Acórdão nº 482/17.1T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Abril de 2018
Magistrado Responsável | ANA PAULA AMORIM |
Data da Resolução | 23 de Abril de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Divórcio-482/17.1T8VNG.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo de Família e Menores de Vila Nova de Gaia - Juiz 1 Proc. 482/17.1T8VNG*Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim Juízes Desembargadores Adjuntos: Manuel Fernandes Miguel Baldaia de Morais*Acordam neste Tribunal da Relação do Porto[1] ( 5ª secção judicial – 3ª Secção Cível )I. RelatórioNa presente ação declarativa de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge, em que figuram como: - AUTOR: B…, residente na Rua …, nº .., …, Vila Nova de Gaia; e - RÉ: C…, residente na Rua …, nº .., …, Vila Nova de Gaia pede o autor que se decrete o divórcio e dissolução do casamento celebrado com a ré.
Alega para o efeito e em síntese, que as relações entre o casal deterioraram-se desde há 5 anos, pioram há cerca de 3, e desde 4 de janeiro de 2015 que não há comunhão de vida entre o casal e apesar de residirem na mesma casa, quando o autor se encontra em Portugal, dormem em quartos separados, não mantêm relações sexuais, não partilham as refeições, não se acompanham, não visitam os amigos, nem partilham as despesas e o A. não pretende restabelecer a vida em comum.
*Designou-se data para a realização da tentativa de conciliação nos termos dos artºs. 1779º do C.C. e 931º do C.P.C., com notificação do autor e citação da ré.
*Realizou-se a tentativa de conciliação, nos termos dos artºs. 1779º do C.C. e 931º do C.P.C, sem que se tivesse alcançado a conciliação entre os cônjuges ou a conversão do divórcio em mútuo consentimento, manifestando a ré o propósito de não se divorciar.
*Notificada a ré para contestar, não apresentou contestação.
*Elaborou-se o despacho saneador e proferiu-se despacho com indicação do objeto do litígio e dos temas de prova.
*Realizou-se o julgamento, com gravação da prova.
*Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve: “Pelo exposto, julgo a presente ação procedente, e em consequência decreto o divórcio entre B… e C….
Custas pela R.”.
*A Ré veio interpor recurso da sentença.
*Nas alegações que apresentou a apelante formulou as seguintes conclusões: 1. – A presente ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge não foi contestada.
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– Nesta ação discutem-se direitos indisponíveis, razão pela qual não é suscetível a eventual confissão de factos, pela não apresentação de contestação.
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– Não foi feita qualquer prova, nem testemunhal nem documental, para além de que “A. e R. contraíram casamento católico a 8 de agosto de 1982.” 4. – O tribunal a quo considerou como provados os seguintes factos: “Desde 2005 que o A. se encontra emigrado, a trabalhar, primeiro em Espanha e depois em França.” “Quando o A. vem a Portugal, volta para a casa de morada de família.” “Pelo menos desde 2015 que A. E R. não dormem juntos ou têm relações sexuais, não comem juntos em casa, a R. não o acompanha nem o convida para a acompanhar, não tomam decisões em conjunto, a R. não lhe telefona para França, e chegou a ir a França e não procurou ou visitou a A.” Resultou tal prova, exclusivamente da confirmação pelo Autor, em declarações de parte, dos factos que tinha narrado na Petição Inicial, nos artigos 4º, 5º, 7º, 8º, 9º, 11º, e 12º através do seu mandatário.
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– No requerimento para declarações de parte do Autor não foram indicados os factos em que o Autor interveio pessoalmente ou que tivesse conhecimento. Razão pela qual o Autor respondeu a toda a matéria. Isto é, o Autor limitou-se a repetir o que já era do conhecimento do Tribunal.
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– A declaração de parte não está prevista para exercer a função de “Testemunha de Parte”. Razão pela qual o tribunal apenas poderia considerar como provado que Autor e Ré contraíram casamento católico a 8 de Agosto de 1982, por estar documentalmente provado.
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– Não podia o Tribunal a quo, valorar, como valorou, a prova por declarações de parte do Autor suficiente para fazer proceder a ação, sem qualquer outra prova complementar, sem desvirtuar o ónus probatório.
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– As declarações de parte, instituídas pelo novo CPC, não têm a mesma força probatória que os restantes meios de prova, como já foi decidido em acórdão por este Tribunal da Relação do Porto de 15/09/2014 (Proc. 216/11.4TVBRG.P1), que aqui se reproduz: “No presente acórdão o TRP entendeu que as declarações de parte, instituídas pelo novo CPC, não têm a mesma força probatória que os restantes meios de prova. Apesar de ter decidido em total concordância com a decisão da primeira instância, que reputou por incongruentes as declarações da parte em causa, o TRP em jeito de comentário final, considerou que este meio de prova produz “declarações interessadas, parciais e não isentas, em que quem as produz tem manifesto interesse na ação.” Segundo este tribunal “seria de todo insensato que sem mais, nomeadamente, sem o auxilio de outros meios probatórios, sejam eles documentais ou testemunhais, o tribunal desse como provados os factos pela própria parte alegados e por ela, tão só, admitidos” (…), “sob pena de se desvirtuar na totalidade o ónus probatório e que as ações de decidam apenas com as declarações das próprias partes”.
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– O tribunal a quo, com a sua decisão, considerando provados os factos alegados pelo Autor apenas com a prova de declarações de parte do Autor desacompanhado de quaisquer outros meios probatórios, documentais ou testemunhais, violou, o disposto nos artigos 342º, nº 1 do Código Civil e 466º, nº 3 do CPC.
Termina por pedir a revogação da sentença e a sua substituição por outra que considere a ação improcedente por não provada.
*O Autor veio responder ao recurso, formulando as seguintes conclusões: 1 - O nosso sistema jurídico está todo ele alicerçado na procura pela da verdade material, bem como no direito à prova.
2 - O novo CPC prevê a possibilidade de prestarem declarações em audiência as próprias partes.
3 - As partes têm o dever de colaborar com o tribunal para a descoberta da verdade (art 417 CPC).
4 - Nada obsta quer no código civil, quer no código de processo civil que seja requerido, e ouvida a parte, em ações que versem sobre direitos indisponíveis, e embora não se admita a confissão de factos relativamente a direitos indisponíveis, poderá admitir-se sobre eles o depoimento de parte que ficará sujeito a livre apreciação do juiz.
5 - Tratando-se, como se trata nos presentes autos, de ação de divórcio, parte dos factos passaram-se na esfera privada de apelante e apelado.
6 - Parte desses factos foram apenas presenciados e vividos pelas partes, e que pela sua natureza torna-se inviável outra prova.
7 - Sem qualquer desprimor pelos restantes meios de prova – além de caber à parte demonstrar o seu propósito de não restabelecer a vida em comum, intenção interior de pelo menos um deles de não restabelecer a vida matrimonial, as declarações de parte, por serem único meio de prova, devem ser merecedoras da maior consideração por parte do decisor.
8 - As declarações de parte tornam-se fundamentais à descoberta da verdade material, as quais são livremente valoradas pelo juiz, na parte em que não representem confissão, e neste domínio integram um verdadeiros testemunho de parte.
9 - E, nestes casos, a prova deve ser valorada tal como uma verdadeira prova testemunhal, não podendo ser degradada antecipadamente com fundamento no facto de provir da parte.
10 - Declarações essas que devem ser valorizadas pelo reforço do princípio da imediação e da livre avaliação da prova.
11 - Nada obsta a que as declarações de parte constituam a única fonte de prova, sem concorrência de qualquer outro para dar o facto como provado tendo em conta a natureza do processo aqui em apreciação, e dos factos se terem passado na esfera privada das partes.
12 - As declarações de parte podem por si, estribar a convicção do juiz de forma autossuficiente, assumindo um valor probatório autónomo. Pelo que; 13 - A douta sentença recorrida aplicou corretamente a Lei aos factos, não merecendo qualquer censura.
Termina por considerar que deve improceder o recurso, mantendo-se a...
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