Acórdão nº 736/11.0TTPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelRUI PENHA
Data da Resolução24 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 736/11.0TTPRT-A.P1 I. RelatórioB…, residente na Rua …, …, Porto, patrocinado por mandatário judicial, veio intentar a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra C…, S.A., com sede na Av. …, …, Porto.

Pede que a ré seja condenada a pagar-lhe: a) 1.424,06€ de diferenças salariais de 2010/2011; b) 14.865,12 de diferenças da retribuição da IHT; c) 1.617,14€ de cortes salariais em 2011; d) 300€ do valor remuneratório do uso da viatura em falta; e) 3.250,78€ de retribuições retiradas pela Ré em Abril de 2011; f) 15.957,60€ de indemnização da resolução com justa causa; g) os juros moratórios à taxa legal, a contar desde o vencimento de cada prestação retributiva em mora e desde a citação quanto à indemnização.

Alega, em síntese: No dia 01 de Agosto de 2007, foi admitido ao serviço da Ré e, sob as ordens e autoridade desta, aí prestou a sua actividade de advogado até 19 de Abril de 2011; Na data da admissão, a Ré incluiu o A. no grupo I e nível 12 do ACT, enquadramento que manteve até à cessação do contrato; Por cláusula escrita no contrato de trabalho, a Ré obrigou-se a contar “para todos os efeitos” de antiguidade o tempo de serviço prestado pelo A. ao D…, “desde 10 de Abril de 1989 até 29 de Setembro de 1992”; a Ré sempre pagou ao A. a retribuição (salário base, diuturnidade, subsídio de alimentação, isenção do horário do trabalho...) pelos valores retributivos acordados para as instituições de crédito abrangidas pelo ACT citado; Por declaração escrita endereçada e entregue ao A. com a mesma data da admissão, a Ré, juntamente com o mais que constava do contrato escrito e assinado entre ambas as partes, confirmou, como tinha sido acordado, que “ser-lhe-á concedida uma remuneração complementar no montante de €535,00”; Por isso, o verdadeiro salário base acordado e praticado foi o do nível 12, com as actualizações do ACT, sempre acrescido de 535€; Por outra declaração escrita endereçada e entregue ao A. aquando da celebração do contrato, a Ré, conforme o acordado, confirmou que concederia ao A. a “isenção total de horário de trabalho”, “no quadro do Acordo Colectivo de Trabalho Vertical (ACTV)”; Aquando da admissão, foi também acordado que a Ré proporcionava ao A. um ligeiro de passageiros para seu uso exclusivo, quer fosse na actividade profissional, quer fosse na sua vida privada, 24 horas por dia, feriados, folgas semanais, férias e qualquer outra ausência ao serviço, suportando a Ré todos os encargos de manutenção, combustível, seguros e impostos; Conforme o acordado, a Ré pagava mensalmente ao A. um complemento correspondente aos encargos deste com a inscrição na Ordem dos Advogados (quota mensal) e na Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores; Desde Janeiro de 2009 e até à cessação do contrato, a Ré pagava ao A. uma retribuição mensal com os seguintes valores: a) o salário base mensal – 1.584,99€ + 585€; b) uma diuturnidade – 40,40€; c) subsídio de alimentação (valor médio mensal) – 196,68€; d) isenção de horário de trabalho – 754,67€; e) “subsídio infantil ACTV” – 24,82€; f) “quotas CPAS/OA” – 202,40€; Acrescia ainda um “subsídio de estudo descendentes”, trimestral, no valor de 58,86€; Em 2010 e 2011, a Ré continuou a pagar a retribuição especificada não a actualizando em conformidade com a nova tabela praticada em todas as outras instituições bancárias abrangidas pelo ACT, com efeitos a partir de Janeiro de 2010; Ou seja, a Ré deixou de pagar ao A. (por cada mês, com excepção de f): a) o salário base mensal – 15,85€; b) uma diuturnidade – 0,40€; c) subsídio de alimentação (valor médio mensal) – 47,96€; d) isenção de horário de trabalho – 18,96€; e) “subsídio infantil ACTV” – 0,25€; f) “subsídio de estudo descendentes”, trimestral – 0,59€; no dia 28.03.2011, a R., inesperadamente, ordenou ao A. que entregasse a “referida viatura e respectivos documentos e acessórios”; O A. sentiu-se desprezado, desconsiderado, chocado, humilhado e frustrado com os descritos comportamentos da Ré; Perdeu toda a motivação para se manter no exercício das funções na Ré; Ficou sem rendimentos para manter os encargos assumidos e as despesas do seu agregado familiar, em conformidade com o seu estatuto social; Os comportamentos da Ré e o ambiente por eles gerados tornaram insustentável, de modo imediato e prático, a manutenção do contrato de trabalho do A.; A Ré quebrou irremediavelmente a confiança que levou o A. a estabelecer o contrato de trabalho, ferindo de morte o seu projecto de realização profissional e pessoal ao serviço da Ré; Por tudo isso, o A., através de carta datada de 18-04-2011, comunicou à Ré a sua decisão de fazer terminar de imediato o seu contrato individual de trabalho com justa causa.

Regularmente citada a ré, realizou-se audiência de partes, não se logrando a conciliação das mesmas.

A ré veio contestar, impugnando o alegado pela autor, que o autor foi admitido para desempenhar funções como gestor de clientes, não integrando a remuneração complementar o salário base, que a viatura era para ser usada apenas em deslocações de trabalho, que a redução salarial resultou das normas da Lei do Orçamento (Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro), face à nacionalização da ré, altura em que igualmente alterou a política de atribuição de viaturas.

Foi proferido despacho saneador, que transitou em julgado, foi dispensada a realização de audiência preliminar e a fixação da matéria de facto assente e controvertida, mais se decidindo: “No processo nº 736/11.0TTPRT, pendente neste Juízo e secção, intentado contra o C…, os Sindicatos dos Bancários do Norte, Centro, Sul e Ilhas pedem, a título principal, o reconhecimento da inconstitucionalidade da referida Lei do Orçamento do Estado, a plena aplicabilidade da totalidade das cláusulas da ACT incluindo as de expressão pecuniária que deixou de cumprir desde 01 de Janeiro de 2011 aos trabalhadores. Por conseguinte, a questão da inconstitucionalidade do referido diploma legal e consequentes reduções das retribuições dos trabalhadores do Réu constitui o cerne dos litígios destes processos e implica a interpretação e aplicação das mesmas normas jurídicas. Pelo exposto, decide-se apensar à presente acção a mencionada acção nº 736/11.0TTPRT, sendo ambas julgadas na data designada nesta última— dia 16 de Abril, às 14 horas.” Foi fixado à acção o valor de €37.414,70.

Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, tendo ambas as partes prescindido da produção da prova.

Foi proferida sentença, que decidiu a final: “ao abrigo do artigo 204º da CRP recusa-se a aplicação do artigo 19º da Lei nº 55-A/2010 de 31.12 (publicada no D.R., I série, nº 253) e, nesta conformidade, julga-se a acção totalmente procedente, e em consequência, condena-se o Réu a pagar ao Autor: - 1.424,06€ de diferenças salariais de 2010/2011; - 14.865,12 de diferenças da retribuição da IHT; - 1.617,14€ de cortes salariais em 2011; - 300€ do valor remuneratório do uso da viatura em falta; - 3.250,78€ de retribuições retiradas pela Ré em Abril de 2011; - 15.957,60€ de indemnização da resolução com justa causa; - os juros moratórios à taxa legal, a contar desde o vencimento de cada prestação retributiva em mora e desde a citação quanto à indemnização.” Desta sentença interpôs o Ministério Público recurso obrigatório para o Tribunal Constitucional, tendo sido proferido acórdão, de fls. 416 a 436, no qual se decidiu: “a) não julgar inconstitucional a norma do artigo 19º da Lei nº 55-A/2010, de 31 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2011; e, em consequência, b) conceder provimento ao recurso, ordenando-se a reforma da decisão recorrida em conformidade com o precedente juízo de não inconstitucionalidade.” Em cumprimento de tal acórdão foi elaborada nova sentença, tendo a final sido proferida a seguinte decisão: “julga-se a ação parcialmente procedente e, em consequência, vai a Ré condenada a pagar ao Autor: a) €300,00 do valor remuneratório do uso da viatura em falta; b) €3,250,78 de retribuições retiradas pela Ré em abril de 2011; c) €15.957,60 de indemnização pela resolução do contrato com justa causa; d) nos juros moratórios à taxa legal, a contar desde o vencimento de cada prestação retributiva em mora e desde a citação quanto à indemnização.

No demais, vai a Ré absolvida.” Inconformada, interpôs a ré o presente recurso de apelação, concluindo:

  1. Sobre a alteração da decisão relativa à matéria de facto.

    1. Requer-se que o facto provado nº 11, correspondente ao art. 11 da p.i., transite para o rol dos factos considerados não provados, uma vez que foi impugnado no art. 18 da contestação e não existe documento que o prove.

    2. Requer-se que do facto provado sob o nº 26, correspondente ao art. 30 da p.i., seja retirado o excerto “muito embora tenha excluído do respectivo cálculo a referida componente de 535,00€”, o qual deve transitar para o rol dos factos considerados não provados, uma vez que foi impugnado no art. 18 da contestação e não existe documento que o prove..

    3. Requer-se que os factos provados sob os nº 27 e 29, correspondentes, com ligeiras alterações, aos arts. 31 e 34 da p.i., transitem para o rol dos factos considerados não provados, uma vez que: i) foram impugnados exaustiva e reiteradamente na contestação, nomeadamente nos seus arts. 18, 24, 25, 26, 29, 30, 33, 78, 79, 91 a 99, 103 e 201 a 217; ii) não existem documentos que os provem; iii) e a presunção a que a Senhora Juíza a quo recorre não é válida, nem sob o ponto de vista formal, porquanto viola o art. 349º do Código Civil e os arts. 3º, nº 3, e 607º, nº 4, ambos do Código do Processo Civil, nem sob o ponto de vista de facto, porquanto no parece inequívoco que (i) “não assenta em factos conhecidos e aceites pela Ré” (ao contrário do que se refere na sentença; (ii) o eventual e putativo uso exclusivo de uma viatura de serviço por parte de um trabalhador, não implica lógica e necessariamente a sua utilização para fins pessoais, muito menos “24 horas por dia, feriados, folgas semanais...

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