Acórdão nº 881/16.6JAPRT-AP.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DEOLINDA DION
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

REURSO PENAL n.º 881/16.6JAPRT-AP.P1 2ª Secção Criminal Conferência/Urgente Relatora: Maria Deolinda Dionísio Adjunto: Jorge Langweg Acordam os Juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO 1. No decurso da audiência de julgamento do processo comum colectivo n.º 881/16.6JAPRT, do Juízo Central Criminal do Porto-J6, da Comarca do Porto, por despacho proferido a 26/9/2017, o tribunal a quo, ouvidos os sujeitos processuais, declarou a especial complexidade dos autos.

  1. Inconformados, os arguidos B...

    , C...

    , D...

    , E...

    , F...

    e G...

    , todos com os demais sinais dos autos, interpuseram recurso finalizando a motivação respectiva com as conclusões seguintes: (transcrição)Arguido B...

    1 - Vem o presente recurso interposto do douto despacho que declarou a excecional complexidade dos presentes autos, por se entender que não se verificam os pressupostos factuais que permitem a sua aplicação e, bem ainda, por se entender existir violação de caso julgado formal, nos termos do disposto nos artigos 620.º, n.º 1, 625.º, 628.º e 666.º do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do artigo 4.º do CPP.

    A - DA NÃO VERIFICAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS FACTUAIS QUE PERMITEM A APLICAÇÃO DA EXCECIONAL COMPLEXIDADE DO PROCEDIMENTO 2 - A excecional complexidade do procedimento será sempre declarada previamente e desde que efetivamente o procedimento se revele de excecional complexidade.

    3 - Para que essa declaração de excecional complexidade possa ter lugar, necessário será que não se trate de uma qualquer complexidade, mas que se revele ao magistrado respetivo como uma complexidade acima da média, fora do comum, uma complexidade anormal, que transforme o procedimento em algo de especialmente complicado, muito difícil de gerir, de coordenar e de gerir de forma coordenada.

    4 - É por essa razão que o legislador utiliza a expressão "excecional complexidade".

    5 - Não basta que o procedimento seja complexo, deverá ser ainda excecionalmente complexo.

    6 - Acresce que - é também evidente - o advérbio de modo «nomeadamente» do qual o legislador faz uso no n.º 3 do art. 215.º, do CPP, induz o cariz exemplificativo das causas que podem determinar aquela excecional complexidade, tratando-se de causas que não são de funcionamento automático.

    7 - Ou seja, para além das causas enunciadas pelo legislador como, por exemplo, o número de arguidos ou de ofendidos ou do caráter altamente organizado do crime, outras causas poderão existir, desde que, efetivamente tornem excecionalmente complexo o procedimento.

    8 - O conceito de excecional complexidade tem assim de ser apreciado caso a caso, pelo magistrado judicial, que, com a sua experiência, deverá ponderar se, na verdade, "aquele" processo suscita procedimentos anormalmente complexos, não usuais, pela dificuldade de investigação, pelo conjunto alargado de diligências de prova e pela sua excecional dificuldade de realização e de conjugação, o que, por vezes, é ditado nomeadamente pelo elevado número de arguidos e/ou de ofendidos e/ou do caráter altamente organizado do crime.

    9 - A declaração de excecional complexidade do procedimento terá essencialmente por efeito o alargamento automático dos prazos de duração máxima da prisão preventiva.

    10 - Tudo isto para afirmar que no caso dos presentes autos, verifica-se, desde logo, que a «maior dificuldade» do procedimento, a ter existido, sucedeu, sem quaisquer dúvidas, na fase do inquérito.

    11 - Basta analisar todo o inquérito (e até toda a instrução) para constatar que foram levadas a cabo inúmeras diligências de prova - meios de prova e meios de obtenção de prova -, com vários suspeitos - e desde 17/05/2016 com sete arguidos em prisão preventiva - e de ofendidos/lesados.

    12 - No entanto, nunca em qualquer uma dessas fases processuais foi declarada a excecional complexidade do procedimento.

    13 - Mais, sempre foi entendimento do Tribunal, inclusivamente para efeitos de consulta, exame e análise de todo o inquérito - composto por milhares de folhas - por parte dos arguidos, em ordem a escorar requerimentos de abertura de instrução, pese embora todas as supra mencionadas circunstâncias - que não se justificava a declaração de excecional complexidade do procedimento e, em consequência, a prorrogação dos prazos previstos, designadamente, no artigo 287.º, como permite o artigo 107.º, n.º 6, ambos do CPP.

    14 - Ora, na fase de julgamento trata-se apenas de proceder ao interrogatório de arguidos, à inquirição de testemunhas, à audição de gravações de interceções telefónicas - o que sucedeu apenas por duas vezes - e, proceder à análise de documentos, tudo a requerer o usual e normal labor de uma audiência de discussão de julgamento sem dificuldades acrescidas.

    15 - Nada de extraordinário, de complexo, de anormal ou de procedimental ou processualmente mais difícil, complicado ou complexo que o comum em processos desta natureza.

    16 - O certo, porém, é que o Tribunal vem agora declarar a excecional complexidade do procedimento, o que faz tendo em vista obviar a eventual libertação dos arguidos a 20 de novembro de 2017.

    17 - No entanto, não pode ser esse o fundamento da declaração de excecional complexidade, uma vez que não é a aproximação do termo do prazo máximo de prisão preventiva que determina que um procedimento seja mais ou menos complexo e, consequentemente, que pode fazer concluir pela sua excecional complexidade.

    18 - De contrário, estava encontrada a forma de todos os prazos de prisão preventiva previstos no n.º 2, do artigo 215.º, do CPP, sempre que necessário - o mesmo é dizer, sempre que se aproximasse o seu termo -, serem alargados para os prazos máximos previstos no n.º 3, do referido preceito legal. Bastaria constatar a aproximação do termo desse prazo, para se declarar a excecional complexidade do procedimento e assim se conseguir o alargamento desse mesmo prazo em vários meses ou, como no caso dos presentes autos, por mais de um ano (art. 215.º, n.º 3, do CPP).

    19 - É por demais evidente que não foi essa a intenção do legislador. O procedimento só pode ser declarado de excecional complexidade em função da sua anormal, extraordinária e, por isso, excecional dificuldade, superior ao que é usual, devido a dificuldades acrescidas face ao que diariamente sucede, e não em função da maior ou menor aproximação do termo de um qualquer prazo, nomeadamente de duração máxima de prisão preventiva.

    20 - O despacho recorrido violou, assim, o disposto nos artigos 215.º, n.ºs 3 e 4, do CPP, por errada aplicação; 21 - Além de que não pode deixar de se invocar aqui a inconstitucionalidade do artigo 215.º, n.ºs 3 e 4, do Código de Processo Penal, quando interpretado no sentido de que a excecional complexidade do procedimento pode ser decretada em função da maior ou menor aproximação do termo do prazo da duração máxima de prisão preventiva; por violação do disposto nos artigos 32.º, n.ºs 1 e 2, e 28.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.

    B - DA VIOLAÇÃO DO CASO JULGADO FORMAL 22 - Por outro lado, o Tribunal da Relação do Porto pronunciou-se já por duas vezes no sentido de que os presentes autos não revestem natureza de excecional complexidade, nos termos do disposto no n.º 4, do artigo 215.º, do CPP.

    23 - Em ambas as decisões o Tribunal da Relação do Porto entendeu não se encontrarem preenchidos os pressupostos legais que permitissem atribuir aos presentes autos a natureza de excecional complexidade.

    24 - Pelo exposto, relativamente à questão em apreciação sucedeu caso julgado formal, o mesmo é dizer, porque as decisões mencionadas recaíram unicamente sobre a relação processual, têm força obrigatória dentro do processo, como decorre do consignado no artigo 620.º, do CPCivil, aplicável do ex vi do art. 4.º, do CPP.

    25 - Nem se diga que, agora, na fase da audiência de julgamento, tudo se tornou mais complexo; 26 - Com efeito, após as fases do inquérito e da instrução, tudo o que se passou nos autos manteve-se praticamente inalterado comparativamente ao que sucedeu anteriormente, não convocando dificuldades de maior.

    27 - Não pode o Tribunal voltar a pronunciar-se sobre esta questão da excecional complexidade do processo uma vez que os pressupostos de facto e de direito que estiveram na base das mencionadas decisões do Tribunal da Relação mantêm-se.

    28 - Não se trata, como se afirma no douto despacho recorrido de «(...) um substrato material objetivamente diverso daquele que foi analisado e decidido na fase de inquérito». As provas a analisar já constavam todas do processo, salvo parte das testemunhas arroladas pela defesa.

    29 - Quando se iniciou a audiência de julgamento o processo era já composto por milhares de folhas e praticamente os mesmos volumes e apensos; A acusação, obviamente, já havia sido deduzida; Aos arguidos já eram imputados os crimes por que estão a ser julgados; O incidente de perda ampliada de bens já havia sido deduzido; Já havia sido admitida a constituição dos assistentes; O número de arguidos manteve-se o mesmo; As perícias à personalidade de alguns arguidos não são realizadas pelo tribunal e já se encontram nos autos os respetivos relatórios que não levantam quaisquer dificuldades; Os pedidos de habeas corpus foram decididos rapidamente e, obviamente, pelo STJ, não por este Tribunal; Os recursos interpostos e as reclamações pela não admissão de recurso não são decididas por este Tribunal, mas pelo Tribunal superior; 30 - De novo, em audiência, para além de parte das testemunhas arroladas pelos arguidos, e das vicissitudes usuais de qualquer audiência, nada há que já não constasse dos autos em fases processuais anteriores; e, no entanto, a excecional complexidade do processo nunca foi declarada e foi até recusada, por duas vezes, pelo Tribunal da Relação.

    31 - Pelo que, não podia o Tribunal voltar a pronunciar-se sobre esta questão uma vez que os pressupostos de facto e de direito que estiveram na base das mencionadas decisões mantêm-se inalterados.

    32 - Assim, não tendo entendido, o douto despacho recorrido...

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