Acórdão nº 2929/16.5T8STS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelCARLOS PORTELA
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação nº2929/16.5T8STS.P1 Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo de Comércio de Santo Tirso Relator: Carlos Portela (834) Adjuntos: Des. José Manuel Araújo Barros Des. Filipe Caroço Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório:B…, divorciado, residente na Rua …, n.º.., 4.º, freguesia de …, concelho de Valongo, veio intentar este processo especial de jurisdição voluntária, requerendo se proceda a inquérito judicial à sociedade “C…, Lda.”, com sede na Rua …, n.º …, …, Valongo, alegando em síntese, o seguinte: Que o requerido D… - único gerente - se encontra a esvaziar o conteúdo, clientela e activos da aludida sociedade (de que o requerente é também, conjuntamente com o mencionado gerente, seu sócio), designadamente transmitindo encomendas e contratos para outras sociedades, dissipando o património da sociedade requerida, alienando viaturas automóveis a si próprio e à sua mulher por valor inferior ao de mercado e em frontal violação dos deveres legalmente impostos aos gerentes de sociedades comerciais, e ainda outorgando - em representação da sociedade requerida - consigo próprio e sua mulher e em seu benefício pessoal, contrato de arrendamento que tem por objecto armazém onde está instalada sociedade ré, vigorando renda mensal (€2.600,00) em valor muito superior aos valores de mercado para espaços semelhantes.

Mais alegou que a sociedade requerida, por iniciativa do seu gerente, vem efectuando transferências de importâncias significativas quer para o gerente quer para familiares próximos destes, e que aquele vem omitindo intencionalmente informações ao ora requerente sobre as contas da sociedade e respectivos documentos contabilísticos, para além do que as contas não revelam a seriedade e transparência minimamente exigíveis, contendo grosseiros erros contabilísticos, tudo como melhor consta do requerimento inicial, que aqui se dá por reproduzido.

Os réus C… e D… contestaram nos seguintes termos: Invocando que o autor renunciou à gerência da sociedade requerida por vontade própria e que, a partir de então, e mais precisamente desde que se encontra incompatibilizado com o seu irmão, o ora requerido, vem dificultando os actos de gerência necessários ao desenvolvimento da actividade societária, sendo falso que o requerido D… venha praticando quaisquer dos actos prejudiciais à sociedade de que é gerente e que lhe vêm imputados no requerimento inicial, pois que alguns dos clientes da requerida deixaram de o ser, precisamente por razões ligadas à conduta que vem sendo protagonizada pelo ora requerente, designadamente publicitando a quota que detém na sociedade em sites, e dando a conhecer a carteira de clientes da requerida, contrariando cláusulas de confidencialidade assumidas pela C….

Mais referiram que a venda das viaturas automóveis foram facturadas e foi apenas realizada com o intuito de reduzir custos na sociedade e aproveitar benefício fiscal - e segundo indicações da TOC -, tanto mais que a ré é ainda dona de 26 veículos automóveis, conforme, aliás, informação recentemente enviada ao aqui autor, sendo que os preços praticados fizeram jus aos efectivos valores correntes ou de mercado.

Alegaram ainda que o contrato de arrendamento realizado por referência ao local onde agora se situa a sede da sociedade requerida - e do qual o requerente demonstra conhecer todos os seus contornos - foi realizado sem prejudicar os interesses da referida sociedade, tanto que se trata de espaço bem maior do que o anterior onde estava instalada a sua sede (mais do dobro), sendo que o preço anteriormente pago pela ré era de €2.000,00 mensais.

Terminaram a negar a existência de quaisquer transferências de importâncias significativas da sociedade para o gerente e/ou para familiares próximos, pois que todas as alegadas situações no requerimento inicial constituíram comprovadamente despesas da própria sociedade.

Os autos prosseguiram os seus termos com a produção da prova requerida pelas partes litigantes.

Proferiu-se então sentença na qual se julgou a acção improcedente e, em consequência, se decidiu indeferir o pedido de realização de inquérito judicial à requerida C… Lda.

Inconformado com o teor da mesma decisão, dela veio recorrer o requerente B…, apresentando desde logo e nos termos legalmente prescritos, as suas alegações.

Os requeridos contras alegaram.

Foi proferido despacho no qual se considerou o recurso tempestivo e legal e se admitiu o mesmo como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.

Recebido o processo nesta Relação emitiu-se despacho que teve o recurso por próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

* II. Enquadramento de facto e de direito:Ao presente recurso são aplicáveis as regras processuais previstas na Lei nº41/2013 de 26 de Junho.

É consabido que o objecto do presente recurso e sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, está definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pelo requerente/apelante nas suas alegações (cf. art.º608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do CPC).

E é o seguinte o teor das mesmas conclusões:1ª - A douta sentença em recurso incorre, salvo o devido respeito por melhor opinião, em flagrantes erros de interpretação jurídica do normativo dos artigos 214º e 216º do Código das Sociedades Comerciais; Com efeito, 2ª - Resulta, com clareza, dos indicados dispositivos que o direito dos sócios à informação social só se considera preenchido se a mesma for verdadeira, completa e elucidativa; Caso contrário, 3ª - Assiste a qualquer sócio o direito de requerer Inquérito Judicial á sociedade; Não obstante, 4ª - O Tribunal recorrido jugou improcedente a acção, indeferindo o pedido de realização de Inquérito Judicial, em parte por considerar que as dúvidas e reservas suscitadas nos presentes pelo Apelante não configuraram negócios ruinosos para a sociedade Apelada, 5ª - E, por outro lado, por entender que as ditas dúvidas e reservas foram esclarecidas pelos Apelados em sede de contestação, desta feita incorrendo em claro erro de interpretação jurídica tendo por objecto o normativo dos artigos 1048º e 1049º do Novo Código de Processo Civil; Em boa verdade, 6ª - Os Apelados jamais prestaram ao Apelante informação verdadeira, completa e elucidativa sobre as questões, contratos, valores e movimentos financeiros por este suscitadas e reproduzidas nas alíneas m), o), q), s), u), v), x), aa), ff), gg), ii) e jj) da douta Decisão de Facto; Aliás, 7ª - As pretensas explicações dos Apelados, nos presentes e em pontuais comunicações remetidas ao Apelante baseiam-se em textos da Técnica Oficial de Contas, fértil em erros e imprecisões grosseiras que a própria admite de forma recorrente, portanto sem a mais ligeira credibilidade; Acresce, 8ª - Que as benévolas considerações do Tribunal “ a quo “ tendo por objecto os contratos, outorgados pelo Apelado D… por si e consigo próprio como gerente da sociedade Apelada, de arrendamento de instalações e de compra e venda de veículos automóveis, representam uma incorrecta interpretação do artigo 64º do Código das Sociedades Comerciais, 9ª - Uma vez que a descrita e demonstrada actuação do Apelado D… configura uma grava violação do dever de lealdade em relação à firma sua representada, ora Apelada; De qualquer modo, 10ª - Resulta, de forma segura, da factualidade apurada nos presentes que os Apelados jamais prestaram ao Apelante informação verdadeira, completa e elucidativa sobre os montantes, critérios e avaliações subjacentes aos ditos contratos; Efectivamente, 11ª - Os Apelados jamais prestaram a mais ligeira informação tendo por objecto os critérios e entidades consultadas para cálculo da renda e preços fixados, com uma adequada ponderação das áreas, localização, estado e características dos bens objecto dos referidos contratos; Termos em que, E nos mais de Direito, Concedendo provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogando a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que julgue procedente a acção e, consequentemente, ordene a realização do requerido Inquérito Judicial, V. Excelências farão a habitual JUSTIÇA!*Já os requeridos/apelados concluem do seguinte modo as suas contra alegações: 1. Tendo por base os factos, provados e não provados, dados como assentes pelo Tribunal “a quo” e cujo recorrente aceita sem quaisquer reservas em sede de recurso (inexistência de impugnação dos factos dados como provados e não provados), não vislumbramos como poderia o Tribunal chegar a uma conclusão (de direito) diferente daquela que consta na douta sentença.

  1. Pelo que, de forma a aplicarmos os dispositivos normativos mencionados pelo recorrente e que este entende que o Tribunal “a quo” fez errada interpretação e aplicação teremos sempre que partir dos factos (provados e não provados) que constam da douta sentença.

  2. Por uma questão de economia processual damos aqui por inteiramente reproduzidos todos os factos dados como provados [alíneas a) a ll)] e bem assim todos os factos não provados [alínea 1) a 8)].

  3. De referir que o recorrente entendeu não ouvir qualquer testemunha.

    Posto isto, 5. O recorrente entende que não os recorridos não cumpriram o estipulado no artigo 214, n.º 1 do C.S.C, na medida em que não foi feita prova nos presentes de haver sido prestada ao Apelante informação verdadeira, completa e elucidativa sobre a indicada matéria, bem como entende que parte da informação foi prestada em sede de contestação.

  4. Os argumentos dos recorrentes não se enquadram minimamente nos factos apurados pelo Tribunal “a quo”.

  5. Julgamos até que neste processo se há alguma coisa que ficou provada, sem qualquer margem para dúvidas, foi que ao recorrente sempre lhe foram prestadas todas as informações que solicitou, quer antes, quer aquando da instauração do processo judicial.

    Vejamos: 8. O recorrente não provou (e se formos rigorosos, nem sequer alegou quer na...

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