Acórdão nº 5944/07.6TBVNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Julho de 2014
Magistrado Responsável | PINTO DE ALMEIDA |
Data da Resolução | 09 de Julho de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1]: I.
AA e BB e marido CC, intentaram a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra DD e mulher EE, FF e mulher GG, HH e mulher II.
Pediram que: a) seja declarada nula e de nenhum efeito a divisão de quotas operada na escritura pública de 12 de Janeiro de 1993, no 2.º Cartório Notarial de Vila Nova de Gaia, exarada a fls. … do Livro …; b) sejam declaradas nulas e de nenhum efeito todas as cessões de quotas ai outorgadas; c) sejam declaradas vendidas as quatro quotas de Esc.: 750.000500 (€ 3.740,98) cada em comum e partes iguais aos três RR. pelo preço de Esc.: 25.000.000$00 (€ 124.699,47); d) sejam todos os RR. condenados a pagarem solidariamente aos AA. a quantia de Esc.; 24.000.000$00 (€ 119.711,49) a título da restante parte do preço das aludidas quotas.
Como fundamento, alegaram que o negócio que celebraram com os réus, através da referida escritura, foi simulado, uma vez que o negócio efectivamente realizado foi a venda em comum e partes iguais de quatro quotas sociais pelo preço de 25.000.000$00; os réus não pagaram ainda este preço na totalidade.
Procedeu-se à citação edital dos 1.°s RR., não tendo o M.°P.º, em representação destes, apresentado contestação.
Os 2.°s RR. contestaram, pugnando pela improcedência da acção.
Os 3.°s RR. vieram também apresentar contestação, impugnando a matéria alegada e invocando a ineptidão da petição inicial e a ilegitimidade passiva da R. mulher, além da simulação do negócio, com as legais consequências.
Concluíram pela improcedência da acção e deduziram reconvenção, pedindo seja anulado o negócio, com fundamento no erro sobre o objecto, ordenando-se a restituição do prestado.
Os AA. replicaram, pugnando pela improcedência das excepções deduzidas e do pedido reconvencional.
Os 3.°s RR. treplicaram.
Em virtude do falecimento da R. EE, foram habilitados como seus sucessores o R. marido e o Ministério Público, em representação dos sucessores incertos.
No saneador, foi julgada improcedente a excepção de ineptidão da p.i. e procedente a excepção de ilegitimidade, declarando-se os habilitados da R. EE e as RR GG e II partes ilegítimas.
A final, foi proferida sentença que julgou totalmente improcedentes quer a acção quer a reconvenção.
Os autores apelaram da sentença, tendo a Relação julgado improcedente o recurso e mantido a decisão recorrida.
Ainda inconformados, os autores pedem revista, tendo apresentado as seguintes conclusões: 1. O presente recurso visa sobre as seguintes questões: a) Falta de fundamentação por parte do Tribunal da Relação do Porto, dado que se o Tribunal de 1ª Instância não levou em conta, os documentos juntos e o seu valor probatório, quer cheques emitidos pelos adquirentes, quer a própria certidão judicial junta cujo teor não foi impugnado, também o não fez a Relação do Porto; b) Desvalorização da certidão judicial de declarações de um dos co-réus e do cheque sem provisão que deu origem a processo-crime 2. O Tribunal da Relação do Porto, do recurso interposto, apenas considerou que, por não haver coincidência entre os outorgantes do contrato promessa e contrato prometido, é suficiente para se considerar que não está verificada a simulação relativa.
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Mais considerou que não releva, para efeitos de confissão, as declarações proferidas em processo crime por um dos co-réus, de que foi junta certidão nos autos, por não poderem ser consideradas como confissão nos termos do art. 352.° e ss. do CC).
Falta de Fundamentação da decisão do Tribunal da Relação do Porto 4. "O legislador ao afirmar que a Relação "reaprecia as provas", acrescentando que na reapreciação se poderá atender a "quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão" (cf. art. 712.°, n.º 2, do CPC), pretendeu que o tribunal de 2ª instância fizesse novo julgamento da matéria de facto, fosse à procura da sua própria convicção e, assim, se assegurasse o duplo grau de jurisdição em relação à matéria de facto.", cfr. Ac. do STJ citado nas alegações.
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O Tribunal da Relação do Porto, não fez uma reapreciação da prova produzida em audiência de Julgamento, nem analisou a documentação junta aos autos para além do contrato promessa (ex: certidão judicial donde consta o cheque de parte do preço devolvido).
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Apesar de parte dos promitentes compradores não serem os que, a final, adquiriram as quotas - no contrato promessa constavam como promitentes compradores HH, DD, JJ e KK -; e no contrato prometido figuraram como adquirentes HH, DD e FF.
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Contudo, tal questão nem sequer foi levantada por qualquer das partes, nomeadamente pelos demandados nos autos, pois bem sabiam dos acordos que haviam efectuado entre si.
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Aceitaram que celebraram o contrato promessa dos autos, quer fosse como intervenientes no mesmo como partes iniciais, quer a título de partes que lhes sucederam.
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Nem sequer colocaram em causa que o preço acertado foi o do contrato promessa.
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Para chegar a tal conclusão basta conferir as contestações apresentadas pelo réu FF ("item" 1º da contestação); e pelo réu HH ("itens" 33º e 36º da contestação).
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Ora, o contrato promessa apenas é um dos elementos de prova que nos pode levar a concluir pela existência de simulação relativa constante no art. 241º do CC (…).
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A exigência legal não obriga a uma coincidência formal entre os negócios, mas só a exigência de que o negócio declarado teve subjacente um outro negócio correspondente à real vontade das partes intervenientes naquele.
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As partes intervenientes no negócio declarado, aceitaram que celebraram um outro negócio, diferente, quanto ao preço, pelo que o contrato promessa apenas se destina a evidenciar que a existência de um outro negócio, que não o efectivamente declarado.
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Para além da aceitação das partes - pelo menos dos contestantes - existem os cheques devolvidos por falta de provisão, que se traduz em prova documental que sustenta a alegada existência do outro negócio dissimulado.
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Esta prova é documental e não testemunhal, e deveria ter sido considerada quer na 1ª Instância, quer na Relação, para ser declarada a simulação relativa do negócio, por declaração de preço diferente do efectivamente acordado.
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Certo é que, ao não analisar toda a documentação, como prova do processo, o Tribunal da Relação do Porto, "furta-se a formar a sua própria convicção, não reapreciando, como devia, as provas apresentadas em que assentou a parte impugnada da decisão ... ", não assegurando de forma efectiva um duplo grau de jurisdição em matéria de facto.
Valor probatório das declarações proferidas em processo crime: valor de confissão? 17. Entendeu o Tribunal da Relação do Porto que as declarações do co-réu, em processo crime, segundo o qual o mesmo declara - assim como o faz na sua contestação conforme supra se referiu -, que o preço não estava pago, mas seria pago em 8 cheques, não tem a virtualidade de poder ser considerada como confissão.
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Mormente não pode ser considerada para os efeitos previstos no art. 352.° do CPC.
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Então qual o valor probatório de tais declarações? Não terá valor probatório algum? 20. Refere o art. 352º do Código Civil, que a confissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária, podendo ser judicial ou extrajudicial.
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As declarações em concreto, cuja certidão foi junta a estes autos, e que não foi objecto de qualquer impugnação do seu teor, quer pelo próprio autor, quer pelos demais co-réus, mesmo que não possam ter a virtualidade de confissão, têm valor probatório.
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A...
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