Acórdão nº 199/17.7GCOAZ-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MOTA RIBEIRO
Data da Resolução21 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 199/17.7GCOAZ.P1 – 4.ª Secção Relator: Francisco Mota Ribeiro*Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto1. RELATÓRIO1.1.

Por despacho de 12/01/2018, proferido no Processo n.º 199/17.7GCOAZ, que corre termos no Juízo de Instrução Criminal de Santa Maria da Feira, J2, Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, por se considerar que não existia, por ora, fundamento para produzir antecipadamente o depoimento testemunhal promovido pelo Ministério Público (declarações para memória futura), foi indeferida a respetiva promoção.

  1. 2.

    Não se conformando com tal decisão, dela interpôs recurso o Ministério Público, apresentando motivação que termina com as seguintes conclusões: “1. Nos presentes autos foi apresentada denúncia dando conta que B…, nascido a ../../1941, sofreu um AVC há sete anos, tendo frequentado clínica de reabilitação até maio de 2017, altura em que voltou para casa porque a esposa pretendia prestar-lhe todos os cuidados que necessitava.

  2. A denunciada mantém o marido permanentemente deitado na cama, não deixando o idoso, apesar de este se conseguir mover pelos seus próprios meios, levantar-se ou mover-se, não permitindo igualmente que as técnicas de saúde que tratam da sua higiene o desloquem, exigindo que esteja sempre deitado na cama.

  3. Quando confrontada com esta exigência a denunciada grita, puxa os cabelos e responde “ele é meu”.

  4. Perante esta denúncia, por se entender que os factos relatados seriam suscetíveis de integrar a prática do crime de violência doméstica previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a), e nº 2, do Código Penal, foi requerida a tomada de declarações para memória futura da aqui vítima, o que foi judicialmente indeferido.

  5. No caso de crimes de natureza pública, como sucede com o crime de violência doméstica, o Ministério Público pode tomar notícia da existência de crime por conhecimento próprio, por intermédio dos OPC ou por denúncia de terceiro que deles tenha conhecimento. Foi o que aconteceu neste caso: a denúncia que deu origem ao inquérito foi apresentada por terceira pessoa, a neta do arguido, que relatou os factos de que tomou conhecimento e que, por causarem sofrimento ao avô, denunciou para que sejam tomadas medidas que obstem à sua continuação.

  6. Na notícia do crime, todos os intervenientes estão identificados, incluindo denunciante e testemunhas indicadas, apenas solicitando aquela que não seja comunicada a sua identidade aos intervenientes.

  7. Ou seja, nada nos autos, nem sequer esta circunstância nos leva a, num primeiro juízo, entender a denúncia como infundada ou falsa, não podendo do mero pedido de confidencialidade da identidade ser retirados factos que permitam fundar um juízo que afaste a credibilidade da denúncia, tanto que parece-nos compreensível – sem curar da sua exequibilidade - que, tratando-se de relações familiares próximas, pretenda a denunciante que sejam tomadas medidas quanto à situação do avô, evitando represálias ou conflitos no seio das relações com os restantes familiares.

  8. O ato de se forçar uma pessoa, capaz de se deslocar pelos seus meios ou com auxílio de terceiros, a permanecer permanentemente deitada numa cama, sem qualquer justificação, pelo menos desde maio de 2017, com as inerentes lesões físicas que uma tal conduta pode determinar (úlceras de pressão, alterações no funcionamento de órgãos como o intestino por ausência de movimento, com possíveis obstruções intestinais, deterioração das articulações, atrofia muscular, etc…), causando sofrimento a essa pessoa é um trato cruel, é subjugar outrem à sua vontade injustificada, é mau...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT