Acórdão nº 3809/15.7T8BRG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelJER
Data da Resolução05 de Dezembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

APELAÇÃO n.º 3809/15.7T8BRG.P1 SECÇÃO SOCIAL ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTOI.RELATÓRIOI.1 No Tribunal da Comarca de Aveiro – St. Maria da Feira- Inst. Central, B… deu início à presente acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, através da apresentação do requerimento em formulário próprio a que se referem os artigos 98.º C e 98.º D do Código de Processo do Trabalho, demandando C… S.A, com o propósito de impugnar o despedimento que por esta lhe foi comunicado por escrito, na sequência de procedimento disciplinar.

Foi designado dia para a audiência de partes a que alude o art.º 98º-F, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, a qual veio a ser realizada, mas sem que se tenha logrado alcançar o acordo entre as partes.

Notificada para o efeito, a Ré apresentou articulado motivador do despedimento, pugnando pela licitude do despedimento, elencando os factos que fundamentam a justa causa invocada e indicando o seu enquadramento jurídico, designadamente sustentando que o Autor violou os deveres estabelecidos no art.º 128 n.º1 c), e) f) e g) do Código de Trabalho.

Alega, no essencial, que, em 1 de novembro de 2008 admitiu ao seu serviço o Autor para exercer as funções correspondentes à categoria profissional de vendedor.

A 17.03.2015 detectou que o mesmo realizava “troca de facturação” ou “facturação fictícia”, prática esta proibida total e expressamente proibida pela ré.

Mais refere que a viatura utilizada pelo Autor no exercício das suas funções possui um identificador «D…» com o n.º ………., o qual é propriedade da Ré. A Ré suporta integralmente, através de débito directo na sua conta bancária, todas as despesas de portagens relativas à actividade profissional do Autor. Porém, através de 30 (trinta) notificações da Autoridade Tributária e Aduaneira datadas de 11 de Maio de 2015 (fls. 74-104 do doc. n.º 1), a Ré foi notificada, nos termos do disposto no artigo 70.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias, para proceder ao pagamento de 30 (trinta) coimas e respectivas custas, tudo no total de € 12.704,50 (doze mil setecentos e quatro euros e cinquenta cêntimos), referentes a 30 (trinta) portagens que o Autor passou, entre o dia 31 de Janeiro de 2014 e o dia 12 de Junho de 2014, conduzindo a viatura que utiliza no exercício das suas funções, com a matrícula ..-NJ-.., e utilizando um identificador com o n.º …………, que não é propriedade da Ré, sem ter procedido ao pagamento das respectivas portagens. Tal comportamento fez a ré incorrer na prática da contra-ordenação prevista e punida pelos art.ºs5 n.º1 a) e art.º7 da Lei 25/06 de 30.06.

Invoca que o autor, ao vender mercadoria sem emitir a respectiva factura, assumiu uma conduta que o faz incorrer na prática de crime de burla previsto no art.º217 do C. Penal assim como na prática do crime de fraude fiscal p. e p. no art.º103 n.º1 a) do R.G.I.T.

Conclui que essas condutas traduzem um comportamento ilícito, culposo e censurável consubstanciando infracções disciplinares que justificam o despedimento com justa causa dado que a sua gravidade inviabilizou definitivamente que o autor continue a prestar a sua atividade na ré.

O autor apresentou contestação, defendendo-se por excepção e impugnação. Pugna pela ilicitude do despedimento, peticionando, em reconvenção, a condenação do Réu no pagamento do seguinte: - €4.000,00 a título de danos não patrimoniais; - Indemnização por antiguidade nos termos do art.º391 n.º1 do C. Trabalho (45 dias sobre a remuneração de €2.111,20 (correspondente ao somatório da retribuição fixa de €.850,00 e da retribuição variável de €1.261,20, segundo a média mensal dos últimos doze meses de vigência do contrato); - As remunerações que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que venha a declarar a ilicitude do despedimento nos termos do art.º390 n.º1 do C.T., segundo a retribuição fixa e a retribuição variável média dos últimos 12 meses de vigência do contrato, o que já computa em €7.037,33 (10 dias de julho de 2015, a que acrescem os meses de Agosto e Outubro do mesmo ano).

- Na quantia de €2.131,50 a título de pagamento da retribuição respeitante ao número anual mínimo de formação não proporcionada ao autor (art.º134 do C.T).

- Que seja declarada inaplicável a ressalva prevista no artigo 8.1.3 do Anexo II do Contrato “Fundo de Pensões do Grupo C… – Alteração do Contrato Constitutivo” e na qual está prevista a exclusão expressa dos trabalhadores que hajam sido despedidos com justa causa, e que sejam reconhecidos ao autor os direitos adquiridos aí previstos, mormente as cláusulas 2.5, 8.1.1 e 8.1.2 do referido diploma.

Na defesa por excepção, invocou o seguinte:

  1. A invalidade e ineficácia do procedimento disciplinar e respectiva decisão por falta de poderes do director de recursos humanos; b) Excepção peremptória de caducidade do procedimento disciplinar; c) Nulidade do segundo aditamento à nota de culpa por incumprimento do ónus da descrição circunstanciada dos factos que consubstanciam a acusação; d) Prescrição da infracção disciplinar.

A Ré respondeu à defesa por excepção e à reconvenção. Pede que, procedendo a acção, seja descontado o subsídio de desemprego nas retribuições peticionadas pelo Autor.

I.2 Findos os articulados foi proferido despacho admitindo o pedido reconvencional e fixando à acção o valor de €15.168,83.

Posteriormente, procedeu-se ao saneamento dos autos, com dispensa de fixação da matéria de facto controvertida.

Após a instrução do processo, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais.

I.3 Subsequentemente foi proferida sentença, concluída com o dispositivo seguinte: - «(..)Pelo exposto, julgo regular e lícito o despedimento do autor/trabalhador B… e, consequentemente, absolvo ainda a ré/Entidade Empregadora/ C…, Sgps, SA do pedido reconvencional.

Custas a cargo do autor.

Registe e notifique (..)».

I.4 Inconformada com a sentença o Autor apresentou recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram sintetizadas nas conclusões seguintes: I - O presente recurso tem por objeto a douta sentença proferida nos autos, a qual julgou regular e lícito do despedimento do Trabalhador e absolveu a Empregadora do pedido reconvencional, circunscrevendo-se a matéria de direito.

Questão da nulidade da nota de culpa e da decisão disciplinar: II - O segundo aditamento à Nota de Culpa, datado de 08 de junho de 2015, cujo teor coincide com a factualidade dada como provada na douta sentença sob os números 121 a 138 - não contém factos com um mínimo de concretização, não se encontrando tal alegação minimamente circunstanciada.

III - A Empregadora não identificou, de forma minimamente circunstanciada, os concretos fornecimentos que o Trabalhador efetuava sem fatura, designadamente as datas ou a sua localização mínima do tempo, quantidades ou tipos de produtos ou – ainda – as datas das supostas conversas entre o Trabalhador e esses clientes.

IV - Pelo que esse segundo aditamento é nulo, por inobservância do ónus de descrever circunstanciadamente os factos de que vem acusado o Trabalhador, a que se refere o art. 353º do CT, normativo esse que se entende violado.

V – Ao contrário do sustentado pela douta sentença recorrida, houve um prejuízo real e efetivo do direito de defesa do Trabalhador. Se é certo que este captou a conduta que lhe era imputada, tal apenas ocorreu de forma genérica já que não pôde tomar posição perante factos concretos.

VI - Perante essa alegação generalista, que a douta sentença incorporou indevidamente nos factos provados, com eles fundamentando, concomitantemente, o despedimento, o Trabalhador jamais pôde defender-se. O Trabalhador não pode defender-se perante uma alegação vaga e genérica de ser prática corrente a venda sem fatura, contrapondo o que quer que seja.

VII - Aliás, o prejuízo do direito de defesa do Trabalhador ressoa evidente, por exemplo, quanto à questão da prescrição, em que o Tribunal considerou ser ónus da prova do trabalhador alegar a data do conhecimento desses “factos”. Como pode o Trabalhador alegar o decurso do prazo de prescrição do procedimento disciplinar sobre “factos” que não estão minimamente localizados no tempo? O que a douta sentença, de resto, acaba por reconhecer justamente a propósito do ónus de alegação e prova desta prescrição.

VIII - Assim, não só a alegação generalista impede o trabalhador de se defender perante factos concretos – ratio e essência fundamental do art. 353º n.º 1 do CT – como essa matéria foi equiparada a facto fundamentador do despedimento na douta sentença.

IX - Pelo que ocorre nulidade substantiva da nota de culpa correspondente ao seu 2º aditamento, por violação do art. 353º n.º 1 do CT, a qual não foi sanada, inquinando a decisão disciplinar proferida, que reproduz esses “factos”. Razão pela qual é, igualmente, nula a decisão disciplinar. Normativo esse que a douta sentença igualmente violou.

X – Subsidiariamente, caso assim não se entenda – o que não se concede - dever-se-ão considerar inatendíveis os “factos” provados na douta sentença, sob o número 121 a 138.

Questão da inexistência de factos bastantes integradores do conceito de “justa causa” do despedimento: XI - Os factos provados nos quais o Tribunal fundamentou a decisão de julgar válido e eficaz o despedimento reconduzem-se unicamente aos seguintes quatro items: 1º - A oferta não autorizada de café de 10 kgs. de café à cliente E… (cfr. facto provado 34 a 39; 2º -- A venda fictícia de produto à cliente E… (cfr. facto provado 40 a 51); 3º - A desconformidade entre o stock físico existente na carrinha do Trabalhador e o stock informático (cfr. facto provado 52 a 57); 4º - As declarações de determinados clientes no sentido de que era prática recorrente do Trabalhador vender-lhes café sem fatura (fr. factos provados 121º a 140º).

Quanto à alegada oferta não autorizada de café de 10 kgs. de café à...

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