Acórdão nº 028/16 de Tribunal dos Conflitos, 25 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelLEONES DANTAS
Data da Resolução25 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal dos Conflitos

Conflito n.º 28/16.

Acordam no Tribunal dos Conflitos: I1 – A……… intentou na Secção Cível de Instância Local da Comarca da Madeira contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL DA MADEIRA, I.P. (I.S.S.M., I.P. — R.A.M.), ação declarativa com processo comum, formulando os seguintes pedidos: «a) declarar que à data do falecimento de B…………….. existia uma relação de união de facto entre o “de cujus” e a Autora; b) Declarar o direito à Autora às prestações por morte de B……………..; c) Condenar o Réu a reconhecer a união de facto entre a autora e B……………..; e) Condenar o Réu a reconhecer que a Autora tem direito a ser titular das prestações por morte do “de cujus”; f) Condenar o Réu ao pagamento das prestações por morte referente ao “de cujus”, - desde a data do óbito, - acrescidas dos respetivos juros à taxa legal.» Invocou como fundamento da sua pretensão, em síntese: - A 18 de abril de 2011, faleceu o senhor B…………….., no estado civil de divorciado; - Desde fevereiro de 1999 que B…………….. viveu maritalmente e ininterruptamente com a Autora, até ao seu falecimento.

- Viveram assim a Autora e B…………….. em união de facto durante 12 (doze) anos.

- A autora é divorciada desde 1999.

- A Autora e o falecido B…………….. viveram juntos e com residência comum sita no Sítio da ……… (s/n) 9350-………, freguesia e concelho da Ribeira Brava, Madeira.

- A morada referida no artigo precedente difere da morada atual da requerente, devido a uma alteração toponímica da rua, tratando-se da mesma residência.

- Na residência referida, a requerente viveu com o beneficiário B…………….. em comunhão de mesa, leito e habitação.

- Faziam as refeições juntos; Dormiam juntos; Pagavam em conjunto as despesas da casa, pelo que, inclusivamente, eram ambos titulares de uma conta bancária, no Banco Espírito Santo; Recebiam em casa os amigos e familiares de ambos; Vivendo em plena comunhão de vida; Amparavam-se e protegiam-se mutuamente na sua vida quotidiana; Auxiliavam-se e assistiam-se mutuamente em caso de doença; Comportando-se e agindo reciprocamente como se fossem marido e mulher; E como tal eram vistos e considerados por toda a gente, nomeadamente pelos vizinhos, família e amigos.

- Tendo sido, ainda, aqui a autora que pagou todas as despesas com as cerimónias fúnebres do “de cujus”.

- A Autora deu entrada do pedido de prestações por morte, como membro sobrevivo da união de facto, a 9 de maio de 2011.

- Requerimento onde fez prova da união de facto nos termos do número 2 do artigo 1.°, artigo 2.°-A, e número 3, do artigo 6.° da Lei da União de facto ex vi do artigo 8.° do Decreto-Lei 322/90 de 18.10, dando entrada de todos os formulários e documentação exigida para o referido processo.

- Tendo (...), sido notificada (notificação com data de saída a 10.01.2014 do Centro Nacional de Pensões) nos termos do artigo 101.º do CPA, da proposta de decisão de indeferimento ao requerido, para se pronunciar relativamente a essa mesma proposta.

- Logo responde a essa notificação, pronunciando sobre a proposta de indeferimento e requerendo novas diligências probatórias, nomeadamente inquirição de testemunhas e juntando mais documentos.

- Resposta essa que não foi tida em consideração, pois entenderam os Serviços do Centro Nacional de Pensões não se justificar “a interposição da ação prevista no art. 6.° da Lei n.° 7/2001, de 11/05, nem a realização de quaisquer diligências complementares, designadamente a inquirição das testemunhas ora indicadas.” - Assim, o pedido de prestação por morte foi indeferido por não ter sido reconhecido à Autora o direito às prestações por morte de B…………….., “pelo facto de não ter ficado provada a união de facto”.

- Ora, para reconhecimento do direito das prestações sociais por morte ao companheiro sobrevivo é necessário e suficiente a prova do preenchimento dos requisitos legalmente impostos para a eficácia da união de facto.

- Deste modo, a autora fez prova da união de facto em que viveu com o falecido, nos termos do n.° 2 do artigo 1.º, artigo 2.º-A e n.º 3 do artigo 6.º da Lei da União de Facto ex vi do artigo 8.º do Decreto-lei n.° 322/90 de 18-10, dando entrada de toda a documentação exigida.

- Pelo acima exposto, tem a autora direito à atribuição das prestações por morte do seu companheiro, com quem viveu em união de facto durante 12 (doze) anos.

2 - O Réu contestou, e, para além do mais, excecionou a competência material do tribunal judicial para conhecer do litígio, referindo, em síntese, que a Autora requereu, por via administrativa, o reconhecimento da união de facto com o falecido B……………..

e as prestações sociais daí derivadas, pretensão esta que foi indeferida por despacho do Diretor de Unidade do Departamento de Prestações do Réu e que não impugnou este ato administrativo junto da jurisdição competente.

Referiu ainda que a Autora pretende pela via da presente ação obter «sentença do foro cível, impugnar aquele ato administrativo e obter sentença que declare e reconheça uma união de facto e o direito à prestação por morte que foram expressamente indeferidas pela via da segurança social».

Conclui referindo que a competência para conhecer da ação instaurada pertence aos Tribunais Administrativos, nos termos do artigo 4.°, n.° 1, alínea a), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.

3 - No despacho saneador, o tribunal declarou a incompetência material do tribunal judicial para conhecer do litígio, referindo, em conclusão, que «se a A. não se conforma com a decisão proferida pelo ISS, deveria ter recorrido da mesma para os tribunais administrativos a fim de ver alterada a decisão desfavorável, não o fazendo, tendo intentado a presente ação, na jurisdição comum, estamos perante uma infração às regras da competência em razão da matéria a qual determina a incompetência absoluta da presente instância local cível, constituindo exceção dilatória, de conhecimento oficioso, que conduz à absolvição da Ré da instância, o que se decide (artigos 96.° al. a), 99.º, n.° 1, 278.°, n.° 1 al. a), 576.° n.° 2 e 577.°, al. a), todos do Código de Processo Civil)».

4 - Inconformada com este despacho, a Autora apelou dele para o Tribunal da Relação de Lisboa, que conheceu do recurso por acórdão de 18 de fevereiro de 2016, que integrou o seguinte dispositivo: «Termos em que acordam em julgar improcedente o recurso mantendo-se a sentença recorrida. Custas pela Recorrente».

5 – Irresignada com esta decisão a Autora interpôs recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, louvando-se do disposto nos artigos 671.°, n.° 1, 672.°, c) 675.°, n.° 1 e 676, n.° 1 do Código de Processo Civil, integrando no recurso apresentado as seguintes conclusões: «1 - Recorre a Autora, aqui Recorrente do, aliás, douto Acórdão proferido em segunda instância pelos Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa, por não se conformar com a decisão por estes proferida e por tal douto Acórdão estar em contradição com Acórdão de Uniformização do Supremo Tribunal de Justiça e com Acórdão da Relação do Porto, já ambos transitados em julgado, como infra explicitaremos.

2 - A recorrente, instaurou a presente ação tendente à declaração judicial e reconhecimento de que viveu em união de facto com B…………….. durante, pelo menos, 12 anos, e consequentemente, também o reconhecimento de que é titular do direito às prestações por morte deste.

3 - Tendo, para o efeito, formulado e individualizado, entre outros, o seguinte pedido, sob a alínea a) “declarar que à data do falecimento de B…………….. existia uma relação de união de facto entre o “de cujus” e a autora”; 4 - Relativamente ao qual o despacho saneador proferido nos autos, pelo tribunal de primeira instância, não se pronuncia, nem em todo, nem em parte.

5 - Foi, no entanto, decidido, pelo aludido despacho saneador/sentença que é omisso quanto ao pedido formulado e supra transcrito, que, ao ser intentada a presente ação num tribunal de jurisdição comum, se estaria perante “uma infração às regras de competência em razão da matéria a qual determina a incompetência absoluta da presente instância local cível”.

6 - Por ter pedido “a declaração judicial de reconhecimento do direito às prestações por morte, na modalidade de sobrevivência, decorrentes do óbito de B……………..”.

7 - Decisão esta que determinou a absolvição do Réu da instância e o termo do processo.

8 - Decisão que foi mantida pelo douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em segunda instância.

9 - Discordamos em absoluto de tal entendimento, pois pela leitura atenta, quer da petição inicial que deu início à ação, como da resposta às exceções, como ainda do recurso interposto para a segunda instância, se verifica que a Autora/Recorrente, não pediu apenas, e tão só, a declaração judicial de reconhecimento do direito às prestações por morte, na modalidade de sobrevivência, decorrentes do óbito de B……………...

10 - Pediu sim, e antes de qualquer outro pedido, a declaração, pelo tribunal judicial, de “que à data do falecimento de B…………….. existia uma relação de união de facto entre o “de cujus” e a Autora.

11 - Pois, por via da presente ação a Autora/recorrente pretende que seja declarado, judicialmente, que vivia em união de facto com B…………….. à data da sua morte, união de facto que durou por, pelo menos, doze anos, e que o Réu seja condenado a reconhecer essa mesma união de facto.

12 - Sendo esta, única e exclusivamente, a matéria controvertida na presente ação.

13 - Tendo, como não poderia deixar de ser, que intentar a presente ação judicial, junto do tribunal judicial, para ver declarado judicialmente que viveu em união de facto com B…………….., por mais de 2 anos (12 anos pelo menos!).

14 - Na medida em que, com as alterações introduzidas pela Lei n.° 23/2010, e nos termos do decidido em Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça “o contencioso administrativo continua a não se poder pronunciar sobre a existência do pressuposto básico da união de facto” (sublinhado nosso) 15 - Estamos assim...

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