Acórdão nº 392/12.9T3OVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução28 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 392/12.9 T3OVR.P1 Recurso penal Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto: I - Relatório I - Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 392/12.9 T3OVR, corre termos pela 2.ª Secção Criminal (J3) da Instância Central da Comarca de Aveiro, B…, devidamente identificada nos autos, foi submetida a julgamento, por tribunal colectivo, acusada pelo Ministério Público da prática, em autoria material, de um crime de peculato previsto e punível pelos artigos 375.º, n.º 1, e 386.º, n.º 1, al. c), do Código Penal.

A Câmara dos Solicitadores requereu e foi admitida a intervir como assistente.

C… e D…, com os sinais dos autos, deduziram pedido de indemnização civil contra a arguida.

Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, após deliberação do Colectivo, foi proferido acórdão (fls. 418 e segs.), datado de 27.05.2015 e depositado na mesma data, com o seguinte dispositivo: “Por todo o exposto, acordam os Juízes que compõem este Tribunal Colectivo, julgar a acusação parcialmente procedente e, em consequência:

  1. Absolver a arguida B… dos factos da acusação que implicam a prática de um crime de peculato na forma consumada, p. e p. pelos art.ºs 375.º, n.º 1 e 386.º, n.º 1, al. c), do Código Penal, de que vinha acusada.

  2. Condenar a arguida B… pela prática de um crime de peculato na forma tentada, p. e p. pelos art.ºs 22.º, 23.º, 375.º, n.º 1 e 386.º, n.º 1, al. d), do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão, que se decide suspender na sua execução por igual período, ou seja, por 1 (um) ano e 8 (oito) meses, sob a condição de a arguida proceder ao pagamento aos demandantes D… e C…, durante o mesmo prazo e mediante junção do respetivo comprovativo ao processo, da quantia de € 3.000 (três mil euros), fixada a título de indemnização civil.

  3. Custas a cargo da arguida, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC’s.

  4. Julgar o pedido de indemnização civil parcialmente procedente, por parcialmente provado e, em consequência, condenar a arguida B… a pagar aos demandantes D… e C… a quantia de € 3.000 (três mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a data da presente decisão até efetivo e integral pagamento, indo a arguida absolvida do restante pedido.

  5. Custas cíveis a cargo dos demandantes e da arguida, na proporção do decaimento, sendo 27.000/30.000 para os primeiros e 3.000/30.000 para a segunda.

  6. Absolver os demandantes, D… e C…, do pedido de condenação como litigantes de má-fé contra si formulado pela arguida B….

  7. Custas pelo incidente, nos termos do art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil e art.º 7.º, n.º 4.º do Regulamento das Custas Processuais, que se fixa pelo mínimo legal.

  8. Absolver a arguida B… do pedido de condenação como litigante de má-fé contra si formulado pelos demandantes D… e C….

  9. Custas pelo incidente, nos termos do art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil e art.º 7.º, n.º 4.º do Regulamento das Custas Processuais, que se fixa pelo mínimo legal”.

    Inconformada, a arguida veio interpor recurso do acórdão condenatório para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação e, após convite para o efeito, apresentou “conclusões”, de que se transcreve aquelas que se nos afiguram relevantes: “3 - Está aqui em causa a quantia de € 25.021,66 transferida a 9 de setembro de 2011, às 22:55 horas para a conta AE da arguida, com o NIB …………………., pelo remitente D…, como se comprova pelo doc. nº 3 junto à participação criminal a fls. 10 do processo.

    4 - Tal valor decorre do exercício de uma remissão no âmbito de uma execução, perante o pedido de adjudicação do bem pelos exequentes, naquele preço, transferido após notificação da recorrente a 1 de setembro de 2011 em resposta ao pedido de remissão dos recorridos, como se comprova pelo doc. nº 2 junto à participação criminal a fls. 9 do processo.

    7 - Como se pode constatar pelo extrato junto aos autos pelo banco E… e que consta da fl. 164, tal quantia apenas ficou disponível em tal conta no primeiro dia útil a seguir à transferência, ou seja, dia 12.

    8 - Pergunta-se, como pode a mesma ter decidido apropriar-se da referida quantia se, antes da sua transferência e disponibilidade na conta, já se tinha ido denunciar à Câmara dos Solicitadores e sabia que as suas contas seriam de imediato bloqueadas? 10 - Se de facto fosse esse o seu intento, por exemplo, certamente que a recorrente não se iria denunciar antes dos € 25.021,66 ficarem disponibilizados na respetiva conta.

    11 - A afirmação do contrário, não é verdadeira nem factualmente sustentada, nem pode dar-se como provada, porque não só não existe qualquer facto ou elemento que prove tal versão como não houve qualquer intento da recorrente em apropriar-se daquela quantia, não engendrando plano "para não tornar tal vontade tão evidente".

    18 - Quem considerou que a notificação para pagamento das custas era errada, agiu conforme, judicial e processualmente previsto tendo visto a sua pretensão satisfeita. Senão, 19 - Teremos que assumir que os inúmeros erros e lapsos processuais, seja quem for o autor dos mesmos, comportam uma componente criminal, o que seria um absurdo. Sucede que, 20 - Segundo as declarações da recorrente, foram, de facto, interpelados os exequentes para que procedessem ao pagamento de tais custas tendo os mesmos referido que não o fariam porque teria havido uma remissão e, portanto, não queriam ficar minimamente prejudicados naquilo que tinham a receber do produto da venda, cabendo tal pagamento aos remitentes (atente-se ao doc. de fls. 11 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos e no depoimento da arguida que consta da gravação de 16/03/2015, com início às 11:48, minutos 00:08:26 a 00:09:10 e 00:12:10 a 00:12:45).

    22 - É conclusiva, abusiva e irreal sem qualquer base documental, testemunhal ou factual que a sustente, subvertendo o princípio da inocência da arguida até prova em contrário, cujo ónus é do Tribunal. Por outro lado e consequentemente, 23 - Não se vê como é que saiu provado que os exequentes não haviam transmitido tais instruções. Ora, 24 - A notificação dos remitentes para que realizassem tal pagamento, embora se possa considerar errada, não encerra em si qualquer matéria criminal.

    31 - A recorrente não pretendia apropriar-se de uma quantia que não era sua, quando acontece justamente o contrário - a quantia era-lhe devida e legalmente regulada, sendo da competência e responsabilidade da mesma solicitar o mesmo (embora por lapso) o reflexo desse pagamento, naquele processo de execução. Pelo que, 32 - Deste ponto 7 dos factos dados como provados, só a primeira parte do mesmo, em que se refere o envio do email é que está sustentada e se deve manter.

    33 - No dia 9 de setembro de 2011, a recorrente dirigiu-se à Câmara dos Solicitadores para confessar o cometimento de ilícito criminal o que resultou no imediato bloqueio preventivo das suas contas e em consequente procedimento disciplinar. Mais, 34 - A 12 de setembro seguinte, a recorrente foi chamada para prestar declarações por escrito no Conselho Regional do Norte, e no dia 15 imediato as suas contas foram bloqueadas oficialmente (nas operações a débito) e determinada a sua suspensão preventiva (tudo num espaço de 6 – seis – dias).

    36 - Se numa situação normal, a emissão de um título de transmissão de propriedade e respetiva regularização do processo de execução poderá demorar, em média, entre 15 a 30 dias.

    37 - No caso em apreço - relembra-se que o montante da remição foi transferido a 9 de setembro, com data-valor de 12 seguinte e a recorrente foi suspensa a 15 de setembro -, como é que, em 2 (dois) dias, poderia, ou melhor, deveria a recorrente, de entre centenas de processos e com os problemas que a preocupavam, ter emitido esse título? 38 - É totalmente infundado e destituído de sentido a afirmação produzida pelo Tribunal "a quo" que a recorrente se recusou a emitir o título de transmissão, muito menos a devolver a quantia correspondente ao valor remitido aos exequentes. Ainda, 39 - Mais infundada e contraditória é a afirmação de que tal quantia "acabou por ser depositada na sua conta da Sucursal do E… sita na Av. …, nº …, em Lisboa", quando se comprovou perante os autos que a referida conta, onde os € 25.021,66 foram depositados é a de execução e foi bloqueada, preventivamente, a partir do dia 9 e, pelo menos desde tal dia, a mesma não conheceu quaisquer débitos ou transferências. Ou seja, 40 - Tal valor permaneceu e permanece na conta de execução em causa desde tal altura à responsabilidade e gestão da Câmara dos Solicitadores. Por tudo isto, 43 - A 17 de outubro o seu escritório foi fechado, sendo alvo de arresto naquele mesmo mês (…). Mais uma vez, pergunta-se, 44 - Como poderá ter-se recusado a recorrente a prestar esclarecimentos ou a responder a quaisquer notificações que lhe foram feitas se o seu escritório, já estava encerrado há pelo menos 4 meses e aquela se encontrava suspensa do exercício da sua profissão? 50 - A mera menção ou remissão para conceitos genéricos como o das regras do normal acontecer, são destituídos de qualquer sentido ou significado jurídico funcionando como cosmética de justificação. Por tudo isto, 51 - Também o facto dado como provado no ponto 9 não é verdadeiro, sendo, por isso, errada a afirmação de que "recusou-se sempre a arguida a prestar qualquer esclarecimento, ou a responder o que quer que fosse".

    53 - Pela simples e mera análise do extrato junto pelo Banco E… a fls 161 a 174, não há movimentos a débito naquela conta já desde antes da transferência dos remitentes.

    55 - Por tais motivos e remetendo para o exposto em sede de impugnação do facto dado como provado no ponto 6, também o ponto 10 não pode ser tido dado como provado.

    57 - Quanto à afirmação na motivação da douta sentença recorrida, de que a recorrente já...

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