Acórdão nº 757/17.0Y2VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES SILVA
Data da Resolução24 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 757/17.0Y2VNG.P1 Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do PortoI. RELATÓRIO:Nos presentes autos o arguido B… deduziu impugnação judicial da decisão proferida pela autoridade administrativa que lhe aplicou a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 (trinta) dias, pela prática da contraordenação prevista e punida nos artigos 69.º, n.º 1, alínea a), e 76.º, alínea a) do Regulamento de Sinalização de Trânsito; artigos 138.º e 146.º, alínea l), Código da Estrada.

Após o legal contraditório foi proferido despacho judicial que declarou a irregularidade da decisão administrativa e ordenou o arquivamento dos autos.

Inconformado com tal decisão, o Ministério Público interpôs recurso para esta Relação, formulando, para o efeito, as seguintesCONCLUSÕES:1- A decisão administrativa no âmbito de um processo contraordenacional deve conter a identificação do arguido, a descrição dos factos imputados, com indicação das provas obtidas, a indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão, a coima e as sanções acessórias, sendo certo que nesta fase não é de exigir o rigor formal como se em processo penal estivéssemos.

2- Tal exigência deve respeitar apenas a de uma narração, ainda que sintética, devido à simplicidade e celeridade que norteiam a fase administrativa, e que permita ao arguido efectuar um juízo de oportunidade sobre a conveniência ou necessidade de impugnar judicialmente a decisão e posteriormente, já em sede de impugnação judicial, possibilitar ao tribunal conhecer e aferir sobre o processo lógico da formação da decisão administrativa e respectivos fundamentos (cfr. Ac. da Relação de Coimbra de 06-02-2013, proferido no processo n.º 77/12.6TBAVZ, disponível no site da dgsi).

3- A decisão administrativa que fundamenta o presente recurso de contraordenação obedece aos requisitos enunciados no artigo 58.º, do RGCO, não padecendo de irregularidade.

4- A decisão administrativa não é omissa quanto ao elemento subjectivo e enuncia os critérios que fundamentam a imputação a título de negligência da contraordenação em causa.

5- A decisão administrativa enuncia minimamente os critérios que ocasionaram a fixação concreta da sanção acessória de inibição de conduzir e a determinação da respectiva suspensão.

6- A decisão administrativa em causa nestes autos obedece aos requisitos mínimos referidos no artigo 58.º, do RGCO.

Termos em que se afigura que o presente recurso deverá ser julgado procedente e, por via dessa procedência, deverá ser revogada a douta decisão em causa e determinada a sua substituição por outra que não declare a irregularidade da decisão administrativa.

*Não foi apresentada resposta ao recurso.

*Nesta Relação o Ministério Público emitiu douto parecer no sentido do provimento do recurso.

*Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não foi apresentada resposta.

*Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

* II. FUNDAMENTAÇÃO: A. Decisão recorrida: I - RelatórioNos presentes autos de recurso de contra ordenação veio o arguido B…, recorrer da decisão da autoridade administrativa que lhe aplicou a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 (trinta) dias, pela prática dos factos referidos na decisão de fls. 5 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, onde se lhe imputa a contraordenação prevista no artigo 28.º, n.º 1, alínea b) do Código da Estrada.

O arguido veio impugnar a contraordenação, invocando: - a nulidade da decisão administrativa por não conter a descrição precisa dos factos; - a impugnação em si da matéria de facto.

Conclui, assim, requerendo seja declarada a nulidade da decisão administrativa com a consequente absolvição do arguido ou, caso assim não se entenda, seja aplicada a dispensa ou suspensão da aplicação da sanção acessória de inibição de conduzir, nos termos previstos no artigo 141.º do Código da Estrada ou, por último, a atenuação especial da sanção acessória.

* II - SaneamentoO tribunal é competente.

As partes têm legitimidade.

* - Da invocada nulidade da decisão administrativaInvoca o arguido a nulidade da decisão, invocando nada de concreto constar em termos de descrição dos factos imputados.

Apreciando, cumpre sumariamente referir que, não obstante se concordar com a argumentação expendida quanto à ausência de concretização dos elementos, quer objetivos, quer subjetivos da prática da infração, no entender do Tribunal tal não consubstancia ou acarreta a nulidade da decisão administrativa, tendo, ao contrário, a consequência que infra se retirará.

Assim sendo, face ao exposto, de acordo com o referido e sem necessidade de mais considerações, improcede a invocada nulidade da decisão administrativa.

Notifique.

*Não existem quaisquer nulidades, exceções ou questões prévias que impeçam o conhecimento do mérito da causa.

* III - Dos Factos De acordo com os documentos juntos aos autos, resultaram provados os seguintes factos: 1. No dia 16 de fevereiro de 2015, pelas 10 horas e 31 minutos, no local Rua …, …, Vila Nova de Gaia, o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula NX - .. - .., desrespeitou a obrigação de parar imposta pela luz vermelha de regulação do trânsito.

  1. O arguido prestou depósito, que se converteu automaticamente em pagamento voluntário da coima respetiva.

*De resto não se provaram outros factos com relevância para a boa decisão da causa.

* IV - Motivação da Decisão de FactoA convicção do Tribunal para dar como provados os factos supra descritos resultou da apreciação crítica e seletiva de toda a prova produzida e designadamente, com base na análise dos documentos juntos aos autos, sendo o auto de contraordenação de fls. 1, o registo de condutor de fls. 3 e 4, os quais não mereceram qualquer reparo.

* V - Do Direito O Código da Estrada prevê no seu artigo 55.º, n.º 1, que "As decisões, despachos e demais medidas tomadas pelas autoridades administrativas no decurso do processo são susceptíveis de impugnação judicial por parte do arguido ou das pessoas contra as quais se dirigem", bem como no artigo 59.º, n.º 1, 2 e 3 do mesmo diploma legal, consagra que "As decisões das autoridades administrativas que aplicam uma coima são susceptíveis de impugnação judicial, por meio de recurso, interposto pelo arguido ou pelo seu defensor, por escrito e apresentado à autoridade administrativa que aplicou a coima, no prazo de 20 dias após o seu conhecimento pelo arguido, devendo constar de alegações e conclusões".

Nos termos do artigo 18.º do RGCOC, "a determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que retirou da prática da contra-ordenação".

Essa determinação constitui uma operação cuja responsabilidade se reparte entre o legislador e o aplicador da coima, seja a autoridade administrativa ou o juiz.

Assim, enquanto ao primeiro cabe estabelecer, um mínimo e um máximo para as molduras abstratas aplicáveis a cada um dos tipos legais de ilícitos de contraordenações descritos na legislação avulsa, à autoridade administrativa ou ao juiz caberá, respeitando as balizas fixadas pelo legislador, dizer, em concreto, qual a pena que, no caso em apreço deve ser aplicada.

Assim, no que toca à gravidade da contraordenação, deve atender-se: - ao grau de violação ou perigo de violação dos bens jurídicos e interesses ofendidos; - ao número de bens jurídicos e interesses ofendidos e às suas consequências, - à eficácia dos meios utilizados.

No que toca à culpa do agente: Quanto ao papel que cabe à culpa na determinação concreta da sanção a doutrina tem apontado três teorias: da sanção exacta no acto de determinação da sanção; do valor de emprego ou de graus e da margem de liberdade.

Conforme resulta dos artigos 71.º e 72.º, ambos do Código Penal (subsidiariamente aplicáveis, na medida em que não são contrariados pelo artigo 18.º do RGCOC), entre nós adaptou-se a teoria da margem de liberdade, entendendo-se ser "claro que, em absoluto, a medida da pena é uma certa: simplesmente que ela seja exactamente, é coisa que não poderá determinar-se, tendo, pois, o aplicador que remeter-se a uma aproximação que, só ela, justifica aquele "Spielraum", dentro do qual podem ser decisivas considerações derivadas da pura prevenção", BMJ, n.º 149, pág. 172.

Para determinação da sanção o aplicador "deve ter em conta todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de contra-ordenação, deponham a favor ou contra o agente", C…, D… e E…, in Contra-Ordenações, E.S.P, pág. 30 e António Joaquim Fernandes, Regime Geral das Contra-Ordenações, Notas práticas, Ediforum Edições Jurídicas, Lda., Lisboa 1998, pág. 43.

Assim, deve atender-se: - ao grau de violação dos deveres impostos; - ao grau de intensidade da vontade de praticar a infração; - aos sentimentos manifestados no cometimento da contraordenação; - aos fins ou motivos determinantes; - à conduta anterior ou posterior; - à personalidade do agente.

No que toca à situação económica deve atender-se à situação pessoal do agente.

No que se reporta ao benefício económico que o agente retirou da prática da contraordenação, deve atender-se não só ao valor do dano causado, que é considerado na gravidade da contraordenação, mas ao benefício obtido.

Ora, analisando a decisão administrativa é manifesto que a mesma é omissa quanto às condições económicas e benefício económico retirado pelo arguido e quanto aos critérios seguidos e discriminados quanto à fixação da sanção acessória concreta aplicada, sendo certo que, obviamente, tratando-se de processo contraordenacional não compete ao arguido fazer prova das condições económicas ou alegar factualidade que leve a concluir pelo tempo de inibição de conduzir a que deve ficar sujeito, mas antes à entidade administrativa averiguar dessas mesmas condições e demais factualidade. Em conclusão, a autoridade administrativa proferiu a decisão sem fundamentar os critérios que estiveram...

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