Acórdão nº 832/10.1JAPRT.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Julho de 2014

Magistrado ResponsávelMANUEL BRAZ
Data da Resolução09 de Julho de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: No Tribunal Judicial da comarca de ..., no final de julgamento em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, foi proferido acórdão condenando AA, nascido em ...: -na pena de 6 anos de prisão, pela prática de um crime de violação p. e p. pelo artº 164º, nº 1, alínea a), do CP; -na pena de 18 anos de prisão, pela prática de um crime de homicídio qualificado p. e p. pelos artºs 131º e 132º, nºs 1 e 2, alíneas c) e g), do CP; -na pena de 2 anos de prisão, pela prática de um crime de coacção agravada p. e p. pelos artºs 154º, nº 1, e 155º, nº 1, alíneas a) e b), do CP; e -em cúmulo jurídico, na pena única de 22 anos de prisão.

O arguido interpôs recurso desse acórdão directamente para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo a sua motivação nos termos que se transcrevem: «1. Decidiu o Tribunal não proceder à atenuação especial da pena, recusando aplicar ao Arguido o regime penal especial para jovens instituído pelo DL n° 401/82, condenando o mesmo na pena única de 22 anos de prisão.

  1. O Arguido não se conforma com esta decisão, e defende que deve beneficiar do regime especial, porquanto, deve, o mesmo, ser-lhe aplicado, só assim se cumprirá a Lei e se fará justiça.

  2. Entende o Arguido que o Tribunal, ao recusar a aplicação do regime penal especial para jovens violou a Lei, nomeadamente o art° 4° do DL 401/82 e, ao fixar-lhe a pena concreta de 22 anos de prisão, violou os art°s 72° e 73° do C.P.

  3. Na tomada da sua decisão, para a não aplicação do regime especial, argumenta o tribunal a quo que “… não há duvidas que os crimes cometidos pelo Arguido são muito graves…“ “... Além disso, não se poderá ignorar o forte impacto que esta situação causou na comunidade…” “…não se podendo olvidar que estaremos possivelmente perante uma pessoa com propensão para este tipo de crime (homicídio)…”.

  4. Assentou e fundamentou tribunal a sua convicção, para a não aplicação do regime penal especial para jovens, na culpa que qualifica de muito grave, na ilicitude dos factos, alarido social e possível reincidência. Resumindo, o tribunal apenas e somente atendeu à exigência de prevenção especial.

  5. Esqueceu-se o tribunal de preceder à análise ou ponderação de exigências especiais “… séria razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”, as quais omitiu por completo aquando da fundamentação da decisão.

  6. O Tribunal interpretou a norma do art° 4º do Dec.-Lei 401/82 no sentido de que o regime da atenuação especial só é de aplicar quando seja de prever que ela terá efeitos socializantes positivos e facilitará a inserção social do jovem delinquente, impondo-se por isso a ponderar a personalidade do agente, o seu comportamento anterior e posterior ao crime, a natureza e gravidade do ilícito praticado e todo o circunstancialismo que rodeou o seu cometimento.

  7. Não levou em consideração o tribunal a quo que o direito penal especial para jovens é um direito que tem uma vertente mais reeducadora do que sancionadora, uma vez que na decisão que proferiu, fez ceder a vertente reeducadora perante os “interesses fundamentais da sociedade”.

  8. O art° 4° do DL 401/82 impõe ao juiz o dever de atenuar especialmente a pena de prisão e o preâmbulo da lei explica que, esta, “exige” que a pena seja sempre especialmente atenuada quando o crime é cometido por um jovem delinquente.

  9. Sendo a inexistência de sérias razões para o julgador crer que da mesma resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado o único limite legal deste dever de atenuação especial.

  10. Contrariamente ao defendido pelos Meritíssimos Juízes, a decisão de atenuação especial não depende da culpa do agente nem das exigências de prevenção resultem vantagens para a reinserção social do jovem.

  11. Não são as exigências de prevenção da criminalidade, de defesa da sociedade, nem é o modo como os actos ocorreram que legitima o tribunal a decidir pela não aplicação da atenuação especial.

  12. No caso em apreço existem serias razões para crer que da atenuação da pena resultarão vantagens seguras para a reinserção social do Arguido.

  13. Factos relevantes, dados por provados e referidos no Douto Acórdão, bem como o relatório social junto aos autos, são reveladores de que o Arguido é um jovem, que há data dos factos tinha 20 anos de idade, que está totalmente integrado no seu meio familiar e social, onde goza de uma imagem social globalmente positiva, considerado como trabalhador, não fazendo uma vida de marginalidade.

  14. Todo o seu percurso pessoal e social até então é suficiente para configurar as tais “sérias razões” necessárias para o tribunal acreditar que da atenuação especial da pena só podem resultar vantagens para a reinserção social do Arguido.

  15. Do relatório social depreende-se, que ao ser-lhe aplicada uma pena justa, especialmente atenuada, este ficará plenamente apto a regressar à convivência social e a retomar a sua vida de forma ordeira e cumpridora.

  16. A pena de 22 anos de prisão aplicada ao Arguido, à data dos factos com 20 anos, um jovem, em nada poderá contribuir para a sua reinserção social, atenta a sua medida excessiva, fortemente estigmatizante pela longa duração e peso, que só poderá resultar em inconvenientes e desvantagens para a sua reeducação.

  17. Atendendo, assim, a que existem sérias razões para crer que da atenuação da pena resultarão vantagens seguras para a reinserção social do arguido, deve a mesma, em cumprimento do disposto no artº 4º do DL 401/82, ser atenuada especialmente nos termos dos artºs 72º e 73º e, como tal, fixada em 15 anos de prisão.

    Nestes termos, e nos mais que V. Ex.cias doutamente se dignarão suprir, deve o presente recurso ser julgado procedente e ser revogada a decisão, fixando-se o quantum...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
2 temas prácticos
2 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT