Acórdão nº 14407/13.0TDPRT-E.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 31 de Janeiro de 2018
Magistrado Responsável | LU |
Data da Resolução | 31 de Janeiro de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº 14407/13.0TDPRT-E.P1 Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I. RELATÓRIO 1. No Processo Comum (Colectivo) nº 14407/13.0TDPRT (do Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Central Criminal do Porto – Juiz 3) de que os presentes autos constituem apenso, realizado o julgamento, foi proferido acórdão, em 21 de Novembro de 2017, ainda não transitado em julgado, que condenou o arguido B..., com os sinais dos autos, pela prática de um crime de corrupção passiva agravado, p. e p. pelos artigos 373°, nº 1 e 374°- A, nº 2 e 3 do Código Penal, e de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelos artigos 255°, al. a) e 256°, n° 1, d) e n° 4 do Código Penal, na pena única de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão, assim como pena acessória de proibição do exercício de funções como Engenheiro Civil para entidades públicas ou similares, pelo período de 5 (cinco) anos.
Nesse mesmo acórdão, logo após o respectivo dispositivo, foi ainda decidido, ao abrigo do disposto no artigo 213.º, n.º 1, b) do Código de Processo Penal, proceder à substituição da medida coactiva de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica a que o arguido estava sujeito pela medida de prisão preventiva.
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Inconformado com esta alteração da medida de coacção, este arguido interpôs recurso, finalizando a respectiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): “1. No âmbito dos presentes autos foi o Recorrente condenado pela prática em concurso real de um crime de corrupção passiva qualificado e um de falsificação de documento na pena única de oito anos e seis meses de prisão efectiva.
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Após a leitura do acórdão, o doutro Tribunal a quo proferiu despacho no qual se pronunciou sobre a medida de coacção aplicada ao arguido - obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica - tendo-a revogado e decretado a prisão preventiva do mesmo com imediata condução ao EP do Porto, sendo que é deste despacho que ora se recorre.
3 - O despacho recorrido assentou, única e exclusivamente, na alegada existência de perigo de fuga (alínea a) do art.º 204° Cód. Proc. Penal), tendo expressamente afastado a verificação das circunstâncias alegadas nas restantes alíneas da citada normal legal.
4- Para fundamentar a verificação in casu do alegado perigo de fuga, o tribunal a quo avançou com a seguinte factualidade e conclusões: 1- Personalidade avessa ao Direito traduzida na incapacidade do arguido se auto-censurar pelo mal praticado; 2- Alegada ausência de arrependimento por parte do arguido (não obstante o ter afirmado e verbalizado durante a audiência de discussão e julgamento); 3- Expectativa do tribunal recorrido que o arguido não acate a pena aplicada como justa e adequada (ilação conclusiva); 4- Existência de um concreto perigo de fuga porquanto a fuga não ocorreu; 5- À data da elaboração do relatório social, o conjugue do arguido, com quem este vive, encontra-se reformado; 6- Presunção que a filha do arguido viva na Suíça, porquanto à data da elaboração do relatório social a mesma ali trabalhava; 7- Detenção de contas bancárias no Brasil; 8- Disponibilidade de meios de fortuna, além dos que se encontram apreendidos; 9- A ilação conclusiva que dispõe de contactos privilegiados no Brasil; conhece o modo de agir no meio negocial e burocrático (obtenção de CPV); 10- O facto de Portugal se situar no espaço Schengen e deste o arguido alegadamente se poder deslocar para qualquer ponto do Mundo; 5. A matéria alegada; não acrescenta, quer em termos factuais e circunstanciais quer de direito; qualquer novidade aos substratos tácticos que eram conhecidos nos autos desde a detenção do arguido em 14 de Janeiro de 2016 e que estiveram na base das várias reapreciações das medidas de coacção aplicadas que ocorreram na pendência do processo todas unânimes na manutenção da OPH com VE.
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Aquando da promoção promovida pelo MP em 15/01/2016, despacho subsequente de decretamento da medida de coacção do mesmo dia e subsequente despacho de 03/0212016, que determinaram a aplicação de medida coactiva de OPH com VE valoradas as mesmas circunstâncias, que se mantiveram inalteradas desde aí até à prolação do despacho recorrido.
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A questão que se coloca no presente recurso é se, entre 14/09/2017 - data do último despacho de reapreciação das medidas cautelares (ref. 384749666) - e 21/11/2017 com a prolação do acórdão condenatório; sobreveio alguma circunstância justificativa bastante para se decretar a alteração da medida coactiva aplicada ao arguido que, subânhe-se, era já detentiva da liberdade circulatória do mesmo.
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Nenhuma circunstância ocorreu que justifique o agravamento da medida aplicada [e sucessivamente revista e mantida ao longo de 22 meses], em sentido claramente antagónico ao doutrinal e jurisprudencialmente defendido princípio do rebus sic stantibus.
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A alegada ausência de arrependimento pela qual o tribunal a quo concluiu [sem prescindir; e sublinhe-se, o arguido o ter expressado durante a audiência de discussão e julgamento], não é circunstância a ponderar na medida de coacção a aplicar; antes sim, é uma circunstância que o julgador deve ter em conta na escolha e determinação da medida da pena a aplicar - o que o tribunal a quo inclusive fez de forma determinante no acórdão condenatório.
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A alegada ausência de arrependimento apenas se poderá subsumir à já imputada personalidade avessa ao direito e insensibilidade para com os valores ético-jurídicos vigentes em sociedade do arguido e não à alegada existência de perigo de fuga, até porque estes elementos foram sucessivamente valorados ao logo dos últimos 22 meses e sempre justificaram a manutenção da medida de coacção até aí aplicada.
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A alegada incapacidade de auto-censura por parte do arguido já havia sido referida no Relatório Social enviado para o tribunal a quo a 14 de Junho de 2017, o que não impediu o tribunal a quo de manter a medida de coacção de OPH com VE por despacho de: 14/09/20017, aquando da reapreciação da mesma.
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O recorrente nunca faltou a nenhum acto para o qual foi convocado, qual seja em inquérito ou em julgamento, sequer na leitura do acórdão, tendo-se deslocado sempre para o efeito sozinho, em viatura própria e desacompanhado de quaisquer elementos policiais.
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Durante todo o período em que permaneceu em OPH com VE nunca houve registo de qualquer incidente, tendo inclusive o arguido obtido autorização para passar o Natal em local distinto da sua habitação, o que fez mais uma vez em viatura própria e sem acompanhamento de quaisquer autoridades policiais.
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Ao contrário do que consta do Douto Acórdão - do qual o arguido interporá recurso - o arguido confessou os crimes pelos quais veio a ser acusado já em fase de inquérito, o que reiterou em julgamento, pelo que sabia, e sempre teve consciência, que a sua confissão levaria a que o tribunal o condenasse pela prática dos crimes pelos quais se encontrava acusado, não desconhecendo a natureza e moldura penal subjacente aos mesmos.
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Mesmo após a comunicação de factos não substanciais ao arguido, qual resultava inequivocamente que o acórdão a proferir seria condenatório, até porque todos os factos então comunicados eram circunstanciadores de um agravamento da conduta imputada (e confessada) pelo mesmo, o arguido compareceu na leitura do acórdão.
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Se este mesmo arguido optou por se dirigir - pelos seus próprios meios e sem qualquer controlo policial - ao tribunal a quo para estar presente na leitura do acórdão que sabia obrigatoriamente ser condenatório e que atentas as molduras penais em causa que obrigatoriamente teria de passar por uma pena de prisão (sendo a efectividade da mesma um cenário necessariamente latente), isso só pode significar que o mesmo nunca equacionou furtar-se à acção da justiça e consequentemente à execução e cumprimento da pena que lhe viesse a ser aplicada.
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As circunstâncias familiares do arguido são idênticas às do início do processo, tendo inclusive a filha do arguido regressado a Portugal e mesmo que assim não fosse. Não é o facto de se ter um familiar num outro país que facilita - mais ou menos - a fuga duma pessoa. Nos dias de hoje a mobilidade é sempre fácil e facilitada para quem, de facto, se quiser mover.
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A verdade é que os autos demonstram, no que ao arguido respeita, precisamente que o não se pretendeu ausentar da sua área de residência ou não respeitar o que lhe foi, judicialmente, imposto, pelo que não pode o tribunal concluir que os circunstancialismos familiares do arguido não podem - seguramente - obstar a que o arguido inicie um processo de fuga, impondo-se uma conclusão precisamente contrária.
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Os recursos financeiros que o recorrente detém actualmente são os mesmos que detinha, após o decretamento do arresto dos seus bens - que se mantém -, pelo que, no que aos meios de fortuna diz respeito, também nenhuma alteração se verificou que justifique o agravamento da medida de coacção aplicada ao arguido no momento da prolação do acórdão, inclusive aos detidos no Brasil.
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O arguido não dispõe de conhecimentos privilegiados no Brasil, e o C.P.F. - Cadastro de Pessoas Físicas estrangeiras no Brasil - que é obtido por um qualquer cidadão português junto da embaixada do Brasil - sem necessidade de quaisquer conhecimentos e/ou contactos privilegiados naquele país e sem necessidade de lá se...
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