Acórdão nº 3193/09.8TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Novembro de 2014
Magistrado Responsável | MELO LIMA |
Data da Resolução | 19 de Novembro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça (Revista) – 4ª Secção (ML/MBM/PH) I. Relatório 1.
No Tribunal do Trabalho de Lisboa, AA, propôs, contra BB, …, Lda.
, a presente ação de impugnação de despedimento coletivo, sob a forma de Processo Especial, pedindo que seja declarada a ilicitude do despedimento coletivo que o abrangeu, sendo a ré condenada a pagar-lhe o valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado, computadas, à data da entrada da petição inicial, em € 19.296,90, e no pagamento de € 50.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescidas, tais quantias, de juros de mora desde o vencimento até integral e efetivo pagamento.
Na pendência da ação o A. optou pela indemnização em substituição da reintegração (cfr. fls. 230).
Alegou, em síntese, que a R. não fundamentou devidamente os motivos que impuseram a redução do número dos seus trabalhadores, bem como não concretizou, objetivamente, o critério que utilizou para a seleção dos trabalhadores a despedir, violando o disposto nos artigos 350.º e 360.º, n.º 2, al. c), do CT, bem como o disposto no artigo 53.º da CRP.
Alegou, ainda, que auferia a retribuição mensal de € 6.000,00, acrescida de um subsídio de refeição cuja média mensal era de € 147,00, bem assim, o valor do uso da viatura atribuída, correspondente a € 1.000,00 mensais.
Mais alegou que, em consequência do despedimento, ficou profundamente abalado, angustiado e perturbado o que lhe causou danos não patrimoniais que computa em € 50.000,00.
Citada, a R. deduziu contestação, sustentando ter observado os procedimentos devidos, sendo o despedimento lícito.
No essencial, alegou não ter suporte na lei a remissão feita pelo A. do art. 383.º, al. a), para o art. 360.º n.º 2, ambos do CT/09, já que a mesma não resulta da norma, significando que a enunciação dos critérios de seleção dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento não constitui uma exigência legal cuja preterição justifique a ilicitude do despedimento coletivo. Assim, ainda que a indicação do critério não tivesse sido concreta e objetiva, tal não constituiria motivo para a ilicitude do despedimento. Contudo, defende, concretizou o critério, o qual foi: (i) avaliação de desempenho; (ii) reflexos da perda de contas nas funções desempenhadas ou categorias envolvidas; (iii) contratos a termo; (iv) redundâncias decorrentes da necessidade de aproveitamento de sinergias. A razão de ser da escolha do autor é nítida, existindo o nexo de causalidade entre as dificuldades financeiras sentidas pela ré e a necessidade de despedimento do autor.
Mais alega que concretizou devidamente os motivos para o despedimento coletivo, os quais estão comprovados, enquadrando-se a decisão adoptada em critérios de gestão da empresa, os quais nem sequer são sindicáveis, como é entendimento da doutrina e da jurisprudência.
Impugna, ainda, o valor da retribuição invocado pelo autor.
No que respeita ao uso do veículo, contrapondo que aquele limita-se a avaliar a utilidade económica, sem invocar qualquer fundamento fáctico para o efeito, não correspondendo à verdade que tivesse sido colocado à sua disposição para além do período normal de trabalho, tendo direito ao uso pessoal sem limitações. O veículo estava atribuído para uso profissional.
Conclui, pedindo seja julgada improcedente a presente acção.
Procedeu-se à nomeação de assessores, os quais elaboraram os relatórios periciais.
Foi convocada e realizada a audiência preliminar a que se refere o art. 160.º do CPT, tendo sido proferido despacho saneador e conhecido parcialmente o pedido, nomeadamente quanto à alegada ilicitude do despedimento.
Sobre essa questão, a 1.ª instância, com os fundamentos constantes da decisão exarada em ata, decidiu o seguinte: - «a. Julgar ilícito o despedimento de que o autor foi alvo; b. Condenar a R.“BB, Lda.” a pagar ao A. as quantias referentes às retribuições (incluindo isenção de horário de trabalho e subsidio de alimentação, férias, subsídios de férias e de Natal, desde 01 de junho de 2009, até ao trânsito em julgado da presente sentença, descontadas as importâncias que o autor tenha obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento; c. Condenar a R. “BB, Lda.” a pagar ao A. uma indemnização que se fixa em 30 dias por cada ano completo ou fração de antiguidade – € 4.800,00 - e às retribuições desde 01 de outubro de 2008, até ao trânsito em julgado da presente decisão.
(.)».
Em seguida, a 1.ª instância determinou o prosseguimento da ação para apreciação dos créditos peticionados, tendo, para o efeito, procedido à seleção da matéria de facto relevante.
Posteriormente procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal, tendo sido elaborada resposta à matéria de facto.
Subsequentemente, foi proferida sentença, decidindo-se nos termos seguintes: «(..) 3.1. Nos termos e fundamentos expostos e atentas as disposições legais citadas, decide-se: 3.1.1. Declarar que o A. auferia retribuição base mensal € 4.800,00 (quatro mil e oitocentos euros), acrescida da quantia mensal de € 1.200,00 ilíquidos (mil e duzentos euros) a título de isenção de horário de trabalho e do subsídio de refeição de € 7,00 (sete euros) por cada dia de trabalho efetivo.
3.1.2. Absolver a R. do pedido de indemnização por danos não patrimoniais [3. al. b)].» 2.
Inconformada com a decisão proferida no despacho saneador que decidiu do mérito relativamente à ilicitude do despedimento, apresentou a R. recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Por seu turno, inconformado com a sentença final, o A. apresentou recurso de apelação.
O Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão datado de 4 de Junho de 2014, julgou «o recurso da recorrente procedente, revogando a decisão proferida na fase de saneamento julgando o despedimento ilícito e, consequentemente, absolvendo a R. dos pedidos deduzidos pelo A.». No que respeita ao recurso de apelação que o A. havia interposto da sentença final, o Tribunal da Relação considerou prejudicado o seu conhecimento, por força da solução alcançada quanto ao recurso interposto pela R.
É contra esta decisão que se insurge, agora, o A., no recurso de revista que interpôs para este Supremo Tribunal de Justiça, alinhando, para o efeito, as seguintes conclusões: «
-
Nos termos do artigo 383°, a), do CT, o despedimento é ilícito se o empregador não tiver feito a comunicação da intenção de proceder ao despedimento prevista nos números 1 a 4 do artigo 360.° do CT.
-
Nos termos do número 2 do artigo 360.° do CT, daquela referida comunicação devem constar, entre outros, os critérios para seleção dos trabalhadores a despedir.
Quando a lei fala na falta da comunicação prevista é óbvio que se reporta à falta de comunicação tal como está prevista e não a uma qualquer comunicação. Se nessa comunicação faltar qualquer dos elementos imperativa e taxativamente impostos pelo número 2 do artigo 360.°, é evidente que essa comunicação não corresponde à comunicação prevista.
-
A indicação dos critérios de seleção destina-se a servir, sob pena de inutilidade legal, para estabelecer a necessária ligação entre a fundamentação invocada para o despedimento coletivo e o concreto despedimento de cada trabalhador abrangido.
O que, manifestamente, não é possível no caso presente.
-
A não indicação de critérios objetivos que possibilitem aquele referido escrutínio equivale à ausência da indicação de critérios de selecção, imposta pela alínea c) do n.º 2 do artigo 360.º do Código do Trabalho, afetando a validade da própria comunicação prevista nos números 1 a 4 do artigo 360.º do mesmo código.
-
No caso sub judicio, da enunciação dos critérios de seleção indicados pela Recorrida, não se descortina a razão da escolha dos trabalhadores abrangidos, nomeadamente do A., Recorrente.
-
Devendo concluir-se que a indicação dos critérios dos trabalhadores abrangidos pelo despedimento coletivo é genérica e abstracta, equivalendo à ausência de indicação de critérios de seleção como impõe o n.º 1 e a alínea c) do n.º 2 do artigo 360.º do Código de Trabalho, o que equivale à ilicitude do despedimento coletivo de que o autor foi alvo em face do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 383.º do Código de Trabalho.
-
O art. 53.° da CRP ao prever que "são proibidos os despedimentos sem justa causa", proíbe os despedimentos imotivados, não admite a denúncia discricionária por parte do empregador, e apenas possibilita a cessação do contrato de trabalho por vontade do empregador se existir uma justificação ou motivação válidas para o efeito.
Conclui-se, pois, que o presente despedimento coletivo corresponde a um despedimento "seletivo", "à pinça", concretizando um objetivo da R. estranho ao instituto legal, pretendendo encobrir, sob a aparência de um expediente legalmente admitido, o despedimento ilícito do A.
-
O acórdão recorrido está em manifesta contradição com o acórdão da mesma Relação de Lisboa no processo 2261/09.0TTLSB-L1 (agravo da decisão do procedimento cautelar de suspensão do despedimento). Ora, sendo a matéria de facto em apreciação exatamente a mesma - porque versando apenas sobre o teor da comunicação da empregadora - e o caso o mesmo, não abona a crédito da Justiça a prolação de duas decisões, do mesmo tribunal de recurso, completamente opostas.
-
O acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 360.°, n.º 2, al. c), 381.°, alínea c), e 383.º, alínea a), todos do Código do Trabalho e, ainda, o disposto no artigo 53° da CRP».
Conclui pela revogação do acórdão recorrido, «confirmando-se a declaração de ilicitude do despedimento do A., Recorrente, proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância».
Requer, ainda, que, «subsequentemente, se[ja] apreciado o recurso de apelação interposto pelo A. da sentença final em 1.ª instância, apreciação prejudicada pela decisão do acórdão recorrido».
A ré pugnou pela improcedência do recurso e pela confirmação do julgado.
Neste...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 1891/15.6T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Outubro de 2017
...de dados. [9] Maxime, nos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20.10.2011 (Proc. 947/08.6TTLSB-A.L1.S1) e de 19.11.2014 (Proc. 3193/09.8TTLSB.L1.S1). Nas Relações, vide por todos o Acórdão desta Relação de Évora de 14.02.2012 (Proc. 39/10.8TTSTB.E1) e da Relação de Lisboa de 12.02.201......
-
Acórdão nº 3338/15.9T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Janeiro de 2019
...comunicação contém todos os elementos necessários, não se verificando a apontada nulidade. Veja-se o Ac. STJ de 19/11/2014, processo nº 3193/09.8TTLSB.L1.S1, onde se refere…” “Importa relembrar que o artigo 383.º 1 al. a), do CT/09, não se refere à falta de indicação de critérios para seleç......
-
Acórdão nº 146/14.8TTFUN.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Maio de 2015
...legais em termos que permitam a sua sindicação. Como proclamou o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. acórdão de 19.11.2014, proc. 3193/09.8TTLSB.L1.S1), “Tratando-se de um despedimento coletivo, na comunicação por escrito à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ......
-
Acórdão nº 1891/15.6T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Outubro de 2017
...de dados. [9] Maxime, nos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20.10.2011 (Proc. 947/08.6TTLSB-A.L1.S1) e de 19.11.2014 (Proc. 3193/09.8TTLSB.L1.S1). Nas Relações, vide por todos o Acórdão desta Relação de Évora de 14.02.2012 (Proc. 39/10.8TTSTB.E1) e da Relação de Lisboa de 12.02.201......
-
Acórdão nº 3338/15.9T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Janeiro de 2019
...comunicação contém todos os elementos necessários, não se verificando a apontada nulidade. Veja-se o Ac. STJ de 19/11/2014, processo nº 3193/09.8TTLSB.L1.S1, onde se refere…” “Importa relembrar que o artigo 383.º 1 al. a), do CT/09, não se refere à falta de indicação de critérios para seleç......
-
Acórdão nº 146/14.8TTFUN.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Maio de 2015
...legais em termos que permitam a sua sindicação. Como proclamou o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. acórdão de 19.11.2014, proc. 3193/09.8TTLSB.L1.S1), “Tratando-se de um despedimento coletivo, na comunicação por escrito à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ......