser ordenado o levantamento penhora dos saldos bancários junto do D… por violação expressa do princípio da proporcionalidade e necessidade”.

No âmbito dos embargos, alegou, em síntese, que o estabelecimento comercial que tomou de arrendamento ao embargado não possuía a licença de utilização necessária ao seu funcionamento. Confrontada com a impossibilidade de usar o espaço arrendado, ficou acordado entre ambos que apenas teria de liquidar rendas a partir da emissão da nova licença de utilização para comércio e indústria, a qual só passou a produzir os seus efeitos em Agosto de 2015. Por isso, desde janeiro até agosto de 2015, em virtude de não possuir uma licença válida para comércio e indústria, não pode exercer a sua atividade comercial e, sem receber qualquer cliente ou realizar qualquer venda neste espaço comercial, teve de continuar a pagar vencimentos dos funcionários para além de outros prejuízos de que padeceu. Por tal razão, apenas carecem de liquidação as rendas correspondentes aos meses de agosto de 2015 a março de 2016, tal como as despesas de condomínio relativas a esse mesmo período.

1.2. Foi proferida decisão que, à luz das regras do procedimento especial de despejo, que admite uma fase de oposição, considerou não ser admissível oposição à execução através de embargos de executado (artigo 15.º-J, n.º 6 do NRAU). Decisão com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, e nos termos do art. 732.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, indefere-se liminarmente a oposição à execução através de embargos de executado deduzida por B… Unipessoal, Lda. contra C….”.

1.3. Inconformada, a executada/embargante interpôs recurso da decisão de indeferimento liminar dos embargos de executado, o qual foi admitido como apelação, como subida imediata, em separado e com efeito meramente devolutivo. Formulou para a sua alegação as seguintes conclusões: “I. Vem o presente Recurso interposto da douta sentença proferida, que julgou totalmente improcedentes por indeferimento liminar os Embargos de Executado deduzidos pela ora Apelante.

  1. Os presentes autos provêm do procedimento especial de despejo para desocupação do locado e pagamento de quantia certa que correu termos no Balcão Nacional de Arrendamento.

  2. Em virtude da alteração da sede para a morada do locado, logo após a celebração do contrato de arrendamento, a citação para tal procedimento no BNA nunca foi recebida pela ora Apelante.

  3. Assim, foi emitido o competente título de desocupação do locado e emitido título executivo para pagamento de quantia certa (aposta fórmula executória à luz do que sucede na ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos e injunção).

  4. Desta forma, a Apelante nunca tomou conhecimento que contra si corria termos procedimento de despejo pois nunca foi citada para o efeito. Pelo que, não deduziu oposição em sede de procedimento especial de despejo.

  5. Notificada da execução para pagamento de quantia certa e da penhora, a ora Apelante deduziu oposição mediante embargos de executado.

  6. Contudo, tal defesa não foi aceite pelo tribunal a quo atento o disposto no artigo 15.º-J, n.º 5 e 6 do NRAU, o qual preceitua que: “ [5] O título para desocupação do locado, quando tenha sido efetuado o pedido de pagamento das rendas, encargos ou despesas em atraso, e a decisão judicial que condene o requerido no pagamento daqueles constituem título executivo para pagamento de quantia certa, aplicando-se, com as necessárias adaptações, os termos previstos no Código de Processo Civil para a execução para pagamento de quantia certa baseada em injunção.

    [6] - Nos casos previstos no número anterior não há lugar a oposição à execução.” (negrito e sublinhado nossos).

  7. O n.º 6 do referido preceito viola expressamente o princípio da proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa em virtude de restringir desproporcionadamente o direito de defesa de um alegado devedor em face do interesse do credor de obrigação pecuniária em obter um título executivo “de forma célere e simplificada”.

  8. Foram ainda violados, com a decisão de indeferimento, os n.º 4 e 5 do art.º 20.º da CRP que consagra o princípio da tutela jurisdicional efetiva, prescrevendo-se que nas causas em que as partes intervenham, a decisão deve ser tomada mediante processo equitativo, nomeadamente à luz do princípio do contraditório.

  9. E, foi ainda violado, com esta decisão, o disposto no art.º 6.º n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que prescreve: “Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativamente (...) por um tribunal (...) o qual decidirá (...) sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela”.

  10. Mesmo que a ora Apelada tivesse sido citada do procedimento de despejo, a verdade é que tal citação não iria conter qualquer referência ou advertência de que a falta de oposição determinaria o acertamento definitivo da pretensão do requerente, pois tal não decorre do disposto no art.º 15.º-D n.º 1 do NRAU. E, XII. Para que exista um “processo justo” é elemento essencial do chamamento do demandado a advertência para as cominações em que incorre se dele se desinteressar (cf. artigo 227.º, n.º 2, in fine do CPC).

  11. O exercício efetivo do contraditório pressupõe que o requerido tome conhecimento do procedimento e dos efeitos preclusivos associados à falta de oposição, o que não sucedeu no caso dos presentes autos.

  12. Estamos, assim, perante uma violação dos elementos essenciais da citação importando a nulidade da citação ao abrigo do disposto no artigo 191.º n.º 1 do CPC por violação do disposto no artigo 227.º, n.º 2, in fine do CPC.

  13. Assim, desconsiderada, nos termos supra referidos, a norma do art.º 15.º J, n.º 6, e, consequentemente, os limites que aí se estabelecem, deixa de subsistir o motivo que foi apontado pelo Tribunal a quo, para indeferir liminarmente os embargos de executado deduzidos pela ora Apelante, embargos esses que, se outro motivo não houver que a isso obste, deverão, assim, ser recebidos.

  14. Garantindo, desta forma que a ora Apelante pode utilizar, em sede de oposição à execução, a sua defesa com a mesma amplitude com que o podia fazer na ação declarativa.

  15. Veja-se que, o Novo Regime do Arrendamento Urbano assenta no já conhecido procedimento de injunção. Assim, o disposto no artigo 15.º-J, n.º 5 e 6 do NRAU deve ser interpretado à luz do preceituado no Decreto Lei n.º 269/98 de 1 de Setembro e, bem assim, com as necessárias adaptações o disposto nos atuais artigos 729.º a 731.º do CPC.

  16. Cumpre ainda não esquecer a apreciação constitucional que tem sido feita das normas do CPC respeitantes à oposição à execução baseada em injunção a que tenha sido aposta fórmula executória.

  17. No CPC na redação dada pela Lei 41/2013 de 26 de Junho, o legislador entendeu dever fazer uma distinção entre o título executivo “sentença” e o título executivo “requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executória” ao estabelecer um leque mais alargado de fundamentos de oposição à execução quando se trate de execução baseada em requerimento executivo.

  18. A generalidade da doutrina tem considerado que a aposição, pelo secretário judicial, da fórmula executória no requerimento de injunção integra um título executivo distinto das sentenças, sendo admissível que, na oposição à execução nele fundada, o executado invoque, para além dos fundamentos invocáveis na oposição à execução fundada em sentença, “quaisquer outros que seria lícito deduzir como defesa no processo de declaração”.

  19. Por sua vez, o Tribunal Constitucional já se pronunciou várias vezes sobre esta questão, nomeadamente no Acórdão n.º 437/2012 (processo n.º 656/11) de 26 de Setembro de 2012, que julgou inconstitucional a norma que equipara à sentença judicial a injunção na qual tenha sido aposta fórmula executória para efeitos de restrição da possibilidade de oposição à execução e também no Acórdão n.º 658/2006 que julgou inconstitucional, por violação do princípio da proibição da indefesa ínsito no direito de acesso ao direito e aos tribunais, consagrado no artigo 20.º da Constituição, a norma do artigo 14.º do Regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, na interpretação segundo a qual, na execução baseada em título que resulta da aposição da fórmula executória a um requerimento de injunção, o executado apenas pode fundar a sua oposição na alegação e prova, que lhe incumbe, de factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado pelo exequente, o qual se tem por demonstrado.

  20. De modo semelhante se têm pronunciado vários outros arestos, nomeadamente dessa Relação de Coimbra, dos quais se destacam o Nº 19664/11.3YYLSB-A.C11, o Nº 21/10.5TBVLF-A.C1, e o Nº 1506/10.9T2OVR-A.C1. E, XXIII. Mais recentemente o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 264/2015 que decidiu “declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral...

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