Acórdão nº 1070/16.5T8AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelRITA ROMEIRA
Data da Resolução24 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc.Nº 1070/16.5T8AVR.P1 Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Aveiro - Juízo do Trabalho - Juiz 1 Recorrente: B… - Companhia de Seguros, S.A.

Recorridas: C… e D… Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO A A. C…, por si e em representação da sua filha menor, D…, veio instaurar acção declarativa com processo especial, emergente de acidente de trabalho de que foi vítima mortal, E…, respectivamente, marido e pai das AA. contra B… – Companhia de Seguros, S.A., na qual pede a fixação de pensão provisória, nos termos do art. 122º do Código de Processo de Trabalho, e a condenação da R. a pagar-lhes:À viúva C…:

  1. A pensão anual e vitalícia de €2.226,00, devida desde 12 de Março de 2016, dia seguinte à morte; b) €1.737,50, a título de reparação por despesas que suportou com o funeral do sinistrado; c) €5.533,68, a título de subsídio por morte; d) Juros de mora vencidos e vincendos, sobre as quantias reclamadas, calculados à taxa de 4%.

  2. €1.353,27, a título de despesas hospitalares.

    À filha D…:

  3. A pensão anual e temporária de €1.484,00, desde 12 de Março de 2016, até perfazer 18, 22 ou 25 anos; b) €71,15, referentes ao período entre a data do acidente e a data do falecimento; c) Juros de mora vencidos e vincendos, sobre as quantias reclamadas, calculados à taxa de 4%.

    Fundamentam o pedido alegando, em síntese, que o sinistrado trabalhava para a Sociedade “F…, Unipessoal, Ld.ª”, exercendo as funções de empregado de mesa, num restaurante sito na Avenida … n.º …., em …, mediante a retribuição anual ilíquida de €7.420,00.

    No dia 6 de Março de 2016, o sinistrado, após iniciar o turno das 19:00 às 23:00 horas, começou a sentir-se indisposto e comunicou ao gerente da empregadora que ia para casa – o que este aceitou.

    Ao deslocar-se para casa, no percurso que habitualmente fazia, conduzindo o motociclo matrícula .. – LP - .., na sua mão de trânsito, o sinistrado caiu inesperadamente ao solo, juntamente com o motociclo, sem ter havido da sua parte qualquer acção que tivesse provocado a sua queda.

    Por causa dessa queda, o sinistrado sofreu lesões que lhe causaram a morte.

    Mais, alegam que o Centro Hospitalar G…, E.P.E. apresentou 2 facturas devidas pela assistência ao sinistrado, desde o dia do acidente até ao dia do seu falecimento, que totalizam o montante de €1.353,27.

    Alegam, ainda, que à data em que ocorreu o acidente, a entidade empregadora tinha a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho transferida para a R., que é por isso responsável pela reparação.

    *Citada a R. contestou, defendendo que as AA. não alegam as razões da queda do sinistrado, não se podendo por isso concluir pela existência de um evento naturalístico inesperado causador da sua morte.

    Mais, alega que o acidente deve ser considerado descaracterizado, porque aquando da sua ocorrência, o sinistrado conduzia o motociclo com uma taxa de alcoolémia de 1,89 g/l no sangue, o que lhe alterou o estado de espírito e a disposição, diminuindo-lhe drasticamente os sentidos, atenção, concentração, capacidade de reacção, equilíbrio e reflexos necessários à condução do veículo.

    Tendo o estado de influência do álcool em que se encontrava sido causa directa e necessária da produção do acidente, que ocorreu por culpa única e exclusiva do sinistrado, que de livre e espontânea vontade, se colocou numa situação de privação acidental do uso da razão.

    Refere, que o subsídio por morte, a ser devido, é-o a ambas as AA., e não só à A. C… e quanto às despesas de funeral, que incumbe a elas o ónus da prova de que as suportaram efectivamente.

    Invoca que se encontra incorrectamente calculada a indemnização pelo período de ITA sofrido, que a ser devida, é-o igualmente à A. C…, na qualidade de herdeira do sinistrado e desconhecer se as AA. procederam ao pagamento das facturas hospitalares juntas aos autos.

    Por último, defende não ser responsável pelo pagamento da pensão provisória.

    Conclui que, provando-se a ocorrência de acidente de viação e a privação acidental do uso da razão do sinistrado por causa que lhe é imputável, deve o acidente de trabalho ser descaracterizado ou, caso assim não se entenda, deve a acção ser julgada em conformidade com a prova que venha a ser produzida, com a sua consequente absolvição do pedido.

    *Nos termos que constam a fls. 109 e ss., em 09.03.2017, foi proferido despacho saneador tabelar, fixaram-se os factos assentes e a base instrutória.

    Através do requerimento junto a fls. 124, em 23.03.2017, a A., D…, veio informar no processo que perfez 18 anos de idade, no dia 01.01.2017, ratificar todo o processado e constituir mandatário.

    Em 07.04.2107, nos termos do despacho de fls. 145 e ss., foi fixada pensão provisória às AA., a cargo do Fundo de Acidentes de Trabalho (FAT) e diligenciou-se pelo prosseguimento dos autos para julgamento.

    Os autos prosseguiram para julgamento e realizada a audiência, nos termos que constam das actas de fls. 176 e ss., respondeu-se à matéria de facto constante da base instrutória.

    Por fim, em 03.07.2017, foi proferida sentença que terminou com a seguinte decisão: “Em face de todo o exposto e na parcial procedência da acção, decide-se: I. Condenar a R. B… – Companhia de Seguros, S.A. a pagar: A) À A. C…, viúva do sinistrado:

  4. O capital de remição da pensão anual e vitalícia de €2.226,00 (dois mil, duzentos e vinte e seis euros), desde 12 de Março de 2016 – com dedução porém das quantias que recebeu do FAT, a título de pensão provisória.

  5. €2.766,84 (dois mil, setecentos e sessenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos), a título de subsídio por morte.

  6. €30,50 (trinta euros e cinquenta cêntimos), correspondentes à sua quota-parte na indemnização pelo período de incapacidade temporária absoluta para o trabalho sofrido pelo sinistrado, desde a data do acidente, até à do falecimento.

  7. €1.737,50 (mil setecentos e trinta e sete euros e cinquenta cêntimos), a título de reembolso por despesas suportadas com o funeral do sinistrado.

  8. Juros de mora à taxa legal (actualmente de 4%) sobre as referidas prestações, até integral pagamento, contados desde 12 de Março de 2016, no que se refere às aludidas supra nas alíneas a) e c) e desde a citação da R. para contestar, no que se refere às referidas nas alíneas b) e d).

    1. À A. D…, filha do sinistrado: a) A pensão anual de €1.484,00 (mil quatrocentos e oitenta e quatro euros), enquanto se encontrar em alguma das situações previstas no art. 60º n.º 1 da Lei n.º 98/2009, de 04/09, pensão essa actualizada para €1.491,42 (mil quatrocentos e noventa e um euros e quarenta e dois cêntimos), a partir de 01/01/2017 – com dedução porém das quantias que recebeu do FAT, a título de pensão provisória.

  9. €2.766,84 (dois mil, setecentos e sessenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos), a título de subsídio por morte.

  10. €30,50 (trinta euros e cinquenta cêntimos), correspondentes à sua quota-parte na indemnização pelo período de incapacidade temporária absoluta para o trabalho sofrido pelo sinistrado, desde a data do acidente, até à do falecimento.

  11. Juros de mora à taxa legal (actualmente de 4%) sobre as referidas prestações, até integral pagamento, contados desde 12 de Março de 2016, no que se refere às aludidas supra nas alíneas a) e c) e desde a citação da R. para contestar, no que se refere à referida na alínea b).

    1. No mais, absolver a R. do pedido formulado pelas AA..

    2. Condenar a R. a reembolsar o FAT das importâncias que este pagou às AA., a título de pensão provisória.

      *Custas a cargo das AA. e da R., na proporção dos respectivos decaimentos (art.º 527º n.ºs 1 e 2 do Cód. de Processo Civil), sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiam as AA..

      *Valor da acção: €67.063,93 – art. 120º do Cód. de Processo de Trabalho.

      ”.

      *Inconformada com esta decisão a Ré/seguradora interpôs recurso, cujas alegações juntas a fls. 205 e ss. terminou com as seguintes CONCLUSÕES: I.

      A sentença recorrida não pode manter-se, uma vez que efectuou uma incorrecta apreciação da prova produzida em Audiência de Julgamento, bem como do direito aplicável; II. As questões essenciais e cuja ponderação se requer são as seguintes: a. O cumprimento do ónus da prova por parte das Autoras, relativamente ao acidente de que foi vítima o trabalhador e que qualificam como de trabalho; b. Em caso afirmativo, saber se o acidente em causa deverá ser descaracterizado tendo por referência a matéria provada nos pontos 25, 26 e 27.

    3. Nos termos do n.° 1 do artigo 8.° da Lei n.° 98/2009, de 4 de Setembro, “é acidente de trabalho aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho e produza directa ou indirectamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou morte”; IV. A caracterização de um acidente como de trabalho pressupõe a verificação de três elementos ou requisitos: a. Elemento espacial - em regra, a local do trabalho; b. Elemento temporal - em regra, correspondente ao tempo de trabalho; e c. Elemento causal - nexo de causa e efeito entre o evento e a lesão, perturbação funcional ou doença, por um lado, e entre estas situações e a redução da capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte.

    4. É noção sedimentada e usada pela doutrina e jurisprudência temáticas a de que “acidente” constituiu todo o facto naturalístico, de causa súbita, violenta, estranha e exterior à vontade da vitima.

    5. Não podemos esquecer que a alegação e prova de factos que se mostrem subsumíveis à noção legal de “acidente de trabalho” impõem cumulativamente a verificação concreta dos três indicados pressupostos; VII. A Autora não só não alegou, como não demonstrou nos autos qual a razão dessa queda; VIII. Não se vislumbra, por essa razão, da matéria dada como provada, nenhum evento naturalístico, inesperado e de ordem exterior ao próprio sinistrado que tenha causado no mesmo lesões corporais; IX. Muito pelo contrário, dos autos resulta que, aquando do acidente, o sinistrado conduzia o motociclo com uma taxa de alcoolémia de...

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