Acórdão nº 1784/03.0PSLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Julho de 2014

Magistrado ResponsávelSOUTO DE MOURA
Data da Resolução25 de Julho de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

AA, nascida a --- em ---, ---, ---, residente em ---, e presentemente reclusa no estabelecimento prisional de Tires, foi julgada por tribunal coletivo e em processo comum, na 8ª Vara Criminal de Lisboa e, por acórdão de 18/12/2013, condenada pela prática dos seguintes crimes: · 1 crime de furto, consumado, (p. e p. pelo artº 203º, nº 1 CP), na pena de 6 meses de prisão, · 1 crime de violação de correspondência, consumado (p. e p. pelo artº 194º, nº 1 CP), na pena de 3 meses de prisão, · 7 crimes de falsificação de documentos, consumados (p. e p. pelo artº 256º, nº 1, als. a), b), c) e nº 3 do CP), na pena de 12 meses de prisão por cada um deles, · 1 crime de burla, consumado (p. e p. pelo artº 217º, nº 1 CP), na pena de 9 meses de prisão, · 2 crimes de burla qualificada, consumados (p. e p. pelo artº 218º, nº 1 e 2, al. b) do CP – NUIPC 15/04.0ZCLSB e NUIPC 1330/04.8PCCSC), na pena de 2 anos de prisão por cada um deles, · 14 crimes de burla qualificada, consumados (p. e p. pelo artº 218º, nº 1 e 2, al. b) do CP – NUIPCs 1588/04.2POLSB, 384/05.4POLSB, 719/05.0PULSB, 760/05.2PTLSB, 6614/05.5TDLSB, 531/05.6SDLDB, 513/05.8PELSB, 1418/05.8PTLSB, 9313/05.4TDLSB, 340/06.5POLSB, 1111/05.1PRLSB, 11958/05.3TDLSB, 23/07.8S5LSB e 453/07.6PBVIS), na pena de 2 anos de prisão por cada um deles; Em cúmulo, foi condenada na pena conjunta de 9 anos de prisão, para além da condenação no pagamento de uma indemnização cível no valor de € 960.

Insatisfeita, a arguida interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, mas porque se verificou que era apenas em relação à pensa única de 9 anos de prisão, que a arguida manifestara a sua discordância, foi entendido que o tribunal competente para conhecer deste recurso era o STJ, e daí os autos terem sido remetidos a esta instância.

A - FACTOS Deram-se por provados os seguintes factos: "A - Dos cheques de BB I – NUIPC ---, --- (1) Em 1.10.2003, BB requisitou uma caderneta de cheques da sua conta nº --- da---, que deveriam ser remetidos, via CTT, para a sua morada (sita na---) em Lisboa.

(2) AA tinha acesso às partes comuns desse prédio, pois havia arrendado o 8º andar do mesmo; (3) Apoderou-se do envelope contendo esses cheques, abriu-o e logo formulou o propósito de os utilizar em seu proveito.

(4) AA assinou-os (nalguns apôs a assinatura da titular dos cheques noutros a sua própria assinatura), preencheu-os e deu-lhes o seguinte destino: a) cheque nº---, em 06.10.2003, no valor de €300,75, apôs o nome de BB, depositou-o na sua conta da ...

  1. cheque nº 842458542, em 07.10.2003, no valor de €200,00, apôs o nome de BB, depositou-o na sua conta da ---; c) cheque nº ---, em 07.10.2003, no valor de €24,25, apôs a sua própria assinatura, e apresentou-o como modo de pagamento; d) cheque nº ---, em 06.10.2003, no valor de €302,90, apôs a sua própria assinatura e apresentou-o como modo de pagamento na loja “ELLA LINGERIE”; e) cheque nº ---, em 06.10.2003, no valor de €171,00, apôs a sua própria assinatura e apresentou-o como modo de pagamento na loja “HELLIOS”; f) cheque nº ---, em 06.10.2003, no valor de €61,20, apôs a sua própria assinatura e apresentou-o como modo de pagamento; g) cheque nº ---, em 06.10.2003, no valor de €262,50, apôs a sua própria assinatura e apresentou-o como modo de pagamento na loja “Lanidor”, sita nas Galerias Saldanha Residence, em Lisboa; (5) Ao usar como modo de pagamento, a arguida AA conseguiu obter os bens assim adquiridos, bem como se apoderou dos valores titulados pelos cheques depositados na sua conta.

B - Da promessa a cidadãos estrangeiros de trabalho e legalização (12) Em data concretamente não apurada, mas em momento anterior a 2004, a arguida AA engendrou um plano que lhe permitia auferir rendimentos, oferecendo a cidadãos estrangeiros, mormente brasileiros, empregos a par da possibilidade de se legalizarem, regularizando a sua situação em território nacional.

(13) De forma a incutir maior credibilidade perante as suas vítimas, a arguida AA intitulava-se advogada, juíza, funcionária da Polícia Judiciária, Inspectora da Polícia de Segurança Pública.

(14) E dizia ter um amigo no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras a quem pediria que tratasse da referida legalização.

(15) Apresentava-se como “Ângela”, “Cristina”, “Cristina Marisa” e outros nomes, deixava o seu contacto telefónico em locais frequentados por esses indivíduos de modo a atrai-los.

(16) Os indivíduos em causa contactavam-na telefonicamente e combinavam encontrar-se em locais de acesso público como terminais de transportes ou centros comerciais.

(17) A arguida prometia, então, tratar-lhes da legalização, regularização da sua situação em território português e/ou arranjar-lhes emprego.

(18) Para tanto, levava-as a entregar-lhes o passaporte e quantias monetárias – variáveis entre os €475,00 e €675,00 – a título de despesas com o processo de legalização.

(19) A partir desse momento, passava a estar incontactável para esses indivíduos.

Outros factos praticados pela arguida: VI – NUIPC 15/04.0ZCLSB (37) Em 16.09.2004, cerca das 12h00m, no Centro Comercial Vasco da Gama - Lisboa, a arguida AA apresentou-se como sendo inspectora da PSP e propôs a CC, de nacionalidade brasileira, tratar da sua situação, obtendo-lhe a nacionalidade portuguesa junto do SEF, através de um seu amigo que aí trabalhava.

(38) CC anuiu e a arguida solicitou-lhe, então, que lhe entregasse o seu passaporte pessoal, bem como a quantia de €475,00, necessários para suportar as despesas do processo.

(39) CC entregou-lhe o seu passaporte, emitido pela República Federativa do Brasil e a quantia de €250,00.

(40) Não obteve a prometida dupla nacionalidade, nem recuperou o dinheiro e o seu passaporte.

(41) Em 20.09.2004, cerca das 16h30m, na Gare do Oriente - Lisboa, a arguida AA apresentou-se como Cristina, intitulou-se como juíza e propôs a DD ir trabalhar como doméstica interna em casa de uma professora universitária sua amiga.

(42) Mais referiu a arguida que tinha uma amiga no SEF que trataria da sua legalização.

(43) DD anuiu e a arguida solicitou-lhe, então, que lhe entregasse o seu passaporte pessoal, bem como a quantia de €735,00, necessários para suportar as despesas de legalização.

(44) DD entregou-lhe o seu passaporte nº ---, emitido pela República Federativa do Brasil e a quantia de €700,00.

(45) Não obteve emprego nem a regularização da sua situação de estrangeira e não recuperou o dinheiro e o seu passaporte.

(46) Em 21.09.2004, cerca das 10h45m, na Gare do Oriente - Lisboa, a arguida AA apresentou-se como Cristina Santos e intitulou-se como juíza, propondo a EE ir trabalhar em sua casa como ama das suas duas filhas.

(47) Mais referiu a arguida que tinha um amigo no SEF que trataria da sua legalização.

(48) EE anuiu e a arguida solicitou-lhe, então, que lhe entregasse o seu passaporte pessoal, bem como a quantia de €660,00, necessários para suportar as despesas de legalização.

(49) EE entregou-lhe o seu passaporte nº ---, emitido pela República Federativa do Brasil e a quantia pedida.

(50) Não obteve emprego nem a regularização da sua situação de estrangeira e não recuperou o dinheiro e o seu passaporte.

VII – NUIPC 1330/04.8PCCSC (51) Em 11.10.2004, cerca das 18h00m, no Centro Comercial Cascais Villa - Cascais, a arguida AA apresentou-se como Ângela Santos, intitulou-se como juíza e propôs a FF ir trabalhar como doméstica em sua casa.

(52) Mais referiu a arguida que tinha um amigo no SEF que trataria da sua legalização.

(53) FF anuiu e a arguida solicitou-lhe, então, que lhe entregasse a quantia de €475,00, necessários para suportar as despesas de legalização.

(54) FF entregou-lhe a quantia pedida.

(55) Não obteve emprego nem a regularização da sua situação de estrangeira e não recuperou o dinheiro.

C - Do arrendamento de casas em Lisboa (60) A par da actividade que desenvolveu junto dos cidadãos estrangeiros, a arguida AA mantinha montado um esquema de promessa de arrendamentos de casas sitas em Lisboa, das quais não era proprietária, logrando obter dos interessados quantias em dinheiro depositadas a título de sinal de reserva de imóvel, caução ou primeira renda.

(61) A arguida AA conseguiu a disponibilidade dos imóveis através da celebração de contratos de arrendamento com os legítimos proprietários, que não cumpriu, e nem pretendia usufruir do locado senão para o mostrar a potenciais interessados no seu arrendamento, arrogando-se a qualidade de proprietária.

(62) A arguida anunciou os imóveis nos jornais “Correio da Manhã” e “Diário de Notícias”, aguardando o contacto pelos interessados para o seu telemóvel pessoal.

(63) Para incutir maior credibilidade junto dos interessados, a arguida dizia ser juíza, advogada ou médica, alegava estar destacada em serviço fora de Lisboa, o que, por vezes, inviabilizava que pudesse mostrar a casa àqueles.

(64) Conseguiu que os mesmos efectuassem depósitos a título de reserva do imóvel, mediante a promessa de que lhes enviaria a chave pelo correio ou através de um autocarro da REDE EXPRESSOS ou através de encontros que nunca ocorreram.

(65) A arguida AA instruía os interessados a efectuar os pagamentos em numerário, através do envio de vales postais ou através de depósitos/transferências nas contas bancárias: - nº ---, do ---, e na conta nº ---, do ---, tituladas pela própria, - nº---, da ---, titulada por ---, mãe da arguida, mas movimentada pela arguida AA, - nº --- da ---, titulada por GG e pela arguida AA, e por esta usada em exclusivo, - nº ---, da ---, titulada por HH (em duas...

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