Acórdão nº 24471/16.4T8PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelRUI MOREIRA
Data da Resolução11 de Abril de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

PROC. N.º 24471/16.4T8PRT.P1Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo Local Cível do Porto - Juiz 6 REL. N.º 491 Relator: Rui Moreira Adjuntos: Lina Castro Baptista Fernando Samões*ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: 1 – RELATÓRIO (onde se transcreve o relatório constante da sentença, por descrever perfeitamente a situação sub judice) B..., solteiro, com residência na Rua ... n.º ..., Hab. ..., no Porto, intentou contra C... e D..., residentes na Rua ... n.º ..., Hab. ..., no Porto, a presente acção comum, peticionando que se declare ilegal a utilização para estabelecimento de alojamento local que é dada pelos Réus à fracção designada pela letra “C”, a condenação dos Réus a cessar imediatamente a utilização que de tal fracção fazem e a reintegrá-la no seu destino especifico de habitação, bem como no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no valor de €150,00 por dia, contados desde a data do trânsito em julgado até à efectiva cessação da actividade de alojamento local.

Para tanto, e em síntese, alega que Autor e Réu são proprietários, cada um por si, de uma fracção autónoma integrada num edifício constituído em propriedade horizontal, que identifica, ambas destinadas, nos termos do título constitutivo da propriedade horizontal, a habitação.

Contudo, o Réu em Março de 2016 começou a prestar serviços de alojamento temporário a turistas na fracção de que é proprietário, tendo sido a Ré que procedeu ao competente registo da actividade junto da Câmara Municipal, sem que obtivesse o consentimento dos demais condóminos, que aliás se opõem a tal situação, até porque passou o edifício a ser frequentado por pessoas desconhecidas, aumentando a insegurança, o risco de perturbação ao descanso e um uso mais intenso das partes comuns.

Juntou documentos.

Citados os Réus vieram estes, a fls. 45, contestar para, no essencial, se defenderem por impugnação.

Aceitaram que são prestados serviços de alojamento temporário a turistas na fracção, já que o Autor reside no estrangeiro e alegaram que tal cedência não exorbita o fim habitacional da mesma. Alegaram ainda que como utilizadores do edifício, têm as pessoas a quem cede a habitação o direito a aparcar o veículo na garagem.

Mais alegam que a vingar a tese do Autor estar-lhe-iam a ser coarctados os poderes que como proprietário têm sobre o imóvel, tanto mais que nem todas as fracções se destinam a habitação.

Juntou um documento.

Por despacho proferido a fls. 68, e com fundamento na preterição de litisconsórcio necessário, foi o Autor convidado a fazer intervir nos autos os demais condóminos, o que este fez a fls. 78.

Admitida a intervenção, foi ordenada a citação dos Chamados, que se concretizou, sem outra consequência processual.

O processo foi saneado e, por ter sido considerado que a questão a decidir o era meramente de direito, foi proferida sentença. Nesta, a acção foi julgada totalmente procedente, fixando-se o seguinte dispositivo: “a) Declarar ilegal a utilização para estabelecimento de alojamento local que é dada pelos Réus à fracção autónoma designada pela letra “C”; b) Condenar os Réus a cessar imediatamente a utilização que fazem da fracção “C” e reintegrá-la no seu destino específico de habitação; c) Condenar os Réus no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no valor diário de €150,00, desde a data do trânsito em julgado da presente decisão e até efectiva cessação da actividade de alojamento local.

*É contra tal decisão condenatória que os réus deduzem o recurso sob apreciação, que terminam formulando as seguintes conclusões: 1. não foram alegados na PI factos demonstrativos de alguma perturbação ou incomodidade ao A ou aos demais condóminos pela afectação da fracção do R ao alojamento local, 2. pelo que o Mmo. a quo não poderia dar como provado o facto 11; 3. se era relevante, para a boa decisão da causa, apurar o eventual prejuízo decorrente da actividade de alojamento local, o Tribunal a quo teria de convidar o A. a aperfeiçoar a PI, nos termos do art.º 590º, nº 2, alínea b), e nºs 3 e 4, do CPC, o que não fez; 4. o Tribunal a quo deu como adquirido que a fracção “C” passou a ser utilizada, a partir de Março de 2016, exclusivamente para alojamento local, quando a mesma é utilizada também para habitação do R nos períodos em que se encontra em Portugal; 5. tais factos foram alegados pelos RR na contestação e apresentado requerimento de prova, designadamente testemunhal, pelo que se impunha ao Tribunal a realização da audiência de julgamento, 6. e não resumir o objecto dos autos a uma mera questão de direito; 7. por este motivo, deverá substituir-se a sentença proferida por outra que ordene a realização da audiência de julgamento; 8. o alojamento local não é uma realidade nova surgida em Portugal com o DL 128/2014, de 29/8; 9. desde há muito tempo que se disponibilizam habitações para acolher temporariamente outras pessoas, designadamente em períodos de férias nas zonas costeiras do país, principalmente no Algarve; 10. a cedência de habitações, não se resume apenas a situações de férias, mas igualmente a estudantes e alguns profissionais que se deslocam com frequência, como é o caso dos professores; 11. mais recentemente surgiram as residências abertas ou “casas de artistas”, que acolhem temporariamente pessoas de uma determinada área cultural ou cientifica para partilhar experiencias artísticas, intelectuais ou simplesmente dispor de um local para pensar ou criar; 12. a internet e a proliferação de plataformas digitais e redes sociais fomentou outras formas de partilha de habitação; 13. a solução de muitos jovens independentes, que não têm possibilidade de arrendar ou comprar, passa por partilhar uma casa; 14. a troca ou partilha de casas, vulgarmente designado de “house sitting”, revolucionou a forma de viajar, permitindo a troca de favores entre donos de casas e viajantes e veio dar resposta a quem procura um lugar em que se sinta em casa durante as viagens; 15. em todas as situações descritas, a casa (quer seja moradia independente ou fracção autónoma), não perde a sua virtualidade de habitação; 16. não é pelo facto da habitação ser cedida, total ou parcialmente, onerosa ou gratuitamente, por determinado período, com ou sem inclusão de serviços de apoio, que altera a sua finalidade principal que é a de proporcionar habitação; 17. o facto de serem prestados serviços de apoio à habitação, como a confecção e o fornecimento de refeições, não são bastantes para caracterizar a actividade de alojamento local como prestação de serviços; 18. o legislador, no art.º 1028 do CC, prevê a pluralidade de fins na coisa locada, estabelecendo no seu nº 3 que, se um dos fins for principal e os outros subordinados, prevalecerá o fim principal; 19. em todos os casos supra descritos, como na situação dos autos, é incontornável que a utilização principal dada ao imóvel é a habitação, quer seja do proprietário quer dos terceiros a quem proporciona alojamento; 20. o DL 128/2014, de 29/8 visou assegurar o mínimo de condições de habitabilidade e segurança das casas cedidas para alojamento e evitar a evasão fiscal; 21. o referido diploma consagrou expressamente que o alojamento local se distingue dos empreendimentos turísticos (art.º 2, nº 2) e reconheceu que é uma actividade desenvolvida em imoveis tradicionalmente afectos à habitação (art.º 3º), razão pela qual o uso habitacional (edifícios de habitação unifamiliar e multifamiliar) é o uso específico para inscrição de um imóvel no alojamento local; 22. desde sempre foi permitido ao arrendatário instalar pequenas indústrias domésticas, ainda que tributadas, e hospedar até três pessoas em sua casa, entendendo-se como hóspede a pessoa a quem o arrendatário proporcione habitação e preste habitualmente serviços relacionados com esta ou forneça alimentos mediante retribuição (cfr. art.ºs 1092 e1093, ambos do CC); 23. pelo que esta realidade, consagrada pelo legislador, pelo menos, desde a entrada em vigor do DL 47344, de 25/11/1966, que aprovou o CC (art.ºs 1108 e 1109), em nada difere do alojamento local; 24. para acautelar a sua tranquilidade e segurança, as pessoas que habitam em propriedade horizontal podem lançar mão dos regulamentos do condomínio e demais legislação em vigor, designadamente a...

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