Acórdão nº 800/12.9TBCBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | SERRA BAPTISTA |
Data da Resolução | 23 de Outubro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA veio intentar acção, com processo ordinário, contra BB e CAIXA CC, SA, pedindo a condenação destes a: 1. Reconhecerem que o autor é proprietário exclusivo da fracção identificada no art. 3.º da p. i., por se tratar de bem próprio seu e, em consequência: 2. Ser considerada na partilha dos bens comuns do casal a titularidade exclusiva do autor sobre a referida fracção; 3. Ser alterada a apresentação nº 78 de 1987/06/04 da descrição predial nº … – fracção B – freguesia de Santo António dos Olivais, no sentido da exclusão da ré da titularidade da fracção por referência à titularidade exclusiva da fracção pelo autor, por se tratar de bem próprio seu; 4. Ser alterada a apresentação nº 80 de 1987/06/04 da referida descrição, desresponsabilizando a ré (mulher) do crédito hipotecário.
Alegando, para tanto, e em suma: No dia 28 de Agosto de 1987 adquiriu a fracção autónoma que melhor é descrita no art. 3.º da p. i. mas, apesar de casado com a ré BB no regime da comunhão de adquiridos, tal fracção é um bem próprio seu, pois suportou integralmente, com dinheiro próprio, apenas proveniente da sua pensão de reforma por invalidez, quer o crédito hipotecário, quer as benfeitorias realizadas no imóvel, bem como todas as despesas inerentes à sua existência.
A dita pensão de invalidez é um bem próprio, adquirido antes do casamento e na constância do mesmo por virtude de direito próprio anterior, insusceptível de se transmitir ao património comum do casal.
Por isso, a fracção autónoma é bem próprio do autor.
Por ocasião da aquisição da fracção foi celebrado com a ré Caixa um contrato de mútuo com hipoteca.
Citadas rés, vieram contestar.
Dizendo a ré Caixa, também em suma: Salvo convenção em contrário, que não existe, a hipoteca constituída sobre o prédio é indivisível, subsistindo por inteiro sobre a coisa onerada e sobre cada uma das partes que a constituam, ainda que a coisa ou crédito seja dividido.
Não pode, pois, desde logo, ver o autor atendido o seu pedido no tocante à ré Caixa, não podendo a ré BB ser desvinculada do contrato de mútuo celebrado.
Tendo vindo a ré BB alegar, ainda em síntese, o seguinte: A pensão de invalidez é um rendimento equiparado ao produto do trabalho, tendo, assim, a qualidade de bem comum.
Quer a ré, quer o autor, na constância do matrimónio, contribuíam para a economia comum do casal, sendo este quem sempre conheceu e movimentou as contas bancárias do casal.
Replicou o autor, mantendo a sua pretensão inicial, pedindo, à cautela, a título subsidiário, a alteração do pedido, para a hipótese de não lograr provar que para aquisição, conservação e beneficiação do imóvel contribuíram apenas bens próprios do autor, deve-lhe este ser atribuído por para ele ter participado com a contribuição mais valiosa.
Proferiu a senhora Juíza o despacho saneador, tendo nele decidido pela improcedência da acção, com absolvição das rés em relação aos respectivos pedidos.
Inconformado, veio o autor, sem êxito, interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Coimbra.
Ainda irresignado veio o mesmo autor pedir revista excepcional, que foi admitida, para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - O Tribunal recorrido entendeu erradamente que as prestações recebidas a título de pensão de reforma por invalidez não podem ser bens próprios e incomunicáveis, nem enquadráveis em qualquer das previsões do n." I do artigo 1722° e/ou do n." I do artigo 1733.º do Código Civil.
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- O Recorrente não pode alinhar, nem concordar com uma decisão do teor da proferida, desde logo porque ela anula a ratio que subjaz à destrinça entre os bens incomunicáveis (próprios) e os bens comunicáveis (comuns), que é a existência ou não de real cooperação ou esforço conjunto entre ambos os cônjuges para a obtenção de bens.
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- O critério da distinção entre bens comuns (ou comunicáveis) e bens próprios (incomunicáveis) no regime supletivo da comunhão de adquiridos assenta, essencialmente, na existência ou inexistência, respectivamente, de cooperação, actividade conjunta e de comunhão e conjugação de esforços e de sacrifícios entre ambos os cônjuges para a obtenção dos bens.
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- O núcleo do património comum limita-se, destarte, aos bens adquiridos com base numa real cooperação entre cônjuges.
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- Já o património próprio e a aquisição de bens próprios (cfr. artigos 1722°, 1723°, 1726°, 1727 e 1733° do Código Civil) fundamenta-se essencialmente na ausência de colaboração, cooperação ou esforço conjunto de ambos os cônjuges na aquisição do direito, sendo que a situação de facto fundamental geradora do direito próprio do cônjuge está constituída antes do casamento.
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- A razão de ser desta distinção, que se faz entre bens comuns e bens próprios no âmbito do regime da comunhão de adquiridos, tem intrínseca a rejeição do locupletamento de um cônjuge à custa do outro e do esforço do outro.
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- Por outro lado, o Acórdão em crise parece ter esquecido que a pensão de reforma por invalidez atribuída ao Recorrente e o direito ao respectivo recebimento tiveram a sua génese e constituição no estado de solteiro deste último, i.e., em momento bem anterior ao do seu casamento com a 1ª Recorrida, e igualiza (quanto às características, natureza jurídica, fundamentos e efeitos) a pensão de reforma por invalidez à pensão de reforma por velhice, olvida completamente que existe uma diferenciação substancial entre ambas, merecedora de um regime diferente e específico para cada uma delas.
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- Desde logo, as pensões de reforma por velhice são o resultado das contribuições do cônjuge remunerado para a instituição de segurança social e constituem património comum do casal porque estas últimas são realizadas com a sua retribuição.
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- A pensão de reforma por velhice tem natureza patrimonial e retributiva e é determinada pela antiguidade do serviço e fixada com base na média das retribuições recebidas nos últimos anos de serviço prestado e por causa delas.
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- O direito à pensão de reforma por velhice é formado por parte dos rendimentos do trabalho (produto do trabalho), pelo que as respectivas prestações pecuniárias por reforma, periódicas e mensais, porque substitutivas dos rendimentos do trabalho, são proventos e produto do trabalho dos cônjuges, que entram para a comunhão, nos termos da alínea a) do artigo 1724.º do Código Civil.
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- Substancialmente diferente é a pensão de reforma por invalidez.
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- A pensão de invalidez é um valor pago mensalmente, que integra imediatamente o património do lesado que a recebe, destinado a proteger o beneficiário em toda a situação incapacitante, de causa não profissional, determinante de incapacidade física, sensorial ou mental permanente (relativa ou absoluta) para o trabalho (arts. 2° e 4º do Decreto-Lei n." 187/2007, de 10 de Maio).
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- Contrariamente à pensão de reforma por velhice, a pensão por invalidez não tem natureza retributiva, mas reparatória/compensatória da perda da capacidade de trabalho e de ganho, e é fixada não em função da antiguidade do serviço ou da média das retribuições recebidas nos últimos anos de serviço prestado, mas sim em função do grau de incapacidade...
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