Acórdão nº 1248/13.3T2AVR-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução26 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. N.º 1248/13.3.T2AVR-A.P1 Sumário do acórdão proferido no processo nº 1248/13.3T2AVR-A.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil: 1. O estabelecimento comercial, enquanto móvel sui generis, é passível de ser adquirido por usucapião, embora com aplicação dos prazos previstos para os bens imóveis.

  1. A presunção legal do nº 2, do artigo 1252º do Código Civil, só pode operar quando está provada uma materialidade fáctica que corresponda ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real de gozo.

  2. A promessa de doação, rectius o contrato-promessa de doação não é passível de execução específica, atenta a natureza da obrigação assumida pelo doador.

    *** * ***Acordam os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto: 1. RelatórioEm 24 de Abril de 2015, por apenso à ação declarativa nº 1248/13.3T2AVR, pendente na 1ª Secção Cível da instância Central da Comarca de Aveiro, B…, ré nos autos principais, intentou o presente procedimento cautelar comum contra C…, na qualidade de cabeça de casal das heranças indivisas de D… e E…, pedindo que, com dispensa do contraditório, seja a final ordenada: A) A notificação da AT (Autoridade Tributária) para que emita a favor da requerente nova senha que permita a esta aceder a todas as funcionalidades disponibilizadas pelo Portal das Finanças tendentes à gestão do estabelecimento e liquidação dos impostos devidos (IVA, IRS, etc…), senha essa que não poderá permitir a sua alteração futura pelo cabeça de casal, aqui requerido, sem a autorização deste Tribunal.

    Subsidiariamente deve ainda ordenar-se, B) A entrega/devolução pelo requerido à requerente, por qualquer modo, da senha do Portal das Finanças que permita a esta última a regularização imediata de todas as obrigações fiscais já em falta e o acesso irrestrito futuro a todas as funcionalidades daquele Portal, tendentes ao exercício gerencial da farmácia.

    1. A devolução pelo requerido à requerente através de transferência bancária e para o NIB do F… …………………, de todas as quantias por si rececionadas do G…/G1…, desde finais de Fevereiro de 2015 até à prolação de decisão cautelar.

    2. A Notificação urgente quer do G… quer da G1…, ambos com sede na Rua … nº./….-… Lisboa, para que passem a transferir imediatamente para o NIB da Farmácia até aqui vigente (n.º……………….. do F…) todas as quantias relativas ao receituário do SNS e demais organismos.

    3. A comunicação ao Infarmed, G1…/G…, Segurança Social e AT – Autoridade Tributária do teor da douta decisão cautelar para os fins tidos por convenientes, mormente os de reconhecimento da requerente como única interlocutora e gestora/administradora do estabelecimento Farmácia H…, com o Alvará N.º…, e finalmente, F) Que o requerido, que deu azo a todos os já denunciados prejuízos para o estabelecimento de farmácia, proceda à liquidação, do seu bolso, de todas as sanções, coimas, juros, penalidades fiscais ou outras, custas judiciais, honorários de Agente de Execução ou outros, resultantes desta sua atuação, e de que a requerente venha a ser futuramente notificada para liquidar.

    Para fundamentar as suas pretensões, a requerente alega, em síntese, o seguinte: - a requerente e ré na ação principal, (em conjunto com o marido) é desde 1982/83 a única e irrestrita administradora/gestora/dona do “estabelecimento Farmácia H…” com sede em … … …. Albergaria-a-Velha (Alvará n.º…..); a dita “Farmácia” (incluindo Alvará e respectivo recheio), em conjunto com o imóvel onde esta se sedia, (e que inclui uma parte habitacional e uma outra de natureza comercial) foram-lhe doados (verbalmente) pelos falecidos pais (até para restabelecer alguma “igualdade” entre os demais 5 irmãos já objeto à data de avultadas “entregas” de imóveis e não só; foi precisamente por esta relevante razão, que aqueles “bens” passaram a integrar o património da ora requerente em face da gestão/administração da “farmácia” e uso/posse ininterrupta, e por mais de trinta e dois anos a fio, do já citado imóvel e estabelecimento comercial; consumada tal posse na já invocada e aqui reiterada usucapião (por si e sua família), porque prolongada no tempo e nos atos atinentes, desde pelos menos 1982 até à presente data, e que aqui se renova para ser considerada e valorada; tal imóvel e estabelecimento comercial, dada a notoriedade, no concelho (e não só), “do Prof. E… e esposa Dr.ª D…”, (que inclusive eram oriundos da freguesia da …, deste concelho), era e foi sempre reconhecido (nos últimos 32 anos) publicamente e por todos, e sem oposição de quem quer que fosse, como propriedade da filha “dos donos do Colégio I…” (assim eram conhecidos os acima indicados pais da requerente) que inclusive e durante todos estes alongados anos de posse reiteradamente de forma pacifica, pública e de boa-fé, usufruiu deles (imóvel e estabelecimento) e retirou as respetivas vantagens, mormente tratando-os, conservando-os, nele residindo com a sua família, como primeira e única habitação, repete-se desde pelo menos 1982 em diante e até hoje; em 18 de fevereiro de 2015, a ora requerente (e até o requerido) foram informados pelo TOC (Dr. J…), que a “senha das finanças” que permitia até aí o acesso ao respectivo portal, tinha sido alterada e portanto já não seria possível à ora requerente, no futuro, cumprir, entre outras, com as obrigações fiscais da “farmácia”; no dia 20 de fevereiro de 2015, o requerido informou o TOC J… que este “deveria enviar todos os elementos contabilísticos” para uma outra empresa de contabilidade que aí identifica; a farmácia, e mais precisamente a ora requerente, tomou conhecimento, através da G1…, que o “G…” já havia regularizado nesse mesmo dia o valor do receituário, não para a conta habitual da farmácia (cujo NIB é e sempre foi o da Dr.ª B…), mas sim para uma outra conta do requerido e cabeça de casal (não referenciada), ficando pois a empresa sem meios para regularizar salários, impostos e “fornecimentos” aos seus credores; o requerido assumiu ou pretendeu assumir agora que não antes, a administração e a gestão da farmácia que por lei lhe é negada, já que é médico com consultório aberto ao público no concelho onde se sedia a farmácia aqui em causa, e portanto prescritor; esta situação coloca em perigo 4 postos de trabalho, a abertura do estabelecimento pelo menos após o final do corrente mês (altura em que se prevê que faltarão definitivamente medicamentos para venda), e até a sua futura sobrevivência/reabertura; a requerente comunicou o sucedido ao Infarmed (regulador/inspetor do setor), Ordem dos Médicos, e G1…/G…, (entidade esta que liquida mensalmente o valor do receituário entregue no SNS); com a alteração da senha fiscal pelo requerido que dá acesso ao portal das finanças, a requerente e o seu TOC estão impedidos, no imediato, de cumprir com todas as obrigações fiscais inerentes, mormente liquidação do IVA, envio do ficheiro Saft das facturas, apresentação de declaração de IRS etc… etc… etc..., e isto sem que se aborde todo o somatório sequencial danoso das coimas, juros que se seguirá; a requerente, à mingua da verba mensal do SNS, que por força do já antes descrito passou para as mãos do requerido (e não para a herança), viu-se impedida de pagar aos seus fornecedores (cujo pagamento ocorria de 20 em 20 dias, de molde a obter os descontos que propiciassem melhores margens de lucro); o maior fornecedor do estabelecimento/Farmácia H… era a K… (que substituiu a “L…“ em 2012); em face do acordado pagamento mensal (a 20 dias) que se mostra incumprido (a partir do mês de Fevereiro), cessou também e agora os fornecimentos diários de medicamentos já que o seu crédito global se cifrava em € 51.358,07 (se tudo isto não acontecesse tal crédito só seria de € 48.598,77, ou seja menos € 2.759,30 do que já se mostra reclamado judicialmente pela credora cooperativa), sendo que o requerido, pese embora alertado para a exigência de regularizar, esta e outras obrigações, nada entretanto fez; ao invés, o requerido vem detendo em conta própria (numa conta que abriu no M…, agência de … com o NIB …………………, todos os montantes até aqui pagos pelo G… e que somam pelo menos € 56.917,21; a requerente, pese embora todas os seus esforços e as porfiadas diligências encetadas nos últimos dois meses, nada mais poderá fazer para manter o estabelecimento aberto a partir do final do corrente mês de abril, e restabelecer o status quo ante, com a manutenção de pelo menos quatro postos de trabalho, pois que os salários já não poderão ser pagos no final deste mês; por força do desvio e sangria dos rendimentos da farmácia que neste momento somam mais de € 108.404,80 (€ 51.487,59 em 2013 e agora € 56.917,21), e esgotado o stock de medicamentos de que esta dispunha, não tem agora a requerente possibilidades financeiras para reabastecer o estabelecimento (até por corte de fornecimento), e consequentemente, não possui mercadoria para vender à sua clientela, até porque o G… está a “pagar” agora ao requerido o valor do receituário do SNS, e que seria mensalmente de largas dezenas de milhares de euros, mas, por força do ocorrido, e tal como de algum modo já atrás se documentou, será agora só de menos € 2.743,16, face à quebra na faturação (por perda de clientes e falta de medicamentos); a menos de 1,8 kms. de distância e na mesma localidade, existe uma outra Farmácia (“N…”) que como é óbvio “recolherá” entretanto toda a clientela da requerente.

    Proferiu-se despacho liminar indeferindo a dispensa de prévia audiência do requerido e ordenando a citação do requerido para, querendo, deduzir oposição.

    Efetuada a citação, C…, na qualidade de cabeça de casal das heranças abertas por óbito de D… e de E… deduziu oposição afirmando não ser possível a “inversão do contraditório” alegadamente requerida pela requerente, negou que a mesma seja propriedade da Farmácia H…, bem como a alegada doação verbal do mesmo estabelecimento e do imóvel onde se acha instalado o estabelecimento...

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