Acórdão nº 99/14.2YRFLS de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução05 de Novembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça - Nos autos de processo comum com o nº 99/14.2YFLSB do 1º juízo criminal da comarca de Portimão: foi submetido a julgamento em tribunal colectivo, o arguido AA, ...., actualmente preso no Estabelecimento Prisional de ..., na sequência de acusação contra ele formulada pelo Ministério Público, que lhe imputava a prática, como autor material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, nº 1 do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro.

- Realizado o julgamento, o Tribunal Colectivo deliberou por acórdão de 27 de Fevereiro de 2014: “a- Condenar o arguido AA pela prática, como autora material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, nº 1 do D.L. nº 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de cinco anos e dez meses de prisão.

b- Condenar o arguido no pagamento de 4 UC de taxa de justiça, e nas custas do processo, fixando-se a procuradoria em ¼ da taxa de justiça.

c- Declarar perdida a favor do Estado a droga apreendida nos autos, bem como os demais objectos e quantias apreendidos ao arguido (cfr. art. 109º do Código Penal e art. 35º do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro).

d- Ordenar a destruição da droga apreendida, nos termos do disposto no nº 6 do art. 62º do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro.

e- Determinar que, em conformidade com o disposto no art. 8º da Lei 5/2008, de 12 de Fevereiro, oportunamente, se proceda à recolha de amostras de ADN do arguido AA.

* O arguido AA aguardará o trânsito em julgado desta decisão na situação processual em que se encontra, já que integralmente se mantêm os pressupostos de facto e de direito que justificaram a sua sujeição a prisão preventiva – agora reforçados com a condenação de que foi alvo.

Deixa-se consignado que o arguido se encontra em prisão preventiva, à ordem dos presentes autos, desde 20.09.2013 (tendo sido detido em 19.09.2013).

* Notifique.

Boletins à DSIC.

Comunique – art. 64º do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro.

* Procede-se a depósito, nos termos legais.” - Inconformado com a decisão, dela recorreu o arguido para este Supremo Tribunal, concluindo assim a motivação de recurso: 1. O arguido confessou integralmente e sem reservas o teor da acusação que contra si havia sido deduzida; 2. Como consequência dessa confissão integral e sem reservas, o Ministério Publico prescindiu de 15 (quinze) das 16 (dezasseis) testemunhas por si arroladas na acusação.

  1. Como decorrência das declarações do arguido e da sua colaboração com o Tribunal e a justiça a audiência de julgamento teve Inicio às 10 horas e 16 minutos e encerramento às 11 horas e 12 minutos, ou seja, demorou menos de 1 (um) hora.

  2. Ainda como consequência da sua colaboração o tribunal “a quo” deu como provado todos os factos constantes do libelo acusatório, designadamente, que: A – (…); B – (…) C – (…) D – (…) E – (…) F – (…) G – (…) H – (…) I – (…) J – (…) K - O arguido AA, de ... anos de idade é natural de ..., onde cresceu inserido numa família numerosa, alargada, sem a presença do pai, que se encontrava emigrado. Foi o primeiro de uma fratria de sete, entre germanos e consanguíneos. Concluiu o ensino secundário no país de origem. Aos 20 anos veio para Portugal continuar os estudos como bolseiro, na Universidade ..., em ..., mas interrompeu passados dois anos e juntou-se ao pai, na zona da Grande Lisboa. Aos 22 anos casou com a actual mulher, organizando uma vida juntos na linha de Sintra, próximos às famílias de ambos.

    L - Foi em Portugal que registou os primeiros contactos com o mundo do trabalho, através dos familiares, como ajudante num café ou na construção civil. Mas foram experiências pontuais, sem vinculo laboral, M - Pese embota o passado aparentemente ajustado e o apoio familiar encontrado no país de acolhimento, incluindo o casamento com uma conterrânea, o arguido regista um estilo de vida muito permeável a factores de risco criminógeneo, designadamente: inconsistência de referências estruturadas, tendo desistido dos estudos e não tendo conseguido manter uma actividade laboral continuada; confronto com significativas dificuldades económicas; fácil associação a relacionamentos prócriminais, com significativa mobilidade fora do seu meio familiar N - Em meio prisional tem tido um comportamento ajustado, discreto, sem registo de ocorrências disciplinares. A família do arguido afirma-se disposta a continuar a apoiá-lo. Em termos de futuro, os projectos do arguido são de reatar a vida familiar junto da sua mulher. Mostra-se desapontado com as oportunidades que idealizou encontrar no país de acolhimento, mas, ainda assim, não pretende regressar a ...e.

    O - O arguido encara o seu problema jurídico-penal com relativo conformismo, revelando juízo auto-crítico, ciente da dimensão criminal dos factos por que se encontra acusado e dos factores de risco que o conduziram a este envolvimento. Confessou na íntegra os factos.

    P – (…) Q – (…); III – B) DO ERRO NA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DA FACTUALIDADE PROVADA 5. Ao contrário do douto entendimento expresso no Acórdão recorrido, sempre se dirá, com o devido respeito por melhor opinião, que a matéria de facto dada como provada deveria ter sido subsumida pelo tribunal “a quo” no tipo privilegiado previsto no artigo 25º, al. a) da Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro - trafico de menor gravidade - e não na disposição legal contida no artigo 21º deste diploma legal.

    Vejamos porquê: 6. Sumariando o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23-11-2011, Proc. 127/09.3PEFUN.S1, in www.dgsi.pt, podemos ler que: “(…) IX - A diminuição de ilicitude que o tráfico de menor gravidade pressupõe resulta de uma avaliação global da situação de facto, atenta a qualidade ou a quantidade do produto, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção.

    X - Mas, a avaliação de uma actividade, seja ela qual for, obriga a uma definição prévia de critérios (ou de exemplos-padrão) e, portanto, dir-se-á que o agente do crime de tráfico de menor gravidade do art.º 25.º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, deverá estar nas circunstâncias seguidamente enunciadas, tendencialmente cumulativas: a) A actividade de tráfico é exercida por contacto directo do agente com quem consome (venda, cedência, etc.), isto é, sem recurso a intermediários ou a indivíduos contratados, e com os meios normais que as pessoas usam para se relacionarem (contacto pessoal, telefónico, internet); b) Há que atentar nas quantidades que esse vendedor transmitia individualmente a cada um dos consumidores, se são adequadas ao consumo individual dos mesmos, sem adicionar todas as substâncias vendidas em determinado período, e verificar ainda se a quantidade que ele detinha num determinado momento é compatível com a sua pequena venda num período de tempo razoavelmente curto; c) O período de duração da actividade pode prolongar-se até a um período de tempo tal que não se possa considerar o agente como “abastecedor”, a quem os consumidores recorriam sistematicamente em certa área há mais de um ano, salvo tratando-se de indivíduo que utiliza os proventos assim obtidos, essencialmente, para satisfazer o seu próprio consumo, caso em que aquele período poderá ser mais dilatado; d) As operações de cultivo ou de corte e embalagem do produto são pouco sofisticadas.

    e) Os meios de transporte empregues na dita actividade são os que o agente usa na vida diária para outros fins lícitos; f) Os proventos obtidos são os necessários para a subsistência própria ou dos familiares dependentes, com um nível de vida necessariamente modesto e semelhante ao das outras pessoas do meio onde vivem, ou então os necessários para serem utilizados, essencialmente, no consumo próprio de produtos estupefacientes; g) A actividade em causa deve ser exercida em área geográfica restrita; h) Ainda que se verifiquem as circunstâncias mencionadas anteriormente, não podem ocorrer qualquer das outras mencionadas no art.º 24.º do DL 15/93.” 7. In casu, mostram-se cumulativamente preenchidas as circunstâncias enunciadas no douto acórdão para a qualificação do crime no tipo privilegiado do artigo 25.º do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro.

  3. A tipificação do artigo 25° parece significar o objectivo de permitir ao julgador que, sem prejuízo do natural rigor na concretização da intervenção penal relativamente a crimes desta natureza, encontre a medida justa de punição em casos que, embora porventura de gravidade ainda significativa, ficam aquém da gravidade do ilícito justificativa da tipificação do artigo 21° e encontram resposta adequada dentro das molduras penais previstas no artigo 25°.

  4. «In casu», e face à factualidade provada, interpretada à luz do espírito do sistema global, tendo-se presentes as implicações do princípio da proporcionalidade e aquele entendimento jurisprudencial, sempre se dirá que se estaria perante uma actividade de tráfico de menor gravidade nos termos previstos no artigo 25° do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro.

    No entanto, à cautela, Por dever de patrocínio, III - C) DA MEDIDA DA PENA 10. Ainda que se entenda, o que apenas se admite por dever de patrocínio, que o Recorrente cometeu um crime de tráfico p. e p. pelo artigo 21.º do D.L. nº 15/93, de 22 de Janeiro, sempre se dirá que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.

  5. Na determinação da pena, o tribunal atenderá a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente: a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; b) A intensidade do dolo ou da negligência; c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica; e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do...

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