Acórdão nº 368/12.6PFLRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Abril de 2014
Magistrado Responsável | MAIA COSTA |
Data da Resolução | 10 de Abril de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório AA, com os sinais dos autos, foi condenado, por acórdão de 3.7.2013 da 1ª Vara Mista de Loures, como autor material de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 131º e 132º, nºs 1 e 2, e) e j), do Código Penal (CP), na pena de 19 anos de prisão.
Desse acórdão recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 19.11.2013, negou provimento ao recurso.
Novamente inconformado, recorre agora o arguido para este Supremo Tribunal, alegando em conclusão: 1 - Vem o presente recurso interposto do acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, proferido pela 3.ª Secção, em recurso de decisão da 1.ª Vara Mista do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Loures, firmado no processo n.º 368/12.6PFLRS, sendo que a decisão recorrida manteve o acórdão da primeira instância, extirpando os vícios que lhe haviam sido apontados, e, por isso, apesar do muito e devido respeito, não pode merecer a concordância do Arguido e daí o presente recurso, que, mantém a impugnação da matéria de facto dada como assente, arguindo a Nulidade do acórdão e ilegalidade da medida da pena, requerendo uma melhor aplicação do direito, nos termos das Motivações e conclusões que infra seguem.
NULIDADE DA DECISÃO RECORRIDA 2 - O Recorrente apresentou recurso para o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, onde sindicou o Acórdão condenatório da 1.ª Vara Mista de Loures, firmado no processo supra identificado, invocando os vários defeitos que, no seu entender, o Douto Acórdão padecia.
3 - Os defeitos invocados foram: Foi dado como assente que o arguido cometeu o crime de homicídio qualificado, com fundamento na premeditação de matar a vítima, contrariando o parecer médico psiquiátrico e outros dados de factos, o que resulta de errada apreciação da prova; Foi dado como assente que o arguido não demonstrou arrependimento, novamente contrariando o parecer médico psiquiátrico; Não se aplicou o regime especial para jovens menores de 21 anos, constante do Dec. Lei 401/82, sendo certo que o arguido na data dos factos tinha 18 anos, com fundamentação que não encontra suporte nos factos dados como assentes e bem assim, em contrário ao parecer médico psiquiátrico; Existe contradição insanável entre a motivação de facto e a fundamentação, consubstanciada em que se deu como assente que o arguido revela elevada imaturidade, para depois se retirar como factual que o arguido tenha agido friamente e planeado matar, mais uma vez ao arrepio da perícia médico-legal, que refere o contrário.
O princípio da livre apreciação da prova (art.° 127.º do CPP) encontra limite nos JUIZOS técnicos decorrentes da prova pericial e o Tribunal a quo firmou a sua convicção em sentido contrário do juízo técnico decorrente da perícia médica.
Existiu violação do princípio "in dubio pro reo", quando o Tribunal, na dúvida sobre quem tinha a navalha, desfez a dúvida contra o arguido, quando a CRP e a lei manda fazer o inverso, sendo o Acórdão nulo nesta parte, dado que nenhum indício, facto, documento ou qualquer prova se produziu que infirmasse o que foi alegado pelo arguido, sendo que este disse que a vitima (que usava diariamente a navalha) foi quem puxou a navalha e que a tinha tirado, o que confere com os ferimentos na mão da vítima que apresentam cortes e o facto da mesma não ter aparecido pode ser devida a múltiplos factores que, na dúvida, não podem ser utilizados para prejudicar o arguido, como foram, esquecendo que o arguido nunca antes nem depois havia delinquido, sendo os acontecimentos algo de imprevisto e nunca imaginável.
Foram dados como assentes factos sobre os quais nenhuma prova, directa ou indirecta, se fez, nomeadamente, ninguém declarou em audiência, nem consta de qualquer outra prova material, que o arguido tenha dito a quem quer que fosse que o encontro tivesse sido marcado para o arguido "fazer a folha à vítima"; Não se retirou qualquer valor pelo facto do arguido estar afectado pelas denúncias da namorada de então que lhe dissera ter sido atacada e que a tentaram violar, além de lhe terem furtado o telemóvel, sendo que, em ocasião que o arguido estava com a namorada, recebeu uma mensagem do telemóvel daquela (que estava nas mãos dos assaltantes), para o seu telemóvel com o teor que consta nos autos. Pelo contrário, referiu-se que este foi um motivo fútil, próprio de garanhão, quando nada disso resultou da demais prova.
Foi dado valor excessivo ao relatório sobre a personalidade, elaborado por uma técnica do IRS, que entrevistou o arguido durante uma hora e esqueceu-se o que dele disseram professores que com o arguido conviveram anos, e que ficaram perplexos com o ocorrido, que assim o declararam em audiência, mais acrescentando que o arguido era um jovem normal, pacifico e que nunca causara o menor problema, provas que contrariam totalmente o relatório sobre a personalidade, que não pode ter mais valor do que o depoimento de professores.
A pena aplicada é demasiado elevada, atento que o arguido tinha 18 anos no momento da prática dos factos; nunca antes tinha delinquido, era um jovem enquadrado e socialmente considerado, educado, não se metendo em confusões e tudo ponderado resultou claramente demonstrado que a aplicação da legislação penal para jovens delinquentes tem, neste caso, particular razão de ser aplicada, visto que é manifestamente claro que as razões de ressocialização do jovem condenado assim o determinam e deveria, por isso, em razão da idade (e até da imaturidade como da sentença se retira, não esquecendo que o outro interveniente, fruto da jovem idade - 15 anos - foi punido com três anos de internamento) e das expectativas sérias de que se tratou de um caso irrepetível e por isso, são sérias as expectativas que a atenuação especial da pena, em razão da idade e das imposições da recuperação dos condenados, deveria e deve ser aplicada, com a pena a ser fixada em medida nunca superior a dez anos de prisão. Que é a média das penas aplicáveis para casos semelhantes e que se retira da jurisprudência.
O Tribunal a quo apresentou um quadro factual e psicológico do arguido, que não encontra eco no relatório médico-legal, o que redunda em contradição insanável, pois não se pode dar como assente que o arguido premeditou matar, quando o relatório pericial diz o seu contrario e, ao mesmo tempo, considerar como válido o mesmo relatório pericial, que, aliás, foi integralmente esclarecido e suportado pelo depoimento de um dos seus autores, o qual, em audiência, esclareceu claramente que o arguido demonstrava arrependimento sincero e não tinha havido premeditação, tendo os factos acontecido em crescendo.
O Tribunal a quo, ao decidir nos termos que constam no acórdão ora posto em crise, contém assim uma contradição insanável que resulta de ter dado credibilidade total ao relatório médico-legal, cujas conclusões se subtraem à livre apreciação do Tribunal e fazem prova plena do que neles consta.
4 - O Douto acórdão da Relação, de que se recorre, e ao qual se reconhece, e louva, ter-se efectivamente debruçado sobre todos os apontados defeitos, contudo, pecou por manter, integralmente uma posição colada à da 1.ª Instância, passando por cima de elementos de facto, existentes nos autos que levam a conclusão oposta, bem como omitiu parte da prova, referindo apenas uma das versões que a mesma prova faz concluir.
5 - E, por isso, ou o acórdão recorrido procedia a renovação integral da prova, para que se retirassem as dúvidas e razões concretas levantadas pelo recorrente, ou teria de explanar a totalidade da mesma, e não somente excertos para demonstrar a razoabilidade da decisão condenatória.
6 - Porque, a prova gravada, tem excertos, vários e longos, a demonstrar o contrário do que consta no acórdão ora posto em crise, assim procedendo, cometeu, inapelavelmente, a nosso ver e salvo o devido respeito, uma nulidade insuprível, por omissão e pronúncia, ao, não operando a renovação da prova, como o arguido a admitiu no recurso interposto, quando nesse sentido recorreu, não atentou a toda a prova já gravada, mas apenas a excertos retirados apenas para suportar a tese da decisão condenatória e nos termos da mesma, esquecendo os dados de facto e provas existentes, que indicavam o contrário.
7 - Manteve-se no acórdão recorrido, a subalternização do teor do relatório pericial - isto é uma prova de conteúdo científico, subtraído à livre apreciação de prova - retirando-lhe a validade de prova pericial, porque determinante de uma visão do arguido e dos factos bastante diferente, em contraponto com outra prova pericial, que foi a perícia sobre a personalidade, feita em moldes semelhantes aos da perícia médico-legal. Isto é uma valeu e a outra não. Não pode haver dois pesos e duas medidas para provas de valor igual, ou sendo de valor diferente, a prova pericial é de valor superior e, em qualquer dos casos, subtrai-se à livre apreciação do julgador, por se tratar de juízo científico.
8 - Juízo científico este que determinou claramente estar o arguido arrependido e tal arrependimento ser sincero.
9 - Nesta medida, o arguido invoca a nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia, no segmento de que o Tribunal a quo, deveria ou ter procedido à renovação da prova, ou, não o fazendo, ter em conta toda a prova produzida e não somente excertos da mesma, sendo que, por exemplo, opina-se que o arguido não demonstrou arrependimento e apenas se preocupou com o seu futuro, quando o arguido, em várias sessões, e estão gravadas, disse, por exemplo isto: 10 - "lembro-me muitas vezes do que fiz" "até a ver-me ao espelho me custa olhar para mim" "custa-me a dormir á noite, muitas vezes vejo e revejo o que aconteceu" "pergunto-me como fui capaz" "vejo a cara do CC, que era meu amigo e que perdeu a vida e a culpa é minha", expressões, que se transcrevem de memória e dos apontamentos tirados em audiência, mas constam nas várias declarações que o arguido prestou...
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