Acórdão nº 271/14.5TTMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Março de 2018
Magistrado Responsável | NELSON FERNANDES |
Data da Resolução | 05 de Março de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Apelação 271/14.5TTMTS.P1 Autor/apelado: B...
Recorrente/apelante: C... e D..., na qualidade de sócios da sociedade extinta E..., Lda., sendo a responsabilidade destes limitada ao montante que receberem na partilha dos bens das sociedades (antes, F..., Lda., atualmente designada E..., Lda., G..., Lda., atualmente designada H..., Lda., e I..., S.A.) _______ Relator: Nélson Fernandes 1º Adjunto: Des. Rita Romeira 2º Adjunto: Des. Teresa Sá Lopes Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório 1.
1.1.
B... intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra F..., Lda., depois designada E..., Lda., G..., Lda., depois designada H..., Lda., e I..., S.A., pedindo, considerando-se que entre ele e as Rés existia uma relação laboral de pluralidade de empregadores, que estas fossem condenadas solidariamente a pagar-lhe a quantia de € 58.978,93, devida a título de comissões de vendas que deixaram de ser pagas a partir de 2012, acrescido do montante devido pela faturação dos negócios da Farmácia J... e da Farmácia K..., cujo valor deve ser apurado em liquidação da sentença, e ainda juros de mora desde a citação até trânsito em julgado da sentença.
Para tanto, em síntese, alegou que: celebrou com a 1ª Ré no dia 27 de Abril de 2009 um contrato de trabalho para o exercício das funções de Diretor Comercial, auferindo ultimamente uma remuneração base de € 2014,00, acrescido de uma retribuição variável de comissões no valor de 12% sobre a comissão cobrada aos clientes, e que em 2011 o sócio gerente da 1ª Ré criou a 2ª Ré, da qual era sócia a 1ª Ré e o dito sócio gerente, para intermediar os negócios em que estivessem em causa venda de quotas ou ações de sociedades detentoras de farmácias, área em que a 1ª Ré antes atuava, para além da mediação em trespasses de alvarás de farmácias, passando o autor a trabalhar indistintamente para as duas sociedades independentemente de qual faturasse a comissão do negócio de trespasse ou venda de alvará ou negócios de vendas de quotas; aquele sócio gerente era simultaneamente administrador da 3ª Ré que havia sido criada com o intuito de fazer a gestão de farmácias e prestar serviços a farmácias; todas as Rés tinham uma estrutura organizativa comum, trabalhando ele indistintamente para as mesmas, do que se conclui que o contrato que inicialmente havia celebrado com a 1ª Ré se transformou ao longo do tempo num contrato com uma tríplice entidade empregadora; a sua remuneração fixa era paga pela 1ª Ré e a sua remuneração variável era assegurada pelas três Rés indistintamente; contudo, tendo recebido as comissões até 2012 sobre todos os negócios mediados pelas três Rés, por decisão unilateral do respetivo sócio gerente e administrador tal pagamento deixou de ser efetuado sem qualquer justificação, reclamando por essa razão o seu valor, relativamente a todos os negócios concretizados em 2012 e até à cessação do seu contrato por extinção do posto de trabalho em 07/04/2013.
1.2 Frustrada a tentativa de conciliação levada a efeito na audiência de partes, notificadas as Rés para tais efeitos, apresentaram-se as mesmas a contestar.
Também em síntese, admitindo que o Autor trabalhava para as três (Rés), cujo capital é detido por sócios ou acionistas comuns, invocaram que não constituem, porém, uma única realidade económica, nem possuem uma estrutura organizativa comum, como ainda que apenas foi acordado com o Autor o pagamento de um prémio anual calculado pela aplicação de até 12% sobre o total das vendas angariadas pelo mesmo e na condição de aquelas vendas atingirem, anualmente, no conjunto das três sociedades, o valor mínimo de € 300.000,00, sendo tal pagamento efetuado indistintamente pelas três Rés, acordo esse que sempre foi cumprido, não tendo havido lugar ao pagamento de qualquer prémio a partir de 2012, por o Autor não ter atingido o valor mínimo de vendas de € 300.000,00.
Concluíram as Rés pela improcedência total da ação.
1.3 Respondeu o Autor, mantendo a sua posição inicial.
1.4 Proferiu-se seguidamente despacho saneador, dispensando-se nos termos do disposto pelo artigo 49º, nº 3 do Código de Processo do Trabalho a seleção da matéria de facto.
1.5 Tendo os autos prosseguido os seus termos, realizada a audiência de discussão e julgamento, veio a ser proferida sentença, em 18/06/2015, de cujo dispositivo consta: “Por todo o exposto julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência, decido: I – condenar as rés solidariamente a pagar ao autor a quantia de € 55.056,00 (cinquenta e cinco mil e cinquenta e seis euros) a título de comissões, acrescida de juros de mora, á taxa legal, desde a citação até integral pagamento, acrescida da quantia a liquidar após a sentença relativa à comissão devida relativamente ao negócio (venda de quotas) da Farmácia J..., em ..., e respectivos juros de mora, à taxa legal, desde o trânsito em julgado da decisão de liquidação até integral pagamento.
II – absolver as rés da parte restante do pedido.
Custas pelo autor e pela rés, na proporção dos decaimentos – art. 537º do Código de Processo Civil.
Valor da ação: € 58.978,93 (cinquenta e oito mil novecentos e setenta e oito euros e noventa e três cêntimos).” 2.
Não se conformando então com o assim decidido, as Rés interpuseram recurso de apelação, apresentando as respetivas alegações, nas quais formularam como conclusões o seguidamente transcrito: “I. As questões que aqui se colocam a douta apreciação do Meritíssimo Tribunal “ad quem” são as seguintes: - saber se, por um lado, ficou provado que o A. recebia comissões e que as mesmas incidiam sobre o valor de todas as vendas efectuadas, e por outro lado, em caso negativo, avaliar as consequências jurídicas decorrentes do facto do mesmo peticionar o pagamento de prémios; - saber se vigorou um contrato de trabalho entre o A. e uma pluralidade de empregadores; - saber se é equacionável a responsabilidade solidária das RR..
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Quanto à primeira questão, importa referir que a palavra “comissão” foi diversas vezes utilizada com referência ao montante recebido pelo Apelado em função do cumprimento dos objectivos de vendas, mas verdade é que não resultou provado que o mesmo as tenha auferido.
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Tal conclusão resulta do depoimento de C..., (minuto 07:26 a minuto 08:30) e do depoimento da testemunha M... (minuto 20:15 a minuto 20:26 e minuto 22:00 a minuto 22:39), em conjugação com o facto das restantes testemunhas não se terem debruçado sobre a questão da natureza retributiva daqueles valores.
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Atendendo às regras de repartição do ónus da prova (artigos 342º e 346º do Código Civil), verifica-se que os Apelantes apresentaram contraprova de que o acordado era o pagamento de um prémio e que o Apelado não fez prova dos elementos constitutivos do direito que alega.
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A função principal do prémio é a de recompensar a produtividade e o desempenho profissional dos trabalhadores.
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Como era prática comum na empresa, e ocorria, de resto, no caso da trabalhadora N... (minuto 10:30 a minuto 10:45), a bonificação era recebida sobre as vendas concretizadas pela pessoa que, directamente angariava o negócio (minuto 07:36 a minuto 08:30 de minuto 10:54:55 a minuto 12:45:49 do depoimento de C...).
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De resto, como afirma o Apelado a sua intervenção ocorreu directa ou indirectamente em todos os negócios (minuto 21:10 a minuto 21:27), pelo que em determinados casos, o seu papel não foi fulcral para a concretização do negócio.
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Exemplo desse facto é o que sucedeu com os negócios relativos à farmácia O... em Gaia, a farmácia P... em ..., a farmácia Q... sita em Albufeira e a farmácia K... em Lisboa, conforme resulta dos depoimentos de C... (minuto 42:04 a minuto 42:50, minuto 44:00 a minuto 44:42, minuto 46:00 a minuto 47:36, minuto 56:00 a minuto 56:31 de minutos 10:54:55 a 12:45:49), S... (minuto 03:18 a minuto 04:02, minuto10:20 a minuto 11:30) e T... (minuto 04:14 a minuto 04:32, minuto 07:19 a minuto 08:11).
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O Recorrente não logrou provar que tinha direito a uma bonificação, em virtude de todas as vendas realizadas pelas Recorrentes, pela aplicação da percentagem de 12% já que a única testemunha que se pronunciou quanto a esse facto, U..., possui conhecimento indirecto dos factos e encontra-se necessariamente comprometida com o desfecho da presente acção, visto que demandou as, ora, Recorrentes em acção judicial na qual reclama, igualmente, comissões (minuto 00:02 a minuto 00:31 e minuto 49:53 a minuto 50:52).
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Além disso, não ficou reflectido no contrato escrito qualquer comissão de 12% sobre as vendas de farmácias.
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É senso comum que as bonificações visam premiar o trabalho individual e não o trabalho desenvolvido por todas as empresas, já que para isso existe a figura da participação nos resultados.
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Nessa medida, e uma vez que nada foi dito pelo Sr. C... ao Recorrido nesse sentido, o mesmo não podia contar com a atribuição de uma comissão, numa percentagem fixa, XIII. ou mesmo que lhe fosse atribuído um prémio sem mais, já que o mesmo dependia de conseguir atingir determinados “objectivos”.
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Assim, de acordo com o disposto na alínea c), do número 1 do artigo 260.º do Código de Trabalho não se consideram retribuição as prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho ou mérito profissionais, bem como a assiduidade do trabalhador, cujo pagamento, nos períodos de referência respectivos, não esteja antecipadamente garantido (i. e. os prémios).
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Seguindo o entendimento do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo nº 373/10.7TTPRT.P1.S1, de 26/05/2015, o prémio de produtividade cuja atribuição estava dependente da avaliação da produtividade e do desempenho profissional dos trabalhadores não assume natureza retributiva.
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Deste modo, era lícito aos Recorrentes deixar de lho pagar, sem que isso represente violação do princípio da irredutibilidade da retribuição (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo nº 292/11.0TTSTRE.E1.S1, de 17/12/2014).
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Porque se está perante um erro notório na...
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