Acórdão nº 454/17.6PTPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução09 de Maio de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 454/17.6PTPRT.P1 Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do PortoI. RELATÓRIO 1. No Processo Sumário nº 454/17.6PTPRT (do Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Local Criminal de Gondomar – Juiz 2), após realização da audiência de discussão e julgamento, no dia 25.01.2018 foi proferida sentença (constante de fls. 45 a 52) na qual se decidiu condenar o arguido B… (devidamente identificado nos autos) como autor material de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º nº1 e 2 do Decreto-Lei nº 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 6 (seis) meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.

  1. Inconformado, o arguido interpôs recurso (constante de fls. 61 a 69), finalizando a respectiva motivação com as seguintes conclusões (transcrição): “A – Apesar de a douta decisão do Tribunal a quo referir como atenuantes, tanto a confissão integral e sem reservas do Arguido, bem como a sua inserção familiar, social e profissional, entende que estes factores não são bastantes para optar por uma pena não privativa da liberdade.

    B – A decisão recorrida não deu cumprimento cabal ao artº. 70º. do C.P., nem tampouco teve em conta o critério de Prevenção Especial, tendo apenas em conta a Prevenção Geral, porque caso contrário, a opção teria de fazer-se por uma pena não privativa de liberdade.

    C – O douto Tribunal a quo não teve em conta que o Arguido confessou integralmente e sem reservas a factualidade constante da Acusação, tendo inclusive motivado a dispensa de prova testemunhal por parte do M.P.; está inserido familiar e socialmente, tendo a seu cargo a sua mãe, com vários problemas de saúde, e que dele depende; apesar de divorciado, paga mensalmente uma pensão de alimentos ao seu filho, mais as despesas deste, para além de conviver regularmente com ele; é trabalhador, com contrato por tempo indeterminado, numa empresa de serralharia metalúrgica, onde é serralheiro, descontando e pagando todos os seus impostos; do seu salário, está dependente a sua mãe e ele próprio, estando a seu cargo as despesas de água, eletricidade, gás, telefone e tv por cabo; tentou por 3 vezes tirar a carta de condução, mas sem sucesso, fruto da sua fraca escolaridade, aliada à sua baixa aptidão para exercícios que envolvam destreza mental.

    D – O Relatório Social do Arguido, bem como as declarações do Arguido, não foram postas em causa pelo douto Tribunal a quo, e comprovam todas as matérias alegadas na CONCLUSÃO C.

    E – Pelo que, deveria o Tribunal a quo ter optado por pena não privativa de liberdade, como é o caso da pena de multa, podendo fazer acrescer uma pena acessória de obrigação de frequência de uma escola de condução.

    E – Caso assim não se entenda, o que por mera hipótese de raciocínio se aventa, deveria o Tribunal a quo ter optado pela aplicação de pena de prisão ao Arguido, suspensa na sua execução, fazendo acrescer ou não uma pena acessória de obrigação de frequência de uma escola de condução, uma vez que estão cumpridos todos os requisitos do artigo 50.º do Código Penal.

    F – Em último caso, deveria o Tribunal a quo aplicar a pena de prisão, em regime de permanência na habitação com fiscalização por meios técnicos de controlo aplicada ao Arguido, nos termos do n.º 3 do art. 43.º do Código Penal, com as alterações introduzidas pela Lei 94/2007, de 23/08, permitindo desta forma que o Arguido se ausente da sua habitação para desenvolvimento da sua atividade profissional, nas instalações da sua E.P..

    G – Caso contrário, estaremos a assistir a uma flagrante violação do critério de Prevenção Especial, sendo que, em vez de contribuir para o restabelecimento da paz social que alegadamente foi afetada pela prática do ilícito-típico pelo Arguido, se iria instaurar um caos na vida do Arguido e dos que o rodeiam.

    H – Nomeadamente, o Arguido teria que despedir-se do seu emprego (recorde-se que tem contrato de trabalho por tempo indeterminado); deixaria de auferir qualquer quantia a título de salário; não teria acesso ao subsídio de desemprego, porquanto o contrato de trabalho terminaria por sua denúncia; deixaria de poder pagar as contas de água, eletricidade, gás, tv por cabo, telefone, telemóvel, alimentação, vestuário, despesas com medicação e tratamentos da mãe, pensão de alimentos ao filho, etc; no final dos seis meses de “cativeiro”, seria obrigado a procurar novo emprego, o que, tendo em conta a sua idade, se afigura uma tarefa quase impossível.

    Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Ex.as sempre mui doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, sendo feita inteira JUSTIÇA!!!” 3. O recurso foi admitido por despacho de fls. 72.

  2. O Ministério Público junto da primeira instância, a fls. 75 e 76, respondeu ao recurso, concluindo que o mesmo deverá improceder.

  3. Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, a fls. 83 a 87, sufragando a pretendida revogação da sentença recorrida na parte em que impôs a pena de 6 meses de prisão em regime de permanência na habitação e pugnando pela sua substituição por outra que a suspenda na sua execução, pelo período de um ano mediante obrigações e com o apoio e a fiscalização dos serviços de reinserção social, emitiu douto parecer no sentido da parcial procedência do recurso.

  4. No âmbito do art.º 417.º, n.º 2 do Código Penal, o arguido apresentou resposta através da qual veio manifestar a sua concordância ao parecer do Exmo. PGA (cfr. fls. 90).

  5. Foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência, cumprindo apreciar e decidir.

    1. FUNDAMENTAÇÃO1. Poderes cognitivos do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso Constitui jurisprudência corrente dos tribunais superiores que o âmbito do recurso se afere e se delimita pelas conclusões formuladas na motivação apresentada (artigo 412º, nº 1, in fine, do Código de Processo Penal), sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente por obstativas da apreciação do seu mérito, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410.º, n.º 2, do mesmo diploma, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R. I – A Série, de 28/12/1995).

    No caso vertente, vistas as conclusões do recurso (não pondo o recorrente sequer em causa a factualidade dada como provada e o enquadramento jurídico dos factos) as questões suscitadas pelo recorrente, versando unicamente sobre matéria de direito, e seguindo uma ordem de precedência lógica, são as seguintes: - saber se, perante a alternativa prevista no tipo legal de crime, deveria ter sido aplicada pena de multa e não pena de prisão; - saber se a pena de prisão deveria ter sido substituída por pena de multa; - na hipótese da resposta negativa à questão anterior, se a pena de prisão (ao invés de ter sido substituída por regime de permanência na habitação) deveria ter sido suspensa na sua execução.

    - a manter-se o regime de permanência na habitação, se deve ser concedida ao arguido a possibilidade de se ausentar da habitação para desenvolvimento da sua actividade profissional, nas instalações da sua E.P..

  6. Decisão recorridaDefinidas as questões a tratar, vejamos, desde já, quais os factos que foram dados como provados na sentença recorrida (transcrição): “Produzida a prova e discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos: 1. No dia 19 de Dezembro de 2017, cerca das 18h00m, o arguido conduziu o veículo automóvel da marca Hyundai, modelo …, com a matrícula .. - .. - VS, sua propriedade, na Avª …, em ….

  7. Fê-lo sem que possuísse carta de condução ou outro documento que legalmente o habilitasse a conduzir tal veículo na via pública.

  8. Agiu de forma livre, voluntária e consciente, sabendo proibida e punida por lei tal conduta.

  9. Confessou a sua apurada conduta e mostrou-se arrependido por a ter empreendido.

  10. O arguido cresceu no seio de uma família numerosa composta pelos progenitores e 7 descendentes, sendo o arguido um dos mais velhos. A progenitora assumia predominantemente as responsabilidades educativas dos filhos, cuja sustento era assegurado pelos rendimentos do trabalho do progenitor.

  11. Frequentou a escola até ao 6° ano de escolaridade. Não prosseguiu os estudos por falta de motivação, pelo que, aos 14 anos, começou a trabalhar com o progenitor e os irmãos mais velhos na empresa familiar.

  12. Constituiu família aos 30 anos de idade. Do casamento tem um filho com 22 anos.

  13. De 1992 a 2000 a empresa do progenitor cresceu exponencialmente com a instalação de rede de gás natural, laborando...

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