Acórdão nº 3928/15.0T8MTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelNELSON FERNANDES
Data da Resolução05 de Dezembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 3928.15.0T8MTS.P1 Apelação 3928.15.0T8MTS.P1 Tribunal: Comarca do Porto, I C, Secção Trabalho, Matosinhos Autor: B… Ré: Banco C…, SA _______ Relator: Nélson Fernandes 1º Adjunto: Des. M. Fernanda Soares 2º Adjunto: Des. Domingos José de Morais Acordam no Tribunal da Relação do Porto I - Relatório 1.

A Autora intentou a presente ação para impugnação da regularidade e licitude do despedimento, apresentando o formulário a que aludem os artigos 98º-C e 98º-D do CPT, opondo-se ao despedimento que lhe foi promovido pela Ré, pedindo que seja declarada a ilicitude ou irregularidade do mesmo com as consequências legais.

Frustrada a tentativa de conciliação levada a efeito na audiência de partes, a Ré apresentou articulado motivador do despedimento, sustentando que despediu a Autora com justa causa para o efeito, no termo de um processo disciplinar válido e regular que lhe moveu, razão pela qual deve ser julgada improcedente a acção.

A Autora contestou, por excepção e impugnação, e reconveio.

Na contestação arguiu, em resumo: (I) a nulidade do processo disciplinar por ausência de nota de culpa e comunicação de intenção de despedimento válidas; (II) a prescrição do direito a exercer a acção disciplinar; (III) a Invalidade do despedimento por violação do principio da igualdade de tratamento e da proporcionalidade no exercício da acção disciplinar; (IV) a Ilicitude do despedimento pela não ponderação do Parecer da Comissão de Trabalhadores; (V) a Ilicitude do despedimento por invalidade do procedimento – art.º 382.º n.º 2 alínea d) do CT; (VI) a não verificação de justa causa de despedimento; (VII) o Abuso de direito.

Na reconvenção peticionou a condenação da Ré: a) a reintegrar a autora no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua antiguidade; b) a pagar à autora a quantia de €2.532,95, de salários já vencidos e não pagos desde a comunicação do despedimento, acrescida dos salários vincendos até decisão final que determine a reintegração da autora; c) a repor as condições do contrato de mútuo existentes à data do despedimento, bem como a indemnizar a autora dos prejuízos decorrentes da alteração no período em que a mesma durar e a apurar em liquidação de sentença; d) subsidiariamente, para o caso de assim não se entender, condenar a ré a pagar à autora a quantia de €4.478,71, acrescida de juros de mora desde a data de 31/7/2015 até integral pagamento.

A Ré respondeu para, em resumo, se pronunciar pela improcedência das excepções invocadas na contestação, pugnar pela declaração de licitude do despedimento com fundamento na existência de justa causa e pela absolvição dos pedidos formulados em reconvenção.

1.1.

No despacho saneador, o Exmo. Juiz, por entender que o estado dos autos permitia desde já, sem mais produção de prova, o imediato conhecimento do mérito da causa, proferiu decisão, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 61.º “ex vi” do artigo 98.º-M, n.º 1, ambos do Código de Processo de Trabalho, de cujo dispositivo consta: «(...) Nestes termos, tudo visto e ponderado, decide-se: I – Julgar procedente, por provada, a exceção de prescrição da infracção disciplinar invocada pela Autora B… e, em consequência, declaro ilícito o seu despedimento decretado pela ré/empregadora Banco C…, SA.

II - Julgar parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência, condeno a Ré: - A reintegrar a Autora no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; - a pagar à trabalhadora as prestações pecuniárias que esta deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declare a ilicitude do despedimento, deduzida do montante do subsídio de desemprego eventualmente auferido (incumbindo neste caso à entidade patronal entregar essa quantia à Segurança Social, em conformidade com o estabelecido na al. c) do n.º 2 do art. 390º), acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da liquidação que venha a ser efectuada das referidas quantias.

- a repor as condições do contrato de mútuo existentes à data do despedimento, bem como a indemnizar a autora dos prejuízos decorrentes da alteração no período em que a mesma durar e a apurar em liquidação de sentença.» 2.

Não se conformando com o assim decidido, apelou a ré, tendo rematado as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas: “I - Sobe o presente recurso da decisão proferida pelo Tribunal a quo que entendeu que os factos imputados à Recorrida se encontravam prescritos e, desse modo, julgou procedente o pedido, declarando a ilicitude do despedimento e a reintegração desta, com o consequente pagamento do devido, decisão esta de que se discorda; II - O facto infraccional objecto destes autos consubstancia-se na falsificação de assinatura de cliente em documento de suporte de seguro, ou seja, da proposta de subscrição do seguro “C1…” e seu consequente envio à C… Seguros.

III- A falsificação consubstanciou-se fotomontagem das assinaturas realizada pela Recorrida utilizando para tal a assinatura do cliente existente no sistema informático do Banco que copiou e colou na proposta de seguro que, ela própria, enviou depois à seguradora.

IV - Considera-se que a referida fotomontagem ocorreu, na data em que a Recorrida enviou para o C… Seguros a proposta pretensamente assinada pelo Cliente, pois esse envio era imperativo para aquela, datando-se tal em 23 de Julho de 2012, conforme resulta dos documentos de fls. 47 e 48 do procedimento disciplinar.

V- Assim, o prazo prescricional iniciou-se no dia seguinte, 24 de Julho de 2012, face ao disposto no artº 279, alínea b) do Código Civil.

VI - O processo desenvolvido pela Inspeção do Banco, que definimos como processo prévio de inquérito, teve início em 11 de Fevereiro de 2015, data em que aquela Inspeção teve conhecimento dos factos por reclamação do cliente, sendo que a Recorrida foi notificada da Nota de Culpa em 31 de Março de 2015, conforme resulta dos Ponto 49 da matéria provada.

VII – Foi imputado à Recorrida a pratica de acto que configura um ilícito criminal, de falsificação e, inclusive, em sede de Nota de Culpa deu-se conta desse facto e da sua inclusão na previsão do artº 256, nºs 1, a) e 4 do Código Penal.

VIII - Ora, considerando-se o acto como “crime” e face ao disposto no artº 329, nº 1 do Código de Trabalho e na clausula 116, nº 2 do ACTV em vigor, há que considerar que a prescrição ocorre “… no prazo de prescrição da lei penal se o facto constituir igualmente crime”.

IX - A conduta da Recorrida, conforme provado ficou, consubstanciou-se na colocação de 4 assinaturas de um cliente que copiou do sistema informático do banco, onde se encontravam digitalizadas, em quatro folhas de uma apólice de seguro que, pretensamente e dessa forma, passava a cobrir um risco do cliente e que este não subscrevera. (vd. Pontos 15 a 18 da matéria provada).

X – A Recorrida forjou, através de fotomontagem, a assinatura do cliente do próprio balcão que ela co-dirigia como sua subdirectora, em documento que enviou para uma terceira entidade, a C… Seguros.

XI – O Recorrente não apresentou queixa-crime, mas tal não invalida a apreciação do ato da Recorrida numa perspetiva penal, para efeitos de apreciação do instituto da prescrição (vd. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra em 5.12.2012 no proc. 728/11.0T4AVR.C1 (vd.

www.trc.pt/index).

XII – Ora, o crime de falsificação de documento comporta diversas modalidades e, entre elas, se destaca o abusar de assinatura de outra pessoa para elaborar documento falso.

XIII – O crime indiciariamente demonstrado em que se compagina a actuação da Recorrida conduz à aplicação nestes autos do regime e prazos prescricionais previstos no artº 118, nº 1 do Código Penal.

XIV – O ilícito criminal onde se enquadra a falsificação cometida pela Recorrida, enquanto trabalhadora do Banco e no exercício das suas funções, a sanção é de pena de prisão entre 1 e 5 anos, conforme dispõe o artº 256, nºs 1 e 4 do Código Penal, pelo que, e face ao disposto no artº 118, nº 1, alínea b) do Código Penal, o prazo de prescrição é de 10 anos.

XV - Ainda que se entenda inexistir a agravante prevista no nº 4 do artº 256 do Código Penal, fixando-se então a moldura penal em prisão até 3 anos ou pena de multa (artº 256, nº 1) , ainda assim o prazo prescricional será de 5 anos tendo em conta o disposto no artº 118, nºs 1, alínea c) e 4 do Código Penal.

XVI - Considerando que a Recorrida terá praticado a falsificação em 23 de Julho de 2012 e que o processo prévio de inquérito se iniciou em 12.02.2015, que o processo disciplinar foi iniciado em 24.03.2015 e a Nota de Culpa foi recebida pela Arguida em 31.03.2015, claro se torna que não existe prescrição da infracção disciplinar.

XVII – Apesar desta realidade de facto e de iure, o tribunal a quo entendeu que inexiste crime de falsificação por não se encontrarem preenchidos os pressupostos do mesmo, o que não aceita.

XVIII - A falsificação de documentos constitui uma falsificação de declaração incorporada no documento que, no caso sub iudice se consubstancia na sua falsificação intelectual, porquanto a Recorrida incorporou no documento um dado relevante, que o validou, ou seja, a assinatura do cliente pretensamente parte contratante do mesmo.

XIX - O referido documento, sem a assinatura do cliente de nada valia e, aposta a sua “assinatura” nas condições provadas passou a ser juridicamente relevante atestando um facto – a contratualização de um seguro – inexistente, porquanto não pretendido pelo cliente.

XX - O legislador, no crime de falsificação de documentos, pretendeu em primeiro lugar salvaguardar a fé pública, a confiança e veracidade dos documentos que será tanto maior quanto maior for a sua força probatória, o acreditar no mesmo e no seu conteúdo.

XXI - O crime de falsificação de documento deve ser entendido como um crime contra a prova documental, mas também um crime de fraude contra a identidade do autor do documento, como sucedeu no caso em apreciação...

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