Acórdão nº 446/15.0T8AMT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 446/15.0T8AMT.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B... propôs acção comum contra C..., S.A., pedindo que a R. seja condenada a: a) reconhecer que foi privado do veículo Opel, modelo ..., matrícula ..-HT-.., por furto; b) A pagar-lhe a quantia de € 15.684,80 relativa à indemnização devida pelo furto do veículo; c) A pagar-lhe a soma de € 2.175,00 de indemnização pela privação de uso do veículo; d) A pagar-lhe a soma de € 2.500,00 a título de compensação pelos danos morais, sendo todas as somas acrescidas de juros à taxa legal desde a data da citação.

Alegou para tanto, e em síntese, que é dono da viatura Opel ... de matrícula ..-HT-.. que foi objecto de seguro de danos próprios na R., com a cobertura de furto ou roubo, pelo capital de € 15.684,80 euros. Em 24 de Outubro de 2014 o veículo foi alvo de furto por desconhecidos, não tendo a R. pago o capital seguro. O que lhe provocou stress, irritação e nervosismo pela privação do carro.

Contestou a R., questionando que o furto tenha ocorrido e alegando que, além disso, não existe base contratual para compensar danos morais ou privação de uso.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo sido proferida decisão que, julgando parcialmente procedente a acção, condenou a R. a pagar ao A. a quantia de € 7.843.00 (sete mil oitocentos e quarenta e três euros), acrescida de juros à taxa legal, desde a data da citação (16 de Abril de 2015) e até integral pagamento, absolvendo-a do restante pedido.

Inconformada, apelou o A., apresentado as seguintes conclusões:

  1. O Autor Apelante não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, porquanto, em sua modesta opinião, ocorreu erro de julgamento quer quanto à matéria de facto, quer quanto à aplicação da lei, o que determina ilegalidade da decisão proferida nos autos.

  2. Vem, assim, requerer que se proceda à reapreciação da matéria de facto julgada, bem assim como dos pressupostos legais aplicados.

  3. A Ré, foi condenada a pagar ao Autor a quantia de € 7.843,00 (sete mil oitocentos e quarenta e três euros) acrescida de juros à taxa legal, desde a data da citação (16 de abril de 2015) até integral pagamento.

  4. Ora, tendo-se provado o furto do veículo, e sendo o valor do capital do seguro € 15.684,00 (quinze mil seiscentos e oitenta e quatro euros), não se pode conformar o Apelante com a aludida quantia dos € 7.843,00 (sete mil oitocentos e quarenta e três euros), a título de indemnização devida por tal facto.

  5. É do conhecimento geral que o capital do seguro a ser atribuído ao segurado em caso de furto e outros, vai baixando de acordo com os anos de vida dos veículos; F) Contudo, e embora o veículo aqui sub judice, tivesse sido adquirido pelo A., aqui apelante, em estado de novo em Junho de 2009 – DOC. N.º 1 junto com a P.I. - foi-lhe feita uma actualização no seguro no que concerne aos valores do capital para a cobertura de certos riscos, entre os quais o de furto, que aqui está em causa, em 27-09-2014 – DOC. Nº 2 junto com a P.I. - ou seja, menos de um mês antes da ocorrência do furto do veículo, que foi em 24.10.2014; G) Pelo que não pode ser usado como fundamentação para o aqui Apelante não ser ressarcido pelo montante global do capital seguro para o risco de furto, (€ 15.684,00), na sua modesta opinião, a desvalorização do veículo, como o fez o Douto Tribunal “a quo”, pois essa desvalorização já havia sido considerada, como se disse, um mês antes do furto do veículo, para a actualização do montante do capital seguro.

  6. Nem tão pouco se poderá usar como fundamentação (como, erroneamente, o fez a Douta Sentença recorrida) para não ser ressarcido do montante global seguro, o facto do veículo ter sofrido várias avarias e diversas intervenções, pois além de ser falso que o veículo era intervencionado em média duas vezes por mês nos últimos 3 anos (como referiu a Douta Sentença a quo), I) Também as suas “reparações” consistiam na sua maioria em intervenções de manutenção, algumas até obrigatórias, tais como revisões, substituição de óleo e filtro, bem como de escovas, luzes, verificação de travões e AFL (conforme consta do documento junto pela interveniente acidental D..., S.A., a fls. … dos Autos).

  7. E, inclusivamente, a intervenção de maior monta, foi a substituição do motor – Doc. Nº 8 junto com a P.I.- que ocorreu 3 meses antes do furto do veículo, e que não veio desvalorizar o veículo mas antes constituir uma mais valia, pois substituiu-se um motor que já tinha feito mais de 250.000,00Km por outro muito menos usado, K) Pelo que a decisão de ressarcir o aqui Apelante apenas em €7.843,00 ou seja metade do valor capital seguro, deverá ser substituída por outra que lhe atribua o ressarcimento do montante global do capital seguro €15.684,00, pelos fundamentos sobreditos.

  8. Quanto à indeminização pela privação do uso, ao contrário da posição assumida na Douta decisão proferida pela Mma. Juíz a quo, entendemos que a mesma é devida.

  9. É que, no caso sub judice, a indemnização pela privação do uso peticionada pelo Autor, tem por base o facto da Ré não ter pago em tempo útil, como devia, o valor da indemnização pelo furto do veículo e não, por exemplo, porque o veículo tivesse sofrido uma avaria e ficasse sem poder circular enquanto não fosse reparado (caso em que a cobertura de privação do uso deveria, efetivamente, ser contratada, e, não o sendo, não haveria lugar a qualquer indemnização) o que aqui não ocorre.

  10. A jurisprudência não é unânime no tratamento desta questão, havendo quem entenda que tal indemnização é devida, por a mesma ser um “corolário lógico da contraprestação inerente ao risco assumido” pela seguradora, nomeadamente em situações de “choque” do veículo, pois de outro modo ficaria esvaziada de conteúdo a contraprestação da seguradora nestes casos (ou, pelo menos, a respectiva correspetividade das prestações mostrar-se-ia desequilibrada, em prejuízo do tomador do seguro) - Cfr., neste sentido, o Acórdão da Relação de Guimarães de 12.03.2009 (António Sobrinho), Processo 634/04.4TBBCL.G1, que se pode consultar em www.dgsi.pt., O) Ou que “actua em violação de um dever acessório de conduta a seguradora que, sabendo não ser contratualmente responsável pelos danos de privação de uso, demorou mais do que o razoável para o apuramento da indemnização devida e para o seu pagamento, violando o equilíbrio contratual e rompendo a colaboração inter-subjectiva, causando os referidos danos, bem como danos morais, na pessoa do beneficiário do seguro”- Cfr. o Acórdão da Relação do Porto de 25.01.2011 (Vieira e Cunha), Processo 3322/07.6TJVNF.P1, consultável em in www.dgsi.pt.

  11. Outros, porém, defendem que estando em causa uma obrigação pecuniária, e porque se trata de responsabilidade contratual, a indemnização pela mora corresponde aos juros legais, salvo convenção em contrário, pelo em caso de mora do devedor na realização da prestação indemnizatória, não há lugar a qualquer obrigação de indemnizar o dano autónomo da privação do uso do veículo - Cfr. Acórdão da Relação de Coimbra de 23.05.2006 (Ferreira de Barros), Processo 1323/06 e Acórdão da Relação de Lisboa de 25.06.2009 (Ezagüi Martins), Processo 1515/050TBMTJ.L1-2.

  12. No entanto, no caso sub judice, a indemnização pela privação do uso do veículo tem como fundamento o não pagamento atempado do valor da indemnização pelo furto do mesmo.

  13. Pelo que é do nosso entendimento que a solução que exclui a obrigação de indemnizar o dano autónomo da privação do uso do veículo, pelo menos nos casos de demora injustificada no pagamento da indemnização pela perda do veículo, não tem em devida consideração o equilíbrio a que todos os contratos devem estar sujeitos.

  14. Nem considera o princípio da boa-fé, “princípio postulado sem matizes nos contratos em geral, quer na sua fase preliminar – art. 227º do Código Civil – quer durante a sua execução, art.º 762º, nº 1, do mesmo diploma, princípio normativo, ou seja, regra de conduta que deve ser escrupulosamente observada pelos contraentes”, representando uma transferência para o...

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