Acórdão nº 10731/10.1TBVNG.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução13 de Novembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. 10731/10.1TBVNG.P2.S1 R-474[1] Revista Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, intentou em 26.11.2010, no Tribunal de Família e Menores da Comarca de ... – 2º Juízo - Acção de Divórcio Litigioso (divórcio sem consentimento de um dos cônjuges), contra: BB.

Alegando, em síntese: Autora e Réu casaram catolicamente e sem convenção antenupcial no dia 4 de Junho de 1988.

Deste casamento existem dois filhos maiores.

O Réu vive na casa de morada de família mas já não dorme, não come nem convive com a mulher, não contribuindo para as despesas do respectivo agregado.

A Autora e o Réu estão separados de facto desde Março de 2007.

Não existem bens comuns a partilhar.

Conclui, requerendo que a acção seja julgada procedente e, em consequência decretado o divórcio entre a Autora e o Réu, tendo por fundamento as alíneas a) e d) do art.1781º do Código Civil.

Realizou-se sem êxito a tentativa de conciliação a que alude o art.º1407º, nº1 do C.P. Civil.

Notificada para o efeito veio o Réu contestar, impugnado parte dos factos alegados pela Autora, designadamente a sua ausência da casa de morada de família e a não contribuição para as despesas do agregado.

Mais afirma que existem bens comuns a partilhar (o recheio da casa).

Conclui, pedindo a condenação da autora como litigante de má fé.

Notificado para vir esclarecer se deduz oposição a que o divórcio em apreço seja convolado para divórcio por mútuo consentimento, veio o Réu dizer que não se opõe desde que seja obtido acordo quanto à casa de morada da família.

Perante tal posição foi então proferido despacho que, não obstante a falta de acordo quanto à atribuição da casa de morada de família, converteu os autos em divórcio por mútuo consentimento.

Inconformado com esta decisão dela veio recorrer o Réu.

Tal recurso não foi admitido, por se considerar que a decisão recorrida só poderia ser impugnada no recurso que venha a ser interposto da decisão final ou em recurso único a interpor após o trânsito da mesma decisão.

Tal despacho foi objecto de reclamação para a Relação do Porto, que, no entanto. o confirmou.

Entretanto, os autos prosseguiram os seus termos, no que diz respeito à questão em litígio, acabando por ser proferido despacho que decidiu atribuir ao Réu o direito ao arrendamento da casa de morada de família.

A Autora veio interpor recurso de apelação da mesma decisão.

Este recurso foi decidido por acórdão que revogou a decisão proferida e decidiu atribuir à Autora o direito ao arrendamento da casa de morada de família.

Esta decisão foi objecto de recurso de revista por parte do Réu.

O Supremo Tribunal de Justiça, atento o disposto no nº2 do art.º1411º do Código de Processo Civil, não admitiu tal recurso.

*** Na sequência dessa decisão, entretanto transitada em julgado, foi proferida sentença que, nos termos do disposto nos artigos 1775º e 1779º do Código Civil e “tendo por devidamente acautelados os interesses dos cônjuges, homologou os acordos já celebrados nos autos e decretou o divórcio por mútuo consentimento entre os requerentes AA e BB”.

*** Inconformado, o Réu BB, recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, que, por Acórdão de 27.3.2014 – fls. 313 a 318 –, julgou improcedente o recurso de apelação, confirmando inteiramente as decisões recorridas.

*** Inconformado, interpôs o Réu recurso de revista excepcional para este Supremo Tribunal de Justiça – que foi admitido por Acórdão de 9.9.2014 – fls. 368 a 372 – tendo alegado e formulado as seguintes conclusões: I. O recorrente vem pedir revista excepcional ao abrigo do disposto no art. 721º-A, n° 1, a), b) e c) do Código de Processo Civil, em vista do que remete para os fundamentos expostos na 1ª parte das alegações, aqui dados por reproduzidos; II. Essencialmente alega, atentos os fundamentos invocados, que a questão exposta no recurso não tem sido objecto de decisões mais ou menos consensuais, apesar da sua aparente simplicidade; considerando ainda a natureza da matéria e a incidência que tem no estado da pessoa e relações familiares, não se lhe pode negar a relevância social; por último, a decisão do douto acórdão recorrido está em contradição (ao menos de forma implícita) com a do acórdão fundamento, na medida em que neste se exige a manifestação de adesão de ambos os cônjuges para a conversão de divórcio sem consentimento em divórcio com mútuo consenso, enquanto no acórdão recorrido se convalidou essa conversão, independentemente da expressão dessa vontade por parte de um dos cônjuges; III. Um dos fundamentos da douta decisão de 1ª instância para decretar o divórcio de mútuo consentimento foi a existência dos “acordos já celebrados nos autos”; IV. Todavia, quanto à casa de morada de família, não houve qualquer acordo, conforme revela ipsis verbis a acta de fls. 67; ora tendo o recorrente subordinado a existência de tal acordo à sua adesão ao divórcio por mútuo consentimento e não ocorrendo o facto condicionado, tal significa que o recorrente não deu o seu acordo a tal conversão; V. Entendeu todavia o tribunal que podia enveredar pelo divórcio de mútuo à revelia da vontade de um dos cônjuges, faltando apenas um dos acordos; no caso dos autos foi-se mais longe, pois a conversão do tipo de divórcio ocorreu contra a manifestação de vontade nesse sentido; VI. Todavia, embora a lei permita que de comum acordo ambos requeiram o divórcio por mútuo, mesmo na falta de um dos acordos a que alude o art. 1775º do Código Civil, não se segue que o tribunal possa suprir motu proprio essa falta de adesão, quando há apenas um dos ditos acordos por preencher; VII. Por outras palavras, não havendo manifestação conjunta dessa vontade, e hão-de ser os requerentes a manifestá-la e a sujeitar-se às consequências da sua opção, não pode o tribunal enveredar pela dita conversão.

VIII. Face do exposto, a conferência do divórcio para convalidar o divórcio por mútuo consenso (como foi feita) não faz qualquer sentido, pois que é da essência do mútuo acordo a vontade de ambos no mesmo sentido; IX. Deste modo, a decisão do douto acórdão recorrido que convalidou o entendimento expresso em 1ª instância, ou seja, o de que na falta de um dos acordos era lícito ao tribunal enveredar pelo divórcio de mútuo consenso, mesmo sem manifestação de vontade de ambos os cônjuges nesse sentido, não deve ser mantida, por desconformidade com a lei; X. A douta decisão, por erro de interpretação, violou as disposições contidas nos arts. 1773º, n°2, 1775º, 1778º-A e 1779º do Código Civil.

Nestes termos, deve ser admitida a revista excepcional, e, admitida, revogada a douta decisão recorrida por violação das disposições referenciadas.

Não houve contra-alegações.

*** Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Relevam os factos constantes do Relatório: a revista excepcional foi admitida por se considerarem verificados os requisitos das als. a) e b) do nº1, do art. 672º do Código de Processo Civil, e não tanto em função da alegada contradição de julgados, invocada pelo recorrente, que na perspectiva do Acórdão da Formação – fls. 368 a 369 verso – pareceu não se verificar.

Fundamentação: Sendo pelo teor das conclusões das alegações do recorrente que, em regra, se delimita o objecto do recurso – afora as questões de conhecimento oficioso – importa saber: - se, no caso, estão preenchidos os pressupostos para converter o divórcio sem consentimento do outro cônjuge, em divórcio por mútuo consentimento, e consequentemente, com base nesta modalidade, decretar o divórcio dos cônjuges, não existindo consenso quanto à atribuição da casa de morada de família; Foi requerido pela Autora divórcio sem consentimento do outro cônjuge e a convite do Julgador para conversão do divórcio para...

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